Acórdão nº 023/18.3BEBJA 0821/18 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução26 de Junho de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. A…………, LDA, com os demais sinais dos autos, interpôs recurso de revista excepcional do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, exarado em 19/07/2018, que negou provimento ao recurso jurisdicional que interpusera da sentença de improcedência da reclamação judicial que deduzira contra o acto do órgão de execução fiscal que determinou a adjudicação do imóvel vendido na execução fiscal nº 0320-2010/1002230.9.

1.1. Apresentou alegações que rematou com o seguinte quadro conclusivo: 1. O recurso de revista previsto no artigo 150º do CPTA é admissível no âmbito do contencioso tributário (vide, Acórdão desse STA de 16/05/2012, proferido no Recurso nº 0357/12).

  1. Para efeitos de admissão do recurso, a importância fundamental da questão que constitui o seu objeto resulta quer da sua relevância jurídica quer social.

  2. E a necessidade de melhor aplicação do direito deriva da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros, em termos de garantia de uniformização do direito (vide, entre outros, o Acórdão desse STA de 30-05-2007, proferido no Recurso nº 0285/07).

  3. Tal questão radica em aferir, se tendo sido apresentada reclamação nos termos do artigo 276º do CPPT, com subida imediata, contra ato que determina a venda de bem penhorado, podem continuar a ser praticados no processo de execução fiscal atos decorrentes do despacho reclamado, enquanto aquela se encontrar pendente.

  4. Tais como a aceitação de propostas, o envio ao proponente de “Documento Único de Cobrança” e respetiva “Declaração de Não Inibição de Aquisição de Bem(s) em Processo de Execução Fiscal”, a emissão de guias para pagamento de Imposto Municipal sobre as Transações Onerosas de Imóveis (IMT) e Imposto de Selo (IS), recebimento do preço da aquisição e recebimento dos respetivos impostos liquidados.

  5. Ora, por um lado, a solução jurídica do caso não resulta evidente, pelo contrário, depende de operações lógicas e jurídicas que se afiguram complexas. E, 7. Por outro lado, resulta claro que a questão em causa ultrapassa os limites do caso concreto, sendo suscetível de se repetir nos seus traços teóricos num número indeterminado de casos futuros, que serão todos aqueles em que apresentada reclamação nos termos do artigo 276º do CPPT, contra o ato que designa a venda de bem penhorado, continuem a ser praticados no processo de execução fiscal atos decorrentes do ato reclamado, enquanto aquela se encontrar pendente.

  6. Assim, nos seus traços teóricos, a questão em causa reveste importância fundamental, resultando a admissão do presente recurso claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, devendo em consequência o presente recurso ser admitido.

  7. O processo de execução fiscal tem natureza judicial, sendo garantido aos interessados o direito de reclamação dos atos materialmente administrativos que atinjam os seus direitos ou interesses legalmente protegidos (artigo 103º da LGT).

  8. Uma vez apresentada a reclamação, vai esta prosseguir os seus trâmites no tribunal tributário, para onde é expedido o processo de execução fiscal em conjunto com aquela, para que o juiz possa apreciar o ato atacado.

  9. Razão pela qual, o processo de execução sai da esfera do órgão de execução fiscal ficando este impedido de praticar quaisquer atos naquele, mormente atos de execução do ato colocado em causa na reclamação (neste sentido, vide, entre outros, os Acórdãos desse STA de 5/08/2015, proferido no Recurso nº 0990/15 e de 25/03/2015, tirado no Recurso nº 0249/15).

  10. Na data designada para a venda já havia sido apresentada a reclamação, razão pela qual se encontrava o órgão de execução fiscal impedido de praticar atos de execução do ato objeto daquela.

  11. De facto, as decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras entidades (artigo 205º da CRP).

  12. A partir do momento em que a reclamação apresentada contra o despacho em causa deu entrada, estava impedida a prática de qualquer ato daquele decorrente.

  13. Porquanto a legalidade do mesmo despacho iria ser apreciada pelo tribunal competente para o efeito.

  14. Razão pela qual, não deveria ter sido mantida a data da venda e a consideração das propostas apresentadas, nem praticados os atos posteriores decorrentes do despacho reclamado que consubstanciaram a venda, traduzidos no envio ao proponente de “Documento Único de Cobrança” e respetiva “Declaração de Não Inibição de Aquisição de Bem(s) em Processo de Execução Fiscal” e emissão das guias para pagamento de IMT e IS.

  15. Nem deveria o preço da aquisição e os respetivos impostos liquidados, terem sido recebidos.

  16. Mais, não deve prevalecer entendimento vertido no douto Acórdão ora recorrido, no sentido de que, tendo a reclamação sido julgada improcedente por Acórdão do TCA Sul, transitado em julgado, “(…) Não se vislumbra qualquer ilegalidade consequente que afete o despacho ora reclamado, pela razão de que o mesmo não foi praticado como acto consequente de qualquer acto que tenha sido declarado inválido”.

