Acórdão nº 00145/04.8BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 04 de Julho de 2019
Magistrado Responsável | Ana Patroc |
Data da Resolução | 04 de Julho de 2019 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório RG – G…, S.A., N.I.F. 50xxx67, com sede na Rua V…, em Vila Real, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, proferida em 27/11/2007, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IRC n.º 831002067, relativa ao exercício de 2000, no montante de €212.995,95.
O tribunal recorrido julgou a impugnação procedente quanto à parte da liquidação que se mostra influenciada pela tributação autónoma, no montante de €49.554,28, tendo, em consequência, anulado a liquidação nessa parte.
*A Recorrente não se conforma com a parte do julgamento que manteve o restante da liquidação e terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “
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A ultrapassagem do prazo para a conclusão do procedimento de inspecção tributária fixado no art.° 36.º, n.º 2, do RCPIT acarreta a caducidade do próprio procedimento e a consequente invalidade dos actos que se fundem nesse procedimento caducado.
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A douta sentença, ao julgar improcedente este fundamento da impugnação, interpreta e aplica erradamente o preceituado no indicado art.° 36.°, n.º 2, do RCPIT.
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A ser interpretada a norma do art.º 36.º, n.º 2, do RCPIT com o sentido fixado na douta sentença, então tal norma terá de ter-se por inconstitucional, por violação dos princípios da proporcionalidade, da igualdade, da protecção da confiança e do justo equilíbrio entre a prossecução do interesse público e a protecção dos direitos e dos interesses dos particulares.
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A douta sentença ao não julgar procedente o alegado vício de procedimento relativo à intervenção do perito independente interpreta e aplica erradamente o disposto nos art.ºs 92.º, n.º 1, e 91.º[ A Recorrente escreveu nas suas conclusões das alegações de recurso “92.º” certamente por lapso (detectável da restante declaração).], n.º 7, da LGT.
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A considerar-se que a douta sentença interpreta e aplica adequadamente as normas constantes dos indicados preceitos legais, então tais normas têm de ter-se como inconstitucionais por violação dos princípios da proporcionalidade, da justiça e da igualdade.
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A douta sentença incorre em erro de julgamento ao não julgar procedente o alegado vício de violação da lei, por não se verificarem os pressupostos legalmente admissíveis para o recurso a métodos indirectos.
Nestes termos e nos demais de direito, deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida e julgando-se procedente a impugnação, como é de JUSTIÇA.”*Não houve contra-alegações.
*O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de este dever declarar-se incompetente, em razão da hierarquia.
*Por acórdão proferido em 30/04/2009, este TCA Norte julgou-se incompetente e competente em razão da hierarquia para conhecer do recurso a Secção de Contencioso Tributário do STA.
O STA, por acórdão prolatado em 23/09/2009, julgou-se hierarquicamente incompetente para conhecer o presente recurso, por as alegações do recorrente referirem factos que não constam do probatório e aí se retirarem relevantes consequências jurídicas, concluindo existir matéria de facto a apreciar no recurso.
O parecer emitido pelo Ministério Público, prevenindo a hipótese de não procedência desta questão prévia, como efectivamente veio a verificar-se, tomou posição acerca das questões colocadas no recurso, referindo que a sentença recorrida não é passível de censura, porquanto se mostra exaustivamente fundamentada, de facto e de direito, à qual aderiu sem reserva.
*Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento na interpretação do artigo 36.º, n.º 2 do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT), quanto à questão da caducidade do procedimento de inspecção tributária e da consequente invalidade dos actos que se fundam nesse procedimento; na interpretação dos artigos 91.º, n.º 7, e 92.º, n.º 1, ambos da Lei Geral Tributária (LGT), quanto à questão da preterição de formalidades legais no procedimento de revisão; e na apreciação do vício de violação da lei, quanto à questão da inexistência dos pressupostos de recurso a métodos indirectos.
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Fundamentação 1. Matéria de facto Da sentença prolatada em primeira instância, consta decisão da matéria de facto com o seguinte teor: «3.1 Matéria de facto provada, não provada e respectiva motivação Com relevância para para a decisão da causa, considero provados os seguintes factos: a) Em 22/1/2003 a impugnante foi notificada da Ordem de Serviço n.º 40260 emitida pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Vila Real, com vista à realização de uma acção inspectiva incidindo sobre o IVA e o IRC do ano de 2000 - cfr.
- fls. 187 dos autos.
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O Relatório de Inspecção Tributária foi elaborado em 26/5/2005, tendo sido proferido despacho pelo Director de Finanças, nos termos do artigo 62º do RCPIT, em 24/07/2003 - cfr. fls. 33 dos autos.
