Acórdão nº 00563/14.3BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 31 de Maio de 2019
Data | 31 Maio 2019 |
Órgão | http://vlex.com/desc1/1998_01 |
Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório OMMF, com os demais sinais nos autos, veio propor ação administrativa especial, ao abrigo do art.º 48.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20/11, contra o MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, e CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, na qual peticionou: a) que seja reconhecido o acidente ocorrido em 24/10/2012 como acidente de trabalho, condenando-se os RR. “à prática do ato administrativo devido, em substituição, revogando o despacho de indeferimento do pedido de qualificação como acidente de trabalho, e ainda que o Ministério da Justiça seja condenado à prática de um novo ato que qualifique o referido acidente sofrido pela Autora como acidente de trabalho nos termos do artigo 7.º n.º 1 do DL 503/99 de 20 de novembro e artigo 8.º n.º 1 e 2 da Lei 98/2009 de 04 de setembro, com as legais consequências”; b) que se proceda “à atribuição do subsídio de elevada incapacidade permanente, nos termos do artigo 37.º do DL 503/99 de 20 de novembro, desde 19/04/2013, a ser atribuído pela R. Caixa Geral de Aposentações acrescido de juros, à taxa legal até integral pagamento”; c) que se promovam os “respetivos abonos das diferenças de vencimentos, nomeadamente os subsídios de refeição e os suplementos de caráter permanente, desde 01/10/2012 até 01/01/2014 no valor de € 2.465,93 (dois mil quatrocentos sessenta cinco euros e noventa e três cêntimos) faltando contabilizar os restantes meses uma vez que a A. não tem os recibos de vencimento, nos termos do artigo 6.º e 15.º do DL 503/99 de 20 de novembro”; d) que se proceda “à atribuição do Subsídio por assistência de terceira pessoa, nos termos do artigo 16.º e 36.º do DL 503/99 de 20 de novembro, a ser atribuído pela R. Caixa Geral de Aposentações”; e) que se proceda “à atribuição do Subsídio para readaptação de habitação, no valor de € 2.872,26 (dois mil oitocentos setenta dois euros e vinte seis cêntimos), nos termos do artigo 36.º do DL 503/99 de 20 de novembro – Cfr. Doc. n.º 18”; f) que se proceda à “atribuição de pensão anual e vitalícia e atualizável no montante de € 15.399,17 (quinze mil trezentos noventa nove euros e dezassete cêntimos), a pagar adiantada e mensalmente até ao 3.º dia de cada mês, correspondendo cada uma das prestações a 1/14 da pensão anual, sendo a prestação correspondente ao subsídio de Férias e de Natal paga, respetivamente, nos meses de maio e de novembro, acrescendo juros de mora à taxa legal desde o vencimento até integral pagamento, nos termos do artigo 34.º DL 503/99 de 20 de novembro, a ser atribuído pela R. Caixa Geral de Aposentações”.
*A Autora, inconformada com a decisão proferida no TAF de Coimbra em 6 de março de 2019, através da qual a Ação foi julgada improcedente, veio em 25 de março de 2019, recorrer da decisão proferida, na qual se conclui: “1. Vem o presente recurso interposto da douta Sentença de fls. (…) do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que julgou a ação administrativa especial improcedente, e em consequência decidiu absolver os RR. dos pedidos deste com base que: “… veio a concluir-se que o ato impugnado - decisão da Subdiretora-Geral da Administração da Justiça, proferida em 30/07/2013, nos termos da qual foi determinada a não qualificação da ocorrência de 24/10/2012 como acidente de trabalho - não padece de qualquer vício de ilegalidade, devendo ser mantido na ordem jurídica, o que determina não só a improcedência do pedido de impugnação e de condenação à prática do ato devido (de qualificação como acidente de trabalho), como também, forçosamente, a improcedência dos demais pedidos condenatórios relativos ao pagamento das prestações e subsídios no Decreto-Lei n.º 503/99, de 20/11, porque dependentes da prévia qualificação do evento como acidente de trabalho/em serviço, o que não se verifica.” 2. O Tribunal a quo deixou de considerar, inúmeras provas documentais, nomeadamente, o relatório do dano psíquico, onde foram prestadas as declarações da recorrente OF, entre outros documentos, onde demonstram a situação clínica da autora, antes do evento traumático, e documentos onde de uma forma concreta indiciavam que a autora sofreu um verdadeiro acidente de trabalho.
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Pelo exposto, salvo o devido respeito deve-se considerar que a Sentença recorrida viola o disposto no artigo 615.º n.º1 al. b) do CPC.
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Assim, os requisitos formais de admissibilidade da impugnação da decisão de facto, mormente os constantes do artigo 640.º, n.º 1, alíneas a) e c), do CPC, têm em vista, no essencial, garantir uma adequada inteligibilidade do objeto e alcance teleológico da pretensão recursória, de forma a proporcionar o contraditório esclarecido da contraparte e a circunscrever o perímetro do exercício do poder de cognição pelo tribunal de recurso.
