Acórdão nº 89/18.6YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelMARIA DA GRAÇA TRIGO
Data da Resolução24 de Outubro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça I – Relatório 1. AA, Juíz ..., vem impugnar a deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura (CSM) de 30 de Outubro de 2018, que deliberou pela improcedência da reclamação relativa ao despacho do Vice-Presidente do CSM, datado de 7 de Junho de 2018, que decidiu descontar na antiguidade do demandante o período compreendido entre … e … para efeitos do movimento judicial ordinário de 20….

Alega que tanto a deliberação como o despacho padecem das seguintes invalidades: a) Violação do princípio da audiência prévia; b) Violação do caso julgado formado pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) de 16/05/2018, proferido no âmbito do processo nº 76/11….; c) Violação da norma do artigo 156º do Código de Procedimento Administrativo (CPA) por atribuição ilegal de eficácia retroactiva; d) Violação de lei (artigo 281º, nº 3 da Lei de Trabalho em Funções Públicas (LTFP)); e) Violação do princípio da tutela da confiança.

Conclui o demandante pedindo que a deliberação impugnada e o despacho do Vice-Presidente do CSM sejam declarados nulos ou anulados por serem ilegais.

Pede ainda que seja declarado que o período de tempo em causa na referida deliberação e no referido despacho não possa ser objecto de novo procedimento administrativo, devendo a sua antiguidade ser contada em conformidade.

  1. O CSM deduziu resposta a sustentar, no que respeita às invalidades invocadas, o seguinte: - Não ocorre violação do direito à audiência prévia porque o demandante já se pronunciou anteriormente sobre a questão da sua antiguidade, no procedimento nº …, tendo tido conhecimento exaustivo do denso caminho adoptado pelo CSM, com prolação de diversos pareceres e adopção final de duas deliberações do Plenário (naquele e no actual procedimento); - Não padece a deliberação impugnada de vício de violação do caso julgado uma vez que o Acórdão do STJ de 16/5/2018, invocado para tanto, se limitou a declarar a anulação da deliberação com fundamento na caducidade do procedimento administrativo anterior; - Não padece a deliberação impugnada de vício de atribuição ilegal de eficácia retroactiva porque o demandante confunde a retroactividade da decisão administrativa com a definição, por acto administrativo, do tratamento de uma questão, de direito e de facto, que se prolonga ao longo do tempo; - Não padece a deliberação impugnada de vício de violação de lei por, conforme exaustivamente alega, a decisão de fixação da antiguidade ser a mais adequada ao cumprimento da legislação aplicável; - Não padece a deliberação impugnada de vício de violação do princípio da tutela da confiança porque não existiu, por parte do demandado, qualquer conduta que produzisse no demandante a confiança de que não seria decidida a perda de antiguidade no período em causa.

    Conclui pela improcedência da impugnação deduzida.

  2. Posteriormente, o demandante apresentou alegações em que reitera, no essencial, os fundamentos e a argumentação inicialmente invocados, terminando nos seguintes termos: “1) Face quer às deliberações antecedentes à ora impugnada, quer face ao caso julgado que determinou, entre outras, oficiosamente a caducidade do procedimento de fixação da antiguidade do A., ao contrario do que sucedeu, impõe-se que, ao abrigo do princípio da tutela jurisdicional efetiva, sob pena de sua violação (e sem prejuízo das invalidades que se verificam quanto à deliberação ora impugnada que determinam, pelo menos, a sua anulação) se fixe, de uma vez por todas, a antiguidade do A.; 2) A douta deliberação do CSM, de 30 de outubro de 2018, que deliberou pela improcedência da reclamação datada de 09.07.2018, do despacho do Exmo. Senhor Vice-Presidente de CSM de 07 de junho de 2018, padece de invalidades várias e, por isso, deve ser pelo menos anulada. Vejamos: 3) Primeiro viola o princípio da audiência prévia, porque como resulta da evidência dos factos, de acordo com o disposto no artigo 121° do CPA, conjugado com o artigo 124° do CPA, é totalmente claro e sem margem para quaisquer dúvidas de que in casu não estamos perante um caso de dispensa de audiência prévia, pelo que a mesma deveria ter sido realizada, tal como a isso impõe o princípio constitucional da participação dos interessados, que consagra um verdadeiro direito subjetivo procedimental ao A; 4) Trata-se de um verdadeiro direito subjetivo procedimental que visa acima de tudo permitir que os interessados possam contribuir para a boa decisão administrativa, razão pela qual, no caso, ao não ter sido realizada a audiência prévia, o R, não formou a sua decisão [a]través do mais cabal esclarecimento dos factos e do conhecimento da sua posição jurídica perante eles, deforma a conduzir a uma decisão mais acertada e justa; 5) Deste modo, não só por manifesta violação dos princípios de direito referidos, mas também porque em causa não está um ato vinculado, no caso sub judice não há lugar a aplicação do princípio do aproveitamento dos atos administrativos que possa não determinar a anulação da deliberação impugnada por violação do princípio da audiência prévia; 6) Segundo, viola o caso julgado: o douto Acórdão de 16.05.2018, proferido por este Tribunal, não obstante ter anulado a deliberação do CSM de 06.06.2017 que descontou na antiguidade do ora A. o período que mediou entre 15.12.2014 e 14.05.2018, com base na caducidade do procedimento administrativo, não deixou de se pronunciar sobre a questão da antiguidade propriamente dita, como resulta evidente nomeadamente a fls. 14 a 17; 7) Sobre a questão do desconto da antiguidade foi referido, designadamente que o disposto no artigo 74º, alínea a), do EMJ deve ser interpretado de acordo com o disposto nos artigos 280º a 283º da LTFP; 8) Ora, a decisão em crise faz precisamente o contrário, isto é, baseia-se única e exclusivamente no disposto no artigo 74º do EMJ, não fazendo qualquer referência ao disposto nos artigos 280º a 283º da LTFP e nem sequer classifica o que entende por "licença de longa duração"; 9) Isto é, a decisão ora impugnada decide em sentido contrário ao vertido no douto Acórdão de 16.05.2018, razão pela qual há, assim, violação do caso julgado o que determina a sua nulidade; 10) Terceiro, viola o disposto no artigo 156º do CPA por atribuição ilegal de eficácia retroativa; 11) O certo é que não está em causa nenhuma das situações previstas no nº 1 do artigo 156º do CPA, nem no seu nº 2.