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A impugnante foi notificada do Relatório de Inspecção Tributária e da fixação da matéria tributável, por ofício de 29/7/2003 - cfr. fls. 32 dos autos.
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Na sequência da acção inspectiva realizada, foram efectuadas correcções à matéria colectável da impugnante relativamente ao ano de 2000, que através do recurso a métodos indirectos, quer através de correcções de natureza meramente aritmética - cfr.
- fls. 45 dos autos.
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A fundamentação das correcções efectuadas consta do respectivo Relatório de Inspecção Tributária, junto a fls. 33 a 78 dos presentes autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, e do qual consta designadamente o seguinte: "(…) CAPÍTULO III Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria colectável (…) 1.10 No dia 31/12/00, através dos números de ordem internos 130052, 130054 e 130055, efectuou diversos movimentos a débito da conta de devedores e credores diversos (Conta 26805 — JMSMA) e a crédito das contas de depósitos à ordem (Contas 1201 — BESCL, 1203 — BNU, 1205 — CGD, 1212 —BTA, 1214 — CCAM, 1216 — CPP, 1217 —BCP e 1218 — BPI), tendo como documento de suporte, notas de lançamento internas a seguir discriminadas: (…) Após solicitação ao contribuinte ... este justificou aqueles movimentos, por escrito (anexo IV), da seguinte forma: ...
Através da análise aos movimentos efectuados e da justificação dada pelo contribuinte, concluímos que estamos perante pagamentos através do banco sem a justificação dos movimentos reais respectivos, originando que o seu enquadramento fiscal se efectue no âmbito das despesas confidenciais ou indocumentadas sujeitas a tributação autónoma nos termos do artigo 4º do DL n.º 192/90, de 9 de Junho, conforme a seguir se determina: Despesas confidenciais ou indocumentadas — 149.993,87 € Valor da tributação autónoma = 149.993,87€ * 32% = 47.998,04 € (…) CAPÍTULO IV Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos Com base nos registos contabilísticos e documentação de apoio do exercício de 2000, verificaram-se as seguintes irregularidades: 1- No dia 31/12/00, através dos números de ordem internos 130052, 130054 e 130055, efectuou diversos movimentos a débito das contas de depósitos à ordem (Contas 1201 — BESCL, 1203 — BNU, 1205 — CGD, 1212 — BTA, 1216 — CPP e 1217 — BCP) a crédito das contas de devedores e Credores diversos (Conta 26805 — JMSMA) tendo como documento de suporte documental, notas de lançamento internas: (...) Após solicitação ao contribuinte através de notificação ... este justificou aqueles movimentos, por escrito... da seguinte forma: ...
Através da análise aos movimentos efectuados e da justificação dada pelo contribuinte, concluímos que estamos perante entradas de valores nas contas bancárias da empresa sem a justificação dos movimentos reais respectivos, originando que tais operações constituam um indício de omissão de proveitos.
2- Através da análise das facturas de suporte às vendas intracomunitárias e da documentação anexa, designadamente guias de transporte, declarações de expedição (CMR), conhecimento de embarque (B/L) e guias do transportador, verificaram-se as seguintes situações: 2.1 - Divergência entre os montantes da facturas n°s 2137 e 2139 e os valores que constam da contabilidade, conforme a seguir se pode verificar: (…) 2.2 - Divergência entre a guia de transporte emitida pela RG – G… SA e a Declaração de Expedição Internacional (CMR), ao nível do número de paletes e/ou peso bruto, referentes às facturas n°s 103, 237, 238, 239, 874, 1869 e 2844, conforme a seguir se descreve por factura.
(...) 2.3 Divergência entre a guia de transporte emitida pela RG – G… SA e a guia emitida pelo transportador, ao nível do número de paletes e/ou peso bruto, referentes às facturas n°s 396, 781, 1909, 2066, 2250 e 2251: (...) 2.4 - Divergências entre as quantidades mencionadas nas facturas a seguir indicadas e nas guias de transporte respectivas: (...) 2.5 - Nos CMR's anexos às facturas n°s 1947 e 2678, verifica-se que os expedidores são outras empresas: (…) 2.6 - Relativamente às facturas n°s 26, 396, 497, 781, 841, 919, 933, 1049, 1257, 1259, 1362, 1466, 1586, 1782, 1814, 1934, 2202, 2227, 2250, 2251 e 2356, não nos foram exibidas as declarações de expedição (CMR) ou conhecimentos de embarque (B/L).
2.7 - Conforme referido no ponto 1.5 do capítulo III, o valor constante das facturas n°s 161, 1587 e 1974 e que foi registado na contabilidade, é manifestamente diminuto face às mercadorias transacionadas, resultando uma omissão de vendas no valor de 7.840,75 €.
2.8- Face ao descrito nos pontos anteriores...
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