Acórdão nº 00294/19.8BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução14 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: I. RELATÓRIO 1.1. Y., Lda.

, com NIF (…) e sede na Rua (…), (…), intentou o presente processo cautelar contra o IFAP – Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, I.P.

, com sede na Rua (…), (…), no qual formulou o seguinte pedido: «Termos em que deve o presente procedimento ser considerado provado e procedente e, em consequência: - ser suspenso o acto administrativo com a Ref 006116/2019 DAI-UREC - serem pagos os € 6600 respectivos do dossier 12 ainda não pagos - abster-se a administração de compensar créditos da requerente - abster-se de avançar com a execução fiscal de € 139,989,92.

- Tudo com as legais consequências.» Alegou, para o efeito, em síntese, que através do ato suspendendo o Requerido decidiu exigir a devolução de todas as quantias pagas à Requerente no âmbito da operação n.º 020000043148 e fazer a compensação com créditos detidos sobre esta, decisão que configura abuso do direito, na modalidade de venire contra factum proprium, pelo facto de o Requerido ter ilegalmente retirado à Requerente as parcelas de terreno sobre as quais incide a operação em causa, nos primeiros anos de vida das plantas, e ter demorado quase dois anos a repô-las e agora fundar a decisão de resolver o contrato com fundamento na fraca vingabilidade das plantas; Mais alegou que os factos considerados na fundamentação do acto suspendendo não estão correctos: i) apenas estão mortas 10% do total das plantas, ii) a água da rega não foi vista com pressão nos tubos no local 2, iii) a Requerente manteve a sua actividade e a exploração, iv) as facturas, os recibos, os comprovativos das transferências e as vistorias comprovam que a Requerente aplicou integralmente o apoio recebido, v) limpou e alargou as charcas e abriu dois poços, vi) a fraca vingabilidade se deveu às condições atmosféricas e morfológicas do terreno e à circunstância de o Requerido ter retirado as parcelas e os subsídios à Requerente; Alegou ainda que existiu erro de cálculo na fórmula utilizada pelo IFAP, que o ato suspendendo é extemporâneo uma vez que à data da sua emissão já não existia qualquer relação contratual entre a Requerente e o Requerido, uma vez que esta terminou em 08.05.2019, data do termo do prazo da operação e que o processo administrativo deveria ter sido considerado deserto por ter estado parado mais de seis meses entre a audiência prévia e a decisão final.

Aduziu, ademais, que a compensação de créditos origina a perda imediata do subsídio anual contratualmente definido, que traduz a perda de EUR 16.301,67, que conta bancária da Requerente apresenta um saldo de zero euros, não dispondo de qualquer património.

Que o subsídio é essencial para a Requerente, uma vez que se dedica exclusivamente ao projecto, não tendo outras fontes de rendimento e que a situação de extrema seca exigiu um esforço desumano e económico muito superior ao normal.

Que a execução do ato suspendendo afetará também a sua gerente, que se dedica exclusivamente à Requerente, tendo investido tudo o que possuía nesta, tendo uma filha de seis anos a seu cargo e que perderá todo o dinheiro investido e a obra realizada; Por fim, alega que a suspensão de eficácia do acto administrativo evitará a insolvência da Requerente, permitindo-lhe manter a actividade e evitar a morte das culturas e plantações, superando assim o interesse do Requerido em executar aquele acto.

*1.2. Regularmente citada, a Entidade Requerida, deduziu oposição, impugnando o pedido cautelar formulado pela Requerente, por no seu entender, não lhe assistir razão.

*1.3. Foi produzida prova testemunhal em audiência realizada no dia 19.11.2019.

*1.4.

Em 03 de dezembro de 2019 o TAF de Mirandela proferiu sentença na qual pode ler-se o seguinte: « Em face de tudo quanto antecede, julgo a presente acção improcedente, e, consequentemente, indefiro a providência cautelar requerida nos presentes autos.

Custas pela Requerente.

Registe e notifique.»*1.5.

Inconformada com esta decisão, a Autora interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que a decisão recorrida fosse revogada.

Concluiu as suas alegações da seguinte forma: «1ª O ponto A da matéria dada como não provada da sentença que se recorre, deverá ser considerada provada por constar expressamente no ofício do IFAP, 0008256 DGI-UIPA e 01368/2017 DGI-UIPA, doc. 6 da providência, que a Recorrente deixou de ter título de posse desde 20/ 03/ 2017 por resolução do contrato de comodato que sustentava a posse por parte da aqui Recorrente das parcelas e referir o Recorrido que existe um outro titulo de posse válido emitido por S.J.A. e por M.C.C.R., desde 23/05/2017, a P., Lda.

2ªOficio junto como documento 6 é um documento autêntico, lavrado nos termos do art.º 369º, n.º 2 CCiv.

3ª Tem força probatória plena, nos termos do art. 371º CCiv., portanto faz prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade – ou seja, retirou os terrenos do parcelário e alterou para o nome de P.,, Lda..

4ªAfirma a celebração de um contrato de comodato – cfr. art. 1129º CCiv., cujo efeito é a entrega de uma pessoa a outra de certa coisa (de S.M.A., de S.J.A. e de M.C.A.R., para a empresa à P.,, Lda).

