Acórdão nº 046/19.5BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução11 de Dezembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal AdministrativoI – Relatório A…………, melhor identificada nos autos, dirigiu ao Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do disposto nos artigos 25º, nº 2 do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (RJAT) e do artigo 152º do CPTA, recurso da decisão proferida no âmbito de pedido de pronúncia arbitral que formulara no processo nº 269/2018-T do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), que julgou totalmente improcedente o pedido de anulação dos actos tributários de liquidação de IRC e de juros moratórios e compensatórios, relativos aos exercícios de 2010, 2011, 2012 e 2013, que resultaram no valor global a pagar de €8.720.786,64.

Invoca, para o efeito, a oposição da decisão arbitral com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, no processo nº 08342/15 (655/09.0BELRA), datado de 22/02/2018.

Rematou as alegações do recurso com o seguinte quadro conclusivo: “1. O presente recurso é apresentado nos termos do n° 2 do art. 25° do Decreto-Lei n° 10/2011, de 20 de Janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária), por se verificar oposição quanto ao acórdão do CAAD para o processo n° 269/2018-T e o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 22/02/2018 para o processo n.° 08342/15 (655/09.0BELRA), já transitado em julgado em Abril de 2018.

  1. As situações de facto são substancialmente idênticas: ambos os acórdãos versam sobre a atividade de empresas no setor do comércio de metais, embora uma seja de metais ferrosos e outras de metais preciosos, que foram sujeitas a procedimento de inspeção tributária, motivada por suspeitas de utilização de faturas falsas, faturas provenientes de fornecedores com irregularidades fiscais previamente identificadas e que foram caracterizados como não possuidores de adequada estrutura empresarial para o exercício de atividade que declararam.

  2. Ambos os relatórios de inspeção tributaria produzidos apresentam-se com uma extensa caracterização dos fornecedores, mas uma parca ou inexiste caracterização do sujeito passivo e não procede a qualquer análise ou exposição onde os indícios recolhidos na esfera dos primeiros são “completados, confrontados e relacionados com os apurados junto da contabilidade do cliente (receptor das facturas)”.

  3. O cerne da oposição centra-se no cumprimento do poder-dever de “inspecção” e na impossibilidade de se ter por cumprido o ónus da prova que incide sobre a ATA e que lhe permitirá considerar determinada fatura como falsa, quando aquela não procede à análise da situação real e escriturária do sujeito passivo.

  4. Bem como quando é omissa a confrontação e/ou articulação dos indícios recolhidos na esfera dos fornecedores e aqueles que possam resulta da análise do contribuinte ou da sua forma de estar e operar.

  5. Quando tal não acontece, desrespeita-se o princípio do inquisitório consagrando no art. 58.° da LGT que, visa impor um sistema dinâmico entre as partes e, destas com os Tribunais, com o objetivo de fomentar a participação das partes no litígio e na decisão, maximizando a descoberta da verdade material e obter a pacificação do diferendo entre as partes.

  6. O Acórdão em recurso, proferido para o processo n° 269/2018-T, entendeu como suficiente a simples menção de indícios externos recolhidos junto de outros contribuintes para “abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte”, fazendo assim operar a inversão do ónus da prova que pendia sobre a ATA, passando a recair sobre a Recorrente o ónus de provar a veracidade das suas compras e o direito à sua dedução, quando o acórdão fundamento exige o integral cumprimento do ónus de recolha de prova, nomeadamente da recolha de indícios junto do contribuinte e a confrontação e relacionamento dos mesmos com os indícios recolhidos junto dos respetivos fornecedores.

  7. Pelo que a existência de soluções oposta é clara, notória e expressamente abordadas nos respetivos acórdão.

  8. A Recorrente alegou junto do CAAD que a ATA não cuidou “conhecer a A………..”, o seu procedimento de compras, o método de transformação ou venda, a documentação envolvida ou, o processamento, arquivo e detalhe daquela, alertou que a ATA não testou o caixa, não escrutinou o processo de catalogação de fornecedores ou visitou as instalações, não verificou inventários ou relevou a inexistência de imparidades.

