Acórdão nº 995/07.3TTMTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelFERREIRA DA COSTA
Data da Resolução30 de Novembro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: NEGADO PROVIMENTO.

Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO - LIVRO 91 - FLS. 198.

Área Temática: .

Sumário: O contrato de trabalho é compatível com o exercício de funções de gerência de uma sociedade, designadamente quando o gerente nem sequer é sócio da sociedade em causa.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Reg. N.º 635 Proc. n.º 995/07.3TTMTS.P1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B……………. deduziu em 2007-12-19 acção emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra C………….., Ld.ª pedindo que se declare ilícito o despedimento efectuado e que se condene a R. a pagar ao A.: a) Indemnização de antiguidade, que deverá ser fixada em 45 dias de retribuição por cada ano de antiguidade ou fracção até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal, ascendendo à data da propositura da acção a quantia de € 18.900,00, pela qual optou na petição inicial; b) As retribuições que deixou de auferir até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal; c) A quantia de € 5.400,00 correspondente a férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, vencidos no princípio do ano de 2007; d) A quantia de € 4.500,00 correspondente a férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, proporcionais ao tempo de trabalho prestado no ano da cessação do contrato; e) A quantia de € 20.000,00 a título de danos morais vencidos, sem prejuízo dos vincendos e f) Juros de mora à taxa legal desde a data da citação até integral pagamento.

Mais pede que se condene a R. a emitir a declaração comprovativa da sua situação de desemprego.

Alega o A., para tanto, que tendo sido admitido ao serviço da R. em 2001-12-01 para, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, desempenhar a actividade correspondente à categoria profissional de Director Comercial, mediante a retribuição anual de € 36.061,00. Porém, em 2002-12-22 o A. assinou um contrato – sic – de Director Geral para Espanha e Portugal com a sócia maioritária da R., D……………, SL, mediante o qual cessou o contrato de trabalho iniciado em 2001-12-01 com a R. Celebrado tal contrato, o A. passou a auferir, a partir do início do ano de 2003, para além da retribuição acima referida, uma nova retribuição, correspondente ao salário mínimo nacional, acrescida de ajudas de custo de deslocações e mantendo-se as anteriores condições, nomeadamente, a categoria profissional. Mais alega que foi despedido sem justa causa averiguada em processo disciplinar, pelo menos, em 2007-06-27. Alega, ainda, que não lhe foi paga qualquer das quantias pedidas, bem como não lhe foi entregue, apesar de solicitada, a declaração comprovativa da sua situação de desemprego. Por fim, alega que sofreu danos morais em consequência do despedimento ilícito, que descreve.

Contestou a R. alegando, em síntese, que entre A. e R. nunca houve qualquer contrato de trabalho, mas de mandato e, a entender-se o contrário, deve considerar-se que o contrato de trabalho se extinguiu em 2001-12-06 com a sua nomeação como gerente da R. ou em 2002-12-22 em consequência da celebração do contrato com a sócia maioritária da R., D…………, SL. Entre esta e a R. foi celebrado um contrato de prestação de serviços em 2003-01-02, mediante o qual aquela passaria a prestar a esta serviços de direcção e gestão, a efectuar pelo A., como Director Geral, mediante retribuição, que era facturada por aquela a esta. Apesar disso, o A. deu ordens à R. para lhe pagar mensalmente uma retribuição adicional, correspondente ao salário mínimo nacional, bem como ajudas de custo de deslocações. Alega também que não existindo contrato de trabalho entre as partes, o impedimento de o A. entrar nas instalações da R. não consubstancia um despedimento. Por último, alega e pede a condenação do A. como litigante de má fé. Quanto ao mais, contesta por impugnação.

O A. respondeu à matéria de excepção.

Foi proferido despacho saneador tabelar, consignados os factos assentes e elaborada base instrutória, sem reclamações.

Procedeu-se a julgamento com gravação da prova pessoal, tendo o Tribunal a quo respondido à base instrutória pela forma constante do despacho de fls. 391 a 394.

Proferida sentença, o Tribunal do Trabalho absolveu a R. do pedido e não condenou o A. como litigante de má fé.

Irresignado com o assim decidido, veio o A. interpor recurso de apelação, pedindo que se revogue a sentença, tendo formulado a final as seguintes conclusões: 1. A 22 de Dezembro de 2002, o recorrente assinou um contrato de Director GeraI com a sócia maioritária da recorrida (D…………). Na sequência da assinatura deste contrato, a relação laboral que o recorrente mantinha com a recorrida até então extinguiu-se.

  1. Por força do contrato celebrado com a sócia maioritária da recorrida, o recorrente adquiriu a função de Director Geral de Espanha e Portugal.