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A decisão judicial ora posta em crise, que teve por base uma incorreta valoração da prova e, até mesmo prova inexistente ou insuficiente.
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Nesse sentido, na contestação apresentada, ao enunciar o objeto da sua defesa, o Recorrido, não juntou qualquer prova (documental ou testemunhal), nomeadamente, atas, ou outro documento que comprove que efetivamente iria um outro elemento ajudar a ora aqui recorrente, assim resultando incumprido o assinalado ónus.
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Face ao exposto, a decisão judicial recorrida incorre em nulidade nos termos do artigo 615.º, n.º 1 alínea c) do CPC, violou, por erro de interpretação de direito e de facto, os artigos 572.º do CPC, ex vi artigo 1.º CPTA, artigos 341.º e 342.º do Código Civil, pois as provas revelam um sentido e a decisão recorrida extrai ilação contrária, incluindo quanto à matéria de facto provada.
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Defende a recorrente, igualmente, que na decisão recorrida existe contradição entre a fundamentação de direito face à matéria de facto que foi dada como assente, pretendendo assacar à decisão do Tribunal a quo, o vício de nulidade devido a contradição entre os fundamentos de facto e de direito.
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Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al. c), do C.P.Civil, é nula a sentença quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
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Encontramo-nos perante um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no artigo 154.º, nº.1, do CPC.
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Entende a recorrente que face a estas dúvidas, a sentença é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível, é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes.
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Neste caso não se sabe o que o juiz quis dizer, no outro hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos. É evidente que em última análise, a ambiguidade é uma forma especial de obscuridade. Se determinado passo da sentença é suscetível de duas interpretações diversas, não se sabe ao certo, qual o pensamento do juiz.
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A decisão só é, assim, obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível e ambíguo, quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes e/ou sentidos porventura opostos.
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Ou seja, a nulidade só poderá ser atendida no caso de se tratar de vício que prejudique a compreensão da decisão judicial [despacho/sentença/acórdão] e de se apontar concretamente a obscuridade ou ambiguidade cuja nulidade se pretende ver declarada.
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Ora, no presente caso, estamos perante uma sentença obscura e ininteligível, o que determina nos temos do artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC, ex vi artigo 1 do CPTA, a sua nulidade.
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Ora, a questão fulcral que importa apreciar é a de saber se o AVC sofrido pela recorrente (que lhe determinou a atribuição de uma incapacidade permanente global de 70%) se ficou a dever a um acidente de trabalho.
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E julgamos que a resposta, in casu, só pode ser positiva, face á matéria dada como provada nos presentes autos, apenas podemos concluir que a recorrente logrou provar, como lhe competia, a ocorrência de um qualquer evento verificado por ocasião do trabalho ou com ele relacionado causador do AVC e das lesões e sequelas de que ficou portadora. Ou seja, a recorrente provou que o AVC e as lesões sofridas ocorreram por causa de intervenção exterior (evento súbito exterior ao lesado).
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Entendeu o tribunal a quo por conseguinte, pela inexistência, no caso dos autos, de um acidente de trabalho ou em serviço, pelo que nada há a apontar à decisão aqui impugnada, que não qualificou o AVC sofrido pela A. como acidente de trabalho, sendo a mesma de manter, por se mostrar conforme às disposições legais aplicáveis.
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A decisão não explica nem tinha de explicar a hipótese colocada, por se ignorar se a recorrente sofreu, ou não, outras situações e nem se saber se as condições externas foram, ou não, semelhantes às verificadas quando ocorreu o acidente, sendo que, em todo o caso, os acidentes não ocorrem em condicionalismos predefinidos. São, por natureza, inesperados.
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Ora, conforme face à matéria de facto dada como provada, não restam qualquer dúvidas que de facto, a recorrente exerceu a sua atividade no ambiente de grande stress e pressão, bem como ficou demostrado que de facto face à diminuição dos funcionários judiciais, houve também aqui um aumento brutal de serviço.
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Já Carlos Alegre, refere que a doutrina aponta como características do acidente naturalístico tratar-se dum evento exterior à constituição orgânica da vítima, em geral súbito e que causa uma ação lesiva sobre o corpo humano.
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No entanto, continua este autor, esta caracterização está longe de ser completa, pois “nem o acontecimento exterior direto e visível, nem a violência são, hoje, critérios indispensáveis à caracterização do acidente. A sua verificação é extremamente variável e relativa, em muitas circunstâncias. Além disso, a causa exterior da lesão tende a confundir-se com a causa do acidente de trabalho, num salto lógico, nem sempre evidente”.
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Por isso, sustenta este autor que a violência não constitui, a não ser como critério subsidiário, uma característica...
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