Acórdão nº 1168/12.9TBOAZ-C.P1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelHENRIQUE ARAÚJO
Data da Resolução19 de Setembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

PROC. N.º 1168/12.9TBOAZ-C.P1.S2 REVISTA EXCEPCIONAL REL. 99[1] * ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO Declarada a insolvência de AA, S.A.

teve lugar a abertura do presente incidente de qualificação de insolvência.

Os credores BB, SA (hoje BB, SA) e CC apresentaram alegações no sentido de ser declarada como culposa a referida insolvência.

A fls. 461, o Administrador de Insolvência apresentou parecer no mesmo sentido, requerendo que fossem afectados pela qualificação os administradores DD, EE, FF, membros do Conselho de Administração, bem como GG, HH.

Tal parecer foi acompanhado pelo Ministério Público, a fls. 540.

Os requeridos deduziram oposições.

A fls. 2117 a actual Administradora de Insolvência, apresentou requerimento no sentido da exclusão do requerido GG, uma vez que o mesmo deixou de ser HH em Maio de 2012.

Nesta sequência, e uma vez que não houve oposição de nenhum dos credores ou do M.º P.º, foi o requerido GG absolvido da instância.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida a seguinte decisão: Pelo exposto, qualifico a insolvência da insolvente “AA, SA.”, como culposa e, em consequência, decido:

  1. Considerar FF, EE e DD, afectados pela qualificação.

  2. Declarar os Requeridos inibidos para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa pelos períodos de: - 2 anos e 1/2 para o requerido FF; - 3 anos e 1/2 para o requerido EE; e - 5 anos para o requerido DD.

    Desta decisão interpuseram recursos de apelação os requeridos FF, EE e DD.

    No entanto, tais recursos foram julgados improcedentes pelo Tribunal da Relação do Porto.

    Ainda inconformados, os requeridos FF e EE interpuseram recursos de revista excepcional, tendo o acórdão da Formação admitido a revista excepcional do FF, ao abrigo do n.º 1, alínea a) do artigo 672º do CPC, na parte respeitante à autoridade do caso julgado, e determinado que fosse apreciada a admissibilidade da revista normal quanto ao segmento do acórdão recorrido que recusou a existência da nulidade da sentença, por falta de fundamentação.

    O recorrente FF formula as seguintes conclusões recursórias: I. O douto acórdão recorrido decidiu que o procedimento observado na sentença da 1ª instância, não tendo discriminado nem elencado os factos que tenha considerado provados, tendo-os, ao invés, ordenado apenas como "factos alegados" pelas partes (ao contrário do que fizera relativamente aos que considerara "não provados") não constituiria qualquer nulidade, tendo entendido que "quanto aos factos provados o tribunal recorrido fê-lo por referência aos factos que cada um dos intervenientes processuais alegou" (afirmação, aliás, que não é exata, pois nenhuma referência foi feita no sentido de que os factos elencados como alegados pelas partes tivessem sido, todos e cada um, considerados provados); II. Essa decisão diverge frontalmente do decidido no recente e douto acórdão de 20/12/2017, proferido pela Relação de Lisboa (Jorge Leal), no domínio da mesma legislação, e consultável em www.dgsi.pt, que, relativamente a essa mesma questão fundamental de direito, decidiu que " Na sentença deverão discriminar-se quais os factos que se consideram provados e quais os que não se provaram, de acordo com aquilo que foi alegado pelas partes e o que resultou da prova produzida (n.°s 3 e 4 do artu 607.°, art° 5.° n.° 2 do CPC).'\ e que "A omissão de tal fundamentação da decisão implica a nulidade da sentença (ai. b) do n." 1 do art.° 615." do CPC)", sendo que a deficiência dessa fundamentação, não suprível na 2." instância, acarretando a anulação da decisão (alínea c) do n.° 2 do art.° 662.° do CPC)"; III.

    Trata-se de uma questão de indiscutível relevância jurídica, cujo esclarecimento se torna necessário para melhor aplicação do direito, justificando-se por isso a pronúncia desse Colendo Tribunal, o que possibilita o presente recurso de revista excecional, nos termos do n.º 1 do art. 14º do CIR-; IV. Para além disso, o douto acórdão recorrido decidiu que não era aplicável ao presente a autoridade do caso julgado da decisão, transitada em julgado, proferida anteriormente pelo Tribunal da Relação do Porto no apenso K do presente processo (processo n° 1168/12.9TBOAZ-K). que é constituído por uma ação de resolução da apreensão de bens para a massa insolvente, que veio a ser julgada definitivamente procedente por aquela Relação, na qual havia sido declarado que a alienação impugnada não padecera dos vícios invocados pelo administrador judicial, ou de quaisquer outros, designadamente de visar subtrair os bens aos credores e prejudicá-los ou que os administradores (entre os quais o ora recorrente) tivessem agido de má-fé; V. Ao invés, a sentença aqui em causa considerou, relativamente á mesma situação (que constituía pressuposto necessário para a decisão a sentenciar em ambas as ações), que "a insolvente e os seus administradores (nomeadamente o ora recorrente), dissiparam/alienaram o seu património, transmitindo todos os ativos da empresa para, num primeiro momento, duas sociedades, esvaziando a sua capacidade produtiva e mantendo, apenas, o passivo", VI. Ora, o douto acórdão recorrido recusou a aplicação da autoridade do caso julgado da primeira ação, quanto àquelas questões preliminares ali decididas. que constituem pressupostos comuns às decisões de ambas as ações (nomeadamente se a transferência dos bens visou prejudicar os credores da insolvente e se o recorrente agiu com má-fé), por considerar que se trata apenas de factos que ficaram provados na primeira ação, e por isso não estarão cobertos pela autoridade do caso julgado, que se não aplica aos "factos":.

