Acórdão nº 692/02.6BTLRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 20 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução20 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACÓRDÃO I-RELATÓRIO O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (DRFP) veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por G.....-SOCIEDADE DE ESTUDOS E MONTAGENS DE ELETRICIDADE E MECÂNICA, LDA, tendo por objeto o ato de indeferimento expresso da reclamação graciosa da liquidação de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e juros compensatórios (JC), do ano de 1997, no valor global de €49.254,55.

A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem: A. Visa o presente recurso reagir contra a douta Sentença proferida em primeira instância, porquanto a mesma julgou procedente no que respeita às correções das faturas emitidas pela F..... e consequentemente, condenou a Fazenda Pública no pagamento de juros indemnizatórios sobre os montantes indevidamente pagos, contados desde a data do pagamento indevido (31/08/2001) até à data em que vier a ser emitida a nota de crédito).

B.

Compulsada a prova documental e testemunhal junta aos autos de primeira instância, deveria a douta sentença proferida em primeira instância ter julgado provado: a existência de indícios de faturação falsa da emitente das faturas sobre apreço, a sociedade F..... – Armazéns Condutores e Material Eléctrico; que não foram efetivamente efetuados os pagamentos das referidas faturas da F.....; que não foram efectivados os custos decorrentes das faturas da F.....; que a Impugnante levantava os cheques que passava à F..... para pagamentos das referidas faturas; o Caixa da Impugnante não refletia os movimentos financeiros de pagamento que decorrem dos referidos cheques; a F..... teve dívidas aos trabalhadores e que pagava em dinheiro; a F..... incluía nas suas faturas dos materiais: o local, hora, carga e descarga dos materiais.

C.

O Tribunal “a quo” ao considerar que as faturas nos autos contêm a descrição pormenorizada do material vendido e que de acordo com as faturas sabe-se qual a taxa de IVA aplicável na transmissão dos bens em causa, e tendo em consideração que a descrição anexa é suficiente para a Administração Fiscal poder controlar a taxa de IVA, conclui que é suficiente para ser aceite a dedução do IVA, sendo procedente a impugnação quanto a este ponto.

D.

Ao contrário do pronunciado na douta decisão, a Administração Tributária não se limitou a não aceitar as faturas da F....., para efeitos de dedução do IVA, por não conterem os locais de carga, descarga, nem a data e a hora, e as correções operadas não foram, por si só, por causa do preenchimento formal dos requisitos dos elementos das faturas, pelo que não se trata de uma apreciação à luz do n.º5 do art.35.º do CIVA.

E.

Na verdade, a Administração Tributária não aceitou as faturas em apreço da F..... porque efectivamente a Impugnante, ora Recorrida, nunca efetuou o pagamento dessas faturas, e como tal nunca teve esses custos, sendo indevida a dedução do respetivo imposto.

F.

Com o devido respeito, colhida a nossa experiência, tratando-se faturas de favor.

G.

Estamos perante uma fatura que respeita os preenchimentos dos elementos previsto no art.35 n.º5 do CIVA, mas que tem subjacente uma divergência intencional entre a vontade e a declaração negocial, ou seja, uma operação nunca existiu e foi dissimulada por via de um meio legal e verdadeiro.

H.

Em boa verdade, tal como atentou o Tribunal “a quo” quanto às faturas emitidas por Nelson ....., estamos perante uma situação de operação simulada nas faturas emitidas pela F....., e como tal o Tribunal “a quo” deveria ter preconizado o mesmo entendimento.

I.

Entendemos que as vicissitudes das faturas emitidas pela F..... são idênticas às faturas emitidas por Nelson ....., pelo que entendemos que o Tribunal “a quo” deveria ter preconizado o mesmo entendimento e, nos mesmos moldes, a mesma pronúncia de improcedência da pretensão da Impugnante.

J.

À Administração Tributária incumbe o ónus da prova da verificação dos pressupostos que a determinaram a efetuar as correções técnicas, e efetuada esta demonstração pela Administração tributária, então passa a competir ao sujeito passivo, ora inspecionado, o ónus da prova de que as operações se realizaram efectivamente, e conforme bem aclarado na Douta Decisão quanto às faturas emitidas por Nelson ......

K.

Contudo a Impugnante, não demonstrou cabalmente a efetividade dessas operações, havendo uma total ausência de prova nos autos que vá para além das próprias faturas.

L.

Quanto à questão sobre os elementos da carga, descarga, local e hora, atente-se que à data dos factos tributários em apreço, 1997, estava em vigor o Decreto-Lei n.º 45/89 de 11 de fevereiro, respeitante aos documentos de transporte dos bens em circulação, que veio a ser revogado pelo art.2.º do Decreto-Lei n.º 147/2003 de 11 de julho.

M.

