Acórdão nº 318/19.9BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução10 de Dezembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO O Município de Pedrógão Grande, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, datada de 02/08/2019, que no âmbito do processo cautelar de suspensão de eficácia de ato administrativo requerido por José ..........

, decidiu antecipar o juízo sobre a causa principal, nos termos do artigo 121.º do CPTA e julgou procedente a ação, declarando a nulidade do ato de nomeação do instrutor, do ato de designação de advogado para colaboração técnica e ainda de todo o processado subsequente ao ato de nomeação de instrutor.

* Formula o aqui Recorrente, nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “1. A sentença recorrida fez incorrectas interpretação e aplicação do nº 2 do art. 208.º da LGTFP.

  1. O nº 2 art. 208.º da LGTFP prevê expressamente a existência de casos justificados, em que pode ter lugar a nomeação de instrutor de outro órgão ou serviço.

  2. A sentença recorrida entendeu que a referência a diferente órgão e serviço se aplica á mesma pessoa colectiva e não a outra pessoa colectiva.

  3. Todavia, essa referência normativa aplica-se á administração central.

  4. No caso das autarquias locais a referência a diferente órgão ou serviço deve entender-se como referindo-se a outra autarquia local.

  5. O que se compreende, pois nas autarquias não existem “órgãos” administrativos nem “serviços”, mas sim departamentos e divisões.

  6. A argumentação na qual a sentença recorrida se louva para concluir pela obrigatoriedade de o instrutor ser funcionário da mesma autarquia serve precisamente para fundamentar essa possibilidade.

  7. As razões subjacentes à citada estipulação normativa prendem-se com a natureza do vínculo e dos interesses que no âmbito da função pública cumpre prosseguir.

  8. As autarquias integram o poder local, previsto na Constituição, pelo que os interesses públicos decorrentes da instauração do procedimento disciplinar são assegurados pela nomeação de instrutor de outra autarquia, nos casos especiais revistos na norma em apreço.

  9. Aliás, só este entendimento (defendido pela entidade demandada) é que está em consonância com a referida norma.

  10. Não se compreenderia a referência da norma à solicitação ao dirigente máximo, uma vez que nas autarquias o dirigente máximo para instauração de processo disciplinar é o presidente da câmara municipal.

  11. Então, o outro dirigente máximo só poderá ser o presidente da câmara municipal de outra autarquia!!! 13. É um facto público e notório para todos os funcionários da autarquia: consta do mapa de pessoal, aprovado pelos órgãos autárquicos, publicado no Diário da República.

  12. Por outro lado, o despacho de nomeação concretiza a previsão a com a contestação, estando invocado que na autarquia não existe outro Chefe de Divisão nem funcionário de categoria superior que possa desempenhar as funções de instrutor do processo disciplinar.

  13. Além disso, a natureza das infracções, o melindre das questões e o facto de a autarquia ter poucos funcionários no seu quadro aconselham, e mesmo, impõem, que seja nomeado instrutor funcionário de outra autarquia.

  14. Mas a verdade é que o chefe de divisão era o único chefe de divisão da autarquia e era o funcionário mais categorizado da mesma: não há outro chefe de divisão, como consta do mapa de pessoa, bem como consta dos documentos juntos com a contestação e como o próprio Autor o reconhece na sua petição inicial.

  15. O Município de Pedrógão Grande não tem no seu mapa de pessoal um trabalhador em regime de funções públicas titular de cargo ou de carreira ou categoria de complexidade funcional superior à do trabalhador.

  16. Deste modo, não poderia ser dado cumprimento ao artigo 208.º da LGTFP n.º 1 na parte em que determina que na nomeação do instrutor deve ser escolhido de entre trabalhadores do mesmo órgão ou serviço, titular de cargo ou de carreira ou categoria de complexidade funcional superior à do trabalhador ou, quando impossível, com antiguidade superior no mesmo cargo ou em carreira ou categoria de complexidade idêntica ou no exercício de funções públicas, preferindo os que possuam adequada formação jurídica.