    VII. No entanto, ao qualificar desse modo como meros "factos" as questões prévias que o Tribunal teve necessariamente que apreciar e decidir para poder tomar a decisão contida na parte dispositiva da sentença (nomeadamente se a transmissão dos bens em causa e a sua consequente retirada do património da insolvente foi realizada com o intuito de prejudicar os seus credores e se o recorrente e demais administradores agiram com má- fé), por constituírem pressupostos necessários da decisão aí tomada, ou seja, premissas do silogismo judiciário que constitui a parte dispositiva da sentença proferida nessa ação- e recusar assim que tais decisões estejam cobertas pela autoridade do caso julgado, contraria frontalmente as posições doutrinárias e jurisprudenciais desta matéria, designadamente a decisão proferida no douto acórdão do STJ de 07/05/2015. proferido no processo n" 15698/04.2YYlsb- C.L1.S2 (Grania da Fonseca), sobre a mesma questão fundamental de direito; VIII. Com efeito, decidiu esse douto aresto, em frontal divergência com o douto acórdão recorrido, que: "A excepção dilatória do caso julgado visa evitar que o tribunal, duplicando as decisões sobre idêntico objecto processual, contrarie ou reafirme o anteriormente decidido ao passo que a autoridade do caso julgado tem antes o efeito positivo de impor a primeira decisão à segunda decisão de mérito ", "Deve-se entender que os limites objectivos do caso julgado integram as questões preliminares que constituem antecedente lógico indispensável à parte dispositiva da sentença (desde que se verifiquem os requisitos do caso julgado material), abrangendo, pois, todas as excepções ai suscitadas por imperativo legal e conexas com o direito a que se refere a pretensão do autor, solução que permite evitar a incoerência dos julgamentos, respeita os princípios da justiça e da estabilidade das relações jurídicas, propicia a economia processual e corresponde ao alcance do caso julgado contido no art. 621." do NCPC (2013); IX.

    Assim, decidiu-se aí que, a decisão do Tribunal quanto às questões preliminares que tem necessariamente que apreciar e decidir para poder emitir depois, na parte dispositiva da sentença, a pronúncia dispositiva sobre a questão fundamental que lhe é submetida na primeira ação, está abrangida pelo caso julgado da sentença nela proferida, e por isso, está também abrangida pela autoridade desse caso julgado, o que forçosamente implica que deva ser respeitada e tida em conta na segunda ação, em que tais questões são também pressupostos necessários da decisão que o Tribunal aí tem que proferir sobre a nova questão que lhe é posta, e evitar, além do mais, a possibilidade de incoerência dos julgamentos.

    X.

    Daí ser evidente que o acima referido e douto acórdão do STJ de 07/05/2015 se encontra em frontal contradição com o douto acórdão recorrido, quanto a essa mesma questão fundamental de direito, embora este denomine de "factos" as ditas questões prévias de que Tribunal conheceu, e que constituíam pressupostos necessários da decisão que veio a tomar na parte dispositiva da sentença.

    XI.

    Trata-se também de uma questão de indiscutível relevância jurídica, cujo esclarecimento se torna igualmente necessário para melhor aplicação do direito, justificando-se por isso a pronúncia desse Colendo Tribunal - o que possibilita, também por isso, o presente recurso de revista excecional, nos termos do n.º 1 do art. 14 do CIRE.

    Por seu turno, o recorrente FF finaliza as suas alegações como segue: 1. O douto acórdão recorrido decidiu que o procedimento observado na sentença da 1ª instância, não tendo discriminado nem elencado os factos que tenha considerado provados, tendo-os, ao invés, ordenado apenas como "factos alegados" pelas partes (ao contrário do que fizera relativamente aos que considerara "não provados") não constituiria qualquer nulidade, tendo entendido que "quanto aos factos provados o tribunal recorrido fê-lo por referência aos factos que cada um dos intervenientes processuais alegou" (afirmação, aliás, que não é exata, pois nenhuma referência foi feita no sentido de que os factos elencados como alegados pelas partes tivessem sido, todos e cada um, considerados provados); 2. Essa decisão diverge...

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