Acórdão nº 2272/05.5BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelALDA NUNES
Data da Resolução10 de Dezembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: Relatório Ministério dos Negócios Estrangeiros recorre da sentença proferida, no dia 28.2.2013, na ação administrativa comum, sob a forma ordinária, que Guiomar ..........

moveu e na qual pediu a condenação do Estado a indemniza-la em €: 165.021,60, acrescidos de juros de mora, contados desde a data da citação até efetivo pagamento.

A decisão recorrida julgou a ação parcialmente procedente e (a) condenou o réu a pagar à autora indemnização no valor que se vier a liquidar em execução de sentença, relativo à perda de 10% na pensão de aposentação mensal da autora desde 1.6.2004, tendo por base de cálculo nos danos futuros uma esperança de vida de 74 anos, acrescida de juros de mora à taxa legal supletiva, contados desde a citação até integral pagamento. (b) No mais o tribunal julgou improcedente a ação, absolvendo o réu do pedido, nessa parte.

Inconformado o Ministério dos Negócios Estrangeiros interpôs recurso jurisdicional, com alegações e conclusões que sintetizou nos seguintes termos: 1. A entidade demandada, salvo o devido respeito, não pode conformar-se com a douta sentença, na medida em que a esta se aplica o regime jurídico da responsabilidade civil extracontratual do Estado, porém: a. Não está em juízo o Estado, nem foi citado o Ministério Público; b. A sentença considera, por um lado, nos factos que o MNE não ultrapassou o prazo geral de conclusão dos procedimentos administrativos de 90 dias, mas entende que existiu comportamento ilícito porque simultaneamente considera nesse prazo os dias do procedimento que correu termos num Instituto Público, não sujeito a poderes de controlo pelo MNE; c. Os critérios de fixação de pensão mudaram por factum prínceps – por alteração legislativa – não em resultado da atividade administrativa, pelo que não existe nexo de causalidade; d. O dano calculado pela recorrida não é o que a mesma imagina, nem o fixado na sentença.

  1. A entidade demandada, salvo o devido respeito, não pode conformar-se com a douta sentença, na parte em que calcula a pensão, porquanto a mesma contraria a forma legalmente prevista de cálculo em vigor, como resulta do documento junto».

    A recorrida apresentou contra-alegações com as conclusões que seguem: 1. O objeto do presente recurso é limitado apenas ao conteúdo das conclusões apresentadas pelo recorrente MNE (cfr arts 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1, ambos do CPC).

  2. Em tudo o que não consta das conclusões apresentadas pelo réu recorrente, a sentença recorrida transitou em julgado, nos termos e para os efeitos dos arts 671º e 677º ambos do CPC.

  3. O réu MNE concluiu que não poderá ser responsabilizado ao abrigo do regime de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas coletivas públicas no domínio dos atos de gestão pública, consagrado no DL nº 48.051, de 21.11.1967, porque não é «Estado» e tal regime legal apenas é aplicável ao «Estado e demais pessoas coletivas» e que, ele próprio MNE, não é «Estado e demais pessoas coletivas».

  4. O réu/ recorrente MNE é Estado, sendo redundante tal afirmação, por mero dever de patrocínio tem de ser feita. O MNE insere-se na estrutura do Governo, enquanto órgão de soberania (cfr arts 110º e 183º da CRP), funcionando como órgão da Administração do Estado, ao nível da Administração Direta e também Indireta.

  5. O MNE, inserido na Administração Direta do Estado, está sujeito ao poder de direção dos membros do Governo, exercendo os serviços centrais a sua competência em todo o território restrita (cfr arts 2º, nº 1 da Lei nº 4/2004, de 15.1).

  6. De facto, incluem-se na Administração Direta do Estado os serviços de cujas atribuições decorre o exercício de poderes de soberania, autoridade e representação política do Estado – ou que exerçam funções de estudo e conceção, coordenação, apoio e controle ou fiscalização de outros serviços administrativos – entre os quais se inserem necessariamente os Ministérios nos termos do art 183º da CRP.

  7. O réu Ministério dos Negócios Estrangeiros é Estado e por isso lhe é aplicável o «regime de responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas coletivas públicas no domínio dos atos de gestão pública, consagrado no DL nº 48.051, de 21.11.1967.

  8. A conclusão apresentada pelo recorrente MNE mais não é do que uma tentativa de desresponsabilização inaceitável, apresentada como uma forma de «escapar» às suas responsabilidades enquanto ente público, com poderes públicos, não podendo a mesma proceder.

  9. Ao contrário do que alegou e concluiu o recorrente, o tribunal de 1ª instância não decidiu que «existiu comportamento ilícito porque simultaneamente considera nesse prazo os dias do procedimento que correu termos num Instituto Público, não sujeito a poderes de controlo pelo MNE». O MNE compreendeu mal o decisório da sentença sob recurso.

  10. O tribunal a quo concluiu que os serviços do MNE violaram de forma inequívoca o dever de celeridade a que estão obrigados por lei no exercício dos seus poderes, «não tendo aqueles respondido com a eficácia e prontidão exigíveis nos casos».

  11. Cabe à Administração instruir os processos com «eficiência e prontidão» e remete-los para a CGA «em tempo útil». Não sendo, assim, lícito demorara mais tempo do que o estritamente necessário, «sob pena de incorrer em responsabilidade».

  12. Assim, o réu, ao reter o requerimento da autora durante um período superior a 2 meses, não atuou com a eficiência e prontidão que lhe é exigida por lei, tendo remetido o processo para a CGA depois de esgotado o «tempo útil», sendo assim «inequívoca a violação do dever de celeridade pelos serviços do MNE».

  13. O MNE atuou ilicitamente ao reter o requerimento de aposentação da autora durante um período de tempo excessivo – sem que tenha apresentado qualquer motivo ou justificação válida para tal atraso.

  14. É igualmente falso que não exista nexo de causalidade, uma vez que os danos patrimoniais sofridos pela autora resultaram diretamente do exercício ilícito da «atividade administrativa» do próprio réu MNE e não da «alteração legislativa» verificada, conforme pretende o réu.

  15. Assim, caso o réu não tivesse atuado ilicitamente, isto é, caso o réu tivesse remetido o requerimento de aposentação da autora para a CGA atempadamente, a autora não teria sofrido a redução de 10% na sua pensão mensal de aposentação.

  16. Pelo que, ao contrário do que alega o recorrente, no apuramento do nexo de causalidade não releva a «alteração legislativa» verificada, mas antes a «atividade administrativa» do próprio réu MNE, feita lentamente, da qual decorreram diretamente os danos patrimoniais sofridos pela autora.

  17. O recorrente alega ao longo de todo o seu recurso factos novos, nunca antes alegados nos presentes autos e que, como tal, não podem ser objeto do presente recurso.

  18. Sendo o recurso um meio de impugnação de uma decisão judicial e não um meio de julgamento de questões e factos novos, não podem os factos novos ser aceites ou julgados pelo tribunal de recurso, devendo ser desconsiderados por esse tribunal de recurso. Assim, estes factos novos que o recorrente MNE apresentou agora, em sede de recurso.

  19. Mais se impugna o documento agora junto pelo recorrente MNE no seu recurso, por não ser permitida nesta fase nos termos do art 693-B do CPC, tal junção pelo que deverá o mesmo ser desentranhado».

    O Ministério Público, notificado nos termos e para efeitos do disposto no art 146º, nº 1 do CPTA, não emitiu parecer.

    Colhidos os vistos vêm os autos à Conferência para decisão.

    Objeto do...

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