Acórdão nº 00562/19.9BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelRogério Paulo da Costa Martins
Data da Resolução17 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: A.M.C.P.

veio interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, de 04.10.2019, pela qual foi julgada apenas parcialmente procedente a acção administrativa de reconhecimento de direitos que intentou contra o Instituto Público Caixa Geral de Aposentações e a Unidade Local de Saúde do (...), E.P.E., com vista à condenação solidária dos Réus ao pagamento imediato da pensão ou indemnização correspondente à incapacidade parcial permanente de que a Autora ficou padecer em consequência do acidente em serviço de que foi vítima a 23.04.2010, a liquidar em execução de sentença, acrescida de juros.

Invocou para tanto, em síntese, que ao decidir pela responsabilidade exclusiva do Reu Instituto e não pela responsabilidade solidária de ambos os Réus, como se impunha, no seu entender, o Tribunal recorrido violou, por deficiente interpretação, os artigos 513.º e 595.º n.º 2 do Código Civil.

A Unidade Local de Saúde do (...) contra-alegou neste recurso, defendendo a improcedência do mesmo; para além de referir o facto de ter sido indevidamente interposto para a Secção Tributária do Supremo Tribunal Administrativo.

Notificada para esclarecer o seu requerimento de recurso, a Autora, ora Recorrente, veio esclarecer que se deveu a mero lapso a indicação do tribunal de recurso, pretendendo interpor para o Tribunal Central Administrativo.

O Instituto Público Caixa Geral de Aposentações veio também interpor RECURSO JURISDICIONAL daquela decisão.

Invocou para tanto, em síntese, que devia ter sido julgada procedente a excepção de caducidade do direito de acção ou, a não se entender assim, deveria ter sido julgada improcedente a acção.

A Unidade Local de Saúde do (...) contra-alegou também neste recurso, defendendo igualmente a manutenção integral da decisão recorrida.

O Tribunal recorrido proferiu despacho a admitir ambos os recursos como interpostos para este Tribunal Central Administrativo Norte.

*Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

* I.I. - São estas as conclusões das alegações do recurso interposto pela Autora A.M.C.P.

e que definem o respectivo objecto: I. A ora recorrente se não conformar com parte da douta sentença o qual considerou o seguinte: “(…)Assim, por força do disposto no 5º, nº 3 e 34º nºs 1 e 4, do DL n.º 503/99 a competência, avaliação, reparação, atribuição e pagamento de pensões por incapacidade permanente é da responsabilidade da Caixa Geral de Aposentações, única entidade responsável a que pode, nos termos do regime legal aqui convocado, ser responsabilizada (directamente) pela Autora. Desta forma, não impressa o ofício constante no ponto X) dos factos assentes, ao ponto de atribuir a responsabilidade do pagamento da pensão aqui em causa à 2.ª Ré, desde logo porque dele não se extrai a assunção por esta última da responsabilidade (nem exclusiva nem solidária) pelo pagamento do capital global de remissão. Com efeito, apenas se enuncia ou comunica que “o pagamento do capital global de remissão aguarda publicação em Diário da República”, nada se referindo expressamente quanto à entidade que irá proceder ao seu pagamento. Por outro lado, o referido ofício não é capaz de afastar o regime legal citado e que atribuiu a responsabilidade directa (e nas relações externas, exclusiva) pelo ressarcimento da responsabilidade por incapacidade permanente ao 1.º Réu. Deste modo se concluiu que a 2.ª Ré deve ser absolvida do pedido, por não ser titular passivo da obrigação de pagamento aqui exigida. (…)” II. Ora, salvo sempre o devido e merecido respeito, por opinião contrária, entendemos que o Meritíssimo Juiz a quo não decidiu bem, ou seja, não decidiu em conformidade com os ditames da justiça.

III. A 2.ª Ré Unidade Local de Saúde do (...), E.P.E., foi absolvida do pedido, por não ser titular passivo da obrigação de pagamento aqui exigida.

IV. Salvo devido e merecido respeito, a aqui recorrente não se conforma com tal entendimento, pelo que expressamente impugna, com todas as consequências legais.

V. A 2.ª Ré Unidade Local de Saúde do (...), E.P.E., é também titular passiva da obrigação de pagamento aqui exigida.

VI. Conforme se deixou dito em sede de petição inicial, por ofício expedido em 12 de Junho de 2014 foi a Autora, aqui recorrente notificada que o processo de pensão por acidente em serviço havia sido remetido à aqui 2.ª Ré Unidade Local de Saúde do (...), E.P.E. para pagamento. Cfr. Documento n.º 5 junto com a petição inicial.

VII. Facto esse expressamente reconhecido pela 2.ª Ré Unidade Local de Saúde do (...), E.P.E., por ofício datado de 14 de outubro de 2016.

