Acórdão nº 0829/18.3BEAVR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelANA PAULA PORTELA
Data da Resolução11 de Setembro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

I. Relatório 1. A………… LDA recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, do acórdão do TCA Norte, de 1 de Março de 2019, que revogou a sentença proferida pelo TAF de Aveiro e julgou improcedente a AÇÃO DE CONTENCIOSO PRÉ CONTRATUAL por si intentada contra o MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CIÊNCIA, onde pedia: - A anulação do ato de adjudicação de 21 de Maio de 2018; - A condenação do réu a excluir as propostas apresentadas pela adjudicatária B…………, Lda, e pelas concorrentes C………… e D………… e a consequente adjudicação à autora; e em cumulação - Caso o contrato esteja integralmente executado, a anulação do contrato com base em invalidade derivada e a condenação do réu a pagar à autora uma indemnização pelos danos causados pela não celebração do contrato no valor global de €100.240,00.

  1. Para tanto conclui as suas alegações da seguinte forma: “1ª – Nos termos do n.º 1 do artigo 150º do CPTA, existem dois requisitos alternativos que justificam a admissão do recurso, questão que pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental ou, necessidade clara de admissão do recurso jurisdicional para uma melhor aplicação do direito, sendo que no caso em apreço verificam-se ambos os pressupostos.

    2ª – Nos autos em apreço, não existem quaisquer dúvidas de que se verificam os dois pressupostos para a admissão da presente revista excecional.

    Quanto ao primeiro pressuposto, 3ª – Entende-se que a revista deve igualmente ser admitida sempre que «conjugue múltiplas e complexas «quaestiones juris» relacionadas com a contratação pública – mais particularmente, conexas com várias causas de exclusão de propostas e com diversos problemas acerca da submissão de documentos à plataforma electrónica – por se tratar de assuntos juridicamente relevantes e repetíveis em inúmeros dissídios.» 4ª – No caso, são várias as questões complexas suscitadas, a saber, a assinatura dos documentos da proposta com base num certificado digital de autenticação, a apresentação do Anexo I em detrimento do DEUCP (exigível nos termos do n.º 6 do artigo 57º do CCP), a apresentação de documentos redigidos nos seus elementos essenciais em idioma estrangeiro (sendo que o programa de concurso não admitiu a possibilidade de serem apresentados documentos em idioma estrangeiro) e o incumprimento do ónus de formular conclusões (decorrente da reprodução quase integral das alegações).

    Assim, 5ª – Deve ser admitida a revista «pelo interesse geral e susceptibilidade de vir a colocar-se no futuro e relativamente à qual este STA não teve ainda oportunidade de se pronunciar.» 6ª - No caso em concreto, está em causa a apresentação de uma proposta na plataforma eletrónica da Acingov por parte de um operador económico e em que os documentos foram assinados previamente ao seu carregamento com um certificado digital de autenticação. Discute-se, assim, se os documentos de uma proposta assinados nestes termos e em que no momento da submissão da proposta na plataforma foi utilizado um certificado digital qualificado assegura nos termos da Lei 96/2015, de 17 de agosto, quer a assinatura individualizada dos documentos, quer a exigência da utilização aquando da assinatura e aquando da submissão uma assinatura eletrónica qualificada.

    7ª – Conforme se decidiu no acórdão nº 09080/12, de 13 de setembro de 2012 do Tribunal Central Administrativo Sul «tendo a ora recorrente apresentado proposta sem que, aquando da assinatura e submissão, tenha utilizado uma assinatura electrónica qualificada, mas um certificado de autenticação emitido pela plataforma electrónica, ocorre fundamento para a exclusão da proposta.» (realces e sublinhados nossos).

    8ª – Trata-se de uma matéria com elevado potencial de repetição no futuro e que, não obstante já ter havido pronúncia por parte do TCA SUL, ainda não foi analisada e discutida pelo Supremo Tribunal Administrativo.

    Para além do mais, 9ª – Justifica-se a admissão da revista quando «Trata-se de uma questão nova que surge com a nova redação do art. 59º do CPTA. Foi decidida de modo diverso pelas instâncias e é previsível que venha a colocar-se no futuro. É certo que esta formação admitiu uma revista relativa a idêntica questão, mas a mesma ainda não foi decidida (recurso 2157/17.2BELSB).

    Julgamos assim que a presente revista deve ser admitida, pelo interesse geral e susceptibilidade de vir a colocar-se no futuro e relativamente à qual este STA não teve ainda oportunidade de se pronunciar.15» 10ª – Verifica-se também no presente recurso uma questão relevante e nova e que ainda não foi decidida pelos tribunais superiores, ou seja, o DEUCP, o qual era exigível em face do artigo 57º n.º 6 do CCP e da legislação comunitária, e não foi exigido aos concorrentes pelo programa de concurso, estando assim em discussão saber se a apresentação do Anexo I ao invés do DEUCP determina a exclusão da proposta ou se deverá ser tomada uma outra decisão menos gravosa por parte do Júri do Procedimento (pela via da sanação ou pela via do artigo 72º, n.º 3 do CCP).