Quanto aos elementos que obrigatoriamente devem conter as faturas, guia de remessa ou documentos equivalentes, estes vêm prescritos no art.3.º: “1- As faturas deverão conter, obrigatoriamente os elementos referidos no n.º5 do artigo 35.º do Código do imposto sobre o Valor Acrescentado.(…) 4- As faturas, guias de remessa ou documentos equivalentes deverão ainda indicar os locais de carga e descarga, referidos como tais, e a data e hora em que se inicia o transporte. 5- Na falta de menção expressa dos locais de carga e descarga e da data do início do transporte, presumir-se-ão como tais os constantes do documento de transporte. (…)” (negrito nosso).

N.

Daqui decorre, que a fatura quando é utilizada como documento de transporte, para além dos requisitos previstos no art.35.º n.º5 do CIVA, deverá conter o local de carga e descarga, a data e hora do transporte.

O.

Se não havia uma guia de transporte dos bens respeitante a cada fatura, então é porque as respetivas faturas foram utilizadas como guias de transporte.

P.

Se as faturas foram utilizadas como guias de transporte, então tinham de respeitar o previsto no referido n.º4 do art.3 .º do D.L.45/89, sob pena de não terem o respetivo valor jurídico, na medida em que equivale à falta da sua emissão.

Q.

Por outro lado, caso se entenda que as faturas, em apreço, não foram utilizadas como guias de transporte (que não se concebe), e dessa forma, não tinham que ter os elementos do n.º4 do art.3.º do D.L. n.º45/89, cabe-nos alocar aqui a supra referida falta de demonstração da efetividade das operações que competia à Impugnante, ora Recorrida, em virtude do seu ónus da prova.

R.

Porque de facto, e conforme decorre do D.L. n.º45/89, as guias de transporte, como documentos que titulam os bens em circulação, permitem controlar e combater os meios fraudulentos para fugirem à liquidação ou entrega do imposto nos cofres do Estado, dessa forma, as guias de transporte permitiam demonstrar a efetividade dessas operações, mas que não são referidas nas faturas em apreço, nem constam nos presentes autos.

S.

Por fim, quanto aos juros indemnizatórios, atento o recurso da decisão que decidiu pela procedência da impugnação judicial quanto à aceitação da dedução do imposto das faturas emitidas pela F..... decisão de procedência parcial, e pugnando-se pelo erro de julgamento de facto e de direito, com a inerente improcedência da impugnação judicial também quanto às faturas emitidas pela F....., entende-se que a Fazenda Pública não deve ser condenada nos referidos juros indemnizatórios.

T.

Assim sendo, é entendimento da Representação da Fazenda Pública que o Tribunal “a quo”, com a decisão ora em crise, violou o disposto no art.19.º, 20 do CIVA, e os artigos 1.º, 3.º e 4.º do Decreto-Lei n.º45/89 de 11 de fevereiro ao considerar, que as faturas da F..... são suficientes para a Impugnante poder deduzir o IVA em causa, em virtude as faturas conterem a descrição pormenorizada do material vendido, de se saber a taxa de IVA aplicável na transmissão dos bens em causa, sendo suficiente para a Administração Fiscal poder controlar a taxa de IVA.

  1. Com o devido respeito e salvo melhor opinião, o disposto no art.19.º, 20.º e 35.ºdo CIVA, e os artigos 1.º, 3.º e 4.º do Decreto-Lei n.º45/89 de 11 de fevereiro deveriam ter sido interpretados no seguinte sentido que a questão em apreço não constitui saber se as faturas em causa continham ou não os elementos previsto no art.35.º n.º5 do CIVA, mas antes dar por verificado que a Administração Tributária fez prova e demonstração de que aquelas faturas respeitam a operações simuladas, nomeadamente pela inexistência de pagamentos efetivados, e que Impugnante não demonstrou que aquelas faturas contabilizadas titulavam operações comerciais efetivas e reais.

    V. E dessa forma, deveria ter sido perfilhado o mesmo entendimento e sentido, que foi efetuado quanto às faturas emitidas por Nelson ......

  2. Mais ainda, considerar que as faturas emitidas pelas F....., em apreço continham habitualmente o local de carga, descarga, hora e data em cumprimento com o referido no art.3.º do Decreto-Lei n.º45/89 de 11 de fevereiro, e que ao não respeitarem com esses requisitos, acrescido os indícios de simulação previstos no art.19 n.º3 do CIVA, concluir-se que as faturas emitidas pela F..... nunca poderia ter o respetivo valor jurídico para efeitos de custos e dedução do IVA.

    X.

    A Fazenda Pública entende que dever-se-á considerar que a solução de mérito mais acertada no caso concreto é a de que deve manter-se na ordem jurídica, integralmente. a liquidação, ora impugnada, nomeadamente a parte controvertida no presente recurso.

    Pelo que se peticiona o provimento do presente recurso, revogando-se a decisão ora recorrida, assim se fazendo a devida e acostumada JUSTIÇA!” *** A Recorrida não apresentou contra-alegações.

    *** O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da procedência do recurso.

    *** Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

    *** II - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença...

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