VIII. Factos esses, constantes dos factos provados da sentença que ora se coloca em crise, sob as letras “w”e “x”.

IX. Ao contrário do entendimento do Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo, nesse oficio a 2.ª Ré Unidade Local de Saúde do (...), E.P.E., assume expressamente a responsabilidade pelo pagamento da indemnização em capital referente à incapacidade parcial permanente, “No seguimento do acidente em serviço de que foi vítima e da avaliação médica efectuada a nosso pedido de que resultou uma incapacidade permanente parcial, informa-se V.Exa. que o pagamento do capital global de remissão aguarda publicação do diploma em Diário da República no âmbito do Serviço Nacional de Saúde, conforme entendimento prestado pela Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público (DGEAP).”Cfr. Documento n.º 6 junto com a petição inicial.

X. Sendo certo que tal assunção de responsabilidade por parte da 2.ªRé é expressa e não deixa margem para dúvidas, nem possibilita diferente interpretação daquela que a Autora, ora recorrente faz.

XI. Mais a mais, tais ofícios confirmam que desde Junho de 2014 o processo se encontra na posse e titularidade da aqui 2.ªRé, ora recorrida para regularização.

XII. Mais se salienta que a aqui 2.ªRé Unidade Local de Saúde do (...), E.P.E., desde que recepcionou o processo, tal como se encontra ínsito no a documento n.º5 junto com a petição inicial não o devolveu à aqui 1.ª Ré (pelo menos não comunicou tal facto à Autora), nem tão pouco manifestou posição divergente ou contraditória da que assumiu no documento de 14 de Outubro de 2016 antes de 11 de Junho de 2019 ( acto impugnado via judicial , Processo n.º 1620/19.5BEBRG, a correr termos junto da Unidade Orgânica 1 do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga).

XIII. Tais actos implicam a assunção da dívida. A assunção da dívida é a operação pela qual um terceiro (assuntor) se obriga perante o credor a efectuar a prestação devida por outrem – art.ºº 595.º do Código Civil.

XIV. Sendo a declaração a expressão objectiva da vontade do autor do acto, os factos concludentes devem revelar, com probabilidade plena, a vontade do declarante, que é o que sucede no caso sub judice.

XV. A assunção cumulativa da dívida, nos termos do art.º 595, nº2, do C.C., acontece nos casos em que a assunção da dívida coloca o assuntor ao lado do primitivo devedor, mas sem exonerar este, dando assim ao credor, não o direito a uma dupla prestação, mas o direito de obter a prestação devida através de dois vínculos, à semelhança das obrigações com os devedores solidários.

XVI. Por seu turno, na assunção cumulativa, o novo devedor contrai uma obrigação independente da do devedor originário, assumindo como própria uma dívida alheia, conjuntamente com o devedor anterior, XVII. Efectivamente, o devedor aderente quer responder, independentemente do devedor originário, do mesmo modo como se tivesse conhecido, pessoalmente, a obrigação, como se fosse um mutuário ou um comprador, se de uma obrigação «de mútuo ou de compra e venda se tratasse, respectivamente.

XVIII. A assunção cumulativa é, assim, um contrato pelo qual um terceiro aceita responder, solidariamente, com o devedor, na qualidade de um segundo devedor independente, mas a ele equiparado.

XIX. Ou seja, a 2.ª Ré Unidade Local de Saúde do (...) E.P.E. é solidariamente responsável pelo pagamento com a 1.ª Ré Caixa Geral de Aposentações, por voluntariamente ter aceite regularizar o sinistro.

XX. No âmbito do direito civil, as obrigações são singulares (aquelas em que tem apenas um titular do lado activo – um credor – e um só titular do lado passivo – um devedor) ou plurais (aquelas em que são dois ou mais os titulares do lado activo ou do lado passivo da relação, ou de um e outro simultaneamente), podendo a pluralidade ser activa (quando são vários os credores) ou passiva (quando são vários os devedores) ou activa e passiva (quando são vários os sujeitos de um e outro lado da relação obrigacional). (Cfr. Antunes Varela, in “Das obrigações em Geral”, Volume I, 10.ª edição revista e actualizada, Almedina, 2000, pág. 744).

XXI. As obrigações plurais podem ser conjuntas (aquelas cuja prestação é fixada globalmente, mas em que a cada um dos sujeitos compete apenas uma parte do débito ou do crédito comum) ou solidárias (quando o credor pode exigir a prestação integral de qualquer um dos devedores e a prestação efectuada por um destes os libera a todos perante o credor comum – solidariedade passiva – a que nos interessa no caso concreto) – Cfr. Antunes varela, ob. cit., pág. 748 e 751.

XXII. De acordo com o que estabelece o artigo 513.º do Código Civil, sendo a obrigação plural, a conjunção constitui o regime regra, uma vez que a solidariedade só existe quando resulte da lei ou da vontade das partes.

XXIII. No caso sub judice estamos perante uma obrigação solidária nos termos do consagrado no artigo 595.º n.º 2 do Código Civil.

XXIV. Ao decidir, como decidiu, o tribunal recorrido violou por deficiente interpretação os artigos 513.º e 595.º n.º 2 do Código Civil.

NESTES TERMOS e nos mais de direito deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência a parte da sentença de que ora se recorre, sem necessidade de outros considerandos, deverá ser revogada, designadamente a parte que absolve a...

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