Acórdão nº 1119/09.8BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 20 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelCATARINA ALMEIDA E SOUSA
Data da Resolução20 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul 1 – RELATÓRIO M......

, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra que julgou improcedentes os embargos de terceiro por si deduzidos contra a penhora da fracção autónoma designada pela letra “Z”, destinada a habitação, correspondente ao 8º esquerdo, do prédio urbano inscrito na matriz urbana da Freguesia de Algés, sob o artigo….., sito na Rua Margarida Palha, ….., efectuada no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3……, instaurado no Serviço de Finanças de Oeiras 3, em que é executada sociedade S – S......, SARL, dela veio interpor recurso jurisdicional.

Formula, para tanto, as seguintes conclusões:

  1. A embargante não concorda com a decisão proferida pelo Tribunal a quo, a qual deve ser revogada.

  2. Relativamente à matéria de facto dada como provada desde já se dirá que no ponto C) dos factos provados consta que “Em 09/04/1976 foi entregue na Câmara Municipal de Oeiras documento particular assinado pela Embargante, na qualidade de senhoria, dando de arrendamento a fracção autónoma referida na alínea antecedente” – Cfr. documento 5 junto com a p.i., o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido; C) Para além deste facto deveria ter sido dado como provado que em 1 de Novembro de 1975 a Embargante celebrou com H...... um contrato de arrendamento, na qualidade de senhoria, sobre a fracção identificada em A - conforme contrato de arrendamento junto com a pi como doc 5. o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido; D) A posse é definida no artigo 1251º do Código Civil , como «[o] poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real», logo daqui decorre que a posse tem de se revestir de dois elementos, o corpus, elemento material da posse, ou seja, o poder de facto que se exerce sobre a coisa, e o animus possidendi, o elemento psicológico, ou seja, a intenção de actuar como se o agente fosse titular do direito real correspondente, seja ele o direito de propriedade ou outro.

  3. Segundo o artigo 1253º do Código Civil, são havidos como detentores ou possuidores precários os que exercem o poder de facto sem intenção de agir como beneficiários do direito, os que simplesmente se aproveitam da tolerância do titular do direito e os representantes ou mandatários do possuidor e, de um modo geral, todos os que possuem em nome de outrem.

  4. Nos termos do artigo 1263º do mesmo diploma legal A posse adquire-se pela prática reiterada, com publicidade, dos actos materiais correspondentes ao exercício do direito; Pela tradição material ou simbólica da coisa, efectuada pelo anterior possuidor; Por constituto possessório; Por inversão do título da posse.” G) Para ter a posse não é necessária a prática de actos materiais sobre a coisa, basta a possibilidade de os praticar, já que o nosso Código Civil perfilhou uma concepção subjectiva da posse, onde, a par da actuação de facto sobre a coisa é preciso que haja por parte do detentor a intenção "animus" de exercer como o seu titular um direito real e não um mero poder de facto sobre ela (cfr. na doutrina, Código Civil Anotado, Vol. III, de Pires de Lima e A. Varela, 2.ª Edição revista e actualizada, pág. 5 e segs) H) Como nos diz, entre outros, ORLANDO DE CARVALHO «não existe corpus sem animus nem animus sem corpus. Há uma relação biunívoca. Corpus é o exercício de poderes de facto que intende para uma vontade de domínio, de poder jurídico-real. Animus é a intenção jurídico-real, a vontade de agir como titular de um direito real, que se exprime (e hoc sensu emerge ou é inferível) em (de) certa actuação de facto. É essa inferência ou correspondência que se acentua no artigo 1251.º. De resto, o artigo 1253.º, contrapondo posse a detenção, não deixa lugar a dúvidas». (in Introdução à Posse, Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 122 (n.º 3780), pág. 66).

  5. Do nosso entendimento resulta que o promitente comprador, tendo havido tradição da coisa, é um verdadeiro possuidor e não um mero detentor, gozando de tutela possessória, se o “corpus” da posse exercido pelo promitente comprador for acompanhado do “animus possidendi”, ou seja, se ele actuar com “animus rem sibi habendi” (neste sentido, cf. o Ac. da RP de 13.11.2007, P. 0724885, Relator: A….., in www.dgsi.pt) – cfr. Acórdão da Relação do Porto de 01/04/2014, proferido no processo n.º 2688/13.3TJVNF-A.P1, disponível em www.dgsi.pt.

  6. No caso em apreço, tendo em conta que a embargante fundamentou os presentes embargos na existência de contrato promessa, através do qual a executada , prometeu vender, e ela comprar-lhe, o imóvel mencionado nos factos provados (alínea A) dos factos provados) e ficou provado que a promitente vendedora entregou o imóvel supra mencionado à promitente compradora , embargante nos presentes autos (aliena B) dos factos provados ) e que esta passou a suportar as despesas do imóvel , nomeadamente as despesas de condomínio (aliena D) dos factos provados ) e despesas respeitantes a vistorias de obras no imóvel (aliena E) dos factos provados ), e que inclusive arrendou o imóvel na qualidade de senhoria (aliena C) dos factos provados ) K) O facto de o imóvel ter transitado para a embargante promitente compradora conjugado com o facto de esta ter passado a pagar as despesas de condomínio, as taxas referentes as obras , e inclusive ter arrendado o do imóvel na qualidade de senhoria , são demonstrativos de que a embargante exercia sobre o imóvel actos inerentes exercício do direito de propriedade , convicta de a coisa ser sua e como tal agindo em seu próprio nome e não em nome do promitente vendedor .

  7. Tal é bem patente com a celebração do contrato de arrendamento onde assume a qualidade de senhoria, acto que não é compatível com um possuidor precário.

  8. Ainda que o meritíssimo juiz a quo não tivesse dado como provado o pagamento a totalidade do pagamento do preço pela embargante, este facto de per si não é suficiente para afastar o animus possidendi da mesma , o qual pode ser demonstrado por outros factos , como alias o foi.

  9. O pagamento do preço enquanto revelador do animus possidendi é apenas uma das formas desse animus se revelar , e o exemplo mais comum na doutrina, mas não passa disso mesmo um exemplo, veja se sobre esta matéria o acórdão publicado em http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/cae128de0d...

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