  17. Porquanto, “a lei não esclarece o que sucede se a administração tributária der seguimento à execução e estiver pendente a reclamação com subida imediata, mas parece seguro que os atos que ofendam o efeito de suspensão da decisão reclamada são ilegais e o reclamante pode contra eles deduzir nova reclamação” (transcrição do Acórdão do TCA SUL de 23/02/2017, tirado no Recurso nº 568/16.0BEALM).

  18. Reclamação que a ora Recorrente, quando de tais atos foi notificada, apresentou, reagindo contra o despacho na origem dos presentes autos que ordenou a adjudicação do bem, com base em atos ilegais anteriormente praticados.

  19. Ora, por todo o exposto, se impunha em face da apresentação da reclamação deduzida, tivesse sido dada sem efeito a data designada para a venda, bem como não tivessem sido tomadas em conta as licitações efetuadas, nem tão pouco praticados os atos de execução subsequentes.

  20. Pelo que, o despacho que determinou a adjudicação do bem em causa a quem efetuou a licitação mais elevada, na origem dos presentes autos, é ilegal, e deveria a reclamação ter procedido e ter sido concedido provimento ao recurso interposto.

  21. Assim, o douto Acórdão recorrido ao ter negado provimento ao recurso interposto, confirmando a decisão recorrida, preconizou uma errónea interpretação das disposições legais aplicáveis, não podendo em consequência, permanecer na ordem jurídica.

    1.2.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    1.3.

    O Exmo. Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer no sentido de que este recurso de revista devia ser admitido, tendo em conta que a questão colocada, sendo susceptível de se repetir num número indeterminado de casos futuros, foi decidida contra jurisprudência desta Secção do Supremo Tribunal Administrativo, sendo, por conseguinte, claramente necessária a sua admissão para uma melhor aplicação do direito.

    1.4.

    Por acórdão proferido em 13/03/2019 pelo colectivo de juízes conselheiros que integram a formação referida no nº 5 do art.º 150º do CPTA foi admitida a revista, na consideração que a questão nela colocada tem «relevância social de importância fundamental» e há «necessidade de uma resposta pelo órgão de cúpula da justiça tributária como condição para dissipar dúvidas e alcançar uma melhor aplicação do direito, por ser objectivamente útil a definição do efeito suspensivo atribuído à reclamação do acto que determina a venda do bem penhorado na execução. Até porque a posição sustentada no acórdão recorrido não estará de acordo com a jurisprudência deste Supremo Tribunal (…)».

    1.5.

    Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

  22. No acórdão recorrido constam como provados os seguintes factos 1. Em 02.03.2010, foi instaurado no serviço de finanças de Odemira o processo de execução fiscal nº 0302201001002309 contra “A………… Unipessoal, Lda”, para cobrança coerciva da quantia exequenda de € 270.201,73, por dívidas de IRC – cfr doc de fls 1 do pef apenso aos autos; 2. Àquele processo de execução fiscal foram apensados outros processos de execução fiscal, do que resultou o aumento da quantia exequenda em cobrança coerciva - cfr doc. de fls 3 e 55 do pef apenso aos autos; 3. Em 27.01.2011, no âmbito do processo de execução fiscal 0302201001002309 e apensos, a correr termos no serviço de finanças de Odemira, foi lavrado auto de penhora, para pagamento da quantia exequenda de € 3.053.992,68, do “Prédio rústico sito da Freguesia e Concelho de Alcochete, inscrito na matriz cadastral sob o artigo 26 da secção AR/AR11(Parte) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Alcochete sob o n.º 3123/20050118” - cfr doc. de fls 35 do pef apenso aos autos; 4. Através da AP. 3778 de 03.03.2010, sobre o prédio rústico situado em Herdade da ………, com área de 298,534 Hect., com um valor venal de € 4.500,00, inscrito na matriz cadastral da Freguesia e Concelho de Alcochete sob o artigo 26 da secção AR/AR11 (Parte), descrito na conservatória do registo predial sob o nº 3123/20050118, foi registada penhora a favor da Fazenda Nacional, efectuada no âmbito do processo de execução fiscal 0302200901026500, respeitante a uma quantia exequenda de € 543.315,13 - cfr doc. de fls 47 e 48 do pef apenso aos autos; 5. Através da AP. 4017 de 28.01.2011, sobre o prédio rústico situado em Herdade da ………, com área de 298,534 Hect., com um valor venal de € 4.500,00, inscrito na matriz cadastral da Freguesia e Concelho de...

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