Acórdão nº 01187/10.0BEALM 0225/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução06 de Novembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.- Relatório A Autoridade Tributária e Aduaneira – AT veio interpor para este Supremo Tribunal recurso de revista excepcional, ao abrigo do disposto nos artigos 150.º e 144.º n.º 1 e 2 do CPTA, do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 27 de Outubro de 2016, que indeferiu a reclamação para a conferência do despacho do relator naquele TCA que, por não haver que conhecer do seu objecto, julgou findo o recurso que pretendera interpor da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, de 31 de Outubro de 2011, que julgou procedente a Acção Administrativa Especial interposta por A………….., SA, com os sinais dos autos, e verificou a caducidade da garantia prestada no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3530200701050672.

A recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “1. O presente recurso de revista vem interposto do Douto Acórdão proferido em conferência pelo TCA Sul em 27-10-2016; 2. Salvo o devido respeito, que é muito, entende a Autoridade Tributária e Aduaneira que esse acórdão procedeu a uma errada aplicação do Direito, devendo esse Supremo Tribunal intervir em Revista, pois que se verificam os pressupostos previstos na lei para o efeito.

  1. Nos presentes autos foi rejeitado o recurso jurisdicional interposto pela Autoridade Tributária e Aduaneira da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada de 31-10-2011, por ali se ter entendido ser aplicável ao caso – em que estava em causa uma acção administrativa especial em matéria tributária da competência e a correr termos num tribunal tributário – o regime jurídico previsto no art.º 40.º, n.º 3 do ETAF (para os tribunais administrativos de círculo) e, por isso, ser também aplicável ao caso a alínea i) do n.º 1 do artigo 27.º do CPTA.

  2. Em consequência do que se decidiu que o meio de reacção adequado devia ter sido a reclamação nos termos do n.º 2 do citado artigo 27.º do CPTA e não aquele recurso jurisdicional, tendo este sido rejeitado por intempestividade.

  3. A questão relevante controvertida nestes autos consiste, essencialmente, em saber se nas circunstâncias do caso, numa sentença proferida numa acção administrativa especial em matéria tributária, proferida num Tribunal Tributário, por juiz singular (como não podia deixar de o ser), o TCA, ao aplicar a alínea i) do n.º 1 e o n.º 2 do artigo 27.º do CPTA, e isso por entender ser também aplicável o art. 40.º n.º 3 do ETAF procedeu a uma incorrecta aplicação do direito.

  4. A questão enunciada é fundamental para garantir uma correcta e melhor aplicação do Direito e tal, note-se, numa matéria em constante aplicação nos tribunais.

  5. E isso, além do mais, dado que, aquando da interposição, nos presentes autos, do recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Tributário para o TCA Sul, a opção jurisprudencial que se encontrava firmada era no sentido de que das sentenças proferidas em primeira instância pelos tribunais tributários cabia sempre imediato recurso jurisdicional, a interpor no prazo de 30 dias após a notificação das mesmas, em conformidade com o nº 1 do artigo 144º do CPTA, pelo que a sua rejeição constituiu uma decisão totalmente imprevisível.

  6. Apenas agora houve uma inflexão na jurisprudência respeitante às acções administrativas especiais em matéria tributária, tendo os tribunais tributários e os TCA começado a decidir que das sentenças proferidas pelos tribunais tributários cabe reclamação, nos termos do artigo 27º nº 2 do CPTA, e não recurso.

  7. Face ao que se impõe reconhecer, in casu, a importância jurídica da questão e a sua relevância excepcional com vista a uniformizar as decisões e a permitir segurança no domínio do acesso à justiça, situação em que a Revista é essencial.

  8. Em abono do referido veja-se o entendimento acolhido pelo douto acórdão desse Supremo Tribunal proferido no processo nº 1360/13, de 12-09-2013, que supra se transcreveu e que, atenta a sua bondade manifesta, damos como reproduzido, salientando-se aqui que, como aí se refere: «A admissão para uma melhor aplicação do direito tem tido lugar relativamente a matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória, impondo-se a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa como condição para dissipar dúvidas sobre o quadro legal que regula certa situação, vendo-se a clara necessidade de uma melhor aplicação do direito com o significado de boa administração da justiça em sentido amplo e objectivo, (...)».

  9. Termos em que, por estarem verificados os respectivos pressupostos legais, deve a Revista ser admitida.

  10. No caso em apreço estamos perante uma acção administrativa especial cujo objecto consiste num acto administrativo em matéria tributária (que não comporta a apreciação do acto de liquidação - cf. 97, nº 1, alínea p) e nº 2 do CPPT).

  11. A competência para conhecer desses actos administrativos respeitantes a questões fiscais (que não comportem a apreciação do acto de liquidação) foi atribuída aos tribunais tributários pelo artigo 49º, nº 1-a)-iv do ETAF.

  12. Em conformidade com essa norma, os recursos contenciosos - hoje acções administrativas especiais - em matéria tributária correm termos, em primeira instância, nos tribunais tributários.

  13. A competência, organização e funcionamento dos tribunais tributários vem regulada no ETAF, no Capítulo VI desse diploma.

  14. No que especificamente respeita ao funcionamento dos tribunais tributários, rege o artigo 46º do ETAF, decorrendo dessa norma que os tribunais tributários funcionam apenas com juiz singular, só assim não sendo por decisão do presidente do tribunal tributário em causa e na situação específica prevista no respectivo nº 2.

  15. E, salvo o devido respeito, contrariamente ao que o TCA entendeu nos presentes autos, o entendimento da ora recorrente, acima expresso, não é posto em causa pelo regime constante nos artigos 9º-A e 49º-A, aditados ao ETAF pelo Decreto-Lei nº 166/2009, de 31-7.

  16. Da interpretação sistemática do referido artigo 49º-A e atendendo ao Capítulo do ETAF onde está integrado, a conclusão a retirar é que não poderá aplicar-se ao juízo de pequena instância a norma do ETAF prevista no n.º 2 do artigo 46º.

  17. Assim, reiterando o que já havíamos concluído - contrariamente ao que acontece com os tribunais administrativos de círculo - por imposição expressa do artigo 46º, nº 1 do ETAF os tribunais tributários funcionam apenas com juiz singular, só não sendo assim na situação específica prevista no nº 2 do mesmo preceito.

  18. Diversamente do que acontece com os tribunais tributários, a organização, competência e funcionamento dos tribunais administrativos de círculo vem regulada no ETAF, no Capítulo V desse diploma e, dentro deste, no que especificamente respeita ao funcionamento dos tribunais administrativos de círculo, no artigo 40º.

  19. O acórdão recorrido apela, em defesa da sua tese, para o nº 3 desse artigo 40º do ETAF, porém esse nº 3 (bem como, de resto, os números 1 e 2 do mesmo preceito) aplica-se apenas à jurisdição administrativa.

  20. Deste modo, as acções administrativas especiais que aí se referem são as que correm termos nesses tribunais administrativos de círculo e não aquelas que o legislador entendeu serem da competência e deverem correr termos nos tribunais tributários, como acontece com a acção administrativa...

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