Acórdão nº 01540/18.0BELSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Dezembro de 2019

Data12 Dezembro 2019
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO: 1. RELATÓRIO A………………, devidamente identificada nos autos, intentou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (TAC), intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias contra a ADMINISTRAÇÃO CENTRAL DO SISTEMA DE SAÚDE, I.P.

e a ADMINISTRAÇÃO REGIONAL DE SAÚDE DO NORTE, I.P.

, doravante, respectivamente, Requeridas ACSS e ARSN, formulando os seguintes pedidos: “1. Reconhecer imediatamente, para todos os efeitos legais, a qualidade da Requerente enquanto médica, titular de uma incapacidade que limita significativamente a sua mobilidade; 2. Reconhecer imediatamente, para todos os efeitos legais, o direito da Requerente à escolha prioritária do estabelecimento de colocação no âmbito do procedimento concursal em curso, única forma de assegurar o efectivo direito de acesso à função pública, constitucionalmente protegido no artigo 47.º da CRP; 3. Assegurar, em concreto e por consequência, a possibilidade de escolha de um estabelecimento integrado no Agrupamento de Centros de Saúde Grande Porto VIII – Espinho/Gaia, no Agrupamento de Centros de Saúde Grande Porto VII – Gaia ou no Agrupamento de Centros de Saúde Porto Ocidental”.

*Por sentença do TAC de Lisboa, proferida em 30 de Dezembro de 2018, foi julgada extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, quanto aos pedidos formulados em 1 e 2 e improcedente a intimação quanto ao pedido formulado em 3, tendo-se para o efeito, consignado: «Atenta a procedência do recurso administrativo, mostra-se reconhecido, na pendência desta ação e no âmbito do procedimento concursal em causa, o direito da Requerente à escolha do estabelecimento de colocação de harmonia com o estabelecido no Decreto-Lei nº 29/2001, de 3/02.

Consequentemente, vai ser julgada parcialmente extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, quanto aos pedidos formulados em 1 e 2 do petitório».

*A Requerente apelou para o TCA Sul e este, por decisão datada de 09 de Maio de 2019, concedeu provimento ao recurso jurisdicional, revogando a sentença recorrida, com a consequente procedência da acção.

*A ACSS, inconformada, veio interpor o presente recurso de revista, tendo na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões: “A. O presente recurso vem interposto de Acórdão de 09.05.2019, que decidiu revogar a decisão proferida pela primeira instância com o consequente provimento da ação, sendo a admissão do presente recurso de revista necessária, tendo em conta que estamos perante uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental, bem como pelo facto de se visar uma melhor aplicação do direito.

  1. A problemática em apreço nunca mereceu tratamento jurisprudencial por parte do Supremo Tribunal Administrativo; porém as dúvidas em torno da aplicação do DL 29/2001 e as necessárias consequências para o princípio da igualdade de acesso à função pública merecem tratamento pelo Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do artigo 150.º do CPTA.

  2. A divergência em torno da aplicação do DL 29/2001 é patente, tendo em conta que a decisão do Tribunal Central Administrativo Sul (“TCA Sul”) é absolutamente antagónica em relação à proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (“TAC Lisboa”), sendo que o Acórdão que ora se recorre tem um voto de vencido da Senhora Desembargadora …………….., pelo que deve ser admitido o recurso de revista por estarem cumpridos todos os pressupostos.

  3. A questão objeto deste recurso é saber se a quota de emprego, para pessoas com deficiência, com um grau de incapacidade funcional igual ou superior a 60%, no âmbito do procedimento concursal em causa, foi ou não assegurada.

  4. A posição da ACSS é de que sim, tendo em conta que as regras do artigo 3º do DL 29/2001 não se podem aplicar cumulativamente. Se o procedimento concursal em apreço foi aberto a nível nacional, com 378 vagas totais, a aferição da quota de emprego foi feita nesses termos, ou seja, tendo em consideração a existência de mais de 10 vagas foi fixada uma quota de 5% do total do número de lugares.

  5. A ACSS considera que foram cumpridas as normas legais, dado que a única previsão do diploma é relativamente à escolha de profissão e o acesso à função pública em condições de igualdade e liberdade, ou seja, tendo sido definida uma quota de 5% do número total no aviso de abertura do concurso, tal significa que essa quota foi tida em conta no momento de admissão ao concurso.

  6. O Acórdão recorrido pretende a colocação efetiva da Recorrida num estabelecimento que esta escolheu, sem que exista previsão legal para o efeito, violando assim a lei substantiva, o que não se pode admitir pois tal constituiria uma grosseira ilegalidade do procedimento concursal, que permitiria uma avaliação casuística, violando a segurança jurídica que deve ser conferida aos particulares.

  7. Tudo o que ultrapasse os mecanismos de discriminação positiva previstos na lei representaria uma violação da lei e dos princípios norteadores do sistema de quotas de emprego para deficientes.