  9. Mas aquele entendeu que tais argumentos “não constituem fundamento das correções controvertidas, nem foram objeto de análise da AT, encontrando-se fora do âmbito do thema decidendum”.

  10. Já o Acórdão fundamento claramente indica que “Não basta para desconsiderar uma determinada operação, reputando-a como fictícia ou falsa, recolher indícios junto do emitente das facturas, havia também, e sobretudo, que analisar a contabilidade do Recorrido e dela evidenciar indícios que sustentassem a conclusão de que no caso concreto aquelas facturas são falsas”.

  11. A ATA teve à sua disposição todos os documentos contabilísticos e extracontabilísticos, computadores e arquivos da Recorrida, que foram apreendidos à ordem do processo crime 131/12.4TELSB (e mantida em segredo de justiça da A……….), de onde constavam guias de entrega de ouro, contactos, anotações em documentos, registo de marcações e uma serie de outros instrumentos de trabalho, de cuja analise se imponha que a ATA conseguisse evidenciar contradições ou indícios de fraude, burla ou evasão fiscal.

  12. Mas não o logrou fazer.

  13. A decisão recorrida falha completamente o cerne da questão, pois é especialmente importante que a ATA Caracterize O sujeito passivo e a sua actividade, bem como é especialmente importante que analise os elementos do contribuinte (quer os contabilísticos, quer os demais) e os articule e oponha aos elementos recolhidos junto dos fornecedores, pois só quando tal é cumprido, a prova recolhida pode ser valorada, por se encontrar cumprido o poder dever da inspeção e o princípio do inquisitório.

  14. Incumpridos tais princípios, omitida a analise ao sujeito passivo e à sua atividade, o ónus que incide sobre a ATA nunca se poderá assume por cumprido e como tal apenas poderá proceder o pedido de anulação dos atos tributários de liquidação de IRC e de juros compensatórios e moratórios.

    NESTES TERMOS, E NOS DEMAIS DE DIREITO, CONCEDENDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO SERÁ FEITA INTEIRA E SÃ JUSTIÇA.” A Directora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, recorrida nos autos, apresentou contra-alegações que finalizou com as seguintes conclusões: “1. A Recorrente vem interpor recurso, nos termos do artigo 25.°, n.° 2 do RJAT, invocando que entre o Acórdão arbitral proferido no processo n.° 269/2018-T e o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 22-02-2018, proferido no processo n.° 08342/15 (Acórdão fundamento) «existe uma divergência gritante, no que toca ao cumprimento do dever de inspeção ao contribuinte e das diligências que o mesmo comporta».

  15. Não obstante, não se encontram preenchidos os requisitos exigidos pelo artigo 152.º do CPTA, norma que nem sequer foi referenciada na douta p.i., constando da mesma, tão só, a menção à «admissibilidade da revista - Contradições de julgados»; 3. Pelo que não deve o STA tomar conhecimento do mérito do recurso, tal como se decidiu no Acórdão de 5 de junho de 2019, processo n.° 2/19.3BALSB, proferido no recurso para uniformização de jurisprudência interposto pela Recorrente contra a decisão arbitral que versou sobre as liquidações adicionais de IVA.

  16. Constitui entendimento reiterado pela jurisprudência desse douto STA que, para que se tenha por verificada a oposição de acórdãos é necessário que (i) as situações de facto sejam substancialmente idênticas, (ii) haja identidade na questão fundamental de direito, (iii) se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta e (iv) que a oposição decorra de decisões expressas e não implícitas, requisitos que, manifestamente, não se encontram reunidos no caso vertente.

  17. A situação de facto apreciada no Acórdão fundamento em nada se assemelha à factualidade fixada no Acórdão recorrido, porquanto naquele caso, foram efetuadas correções em sede de IRC que resultaram de um procedimento externo de inspeção, no âmbito da qual não foi promovida uma análise rigorosa dos elementos contabilísticos que permitisse...

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