Acórdão nº 10/17.9BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução14 de Novembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acórdão I. RELATÓRIO A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 17.10.2016, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada por V......., Lda (doravante Recorrida ou Impugnante), que teve por objeto a liquidação de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC), atinente ao exercício de 1997.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “A. A liquidação impugnada teve na sua génese acção de fiscalização levada a cabo pelos Serviços de Inspecção Tributária da qual resultaram correcções feitas com base no art. 57° do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC).

  1. A sentença recorrida considerou que o acto impugnado não se encontra suficientemente fundamentado, porquanto a Autoridade Tributária (AT) se limita "tão somente, perante a constatação de que os preços de venda praticados pela impugnante e pela N....... são idênticos, a remeter para uma margem de comercialização de 25% pretensamente vigente no sector".

  2. Não concorda a Fazenda Pública com o doutamente decidido pelas razões que se seguem: D. No que respeita à questão se existirem condições diferentes das normalmente acordadas entre pessoas independentes apurou a inspecção tributária a contracção de empréstimos bancários pela V......., que visam financiar a actividade da I......., suportando custos financeiros elevados e a prática de uma margem de comercialização nula em 1995 e 1996, pelo facto de vender aos seus clientes pelo mesmo preço por que adquire as mercadorias à I……..

  3. Perante esta factualidade, a AT decidiu aplicar o art. 57°, nº 1 do CIRC.

  4. Para determinar o lucro tributável, com base neste preceito, como consta do relatório inspectivo (RIT), recorreu à margem de comercialização utilizada no sector, comprovando, através dos elementos juntos ao Anexo 18 do RIT, que a mesma se fixa em 25%.

  5. Sendo esta, aliás, também, a margem de comercialização utilizada pela Sociedade Comercial V……, Lda, empresa detida pelos mesmos sócios, no ano de 1996 - Cfr Anexo 18 do RIT.

  6. Pelo que, erra a sentença recorrida ao considerar que a AT não fundamentou o recurso à margem de comercialização utilizada e fixada em 25%.

    I. Assim, tendo a AT fundamentado e comprovado a verificação dos pressupostos para efectuar a correcção em causa, recai sobre o contribuinte o ónus de demonstração do erro ou excesso na quantificação (artigo 74°, nº3, da LGT).

  7. Ora, não resulta dos autos que o recorrido tenha comprovado tal excesso, motivo porque se tem por incumprido o ónus.

  8. Acresce ainda que, da leitura da petição inicial resulta que o Impugnante apreendeu com suficiente clareza o cerne das razões, de facto e de direito, que determinaram a prática das liquidações impugnadas, são, nomeadamente, os considerandos vertidos nos art. 29° a 39° da douta petição inicial, nos quais identifica correctamente a factualidade legitimadora das correcções efectuadas pelos serviços de inspecção de tributária.

    L. Nestes termos, ao decidir como decidiu violou o Tribunal, na douta sentença, o preceituados nos art. 57°, nº do CIRC, 77°, nº 3 e 74° da LGT”.