    1. No momento da escolha do estabelecimento não é garantida nenhuma quota de emprego para os candidatos portadores de deficiência, dado que tal foi assegurado anteriormente, pois, caso o legislador pretendesse a previsão da quota de emprego para o momento da escolha, tal estaria previsto expressamente.

  8. A solução defendida pela Recorrente não inviabiliza o direito de exercer a profissão na função pública por portadores de deficiência, na medida em que a ACSS limita-se a aplicar as regras legais em vigor, dado que está obrigada ao cumprimento do princípio da legalidade.

  9. Pelos motivos expostos, deve este Supremo Tribunal Administrativo revogar o Acórdão recorrido e julgar a ação em causa totalmente improcedente, com as demais consequências legais».

    *A recorrida, contra-alegou, concluindo do seguinte modo: “a. O recurso de revista deverá ser liminarmente indeferido ou rejeitado, por não se estarem reunidos os pressupostos de que depende a sua admissão, nos termos do disposto no artigo 150º do CPTA.

    1. A entidade recorrente não empreendeu um mínimo esforço na alegação e fundamentação da admissibilidade do recurso de revista, tendo-se limitado a reproduzir e a remeter para a lei, sem demonstrar a adequação e a imprescindibilidade desta revista no caso concreto.

    2. A entidade recorrente absteve-se do cumprimento do ónus que sobre si recaía de sustentar a admissibilidade deste recurso, por referência ao critério qualitativo estabelecido na lei e à evidenciação especificada de cada um dos seus pressupostos no que toca ao caso concreto, desde logo no que concerne à clara identificação da questão colocada.

    3. A mera remissão para o preceito legal e a afirmação genérica e conclusiva de que estariam verificados aqueles pressupostos não se afiguram suficientes para fundamentar a admissibilidade do recurso de revista, como não o são, sem mais, a mera alegação de dúvida ou eventual discordância quanto ao sentido de uma decisão anterior.

    4. A simples existência de decisões distintas na 1ª instância e em recurso ou de entendimentos divergentes não é suscetível, sem mais, de desencadear uma intervenção do STA nesta sede, caracterizando o próprio funcionamento do sistema judiciário e as dinâmicas comuns ao Direito, associadas à possibilidade de sancionamento em recurso de decisões anteriores, nos termos da lei.

    5. A entidade recorrente não logrou demonstrar, nem minimamente indiciar, a importância fundamental, pela sua relevância social ou jurídica, de que se revestia a questão colocada para justificar a sua apreciação em revista, ou a sua complexidade, nem a essencialidade da intervenção do STA nesta matéria para uma melhor aplicação do direito.

    6. O TCA Sul cuidou de retirar os devidos efeitos da decisão da 1ª instância quanto ao reconhecimento do direito da recorrida à escolha prioritária do estabelecimento de colocação, a que aquela instância obstou ao ter feito uma errada aplicação da norma do artigo 3º do Decreto-Lei nº 29/2001.

    7. O entendimento adotado no acórdão recorrido não revela a existência de erro manifesto ou grosseiro que tornasse justificável a intervenção deste Tribunal em revista, perfilhando uma solução juridicamente plausível e fundamentada, congruente e consistente, compatível com as normas legais em vigor.

    8. Nenhuma questão com relevância jurídica ou social de importância fundamental ou particularmente complexa do ponto de vista jurídico foi identificada pela Entidade Recorrente, não se vislumbrando qualquer questão com tais características, e o acórdão recorrido não revela a existência de erro manifesto ou grosseiro, situando-se o mesmo dentro das opções admissíveis da solução jurídica quanto à questão debatida nos autos, pelo que este recurso deverá ser liminarmente rejeitado ou indeferido, nos termos do artigo 150º, nºs 1 e 6 do CPTA.

      Sem prejuízo, j. O acórdão recorrido não merece qualquer censura, sendo de louvar o mérito jurídico, a razoabilidade e a justeza da decisão proferida com vista à salvaguarda e garantia do exercício efetivo do direito fundamental relacionado com a liberdade de escolha de profissão e acesso à função pública e da proteção constitucional conferida aos cidadãos portadores de deficiência.

    9. A questão colocada nos autos não tem por objeto a decisão de admissão da candidatura da Recorrida nem a aplicação imediata, nessa fase, da quota de emprego reservada a pessoas com deficiência, ou o seu respeito no caso concreto, já que aquela admissão não foi contestada nem determinada ao abrigo da quota reservada.

    10. A questão colocada incide sobre a fase posterior à decisão de admissão da candidatura, quanto à escolha do estabelecimento de colocação, situação não regulada na lei e mediante a qual se efetiva o direito de liberdade de escolha de profissão e acesso à função pública subjacentes ao Decreto-Lei nº 29/2001.

    11. O artigo 3º do Decreto-Lei nº 29/2001 tem por objeto a admissão...

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