Acórdão nº 17/19.1BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 26 de Setembro de 2019
Magistrado Responsável | ALDA NUNES |
Data da Resolução | 26 de Setembro de 2019 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: Relatório A......
, nacional da Serra Leoa, recorre da sentença proferida na presente instância, a 28.3.2019, que julgou improcedente a ação especial urgente de pedido de asilo e absolveu o Ministério da Administração Interna – SEF do pedido de declaração de nulidade da decisão, de 27.11.2017, que determinou o pedido de proteção internacional inadmissível e determinou a sua transferência para Itália.
O recorrente pede seja revogada a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, por, nas alegações que apresentou, concluir: «1.
A sentença recorrida é nula porquanto não apreciou a inconstitucionalidade invocada, cuja arguição se mantem, mesmo que venha a ser sanada a nulidade, se no sentido de manter a decisão recorrida ou considerar constitucional.
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A decisão recorrida enferma de vício, aliás está contrária a diversa Jurisprudência do STA e dos TCA que analisa caso absolutamente idêntico.
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No entanto, dir-se-á que mesmo tratando de apreciação de pedido de proteção internacional ao abrigo do art.º 36.º da Lei 24/2008 de 30 de junho, tem aplicação imperativa a elaboração do relatório prevenido no art.º 17.º da mesma Lei.
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E de facto, no acórdão referido em alegações, pode ler-se na ratio decidendi: “Ora, o art. 17º, nº 1 prevê expressamente que após a realização das diligências cabíveis, no caso houve lugar às declarações previstas no art. 16º, o SEF elabora um relatório escrito do qual constam as informações essenciais ao processo, sendo sobre este relatório que ao requerente é facultada a possibilidade de se pronunciar, no prazo de 5 dias, sendo ainda esse relatório comunicado ao representante do ACNUR e ao CRP (nºs 2 e 3). O que significa que o requerente do pedido de proteção internacional tem direito a ser ouvido sobre as informações essenciais ao seu pedido (que no caso concreto não podiam deixar de ser a inadmissibilidade do pedido e o subsequente procedimento especial que teve lugar), constantes de um relatório escrito que as indique, assim se assegurando a audiência do interessado. No entanto, do procedimento administrativo seguido (e que se encontra descrito nos factos provados), verifica-se que não foi elaborado o relatório contemplado no art. 17º, nº 1 da Lei 27/2008, sobre o qual a requerente se pudesse ter pronunciado, não podendo considerar-se como “relatório”, as declarações da própria requerente acima transcritas. A falta da elaboração desse relatório, tem que ser considerada como preterição de uma formalidade essencial que a lei prescreve, e que determina, consequentemente, que não tenha sido possível à requerente pronunciar-se nos termos do nº 2 do referido art. 17º.
” 5. Os beneficiários de proteção internacional podem ter direito de asilo (cfr. art. 3°), que lhes confere o estatuto de refugiado (art. 4°), ou ser-lhes concedida autorização de residência por proteção subsidiária (art. 7°), sendo único o procedimento desses pedidos, estando a respetiva tramitação prevista nos arts. 10° a 22°, se o pedido de proteção internacional foi formulado junto do Gabinete de Asilo e Refugiados do SEF.
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O art. 17°, n° 1 da Lei n° 27/2008, de 30/6, prevê expressamente que após a realização das diligências cabíveis, no caso houve lugar às declarações previstas no art. 16°, o SEF elabora um relatório escrito do qual constam as informações essenciais ao processo, sendo sobre este relatório que ao requerente é facultada a possibilidade de se pronunciar, no prazo de 5 dias, sendo ainda esse relatório comunicado ao representante do ACNUR e ao CRP (nºs 2 e 3).
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O requerente do pedido de proteção internacional tem direito a ser ouvido sobre as informações essenciais ao seu pedido (que no caso concreto não podiam deixar de ser a inadmissibilidade do pedido e o subsequente procedimento especial que teve lugar), constantes de um relatório escrito que as indique, assim se assegurando a audiência do interessado.
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Sempre e quando o STA apreciou esta matéria, (não em sede de apreciação liminar, mas de forma profunda e analítica) sempre decidiu como acima referida: no sentido de que o art.º 17º, nº 1 da Lei nº 27/2008, de 30 de Junho, prevê expressamente que após a realização das diligências que sejam necessárias, o SEF deverá elaborar um relatório escrito do qual constam as informações essenciais ao processo, sendo sobre este relatório que ao requerente é facultada a possibilidade de se pronunciar, no prazo de 5 dias, sendo ainda esse relatório comunicado ao representante do ACNUR e ao CRP.
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Sem prejuízo do conhecimento da inconstitucionalidade alegada.
Por tudo quanto expendido e com o douto suprimento de V. Exas.
, provendo as conclusões deste recurso, revogando a decisão recorrida, perfilhando a Jurisprudência maioritária».
O recorrido, notificado, não apresentou contra-alegações.
O Exmo. Procurador Geral Adjunto, notificado nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 146º e 147º, ambos do CPTA, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, determinando-se a transferência da análise do pedido às autoridades italianas, de acordo com o estabelecido no regulamento de Dublin.