  2. Porém, logo no início do ano de 2003, o recorrente pactuou verbalmente com a recorrida o início de uma nova relação laboral, com uma nova remuneração correspondente ao salário mínimo nacional, a que acresceriam os custos de deslocação, com a categoria profissional de Director Comercial em Portugal.

  3. Desde o início de 2003 até meados do ano de 2007, o recorrente desempenhou não só as suas funções de Director Geral em Portugal e Espanha, mas também as suas funções de Director Comercial da recorrida, tendo, em consonância, recebido mensalmente o salário acordado, acompanhado das respectivas folhas de vencimento.

  4. O recorrente manteve também a sua qualidade de gerente da recorrida, em conjunto com outros três gerentes.

  5. A questão de fundo que se suscita no caso em apreço é a de saber se, a partir de 22 de Dezembro de 2002, se pode considerar existir um novo contrato de trabalho, ainda que verbal, entre recorrente e recorrida.

  6. Na falta de expressas declarações negociais, nomeadamente provadas por escrito, o recorrente apenas pode provar a existência de contrato de trabalho subordinado através do recurso a todas as circunstâncias do caso, tais como: a. a retribuição fixa auferida; b. a existência de sócios maioritários e gerentes com autoridade e domínio sobre os restantes; c. o efectivo conhecimento que os sócios e gerentes tinham da actividade laboral e da retribuição auferida pelo requerente sem que tivessem manifestado qualquer oposição ou reparo; d. existência de subordinação jurídica do recorrente perante os órgãos directivos da recorrida.

  7. Ao ser simultaneamente Director Geral em Espanha e Portugal, e também Director Comercial em Portugal, é óbvio que o recorrente tinha alguma autonomia e capacidade de decisão no decurso da actividade diária da empresa recorrida, o que não significa, de todo, que o recorrente não estivesse sob a direcção e autoridade da recorrida.

  8. Aliás, conforme já foi decidido pelos Tribunais superiores, a subordinação jurídica não necessita de ser permanentemente exercida, basta que potencialmente o possa ser.

  9. A composição da gerência é relevante para o juízo desta questão, já que nela se encontra o Presidente da sócia maioritária da recorrida, que, como tal, exerce uma posição de autoridade e domínio sobre todos os restantes, incluindo o recorrente.

  10. Apenas o recorrente não apresenta a qualidade de sócio da recorrida, o que reforça a autoridade e domínio dos restantes gerentes em relação ao recorrente.

  11. Perante a existência de um sócio maioritário - que mais não era senão a empresa-mãe da recorrida -, sendo um dos sócios gerentes da recorrida também Presidente da sócia maioritária, e sendo o recorrente o único gerente que não possuía a qualidade de sócio, torna-se evidente que o recorrente estava sob as ordens e direcção dos órgãos directivos da recorrida.

  12. O Tribunal a quo, no julgamento que fez desta questão, não analisou criticamente a prova constante do documento n.º 7, junto pela recorrida aos autos com a sua contestação, mais concretamente a "Acta de Juízo Verbal" elaborada pelo Julgado Social n.º 1 de Ourense, onde constam as declarações proferidas por E………….., um dos sócios gerentes da recorrida, a 14 de Setembro de 2007.

  13. Nestas declarações, E………….. afirma categoricamente que, pelo menos uma vez, esteve presente numa reunião onde o Presidente da sócia maioritária autorizou o aumento dos salários, incluindo do recorrente, reunião essa ocorrida quando o recorrente já estava contratado em Espanha, ou seja, posteriormente a 22 de Dezembro de 2002.

  14. Declara ainda o mesmo sócio gerente que "Nos orçamentos, numa folha à parte, mencionavam-se os vencimentos e salários dos trabalhadores, o vencimento do declarante, o do Sr. B………… também, era apresentado todos os anos. (...) Tem a certeza que entregavam a folha aos sócios." 16. Mais adiante, declara o sócio E……….: "O motivo de utilizar o VISA de Portugal era para desviar os custos de Espanha e ajudar um pouco." 17. Tais declarações foram devidamente transcritas para papel, pelo Julgado Social n.° 1 de Ourense, e assinadas pelos respectivos declarantes, onde se inclui a assinatura do sócio gerente da recorrida E…………...

  15. Nos termos previstos nas disposições conjugadas dos artigos 365°, n.º 1, 369° e 371°, n.º 1 do Código Civil, o documento em questão trata-se de documento autêntico que faz prova plena dos factos que nele são atestados. Ainda nos termos do artigo 393, n.º 2 do Código Civil, não é admissível prova testemunhal relativamente a factos que já estão provados por meio de força probatória plena.

  16. Deste modo, o Tribunal a quo não pode dar por provados factos contrários ao que consta neste documento, bem como não pode considerar não provados factos que se encontram comprovados por aquele documento de força probatória plena.

  17. Há...

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