5ª Aplica-se, então, o art. 1137º CCIv- o comodatário deve restituí-a ao comodante logo que o uso finde ou, 1137º, n.º 2, logo que lhe seja exigida, o que implica a obrigação de restituição da coisa logo que solicitada, art. 1043º, n.º 1 CCiv., aplicável ex vi art. 1137º, n.º 3 CCiv..

6ª Portanto, por consequência também de lei, temos forçosamente de concluir que com a cessação do contrato de comodato, os requerentes deixaram de ter posse das parcelas. Isso deve ser dado como provado, e daí seja natural que tenham deixado de poder cultivar as mesmas.

7ª A retirada das parcelas do nome da aqui recorrente implica o incumprimento das suas obrigações enquanto beneficiária – cfr. doc. n.º 1, fls. 3, cláusula A. 7.

8ª A referida sentença de suspensão de eficácia do acto só é proferida em Agosto de 2018, cfr. doc. n.º 5, fls. 4, algo que não é impugnado. Mas a suspensão de eficácia não se refere ao título de posse da requerente.

9ª Esse título cessou com a resolução do comodato, portanto com a resolução do comodato por motivos ilícitos, a requerente deixou de poder cumprir o contrato, por motivo que não lhe é imputável, o que leva forçosamente à impugnação do facto A, da matéria de facto assente, porque as parcelas foram efetivamente retiradas por falta de preenchimento de condições de manutenção do seu registo em nome do beneficiário.

10ª Se saíram da posse da recorrente naquela data e se o processo 11/18.0BEMDL intentado, procedente a aqui recorrente, só transitou em julgado na segunda metade de Agosto de 2018, cfr doc 5 da prov. Assim é inegável que houve cessação do título de posse e novo título de posse a terceiro, então com o devido respeito dúvidas não restam que terá de ser dado como provado que a R. não teve as parcelas pelo menos entre Maio e 2017 e finais de 2018.

11ª A prova da alínea A), dos factos dados não provados com relevância do tribunal ad quo, provocam que seja dado como provado a alínea B, destes factos, desde logo porque é a consequência legal do art. 21º, n.º 1, do Regulamento Delegado (EU) n.º 640/2014, art 2º da Portaria n.º 87/2017 de 27 de fevereiro, nº1 b) do art 5º Portaria n.º 86/2011 de 25 de fevereiro, artigo 36º do regulamento (EU) n.º 1307/2013 do parlamento europeu e do conselho de 17 de dezembro de 2013 12ª Nunca pode o Tribunal A quo, pedir prova de algo que é uma consequência legal do alegado, pois se os terrenos/parcelas não estavam atribuídos à Recorrente, é obrigação da entidade promotora dos apoios não pagar os mesmos.

13ª O bloqueamento de subsídios aconteceu e são razão pela qual o recorrido, não impugnou nem os artigos 70º, 71º, 83º da providencia, nem o conteúdo destes, razão pela qual também nos termos do art 342º do CC, devem ser dadas como provados que o valor anual de subsidio é de € 16 301, 67 e que este não foi pago devido ao acto administrativo, que viria a ser considerado ilícito e irregular, conforme sentença junta como doc 8.

14ª A IES junto aos autos, a pedido do juiz Ad Quo, doc nº 004322266, junto a 18/10/2019, pag. 632 a 690 da providência, demonstram e fazem prova que os subsídios em 2017 não foram pagos.

15ª A IES do ano de 2018 junto aos autos, a pedido do Juiz Ad Quo, doc. nº 004322267, junto a 18/10/2019, pag. 691 a 749 da providencia, demonstram e fazem prova que apenas foram auferidos 2 165,29 € a título de subsídios de governo e apoio.

16ª Esta quantia é irrisória e de todo insuficiente para 6,50ha de amendoal em sequeiro, de 1,40ha de macieiras em regadio com sistema gota a gota, de 2,40ha de pomar de pessegueiros em regadio com sistema de rega gota a gota, bem como 6,52ha de vinha com sistema de rega gota a gota.

17ª Isto agrava se tiver em causa que o valor a pagar pelo Recorrido de subsídios anualmente, é de € 16.301,67 (dezasseis mil trezentos e um euros e sessenta e sete cêntimos), conforme pag. 7 do doc 8 e valor de causa aceite da sentença junto neste doc 8. E quando nem sequer as parcelas que nunca tiverem em litígios receberam subsídio.

18ª Ora, não existe declaração deste rendimento na contabilidade da sociedade comercial, e a contabilidade não foi em momento algum impugnada, presumindo-se verdadeira – cfr. art. 75º LGT, mais fazendo prova da informação em si contida nos termos do art. 44º do Código Comercial. Portanto, está plenamente demonstrado e de forma escrita que os subsídios foram bloqueados em 2017 e 2018.

19ª Mais, Estes factos foram todos alegados nos termos do art. 5º, n.º 1 CPC.

20ª O IFAP, recorrido, não apresentou documento comprovativo de entrega dos subsídios, o que lhe cabia pelo 342º, n.º 2 C.Civ. Como não cumpre com o ónus da prova, a questão deve resolver-se contra o IFAP, recorrido.

21ª Juiz ad quo tem ainda o dever de considerar factos instrumentais que...

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