Acórdão nº 13638/17.8T8LRS.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 11 de Julho de 2019
Magistrado Responsável | PEDRO MARTINS |
Data da Resolução | 11 de Julho de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados: N e S intentaram em 29/12/2017 uma acção contra S-SA, pedindo que esta fosse condenada a pagar-lhes 13.300€, acrescidos de IVA à taxa legal, bem como juros de mora à taxa comercial vencidos no valor de 8049,24€ e vincendos até ao seu integral e efectivo pagamento.
Alegaram para tanto, em síntese, que celebraram com a ré um contrato de prestação de serviços; realizaram os trabalhos acordados, com o valor de 29.500€ + 2800€ = 32.300€ (a que acresce iva); a ré só pagou 19.000€; este valor devia ter sido pago desde a data da emissão da licença de utilização, 30/11/2009.
A ré excepcionou o pagamento do crédito e a prescrição presuntiva do art. 317/-c do CC, pois que diz, na parte que importa: o crédito em causa, para além de se encontrar totalmente pago, há muito havia prescrito; com efeito, o dito crédito resulta de serviços prestados pelos autores, logo no exercício de profissão liberal, crédito que, nos termos do art. 317/-c do CC, prescreve no prazo de 2 anos; estando vencido desde 30/11/2009 até à citação da ré para a presente acção passaram 8 anos e cerca de um mês, logo muito mais do que os 2 anos necessários para a prescrição operar; e depois impugna, dizendo que todos os serviços contratados pela ré aos autores e efectivamente prestados por estes, foram pagos no momento próprio nada lhe sendo devido; parte dos serviços [cujo pagamento é] pedido pelos autores ainda não se encontravam concluídos em 2006 (licença de utilização de 2009) e por isso integraram um outro projecto solicitado à e elaborado pela T-Lda., por indicação dos autores, projecto esse já pago pela ré [como resultaria de uma confissão consubstanciada num artigo de uma petição inicial de uma acção posta pela T-Lda contra a ré]; os juros, por tudo o que acima se disse, não podem ser calculados à taxa comercial e, a serem devidos, tal apenas aconteceria a partir da citação para a presente acção; conclui pela procedência da excepção de prescrição ou pela improcedência da acção, em qualquer dos casos com a consequente absolvição da ré do pedido.
No despacho saneador foi julgada improcedente a excepção peremptória de prescrição presuntiva e procedente a acção, por provada, condenando-se a ré a pagar aos autores 13.300€, acrescido de IVA à taxa de legal, a título de capital, acrescidos de juros de mora desde 31/11/2009, à taxa de juro supletiva comercial.
A ré recorre desta sentença – para que seja revogada e substituída por outra em que se absolva a ré do pedido – terminando as suas alegações com conclusões (que serão transcritas à frente) em que argúi a nulidade da sentença, outras em que defende a aplicabilidade ao caso da prescrição presuntiva do art. 317/-c do CC e outras em que defende que não há incongruência da sua impugnação com a invocação da prescrição presuntiva; para alem delas, o recurso da ré ainda tem estas conclusões: H) Na sentença recorrida refere-se que “…em face da apreciação judicial efectuada não deverá o tribunal ser colocado na situação de contradizer uma decisão anteriormente tomada” com o que, naturalmente, a ré concorda e, por isso, entende que, também nos presentes autos, tinha que ser absolvida.
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Acontece, contudo, que se usa de forma incorrecta a figura jurídica da autoridade do caso julgado, porquanto, tanto esta, como a própria figura do caso julgado versam, exclusivamente, sobre decisão da sentença propriamente dita e nunca sobre a decisão da matéria de facto.
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O acórdão do STJ de 02/02/2010, proc. 690/09.9, afirma que – “(…) a problemática do respeito pelo caso julgado coloca-se sobretudo ao nível da decisão, da sentença propriamente dita, e, quando muito, dos fundamentos que a determinaram, quando acoplados àquela. Os fundamentos de facto, nunca por nunca, formam, por si só, caso julgado, de molde a poderem impor-se extraprocessualmente (…).
