Acórdão nº 369/19 de Tribunal Constitucional (Port, 19 de Junho de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução19 de Junho de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 369/2019

Processo n.º 114/19

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e recorridos o Ministério Público e outros, o primeiro vem interpor recurso de constitucionalidade, ao abrigo das alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), do acórdão daquele Tribunal de 27 de novembro de 2018 (a fls. 496 a 497), que indeferiu reclamação apresentada contra a decisão do mesmo Tribunal de 18 de setembro de 2018 (a fls. 464), que não admitiu, por considerá-lo extemporâneo, recurso de revista interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 17 de outubro de 2017 (a fls. 307 a 327).

2. Na sua reclamação para a conferência (a fls. 485 a 489) da decisão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de setembro de 2018, o recorrente invocou o seguinte:

«1 - O ora reclamante inconformado com a Decisão da primeira instância, que julgou não aprovadas as contas por si apresentadas, decidiu interpor Recurso de Apelação.

2 - O Tribunal da Relação de Coimbra negou provimento ao Recurso, confirmando a Decisão do Tribunal de 1.ª Instância, ainda que com fundamentos diferentes dos da 1.ª Instância.

3 - O ora reclamante entendeu, entende e expôs que o Tribunal da Relação de Coimbra não se pronunciou sobre questões que foram trazidas à colação pelo ora reclamante no seu recurso de apelação.

4 - E nessa sequência, deduziu reclamação a esse Acórdão datado de 17 de novembro de 2017, a qual veio a ser julgada improcedente por Acórdão de 06 de fevereiro de 2018.

5 - Notificado de tal Acórdão, o reclamante interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, indicando os motivos pelos quais, no seu entendimento, o mesmo deveria ser, primeiro, admitido e, posteriormente, julgado procedente.

6 - Ora, o reclamante foi agora surpreendido pela Decisão Singular de que se reclama, na qual é dito, em suma, que o reclamante interpôs recurso do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, proferido em 17 de outubro de 2017, apenas em 08 de março de 2018, e que, nessa data já se encontrava expirado o prazo para o efeito.

Ora,

7 - Tal entendimento do Ex.mo Senhor Juiz Relator parece assentar, basicamente, no fundamento de que o ora reclamante teria apresentado recurso do referido Acórdão no pressuposto de que a reclamação interromperia o prazo de interposição de recurso dessa mesma decisão.

8 - Ora sempre com o merecido respeito, não pode o reclamante aceitar tal entendimento. De facto,

9 - O nosso ordenamento jurídico estabelece que as decisões judiciais podem ser impugnadas mediante reclamação e / ou mediante recurso.

10 - Consistindo a reclamação num pedido de reapreciação de uma decisão dirigido ao Tribunal que proferiu essa decisão, com ou sem a invocação de novos elementos pelo reclamante.

11 - E consistindo o recurso, por seu turno, num pedido de reapreciação de uma decisão ainda não transitada dirigido a um tribunal de hierarquia superior, fundamentado na ilegalidade da decisão e visando revogá-la ou substitui-la por outra mais favorável ao recorrente.

12 - Deste modo, e tendo o Acórdão proferido em 17 de outubro de 2017 sido objeto de uma legítima e tempestiva reclamação por parte do ora reclamante, reclamação essa que foi objeto de apreciação, não tendo sido liminarmente rejeitada, não poderá este Tribunal, salvo melhor entendimento, afirmar que, na data da interposição do recurso tal Acórdão se encontra já transitado em julgado.

Por outro lado,

13 - Ao contrário do que é dito na Decisão Singular de que se reclama, o recurso em causa não foi interposto do Acórdão datado de 17 de outubro de 2017. Com efeito,

14 - Nas Alegações de recurso é dito pelo ora reclamante:

"O Recorrente, inconformado com a decisão da primeira instância, que não aprovou as suas contas prestadas no âmbito destes autos, interpôs Recurso de Apelação.

O Tribunal da Relação de Coimbra negou provimento ao Recurso, confirmando a decisão do Tribunal a quo, ainda que não pelos mesmos fundamentos, pelo que não se verifica a situação de dupla conforme.

Após ter sido notificado de tal acórdão, e por entender que o mesmo se encontrava inquinado de nulidade, o Recorrente arguiu essa mesma nulidade, em reclamação e requereu que, atento o disposto nos artigos 3.º, n.º 3 e 615.º do Código do Processo Civil, fosse declarada a nulidade do referido Acórdão, reclamação essa que foi julgada improcedente em 06.02.2018.

O Recorrente vem agora recorrer deste Acórdão de 06.02.2018, bem como do Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra datado de 17-10-2017 ."

15 - Verifica-se assim que o ora reclamante interpôs recurso do Acórdão datado de 06 de fevereiro de 2018, recurso esse que estendeu à anterior Decisão do Tribuna da Relação de Coimbra, por se verificar que esta última também era ainda suscetível de recurso.

16 - Falece assim, sem margem para dúvidas, o argumento da Decisão Singular de que se reclama de que o recurso interposto seria manifestamente extemporâneo.

17 - E tanto assim é que, em 14 de maio de 2018 o ora reclamante foi notificado do Despacho de admissão do recurso interposto, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo, nos termos do disposto nos artigos 672.º, n.º 1, b) e 675.º, n.º 1 e 676.º, todos do CPCivil, não tendo sequer sido equacionada qualquer situação de extemporaneidade do mesmo.

Mais,

18 - Nas contra-alegações apresentadas pelo Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Coimbra, o Ex.mo Senhor Procurador Geral Adjunto pugna pela inadmissibilidade do recurso, mas por entender que o mesmo poderá não ser admissível nos termos do artigo 14.º, n.º 1 do CIRE, e nunca por tal recurso ser, de algum modo, extemporâneo.

19 - Aliás, e no que tange à posição defendida pelo Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Coimbra sempre se diga que nas suas alegações de recurso o ora reclamante expõe, de forma justificada, os fundamentos pelos quais o recurso em causa é admissível.

20 - Verifica-se assim que o presente recurso foi interposto em tempo, e tendo objeto Acórdão recorrível e não transitado em julgado, pelo que o seu objeto deverá ser conhecido pelo Supremo Tribunal de Justiça.

21 - A Decisão Singular de que se reclama viola os princípios constitucionais e convencionais do direito a um processo equitativo, o princípio da legalidade, o princípio do direito a um recurso efetivo, o direito à garantia dos direitos, à não discriminação e à proibição do abuso do direito (artigos 6.º, 7.º, 13.º, 14.º e 17.º da CEDH) ínsitos nos princípios de Estado de Direito Democrático (artigos 2.º, 8.º, n.ºs 1 e 2, 13.º, 16.º, 17.º, 18.º, 19.º, n.º 1 a contrario, 20.º, n.º 1, 61.º, 62.º, 203.º e 204.º, todos da CRP), bem como as normas e...

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