Acórdão nº 575/19 de Tribunal Constitucional (Port, 17 de Outubro de 2019

Data17 Outubro 2019
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 575/2019

Processo n.º 1016/2018

2.ª Secção

Relator: Conselheiro Fernando Ventura

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos, pendentes no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Braga, em que é recorrente o Ministério Público e recorrido A., o primeiro interpôs recurso, para si obrigatório, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (doravante LTC), da sentença proferida pelo TAF de Braga em 30 de julho de 2018, a qual recusou a aplicação, com fundamento em inconstitucionalidade da norma contida no artigo 2.º, n.º 8, do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril, na interpretação segundo a qual o prazo de um ano para requerer o pagamento dos créditos laborais, certificados com a declaração de insolvência, cominado naquele preceito legal é de caducidade e insuscetível de qualquer interrupção ou suspensão.

2. Releva para o presente recurso que o contrato de trabalho celebrado entre a aqui recorrida e a sociedade B., Lda, cessou em 4 de março de 2014.

Em 17 de março de 2015, em processo impulsionado pelo recorrido e outros, foi declarada a insolvência da referida sociedade.

Em data posterior, mas anterior a 1 de junho de 2015, o recorrido apresentou, junto do administrador de insolvência, requerimento de reclamação de créditos salariais, no montante de €5.507,68.

Em 5 de novembro de 2016, o recorrido apresentou no Instituto da Segurança Social requerimento para o pagamento dos mesmos créditos salariais, certificados pelo administrador de insolvência.

O Fundo de Garantia Salarial indeferiu a pretensão, com fundamento em que o requerimento não fora apresentado no prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do n.º 8 do artigo 2.º do D.L. n.º 59/2015, de 21 de abril.

3. No requerimento de interposição de recurso, o Ministério Público peticiona a apreciação da conformidade constitucional da dimensão normativa cuja aplicação fora recusada.

Admitido o recurso, remetidos os autos a este Tribunal e efetuada a distribuição, foi determinado o prosseguimento do recurso.

Notificadas as partes, apenas o Ministério Público alegou, concluindo nestes termos:

«1 – A norma do artigo 2.º, n.º 8, do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril, na interpretação segundo a qual o prazo de um ano para requerer o pagamento dos créditos laborais, certificados com a declaração de insolvência, cominado naquele preceito legal é de caducidade e insuscetível de qualquer interrupção ou suspensão é inconstitucional, por violação dos artigos 2º, 13.º e 59º, nºs 1, alínea a), e 3, da Constituição.

2 – Termos em que deve ser negado provimento ao recurso.»

4. Em virtude da cessação de funções da primitiva Relatora, foram os autos objeto de redistribuição.

Cumpre apreciar e decidir.

II. Fundamentação

5. A dimensão normativa cuja conformidade constitucional é posta em controlo no presente recurso foi já apreciada pelo Tribunal, por via do Acórdão n.º 328/2018 (retificado pelo Acórdão n.º 447/2018), que formulou juízo positivo de inconstitucionalidade, por infringir a garantia especial que a Constituição da República Portuguesa confere ao salário, nos termos do n.º 3 do artigo 59.º Esse juízo foi seguido pelos Acórdãos n.ºs 583/2018 e 251/2019, assim como nas Decisões Sumárias n.ºs 111/2019, 114/2019, 204/2019, 297/2019, 464/2019, 512/2019 e 530/2019.

Pode ler-se no aresto n.º 328/2018:

«2.4. Estabelece o artigo 59.º da CRP:

Artigo 59.º

(Direitos dos trabalhadores)

1. Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito:

a) À retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna;

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3. Os salários gozam de garantias especiais, nos termos da lei.

Reafirmando, neste específico domínio, o princípio da igualdade no corpo do n.º 1, a lei fundamental afirma, na alínea a), o direito à justa retribuição do trabalho, cujo destaque encontra evidente justificação. Nas palavras do Acórdão n.º 257/2008 (ponto 13):

“[…]

Na verdade, a retribuição da prestação laboral, quer na sua causa, quer na sua destinação típica, está intimamente ligada à pessoa do trabalhador. Ela é a contrapartida da disponibilização da sua energia laborativa, posta ao serviço da entidade patronal. Ela é também, por outro lado, o único ou principal meio de subsistência do trabalhador, que se...

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