Acórdão nº 189/18.2T8GRD.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelBERNARDO DOMINGOS
Data da Resolução03 de Outubro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL * Relatório[1] « AA, residente em …, …, instaurou a presente acção especial de convocação de assembleia de sócios contra BB - Sociedade de Lacticínios, S.A.

, com sede em …, em que pediu que seja “ordenada a convocação judicial da assembleia geral da sociedade, a realizar em dia, hora e local a designar, tendo como ordem de trabalhos a ratificação e confirmação das deliberações de 23 de Fevereiro de 2016[2], 10 de Março de 2016 e 16 de Março de 2016 e a revogação, por nulidade e anulabilidade, das deliberações do mesmo órgão de 18 de Março de 2016, 22 de Junho de 2016 e 3 de Fevereiro de 2017 [detalhadamente circunstanciadas no artigo 52.º do requerimento inicial, designando] para exercer a função de Presidente da Mesa da Assembleia Geral uma das três pessoa mencionadas no artigo 60.º, que deverá indicar como secretário pessoa da sua confiança, com expressa advertência de que existe impedimento de voto, relativamente a todos os pontos da ordem de trabalhos, de CC ou de quem se apresente a suceder-lhe na titularidade desse lote de acções e, bem assim, de que deve dar cumprimento a todas as formalidades relativas à convocação da assembleia, mediante a adequada publicação, com a necessária antecedência”.

Alegou, em síntese, que o Conselho de Administração (doravante, CA) da sociedade requerida, emitiu, nos dias 23 de fevereiro de 2016, 10 de março de 2016 e 16 de março de 2016, deliberações (constantes das actas juntas) que não foram impugnadas judicialmente, mas que foram posteriormente objecto de deliberações do CA da sociedade, ocorridas nos dias 18 de março de 2016, 22 de junho de 2016 e 3 de fevereiro de 2017, através das quais os membros de tal órgão procederam à anulação daquelas 3 anteriores deliberações, deliberações aquelas (as 3 deliberações “anulatórias”) que, segundo o requerente, são inválidas, o que determinou a instauração de acções de impugnação das referidas deliberações[3].

Mais alegou que, face às sucessivas e divergentes deliberações do CA, requereu, tendo em vista o esclarecimento da questão, em 28 de dezembro de 2017, ao presidente da mesa da assembleia geral (doravante, PMAG) da sociedade requerida a convocação de uma assembleia geral extraordinária para o dia 2 de fevereiro de 2018[4], pelas 14h30m, na sede social, tendo por ordem de trabalhos a ratificação e confirmação das sobreditas deliberações de 23 de Janeiro de 2016, 10 de Março de 2016 e 16 de Março de 2016 e a revogação, por nulidade e anulabilidade, das deliberações do mesmo órgão de 18 de Março de 2016, 22 de Junho de 2016 e 3 de Fevereiro de 2017; porém, o PMAG não convocou a reunião requerida, nem para a data apontada, nem para qualquer outra, não tendo justificado a não convocação da assembleia, motivo pelo qual, sendo detentor de acções representativas de mais de 5% do capital social, lhe assiste o direito de requerer a sua convocação judicial, razão pela qual pede que o tribunal nomeie pessoa para presidir à mesa da assembleia e que ordene as diligências indispensáveis à realização da assembleia.

Ouvida a requerida, veio esta invocar não estarem reunidos os pressupostos da convocação judicial da assembleia geral, alegando que a pretensão que o requerente dirigiu ao PMAG foi por este apreciada em decisão, fundamentada e justificada, enviada ao requerente e a que este não respondeu, tendo, ao invés, instaurado a presente acção, devendo, assim, o requerente, ao ter omitido tais factos, ser condenado como litigante de má-fé; ademais, tendo as deliberações em causa sido objecto de impugnação judicial, que se encontram pendentes em tribunal, não pode a assembleia geral substituir-se ao tribunal, uma vez que ocorre, segundo a requerida, uma inutilidade da lide, não podendo também apreciar-se o pedido de “impedimento de voto” da accionista Aline, por tal contender com o objecto da causa.

“Respondeu” o requerente, mantendo o alegado na PI e opondo-se à sua condenação como litigante de má-fé.

Após o que, entendendo o Exmo. Juiz que os autos contêm todos os elementos de facto para uma decisão de mérito, passou de imediato a apreciá-la e a proferir sentença em que, a final, decidiu “(…) julgar a acção totalmente improcedente e, em consequência, absolver a requerida do pedido, condenando o requerente, como litigante de má-fé, na multa de 5 (cinco) UC.

Inconformado com tal decisão, interpôs o requerente recurso de apelação. Apreciando o recurso o Tribunal da Relação de Coimbra Revogou parcialmente a sentença e decidiu o seguinte: « … ordenar a convocação judicial da assembleia geral da sociedade requerida, a realizar em dia, hora e local a designar, tendo como ordem de trabalhos a revogação, por nulidade e anulabilidade, das deliberações do CA da requerida de 3 de Fevereiro de 2017, designando-se para exercer a função de Presidente da Mesa da Assembleia Geral a Dr.ª DD (melhor identificada a fls. 21 verso) e ordenando-se que a mesma deve dar cumprimento a todas as diligências e formalidades indispensáveis (designadamente, a adequada publicação, com a necessária antecedência) à realização de tal assembleia geral da requerida (art. 1057.º/3 do CPC).

