Acórdão nº 324/19 de Tribunal Constitucional (Port, 29 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelCons. Fernando Vaz Ventura
Data da Resolução29 de Maio de 2019
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 324/2019

Processo n.º 335/2019

2.ª Secção

Relator: Conselheiro Fernando Ventura

Acordam, em conferência, na 2.ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Notificado da decisão sumária n.º 298/2019, dela vem o arguido/recorrente A. reclamar para a Conferência, ao abrigo do n.º 3 do artigo 78.º-A da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, doravante LTC).

2. Para a decisão da presente reclamação importa reter que o presente recurso se inscreve incidentalmente em processo criminal, no âmbito do qual, por acórdão proferido em 23 de outubro de 2017 pelo Juízo Criminal Central de Lisboa, o arguido A. foi condenado pela prática de crimes de associação criminosa, falsificação de documento e branqueamento, na pena unitária de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão. Inconformado, o arguido interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, o qual, por acórdão de 30 de julho de 2018, julgou o recurso improcedente e manteve a condenação proferida pela 1.ª instância. Arguida a nulidade deste último acórdão, foi o incidente pós decisório julgado improcedente.

O arguido/recorrente não se resignou e apresentou recurso para o Supremo Tribunal de Justiça. Por despacho de 11 de setembro de 2018, o relator no Tribunal da Relação de Lisboa não admitiu o recurso para o STJ, com fundamento no disposto no artigo 400.º, n.º 1, alínea f) do CPP.

O arguido/recorrente A. reclamou desse despacho, ao abrigo do artigo 405.º do CPP, impugnação também julgado improcedente por despacho proferido pelo Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça em 11 de outubro de 2018.

Nessa sequência, o referido arguido interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo das alíneas b) e g) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.

No requerimento de interposição de recurso, são enunciadas seis questões de constitucionalidade, todas ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, e a última (sexta) também ao abrigo da alínea g) do mesmo número e preceito.

Por despacho de 30 de outubro de 2018, o Vice-Presidente do STJ não admitiu o recurso na parte deduzida ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, com fundamento em que «as conjugações normativas [questionadas], não foram aplicadas na decisão proferida nos termos do artigo 405.º do CPP (...), o que inviabiliza qualquer julgamento sobre elas por parte do Tribunal Constitucional, porquanto os recursos de constitucionalidade desempenham uma função instrumental». Já quanto à «conjugação normativa dos artigos 412.º, n.º 3, 417.º, n.º 3, e 420.º, n.º 1, do CPP», e à mobilização da alínea g) do n.º 1 do artigo 70.º, foi o recurso admitido.

Notificado, o recorrente/reclamante A. apresentou reclamação para o Tribunal Constitucional desse despacho, ao abrigo do artigo 77.º da LTC, na parte em que não admitiu o recurso de constitucionalidade, impugnação indeferida pelo Acórdão n.º 67/2019, de 25 de janeiro.

Regressado o apenso pertinente à reclamação apresentada ao abrigo do artigo 405.º do CPP ao Tribunal da Relação, foi o mesmo remetido a este Tribunal, onde deu entrada em 25 de março.

3. A decisão sumária n.º 298/2019 concluiu pelo não conhecimento do recurso (na parte que fora admitida pelo supra referido despacho de 30 de outubro de 2018), com fundamento na inutilidade do seu conhecimento, por o questionamento não versar norma efetivamente aplicada na decisão recorrida como ratio decidendi. Lê-se na decisão:

«4. De acordo com o n.º 3 do artigo 76.º da LTC, a decisão de admissão não vincula este Tribunal, pelo que cumpre apreciar da verificação dos pressupostos e requisitos de admissibilidade do recurso apresentado pelo arguido A.. Ora, como decorre do Acórdão n.º 67/2019, o mesmo fundamento que determinou a inadmissibilidade do recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, atinge igualmente o recurso, na parte em que mobiliza a alínea g) do mesmo número e preceito.

5. Com efeito, a jurisprudência constitucional vem entendendo, como pressuposto comum, que todos os recursos de fiscalização concreta revestem natureza instrumental, devendo a solução da questão submetida à apreciação do Tribunal Constitucional poder repercutir-se, de forma útil e efetiva, na decisão recorrida. Na síntese formulada por TEIXEIRA DE SOUSA, Legitimidade e Interesse no Recurso de Fiscalização Concreta da Constitucionalidade, 2015, acessível em https://docs.google.com/viewer?a=v&pid=sites&srcid=ZGVmYXVsdGRvbWFpbnxpcHBjaXZpbHxneDo2ZWZkZDI3NmIyNTg1NzJj:

«Para a admissibilidade do recurso para o Tribunal Constitucional não basta que a parte tenha sido vencida; é ainda necessário que ela tenha interesse em ver revogada a decisão proferida, ou seja, é ainda indispensável que a eventual procedência do recurso seja útil. Como o Tribunal Constitucional já teve oportunidade de referir, o recurso de constitucionalidade apresenta-se como um recurso instrumental em relação à decisão da causa, pelo que o seu conhecimento e apreciação só se revestem de interesse quando a respetiva apreciação se possa repercutir no julgamento daquela decisão (cfr. TC 768/93; TC 769/93; TC 272/94; TC 162/98; TC 556/98; TC 692/99; TC 687/04; TC 144/07; TC 510/07; TC 74/13; TC 725/13). Expressando esta mesma orientação noutras formulações, o Tribunal Constitucional afirmou que o recurso de constitucionalidade desempenha uma função instrumental, pelo que só devem ser conhecidas questões de constitucionalidade suscitadas durante o processo quando a decisão a proferir possa influir utilmente na decisão da questão de mérito em termos de o tribunal recorrido poder ser confrontado com a obrigatoriedade de reformar o sentido do seu julgamento (TC 60/97), e concluiu que o recurso de constitucionalidade possui uma natureza instrumental, traduzida no facto de ele visar sempre a satisfação de um interesse concreto, pelo que ele não pode traduzir-se na resolução de simples questões académicas (TC 234/91; TC 167/92).»

Pois bem, assentando, como se disse no Acórdão n.º 67/2019, o despacho recorrido unicamente nas normas que regem a admissibilidade do recurso para o STJ, designadamente no disposto nos artigos 432.º, n.º 1, alínea b) e 400.º, n.º 1, alínea f), ambos do CPP, resulta evidente a inutilidade do conhecimento de questão de constitucionalidade reportada «à norma extraída da conjugação entre os artigos 412.º, n.º 3, 417.º, n.º 3, 417.º, n.º 3, e 420.º, n.º 1, do CPP, quando interpretados no sentido de que pode ser rejeitado ou não conhecido um recurso que proceda à impugnação a matéria de facto ainda que constem do recurso as passagens a valorar e os pontos de facto concretos a modificar, sem indicação dos requisitos legais incumpridos pelo recorrente ou qualquer fundamentação para o não conhecimento do recurso, nem qualquer convite ao aperfeiçoamento». Esse problema é inteiramente alheio ao despacho recorrido.

Cumpre, assim, concluir pelo não conhecimento do recurso.»

4. Na peça de reclamação, o arguido/recorrente A. vem dizer o que segue:

«1. A decisão sumária ora reclamada recusou conhecer do objeto do recurso interposto por A., com a seguinte argumentação: “o despacho recorrido unicamente nas normas que regem a admissibilidade de recurso para o STJ, (…), resulta evidente a inutilidade do conhecimento de questão de constitucionalidade reportada «à norma extraída...

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