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Pelo que, andou mal o tribunal recorrido ao optar pela verificação da existência de autoridade do caso julgado suportada na matéria de facto assente no proc. 837/13.0TCLRS, pois, conforme resulta da doutrina e da jurisprudência dominantes, os fundamentos de facto de uma sentença anterior não formam, só por si, caso julgado.
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Significa isto que, não pode ser ilidida nos presentes autos a presunção de pagamento de que o ré beneficia tendo em consideração apenas um facto assente noutro processo judicial como é feito na sentença recorrida.
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Ao invés, tendo em consideração a decisão proferida no processo 837/13.0TCLRS e o princípio da autoridade do caso julgado, não poderia a ré ter deixado de ser absolvida do pedido nos presentes autos como já havia sido naquele processo.
[…] T) A Srª juiz a quo entendeu valorar a confissão que diz existir como extrajudicial, considerando, de seguida, que tal confissão tem força probatória plena por constar de sentença, contudo, não lhe assiste razão.
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Na verdade, consta da sentença recorrida que “a comprovação da falta de pagamento decorre do depoimento de parte do legal representante da ré (cfr. a este propósito a transcrição do depoimento junto aos autos, mais concretamente fls. 85v).” V) Significa isto que, tal confissão não consta da sentença proferida no proc. 837/13.0TCLRS mas, isso sim, da transcrição do depoimento do legal representante da ré aí prestado.
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Esta transcrição constitui documento particular elaborado pelos autores, logo, sem força probatória plena.
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Não existindo confissão de não pagamento nos presentes autos ou confissão que possa ser valorada com força probatória plena nos mesmos, não pode concluir-se que os autores ilidiram a presunção de pagamento e que, consequentemente, a quantia reclamada nos autos não se encontra paga.
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Não se tendo provado que a quantia reclamada nos autos não se encontra paga tem que prevalecer a excepção da prescrição presuntiva invocada e, consequentemente, a ré absolvida do pedido.
Os autores contra-alegaram, defendendo a improcedência do recurso e chamando a atenção para o facto de não ter sido impugnada a decisão da matéria de facto.
* Questões que importa decidir: a nulidade do saneador sentença; se a excepção da prescrição presuntiva devia ter sido considerada procedente e se o pedido de condenação da ré devia ter sido considerado improcedente.
* Decidindo: O artigo 640/1 do CPC, com a epígrafe ‘Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto” dispõe que “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
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Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.” A jurisprudência está actualmente estabilizada quanto ao entendimento de que pelo menos “os concretos pontos de factos que [o recorrente] considera incorrectamente julgados” têm de constar das conclusões de recurso, já que o art. 639/1 do CPC diz que “o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.” Lidas as conclusões do recurso, que se transcreveram na íntegra para o efeito, vê-se que delas não consta a indicação de nenhum concreto ponto de facto que a ré considere incorrectamente julgado, quer por ter sido dado como provado quando não o está, quer por não ter sido dado como provado apesar de o estar.
Assim sendo, os factos provados que interessam à decisão das questões a decidir, são os, e apenas os, seguintes: 1. Os autores são arquitectos de profissão.
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A ré é uma sociedade que se dedica à indústria da construção civil e locação de espaços.
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A ré teve como legal representante o Eng. J, o qual era igualmente representante legal da D-Lda.
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No início de 2002, o Eng. J – na qualidade de legal representante da D-Lda e da ré – contactou os autores no sentido de estes procederem à elaboração de um estudo prévio e de um processo de loteamento relativamente a um terreno da ré, com a área de 16.120 m2, sito no C, Estrada da P, Km 0, freguesia da P, concelho de O, no qual estavam implantados dois pavilhões industriais.
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Após a elaboração do estudo prévio e a sua aprovação, seria da responsabilidade dos autores a elaboração dos seguintes projectos de execução das obras de urbanização: a) de arruamentos; b) de abastecimento de água; c) de abastecimento de gás; d) de saneamento básico e drenagem de águas pluviais; e) de electrificação dos lotes e iluminação pública; f) de ligação à rede...
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