Acórdão nº 414/19.2BELLE de Tribunal Central Administrativo Sul, 21 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução21 de Novembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO O Município de Faro, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, datada de 02/09/2019, que no âmbito do processo cautelar de suspensão de eficácia de ato administrativo ou, em alternativa, de condenação à adoção de comportamento, requerido pelo Ministério Público, sendo Contrainteressada a A…. – A…..

, absolveu a Entidade Requerida do pedido de suspensão de eficácia dos atos de deferimento das licenças especiais de ruído tituladas pelos Alvarás n.ºs 106/2019, 107/2019 e 108/2019 e condenou a Entidade Requerida a proceder à medição do nível do ruído emitido nas “Festas Populares de Verão” promovidas pela Contrainteressada na Praceta de São Tomé e Príncipe, em Faro, para as quais tenha emitido a respetiva licença especial de ruído.

* Formula o aqui Recorrente, Município de Faro, nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “A. Ao pedir alternativamente a condenação do Município de Faro a proceder à medição do volume de ruído emitido em todos os recintos habitacionais junto ao recinto, o RECORRIDO pretendeu assegurar que, independentemente do que o Tribunal a quo entendesse quanto à licitude das licenças emitidas, haveria sempre de conseguir obter com a providência cautelar uma decisão definitiva para o litígio, nomeadamente através deste segundo pedido.

  1. Em face do exposto, não pode o RECORRENTE conformar-se com a referida condenação, que viola e contraria directamente a ratio do procedimento cautelar.

  2. Neste sentido, veja-se o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 28 de junho de 2005, no processo n.º 1345/05, no qual se defendeu que “não é viável nem admissível, por contrariar a finalidade própria das providências cautelares, a instauração de um concreto procedimento cautelar com o qual se vise obter uma sentença condenatória de uma acção declarativa de condenação, isto é, não é admissível um procedimento cautelar com o qual se pretenda obter uma decisão definitiva do litígio, decisão essa que é própria da acção declarativa.

    ”.

  3. E ainda ABRANTES GERALDES, in Reforma do CPC – Procedimentos Cautelares, pág. 28, que ensina que “porque as providências cautelares se destinam tão só a prevenir prejuízos decorrentes da demora no processo da acção principal, não podem ter o mesmo objecto que a providência definitiva, ou seja, não pode alcançar-se, por via de um procedimento cautelar, um efeito constitutivo, modificativo ou extintivo que esteja precisamente dependente da sentença a proferir na acção principal. Nos procedimentos cautelares cabem apenas as medidas que visem dar utilidade ou eficácia ao conteúdo da sentença constitutiva”.

  4. Assim, ao pedir a condenação do Município de Faro a proceder a esta medição, o RECORRIDO não pretende obter uma tutela provisória de um direito, mas sim e somente aquilo que será o próprio objecto da acção principal correlacionada com esta providência, F. E que teria de resultar de um juízo de mérito prévio, já realizado pelo Julgador na acção principal no sentido da improcedência definitiva do pedido de licitude das licenças emitidas.

  5. Esse é o juízo que cabe à acção principal e não ao presente procedimento cautelar, H. Contendo este pedido de condenação do RECORRIDO uma finalidade que é própria e única da acção declarativa principal.

    I. Com efeito, um pedido de condenação com este objecto não visa nem pretende o decretamento de qualquer concreta providência antecipatória, não sendo sequer evidente que exista da parte do RECORRIDO um fundado receio de ocorrência de lesão grave e dificilmente reparável para o alegado direito daqueles habitantes, J. Em suma, sobressai à saciedade que este pedido condenatório formulado em sede de providência cautelar pretende a obtenção de uma decisão condenatória que é própria da acção principal, e não de uma providência cautelar, K. Donde resulta que o pedido de condenação formulado alternativamente pelo RECORRIDO deveria ter sido liminarmente rejeitado ou indeferido, por ser manifestamente improcedente.

    L. Uma vez que tal não aconteceu, não poderá deixar de ser indeferida a pretensão deduzida através da revogação da douta sentença quanto a esta condenação em particular, dado não estarmos perante um pedido de natureza cautelar (enquanto pretensão antecipatória provisória) e não se mostrar sequer suficientemente alegado o receio de qualquer lesão efectiva do eventual direito ao descanso dos habitantes.”.

    * O Requerente, ora Recorrido, Ministério Público notificado, apresentou contra-alegações, em que concluiu do seguinte modo: “1. Na presente acção intentada pelo Ministério Público contra o Município de Faro, tendo como contra-interessada a A…. A…., foi pedida (

    1. A suspensão da eficácia dos actos administrativos que aprovaram a concessão de licença especial de ruído datados de 4 de Junho de 2019 e que determinaram a emissão dos Alvarás de Licença Especial de Ruído n.ºs 106/2019, 107/2019 e 108/2019; ou, alternativamente, (b) A condenação da Câmara Municipal de Faro na adopção de comportamento, a saber, medição do ruído nas festas realizadas na Praceta de S….. para as quais tenha emitido uma Licença Especial de Ruído.

    1. A final a acção foi julgada totalmente procedente, tendo a condenação sido no segundo pedido que alternativamente havia sido formulado.

    2. É desta sentença que o Réu vem recorrer com o argumento de que esta sentença configura uma solução definitiva para o litígio, o que contraria a ratio do procedimento cautelar.

    3. Os actos suspendendo vigoraram até ao dia 7 de Setembro – data da realização da última festa agendada pela contra-interessada. Não tendo sido obtida a suspensão dos actos, foi deferida a necessidade de proceder à medição dos níveis sonoros das festas autorizadas por tais actos – ou seja, das festas que decorreram até ao dia 7 de Setembro. Consequentemente, nesta data não impende já qualquer obrigação sobre o Réu ora Recorrente.

    4. Nos termos do disposto no art.º 141.º do CPTA, “pode interpor recurso ordinário de uma decisão jurisdicional proferida por um tribunal administrativo quem nela tenha ficado vencido (…)”. Há, pois, uma diferença entre a legitimidade para a causa e a legitimidade para recorrer, nesta última se incluindo o interesse em agir.

    5. Conforme refere Miguel Teixeira de Sousa in “Legitimidade e interesse no recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade”, “a legitimidade processual refere-se à parte que pode discutir em juízo um determinado objecto; o interesse processual respeita à utilidade para a parte demandante e ao correspondente prejuízo para a parte demandada que podem resultar da tutela que é requerida aos tribunais. Portanto, a legitimidade processual responde à questão de saber quem pode ser parte numa determinada acção (ou quem é a “parte justa” nessa acção) e o interesse processual responde à pergunta de saber qual é a vantagem e o correspondente prejuízo que podem resultar para as partes da concessão da tutela requerida”. Mais à frente explicita este autor que “se a legitimidade para recorrer é aferida em...

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