Acórdão nº 46/19.5T8CTB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelFELIZARDO PAIVA
Data da Resolução17 de Janeiro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra: I – N...

intentou a presente acção de processo comum emergente de contrato individual de trabalho contra “T..., S.A.”, pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe:

  1. Um mês completo de férias por não gozadas e o pagamento quer nas férias quer no subsídio de férias a média mensal do trabalho suplementar pago pela Ré a título de dias de descanso trabalhado, tudo no montante total de €1.172,27.

  2. O valor das diárias nos dias em que este efectuou as viagens de Portugal para a Bélgica e vice-versa, no montante total de €660,00.

  3. Relativamente a esses mesmos dias o montante que refere ter gasto do seu bolso para custear as viagens no montante total de €266,90.

  4. Pelos dias de descanso passados no estrangeiro (sábados domingos e feriados), reclama o montante total de €5.703,11.

  5. A restituição da importância de €135,54 que refere lhe ter sido descontado ilicitamente.

  6. A importância de €4.615,20 a título de incumprimento da Lei “MACRON”.

  7. Pelo direito a dormir em hotel a importância de €3.500,00.

    Todas estas quantias acrescidas de juros de mora à taxa legal a contar de 26.09.2018.

    Para tanto alegou, em síntese, tal como consta da sentença impugnada, ter celebrado com a ré, em 27.09.2017, um contrato de trabalho, que veio a terminar por sua iniciativa em 26.09.2018, sem que durante a execução do contrato tenha gozado férias. Mais alega que no valor a pagar a título de férias não gozadas e de subsídio de férias deve ser incluído o montante relativo à média mensal do trabalho suplementar prestado pelo autor no referido período. Sustenta ainda o autor que em execução do referido contrato passava, em regra, cerca de seis semanas no estrangeiro, ficando depois 2 semanas em Portugal, sendo que, quanto aos dias das viagens de Portugal para a Bélgica e vice versa, a ré apenas suportava os custos com as viagens de avião, não lhe pagando as viagens de comboio de e para o aeroporto, nem o valor da diária, cujo pagamento agora reclama.

    Mais alega que a ré nunca lhe fez adiantamentos para que pudesse pernoitar em hotéis nos dias de descanso semanal regular, reclamando por isso agora essas quantias, mais reclamando que os dias de descanso (sábados, domingos e feriados) que passou fora de Portugal lhe sejam pagos à razão de 77,12€/ por dia no ano de 2017 e de 80,32€ no ano de 2018.

    Sustenta ainda que tendo a ré declarado perante as autoridades francesas, por força da “Lei Macron”, que lhe pagava 9,82€ à hora, terá de ser condenada a pagar-lhe a diferença entre o montante que efectivamente lhe pagava e a referida quantia, sob pena de enriquecimento sem causa da entidade empregadora.

    Por fim, sustenta que a ré lhe descontou indevidamente o valor da última viagem de avião, cuja devolução agora reclama. Conclui por isso pela procedência da acção e pela condenação da ré nos pedidos acima referidos.

    Na audiência de partes não se logrou a composição amigável do litígio pelo que se ordenou a notificação da ré para contestar, o que esta fez, apresentando contestação, na qual impugna a generalidade da factualidade alegada na petição inicial e pugna pela improcedência da acção, aduzindo desde logo que o autor gozou férias, não podendo de qualquer forma no cálculo do respectivo pagamento ser tido em qualquer trabalho suplementar prestado.

    Mais defende que o regime remuneratório aplicado era do conhecimento e foi aceite pelo autor, nada por isso lhe devendo, designadamente no que respeita às despesas tidas pelo autor no dia das viagens de e para Leuze e à diária relativa a tal dia, que não lhe é divida.

    Sustenta ainda que nos dias de descanso que o autor passou no estrangeiro este dispunha do seu tempo livremente, nenhum pagamento lhe sendo devido, para além dos que já lhe foram feitos a título de trabalho suplementar e de diária, cujo valor a ré sempre liquidou ao autor, com referencia a todos os dias que passou no estrangeiro, alegando ainda que o autor tinha instruções para pernoitar em hotéis caso tal fosse necessário, sendo que o mesmo nunca lhe apresentou qualquer factura em conformidade.

    Por fim, sustenta nada dever ao autor a respeito da Lei Macron, já que a mesma não implicou para a ré qualquer enriquecimento, não sendo também devida a devolução da viagem descontada ao autor, já que a ré já a tinha adquirido no momento em que o autor fez cessar o seu contrato. Conclui por isso pela improcedência da acção e pela sua absolvição dos pedidos acima referidos.

    II – Findos os articulados não se realizou a audiência preliminar, afirmou-se a validade e regularidade da instância e dispensou-se a identificação do objecto do litígio e a enunciação dos temas de prova tendo, a final, sido proferida sentença cujo dispositivo se transcreve: “…. em face do exposto, decido julgar a acção parcialmente procedente, e, em consequência, decido: 1. Condenar a Ré a pagar ao A.:

  8. A quantia de 80,03€ devida pela inclusão no subsídio de férias da média mensal do trabalho suplementar pago pela Ré; b) A quantia de 660€ relativa ao valor das diárias nos dias em que o autor efetuou as viagens de Portugal para a Bélgica e vice-versa; c) A quantia de 135,54€, correspondente ao preço da última viagem de regresso a Portugal que a ré lhe descontou; O que tudo perfaz o montante global de 875,57€; f) Condenar a ré a pagar juros legais sobre tais quantias à taxa legal devidos desde a data da citação e até integral pagamento.