  17. O lugar de chefe de divisão é o lugar de maior relevo na hierarquia do mapa de pessoal da autarquia.

  18. A nomeação do instrutor foi justificada no despacho.

  19. Não tendo sido suscitada no processo disciplinar a suspeição do instrutor, mas tão só invocada a ilegalidade da sua nomeação, tal como no requerimento inicial se refere, , inexiste qualquer ilegalidade que se possa imputar a essa nomeação já que, para além da exigência da maior classificação ou antiguidade na categoria, a lei deixa ao livre critério da entidade que decidiu a abertura do processo disciplinar a escolha do instrutor, e o “dever” de escolher um funcionário pertencente ao serviço ou o “poder” de se escolher um funcionário de outro serviço, tem mais a ver com a economia de meios que isso traduz.

  20. Mas a verdade é que estariam os sempre perante uma mera irregularidade processual e nunca uma nulidade.

  21. A sentença recorrida violou o nº 2 do artº 208º da LGTFP.

  22. Neste contexto, não existe ilegalidade, designadamente, in existindo violação do art. 208.º da LTFP.

  23. A sentença recorrida também decretou a nulidade do processo disciplinar pelo facto de ter sido efectuada pelo instrutor a requisição de colaboração técnica, o que faz decorrer da violação do n.º 4 do citado art. 208.º da LGTFP, de desvio de poder e da violação do princípio da imparcialidade.

  24. A designação de colaborador técnico (advogado) ocorreu por despacho proferido pelo Presidente da Câmara Municipal, ao abrigo da previsão ínsita no artº 208º nº 3 da LTFP, que permite que o instrutor do processo disciplinar possa ser assessorado por colaboradores técnicos.

  25. Tendo em conta o facto de as diligências instrutórias de inquirição de testemunhas serem bastante numerosas (cerca de 20 testemunhas indicadas por três arguidos), o colaborador técnico designado apenas auxilia o instrutor em alguns actos de instrução (designadamente e no caso, inquirição de testemunhas) e de opinião jurídica.

  26. O processo está por tramitar, tendo em conta a notificação e despacho recebido, no âmbito do presente processo disciplinar, sendo certo que os requerimentos que o requerente apresentou arguido nulidades só poderão ser apreciados após a presente providência cautelar terminar.

  27. Pelo que deve a sentença violou o nº 3 do artº 208º da LGTFP ser revogada e anulada.”.

    Pede que seja concedido provimento ao recurso e revogada a sentença recorrida.

    * O ora Recorrido, notificado, apresentou contra-alegações, em que concluiu do seguinte modo: “1) Quanto à nomeação do assessor técnico a sentença julgou (fls. 26) dever “(…) concluir-se pela nulidade de todo o processado subsequente à nomeação do instrutor” em virtude de, e bem, ter entendido que, tendo o recurso da nomeação de instrutor sido objecto de recurso hierárquico, o processo teria de ficar suspenso nos termos da lei aplicável.

    2) Como se vê das conclusões, a douta decisão recorrida não foi, quanto a esta dimensão, atacada, pelo que, naturalmente, o despacho de nomeação do assessor técnico (posterior no tempo) tem de se manter na ordem jurídica.

    3) Quanto ao outro acto impugnado, nomeação de instrutor, a douta sentença, sabiamente, veio dizer que o despacho não referiu, na justificação relativa à nomeação de Director de Departamento de outra autarquia como instrutor, que na autarquia em causa, Pedrógrão Grande, não existisse um funcionário com maior antiguidade - cfr. o art. 208.º, n.º 2 da LGTFP e sentença a fls. 18.

    4) A mais disto, refere a douta sentença (fls 18 e 19) que a restante fundamentação do despacho que vimos de mencionar é vaga e genérica, mais dizendo ainda que as razões de “melindre” e as relativas à “natureza “das infracções, bem como as que se prendem com a inconcretizada “escassez de funcionários”, não chegam para evidenciar estar-se perante um “caso justificado, a demandar a excepção consagrada na norma”.

    5) Ou seja, uma das razões de anulação traduziu-se neste decidir, que não só pela impossibilidade de nomear como instrutor no processo disciplinar um funcionário de outra autarquia (cfr. parágrafo que se inicia por “E, neste sentido, (…)” a fls. 19), pelo que, não tendo tal fundamento...

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