Absolve-se o requerente da condenação que lhe foi imposta como litigante de má-fé».

* Inconformada com o acórdão da Relação veio a requerida BB, SA, interpor recurso de revista, tendo rematado as suas alegações com as seguintes Conclusões: « I – O presente recurso tem por objecto o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra proferido em 06/11/2018, o qual decidiu revogar a douta Sentença proferida em 1.ª Instância pelo Meritíssimo Juiz a quo do Tribunal Judicial da Comarca da ..., designadamente ordenando a convocação judicial de assembleia geral da sociedade, ora aqui Recorrente, a realizar em dia, hora e local a designar, tendo como ordem de trabalhos a revogação, por nulidade e anulabilidade, das deliberações do Conselho de Administração da Sociedade ora aqui Recorrente de 3 de Fevereiro de 2017, designando para exercer a função de presidente da Mesa da Assembleia Geral a pessoa indicada pelo próprio accionista na acção e ordenando-lhe que deve dar cumprimento a todas as diligências e formalidades indispensáveis (designadamente, a adequada publicação, com a necessária antecedência) à realização de tal assembleia- geral, mais absolvendo o accionista requerente, ora aqui Recorrido, da litigância de má-fé; – Versa, assim, o presente recurso exclusivamente sobre matéria de direito, nos termos do art. 674.º, n.º 1, al. a), do CPC.

– Ao contrário do que parece ser a interpretação do Tribunal da Relação no acórdão proferido, as deliberações do conselho de administração de 23/2/2016, 16/3/2016 e 10/3/2016 da sociedade, aqui Recorrente, (factos provados em L), M) e N)), foram objecto de uma aturada e decisiva sindicância judicial, porquanto emanam de um CA nomeado em Assembleia Geral de 31 de Outubro de 2015 da sociedade, aqui Recorrente, cuja legitimidade de nomeação veio a ser judicialmente declarada inválida.

IV – Designadamente no âmbito do Proc. n.º 94/17.0T8TCS, que correu termos no Juízo de Competência Genérica de …, Comarca da …, no qual, em virtude de transacção judicial, se assumiu que tais deliberações se encontram feridas de invalidade, quer por nulidade, quer por anulabilidade, nomeadamente a deliberação que aprovou e nomeou os novos membros do Conselho de Administração para concluir aquele mandato de 2014-2016, tudo conforme prova produzida na providência cautelar n.º 156/15.8T8TCS.

V – Esta questão configura-se como incidental, uma vez que só pôde ser trazida aos presentes autos neste preciso momento na medida em que o trânsito em julgado do Proc. n.º 94/17.0T8TCS só ocorreu em 28.06.2018, portanto, já depois de ter sido interposto o recurso de apelação (28.05.2018) do qual se vem agora recorrer, VI – o que determina a possibilidade do Recorrente poder socorrer-se do mecanismo previsto no n.º 1 do art. 680.º do CPC, requerendo a junção da respectiva Certidão Judicial, a qual constitui um documento verdadeiramente superveniente.

VII – Contudo, o apuramento do conspecto desta questão só poderá ser alcançado com a Decisão Judicial proferida no âmbito da Providência Cautelar a que àquela acção principal (94) foi apensada, correspondente ao Processo n.º 156/15.8T8TCS, que correu termos no Juízo de Competência Genérica de ..., Tribunal Judicial da Comarca da ... ; VIII – Assim como a decisão judicial proferida no âmbito do Processo de Pedido Cautelar de Suspensão n.º 120/16.0T8TCS, que correu termos no Juízo de Competência Genérica de …, Tribunal Judicial da Comarca da … .

IX – Todas elas estão intrinsecamente relacionadas com o documento superveniente cuja junção aqui se requer, na medida em que todas elas se debruçaram sobre as deliberações do CA considerado ilegítimo (e, portanto, consideradas inválidas) e sobre as quais a convocação judicial da AG extraordinária incide (factos provados em L), M) e N)); X – pelo que a junção das respectivas certidões judiciais se impõe e se requer para conjugação com o documento superveniente.

XI – A junção do documento superveniente com todo o necessário circunstancialismo inerente e consubstanciado nos documentos que se juntam para instruir tal compreensão destina-se única e simplesmente à apreciação jurídica dos factos provados.

XII – Na decisão judicial proferida no âmbito da Providência Cautelar n.º 156/15.8T8TCS (agora Proc. n.º 94/17.0T8TCS-A), a qual incidiu e veio a decretar a suspensão das deliberações e aprovações tomadas na Assembleia Geral de 31/10/2015 (as mesmas da presente convocação judicial da AG), decorrentes do CA que fora nomeado em 31.10.2015, após destituição do até então em funções, decidiu-se pela sua ilegalidade, por ilegítima, sendo que a Mma. Juíza chegou mesmo a caracterizá-la como um verdadeiro GOLPE DE ESTADO, atento o circunstancialismo em que a mesma operou (impedimento de participação e de voto na AG da maioria dos accionistas com recurso a...

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