Foi proferida decisão sumária pelo relator que concedeu provimento ao recurso e, revogando a decisão recorrida, julgou a ação procedente, anulou o ato impugnado de 27.11.2018 e condenou o recorrido a instruir o procedimento relativo ao pedido de proteção do recorrente com relatório escrito do qual constem as informações essenciais do processo, seguido de notificação para pronúncia do recorrente e posterior decisão.
O Ministério da Administração Interna interpôs recurso de revista da decisão sumária.
O tribunal, com vista a convolar o recurso em reclamação para a conferência, convidou o recorrente a pagar a multa devida pela apresentação do requerimento no primeiro dia a seguir ao termo do prazo de 5 dias.
O que o recorrente fez.
O recorrido anuiu à convolação e logo apresentou resposta.
O tribunal admitiu o requerimento de 30.7.2019 como reclamação da decisão do relator, proferida em 16.7.2019, para a conferência * Nos termos dos arts 652º, nº 1, al c) e nº 3 e 656º do CPC, a reclamação para a conferência constitui o meio adjetivo próprio ao dispor da parte que se sinta prejudicada pela decisão individual e sumária do relator sobre o objeto do recurso.
A reclamação para a conferência da decisão sumária proferida apenas pelo relator faz retroagir o conhecimento em conferência do mérito da apelação ao momento anterior àquela decisão sumária.
Cumpre, pois, reapreciar as questões suscitadas pelo recorrente em sede de conclusões, fazendo retroagir o conhecimento do mérito do recurso ao momento anterior à decisão singular de mérito proferida pelo relator.
Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo, vêm os autos à Conferência para apreciação da reclamação deduzida.
Fundamentação de facto O Tribunal a quo deu como provados os factos que seguem: 1. «Em 18.10.2018, o Requerente apresentou junto do Gabinete de Asilo e Refugiados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) um pedido de proteção internacional tendo sido encaminhado para o Centro de Acolhimento da Bobadela.
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Nesse mesmo dia foram recolhidas as impressões digitais do Requerente, nos termos e para os efeitos do nº 3 do art.1º do Regulamento que define o sistema Eurodac, conjugado com o art.34º do Regulamento (UE) nº604/2013 do PE e do Conselho de 26 de junho.
Cfr. fls.2 do PA.
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No decurso do procedimento para determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção em 09.11.2018 foi solicitado pelo SEF às autoridades italianas a tomada a cargo do Requerente, ao abrigo do art.18º, nº1, b) do Regulamento (EU) 604/2013, de 26 de junho do PE e do Conselho, através do competente formulário harmonizado.
Cfr. fls.17 a 21 do PA.
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Em 26.11.2018, o SEF informou as autoridades italianas que dispunham do prazo de duas semanas para se pronunciar sobre aquele pedido, sob pena da falta de decisão equivaler à aceitação do pedido nos termos do art.25º, nºs 1 e 2 do Regulamento (UE) nº604/2013 do PE e do Conselho, de 26 de junho.
Cfr. fls.30-31 do PA.
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Em 27.11.2018, o Gabinete de Asilo e Refugiados do SEF elaborou a Informação nº1617/GAR/2018, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, na qual consta, designadamente, o seguinte: “ (…) Dos motivos invocados no pedido de transferência: Aos 09-11-2018 o GAR apresentou um pedido de retoma a cargo às autoridades italianas ao abrigo do artigo 18º, Nº1, b) do Regulamento (UE) 604/2013 do PE e do Conselho, de 26 de junho.
Consultado o sistema EURODAC foram detetados dois Hit positivos com os “Case ID .................... e IT1................”, inseridos pela Itália.
Aos 26-11-2018 Portugal informou as autoridades italianas que ao abrigo do artigo 25º, Nº1 do Regulamento (UE) 604/2013 do PE e do Conselho, de 26 de junho, tinha duas semanas para se pronunciar sobre o pedido.
As autoridades italianas não se pronunciaram dentro do prazo estabelecido (…) por isso de acordo com o artigo 25 nº2 do mesmo Regulamento, a falta de uma decisão equivale à aceitação do pedido.
Pelo exposto, propõe-se que Itália seja considerada o Estado responsável pela retoma a cargo, ao abrigo do art.25º, Nº2, b) do Regulamento (CE) Nº604/2013 do Conselho de 26 de junho.” Cfr. fls.33-34 do PA.
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Em 27.11.2018, o Diretor Nacional Adjunto do SEF, com base na Informação antecedente, considerou o pedido de proteção internacional apresentado pelo Requerente inadmissível e determinou a sua transferência para a Itália, ao abrigo do disposto no art.38º da Lei nº27/2008, de 30 de junho, com as alterações introduzidas pela Lei nº26/14 de 5 de maio.
Cfr. fls.35 do PA.
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Em 03.12.2018, o Gabinete de Asilo e Refugiados - SEF notificou o Requerente da decisão que determinou que a Itália é o Estado responsável pela sua retoma a cargo e da sua consequente transferência para esse país.
Cfr. fls.42 do PA.
Com interesse para a...
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