    1. Absolver a ré do demais peticionado”.

      III – Inconformado veio o autor apelar, alegando e concluindo: ...

      A ré não contra alegou.

      O Exmº PGA emitiu fundamentado parecer no sentido da parcial procedência da apelação.

      IV – A 1ª instância considerou provados os seguintes factos: 1. A R. dedica-se ao Transportes Público Rodoviário de Mercadorias.

      2) O A. foi admitido ao seu serviço em 27.09.2017.

      3) Como motorista de veículos pesados com carta da ADR para o transporte de matérias perigosas.

      4) Desempenhando as funções de motorista dos Transportes Internacionais Rodoviários de Mercadorias.

      5) Trabalhando sob as ordens, direcção e fiscalização da Ré.

      6) A R. não pagava ao A. as refeições à factura, conforme ao disposto na Clª 47-A, al. a), do C.C.T.V.

      7) Nem antes da saída para as viagens lhe fazia os adiantamentos previstos nessa cláusula, para esse efeito.

      8) Em vez disso pagava-lhe uma “diária” de 55,00€ por cada dia no estrangeiro às suas ordens, que levava aos recibos no “Código 34” a título de “Ajudas de Custo Estrangeiro – Motoristas”.

      9) O horário do A. era de 40 horas semanais, sendo 8 horas por dia útil de 2ª a 6ª feira, sendo os sábados e os domingos os dias de descanso complementar e obrigatório respectivamente.

      10) Provado que o autor recebeu as seguintes retribuições: De Setembro a Dezembro de 2017: Retribuição base:557,00€; Clª 74 nº 7 (fixada pela Ré):313,32€; Prémio Tir:105,75€; de Janeiro a Outubro de 2018: retribuição base: 580,00€; Clª 74, nº 7: 326,26€; Prémio Tir:105,75€.

      11) No nº 2 da Cláusula Segunda do Contrato de Trabalho (Doc. nº 1) ficou expresso que o A., sempre que se encontrasse deslocado no estrangeiro, para além da retribuição base, teria direito a: a) - Clª 74 nº 7 b) - 105,75 € do Prémio Tir c) – 107,36 € do prémio ADR d) – Ao pagamento do trabalho prestado em dias de feriado e dias de descanso semanal; e) – Ao pagamento de uma Ajuda de Custo/diária até ao limite de 55,00 €, sendo este o valor da diária que sempre foi pago ao A. i. é de 55,00 €. (Doc. nº 2 a 14).

      12) A Ré colocou o A. a efectuar viagens apenas no estrangeiro, entre a cidade Belga de Leuze que funcionava como base e vários outros países europeus.

      13) Na Clª Quarta nº 4, do contrato (Doc. nº 1) ficou estipulado o seguinte: “Após cada período de 6 semanas de trabalho, o trabalhador goza de 2 semanas de descanso em Portugal”.

      14) O A. trabalhava 6 semanas no estrangeiro e vinha 2 semanas a Portugal, saindo do aeroporto de Bruxelas quase sempre num sábado e regressando após 2 semanas à Bélgica quase sempre num domingo, ao mesmo aeroporto de Bruxelas.

      15) As quantias pagas pela Ré a título de trabalho suplementar durante o ano que o A. trabalhou para ela foram as seguintes: ...

      Total: 960,40€.

      16) O A. realizou as seguintes viagens, às ordens e por determinação da Ré, entre a Bélgica e Portugal: Em 27/09/2017 (Doc. nº 15) fez a viagem/Portugal/Bélgica, para iniciar este primeiro contrato.

      E realizou depois as seguintes viagens de ida e volta Bélgica/Portugal: ...

      17) A Ré pagava, destas viagens, o bilhete de avião de Bruxelas para Portugal e de Portugal para Bruxelas.

      18) Porém, não pagava a princípio a viagem de comboio da povoação de Leuza, donde o A. saía para o Aeroporto de Zaventem em Bruxelas, nem depois as viagens de comboio do aeroporto de Lisboa para Castelo Branco, onde o A. reside e vice-versa.

      19) O autor suportou despesas com os transportes nestes dias destas viagens e que dizem respeito às seguintes deslocações: a) – Leuze onde a Ré tinha o parque das viaturas, ao aeroporto de Zaventem em Bruxelas e regresso; b) – Comboio Lisboa/Castelo Branco e regresso.

      20) O A. gastava na viagem de comboio entre Lisboa e Castelo Branco, pelo menos, 14,70€ em cada viagem e teve de realizar 12 viagens, motivadas pelo contrato.

      21) As viagens de comboio, entre Leuze e o aeroporto de Bruxelas e vice-versa, custavam 18,10 cada uma, tendo a última sido realizada em 07/03/2018, uma vez que após essa viagem a Ré começou a dar esse transporte em viatura da firma, tendo o autor custeado 5 dessas viagens.

      22) No período em que trabalhou para a Ré, de 27.09.2017 a 27.09.18, o A. veio a Portugal onde passou os seguintes dias: Na 1ª viagem os dias de 18/12/2017 a 02/01/2018 Na 2ª viagem de 21.02.18 a 07.03.18 Na 3ª viagem de 18.04.18 a 02.05.18 Na 4ª viagem de 13.06.18 a 27.06.18 Na 5ª viagem de 08.08.18 a 22.08.18 A 6ª viagem a 27/09/2018 foi a de regresso definitivo a Portugal E os restantes dias, passou-os o A. todos no estrangeiro.

      23) O autor passou os seguintes dias no estrangeiro: Setembro -...

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