    A Recorrida contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões: “

  9. O ato objeto de impugnação pela entidade recorrida não se encontra suficientemente fundamentado, nos termos legais e constitucionais existentes na nossa ordem jurídica; B) A entidade recorrente ao afirmar o que, em seu entendimento, consubstancia uma relação especial, nos termos enunciados no artigo 57º do C.l.R.C, em vigor à data dos factos, limitou-se a afirmar que os preços praticados na venda de mercadorias pela recorrida e pela N....... são idênticos e que, como tal, o custo das mercadorias desta se encontram sobrevalorizados, impondo-se à recorrida de uma margem de comercialização de 25%, pretensamente aplicada ou apresentada no sector de atividade de ambas, sem o curar de o demonstrar ou provar como era sua obrigação legal; C) Contudo, a entidade recorrente não indica ou refere, por qualquer meio ou forma, como lhe competia, nos termos do artigo 77º nº 3 da L.G.T, os termos em que as operações realizadas entre a recorrida e a N....... seriam realizadas se, porventura , as mesmas decorressem entre entidades independentes, em igualdade de circunstâncias; D) No caso em análise, releva considerar que as operações realizadas entre a recorrida e a N....... detinha uma especificidade ou especialidade, uma vez que a ora recorrida procedia a adiantamentos em dinheiro à I…..e à N….., por conta de encomendas de fornecedores, tal como se demonstrou provado nos presentes autos e como isso foi expressamente reconhecido pela entidade recorrente no relatório que sustenta as correções à matéria tributável da recorrida, conforme se alcançam dos factos dados como provados nas alíneas B) e T) dos factos provados da sentença lavrada, circunstância que deveria ter merecido da parte da entidade recorrente uma análise comparativa das operações realizadas entre partes especialmente relacionadas e partes independentes, situação que não ocorreu por parte da AF; E) Com efeito, a fundamentação lavrada pela recorrente resulta claro que, quanto a essa análise comparativa das operações realizadas entre partes especialmente relacionadas e partes independentes, foi obnubilada por aquela tendo-se limitado, perante a constatação de que os preços de venda praticados pela recorrida e pela N....... são idênticos, a remeter para uma margem de comercialização de 25 por cento, alegadamente existente no sector; F) Aliás, mesmo no que tange ao rácio da margem pretensamente em vigor no sector de atividade da entidade recorrida apurado pela AT, esta limita-se a remeter para dois prints do seu sistema informático sem que explicite ou esclareça, por qualquer meio ou forma, os valores aí inscritos, o universo de sujeitos passivos contemplados por esses indicadores de margens de comercialização e ou a comparabilidade da informação aí referida com a situação da recorrida no caso concreto em análise; G) Resulta dos elementos existentes nos prints do sistema informático da AT, não ressalta nomeadamente se a margem de comercialização estalecida pela recorrente se aplica unicamente a operações efetuadas no mercado interno ou a operações realizadas no mercado externo (como resulta da alínea A) nos seus números 1 a 9 da matéria de facto dada como provada e inscrita na sentença do Tribunal "a quo"), ou se se trata de uma margem de comercialização média do sector aplicado em ambos os tipos de operações; H) Assim, a "...entidade recorrente não forneceu à recorrida o "iter cognoscitivo e valorativo prosseguido de modo a dar-lhe a conhecer as razões factuais e jurídicas que estão na sua génese, de modo a permitir-lhe optar, de forma esclarecida, entre a aceitação do ato ou o acionamento dos meios legais de impugnação", conforme resulta lapidar do Acórdão do STA de 14 de fevereiro de 2013, proferido no Processo nº 642/ 12, entre outros; I) Em face do referido, constata-se que a entidade recorrente não deu cabal cumprimento ao dever de fundamentação do ato tributário imposto pelo disposto no artigo 77º da L.G.T, na redação em vigor à data dos factos apurados e que lhe impunha que descrevesse, em termos comparativos, os termos em que as operações visadas pela AT e realizadas pela recorrida, teriam lugar entre partes independentes, nas mesmas condições o que, não tendo ocorrido por responsabilidade da AT, determinará a anulabilidade do ato tributário de liquidação de IRC referente ao exercício fiscal de 1997, a coberto do artigo 99° alínea c) do C.P.P.T, e consequente anulação do ato tributário de liquidação objeto de impugnação pela recorrida em devido tempo, com todas as consequências legais”.

    Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do art.º 289.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso.

    Colhidos os vistos legais (art.º 289.º, n.º 2, do CPPT) vem o processo à conferência.

    É a seguinte a questão a decidir:

    a) Há erro de julgamento, na medida em que não se verifica falta de fundamentação, não tendo, ademais, a Recorrida demonstrado qualquer excesso de quantificação? II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO II.A.

    O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto: “

  10. Em cumprimento da ordem de serviço nº……., de 1998, a impugnante foi sujeita a uma acção externa de fiscalização, com referência ao IRC do exercício de 1997, tendo em 28-10-1998 sido elaborado relatório pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção Distrital de Finanças de Lisboa, na qual são propostas correcções técnicas de IRC no valor total de 37.839.754$00, com o seguinte teor, em transcrição parcial (cfr. relatório de inspecção tributária (RIT), a fls. 29 a 46 dos autos, que aqui se dá por integralmente reproduzido): «4. OUTRAS CONSIDERAÇÕES SOBRE A EMPRESA Relações Entre a Empresa V......., Lda e o Seu Único Fornecedor ¯N....... , SA‖ 4.1. Sócios Comuns A empresa N......., SA (adiante designada por N.......) foi constituída em 1995, resultante de uma estratégia de reestruturação da empresa I....... Empresa I. …….SARL (NIPC 5 ….) (adiante designada por I.......), que se...

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