    12) Logo, a atribuição de eficácia retroativa à deliberação impugnada é ilegal e também acarreta a sua invalidade; 13) Quarto, viola o disposto no artigo 281º, nº 3, da LTFP, na medida em que, violando o caso julgado, como dito adrede, o R. "fez letra morta" do referido por este Tribunal e decidiu aplicar ao A. o desconto na antiguidade do período de tempo em que o mesmo exerceu funções como magistrado (primeiro como juiz na primeira instância e após no …) em organismo internacional, …., devidamente autorizado para o efeito; 14) Ora, de acordo com o estipulado no artigo 281°, nº 3, da LTFP o exercício de funções em organismo internacional confere ao A. o direito à contagem desse tempo para efeitos de antiguidade - o que não sucedeu, pelo que a deliberação impugnada viola a lei o que acarreta a sua anulação; 15) Quinto, a deliberação impugnada viola, ainda, o princípio da tutela da confiança na medida em que, por um lado, a deliberação impugnada foi tomada em absoluto desrespeito pelo caso julgado, e com aplicação de efeitos retroativos legalmente proibidos; 16) Por outro lado, o CSM publicou as listas de antiguidade relativas aos anos de 20… e 20…, em ambas aparecendo o A. sem qualquer perda de antiguidade resultante das funções que vem exercendo como juiz em organismo internacional (primeiro no … e, desde dezembro de 20…, no …) e na de 20… mesmo depois retificada por despacho do Seu Vice-Presidente de 21.11.2016 (ou seja, 5 meses e meio depois da pronúncia do A., quando o prazo estabelecido para elaboração do projeto de deliberação é de 30 dias, nos termos do artigo 30º do Regulamento Interno do CSM); 17) E por outro lado, ainda, o CSM sabe que as Licenças em causa foram concedidas para o exercício de funções em organismo internacional, cujo interesse público foi declarado, e que por isso o A. tem direito à contagem do tempo para efeitos de antiguidade, nos termos dos artigos 283º, nºs 1, alínea b), e 3, 281º, nº 3, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas - nesse sentido pode ver-se o parecer de 08.06.2016 do hoje Exmo. Senhor Juiz Secretário do CSM.” 4.

    Por sua vez, o CSM também apresentou alegações em que retomou, no essencial, os fundamentos e argumentos anteriormente invocados.

  3. Por fim, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu o parecer de fls. 170-176, no qual se pronuncia no sentido da improcedência da presente acção de impugnação.

    Cumpre apreciar e decidir.

    II – Factos provados relevantes para a decisão 1. Por deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura de 6 de Junho de 2017 foi determinado o desconto na antiguidade do aqui recorrente Juíz ... AA do período que mediou entre … e ….

    2 - De tal deliberação o recorrente AA interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça o qual por acórdão transitado em julgado em 1 de Junho de 2018, no âmbito do processo n.º 76/17.l…. julgou procedente o recurso interposto declarando a anulação da deliberação indicada em 1. com fundamento na caducidade do procedimento administrativo.

  4. Em 6 de Junho de 2018 foi elaborada informação pela Divisão dos Serviços de Quadro e Movimentos Judiciais deste Conselho Superior da Magistratura com o seguinte teor: “Na sequência de decisão judicial proferida no âmbito do Processo n° 76/17…. que correu termos na secção de contencioso do Supremo Tribunal de Justiça e que transitou em julgado no passado dia 1 de junho de 2018, foi declarada anulada a deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura de 6 de Junho de 2017 no qual se concluiu pelo desconto da antiguidade do Exmo. Senhor...

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