    11ª – Também se justifica a admissão da revista sobre este tema em virtude de nele se congregar várias legislações (nacionais e comunitárias), designadamente, o Código dos Contratos Públicos, a Diretiva 2014/24/UE e o Regulamento de Execução 2016/7, de 5 de janeiro, sendo mais um indício da relevância deste tema para o Direito.

    12ª – Outra questão que se embrenha no presente recurso e cuja complexidade demanda a atuação do STA, designadamente, saber se deve uma proposta ser excluída num procedimento em que não foi prevista a hipótese de serem apresentados documentos redigidos em idioma estrangeiro, e em que foi apresentado um documento obrigatório, estando os seus elementos essenciais redigidos em idioma inglês.

    13ª – Também se revela de especial relevância para o Direito e para a Jurisprudência saber quais são os momentos em que incumbe aos concorrentes demonstrar que o produto proposto cumpre com os requisitos exigidos no procedimento (não obstante as revelarem diferenças do ponto de vista técnico em face do exigido) e em que moldes o devem fazer, e que se não o fizerem na proposta, esta deve ser excluída.

    Quanto ao segundo pressuposto, 14ª – O STA entendeu que «A admissão para uma melhor aplicação do direito tem tido lugar relativamente a matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória, impondo-se a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa como condição para dissipar dúvidas sobre o quadro legal que regula certa situação, vendo-se a clara necessidade de uma melhor aplicação do direito com o significado de boa administração da justiça em sentido amplo e objectivo, isto é, que o recurso não visa primariamente a correção de erros judiciários.» 15ª – No caso sub judice verificou-se uma manifesta divergência quer no sentido das próprias decisões, quer na própria fundamentação das decisões e, ainda, quanto ao acórdão recorrido, este violou diretamente jurisprudência proferida pelos tribunais superiores sobre situações semelhantes.

    Em primeiro lugar, 16ª – A sentença proferida pela Mma. Juiz do TAF de Aveiro condenou as partes a acordarem numa quantia indemnizatória (nos termos do artigo 45º do CPTA) por já não ser possível a realização de uma nova avaliação das propostas, ao passo que o TCAN decidiu que em virtude não ter sido demonstrado cada um dos incumprimentos, não havia ficado demonstrada a existência de vícios no ato impugnado e, como tal, não poderia ser o Recorrido condenado no pagamento de uma indemnização.

    17ª – Em segundo lugar, as decisões proferidas pelos tribunais recorridos divergiram na fundamentação quanto a vários dos temas suscitados.

    18ª – Relativamente à demonstração do cumprimento dos requisitos de modo equivalente (artigo 49º do CCP), na douta sentença entendeu-se que os concorrentes haviam assegurado a referida demonstração, ao passo que no acórdão recorrido foi decidido que o TAF de Aveiro não havia admitido a existência de diferenças e a Recorrente não havia demonstrado no recurso cada um dos concretos incumprimentos.

    19ª – No que diz respeito ao DEUCP, a Mma. Juiz do TAF de Aveiro entendeu que a apresentação do Anexo I ao invés do DEUCP não gerava a exclusão da proposta, sendo possível sempre o seu suprimento nos termos do artigo 72º, n.º 3 do CCP, e já no acórdão recorrido, não obstante ter concluído no sentido da não exclusão, entendeu que os concorrentes haviam cumprido com as exigências do procedimento, e como tal, seria contrário aos princípios da igualdade e da concorrência a exclusão por falta de apresentação do DEUCP.

    20ª – Por fim, a admissão da revista justifica-se para uma melhor aplicação do direito, na medida em que o acórdão recorrido violou, por um lado, a jurisprudência firmada acerca da reprodução nas conclusões do corpo das alegações (designadamente, acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra, de 14 de Março de 2017, proc. 6322/11.8TBLRA-A.C2, da Relação de Lisboa, a 21/02/2013, proc. 14217/02.0TDLSB-AM.L1-9, do Supremo Tribunal de Justiça, de 19/09/2017, proc. n.º 3419/14.6T9OER-A.L1.S1), sendo por isso extremamente importante saber se o tribunal a quo poderia ter-se abstido de pronunciar sobre a falta de iniciativa dos concorrentes na demonstração de que os respetivos produtos cumpriam, de modo equivalente, os requisitos exigidos (artigo 49º do CCP), com fundamento na ausência de concretização de cada um dos concretos incumprimentos e que já haviam sido reconhecidos na douta sentença.

    21ª – E, por outro lado, violou o acórdão n.º 08433/12, de 23 de fevereiro do Tribunal Central Administrativo Sul, o qual decidiu que deve ser excluída a proposta que propondo um produto com especificações diferentes das previstas nas peças do procedimento, não efetuou a demonstração exigida (cumprimento de modo equivalente), nos termos do artigo 49º do CCP.

    22ª – Em face das decisões recorridas, entende a Recorrente que a admissão da revista é, de facto, necessária...

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