Acórdão nº 572/07.9TBVLC.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Novembro de 2009

Data03 Novembro 2009
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: REVOGADA.

Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO - LIVRO 331 - FLS. 19.

Área Temática: .

Legislação Nacional: ALÍNEAS C) E G) DO N° 1 DO ART. 4 DA LEI N° 18/2003, DE 11.6 Sumário: I- Se num contrato de mútuo o mutuário cumpre a obrigação a que estava vinculado, procedendo à restituição da quantia mutuada e respectivos juros, não pode haver lugar a qualquer dever de indemnizar, o que, desde logo, exclui a aplicação da cláusula penal; II- Tendo-se inserido num contrato de mútuo uma cláusula pela qual o mutuário se obrigava a vender toda a sua produção de leite ao mutuante, esta infringe o disposto nas alíneas c) e g) do n° 1 do art. 4 da Lei n° 18/2003, de 11.6, que aprova o Regime Jurídico da Concorrência e, assim sendo, deve ser considerada nula, face ao que se dispõe no n°2 do mesmo preceito legal.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Proc. nº 572/07.9 TBVLC.P1 Tribunal Judicial de Vale de Cambra – 1º Juízo Apelação Recorrentes: “B……………, Ldª” e “C……………., SA” Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Canelas Brás e Pinto dos Santos Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO A autora “B………….., Ldª”, com sede no lugar ………, freguesia de …………., Vale de Cambra, intentou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo sumário contra a ré “C………….., SA”, com sede em ……….., ……., Vale de Cambra, pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de €5.000,00, acrescida de juros de mora.

Alegou, em síntese, que há mais de 10 anos a ré lhe vem comprando leite. Relativamente ao leite fornecido no mês de Agosto de 2007, o preço total do mesmo foi de €8.263,12 acrescido de IVA. Acontece que por conta desse preço, a ré apenas pagou a quantia de €2.923,10, encontrando-se em dívida o montante peticionado.

A ré apresentou contestação, alegando que entre as partes foi celebrado um contrato de mútuo, através do qual a ré concedeu à autora um empréstimo de €15.000,00, que seria pago em 20 prestações mensais de €750,00 cada uma, até ao dia 10 do mês respectivo, iniciando-se o seu pagamento no mês de Fevereiro de 2007.

Nesse contrato foi ainda estipulado que enquanto a autora devesse qualquer quantia à ré no âmbito desse contrato teria de vender-lhe toda a produção de leite. Mais estipularam que a falta de cumprimento dessa obrigação, durante o período de duração do contrato, determinaria a obrigação da autora pagar à ré a quantia de €5.000,00.

Tendo a ré apurado que, em Setembro de 2007, a autora vendeu leite a terceiros desde Julho de 2007 a Setembro do mesmo ano, comunicou-lhe que no pagamento a efectuar nesse mês retinha a quantia de €5.000,00 para pagamento da indemnização prevista no contrato.

Como tal, o direito de crédito da autora sobre a ré extinguiu-se por meio de compensação. Admitindo, contudo, que tal compensação não houvesse sido feita, sempre a ré poderia proceder à mesma através da sua contestação.

A autora respondeu à excepção invocada pela ré, alegando que nunca esteve em mora, que o adicionamento da cláusula penal constitui abuso de direito e, caso a mesma seja aplicada, deverá ser reduzida equitativamente.

Foi proferido despacho saneador, tendo sido fixada a matéria fáctica assente e organizada a base instrutória.

Realizou-se audiência de julgamento com observância do legal formalismo e o tribunal respondeu à base instrutória através do despacho de fls. 128/130, que não teve qualquer reclamação.

Foi depois proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, tendo condenado a ré “C…………….., SA” a pagar à autora “B………………., Ldª”a quantia de €2.500,00.

Inconformados com esta sentença, dela interpuseram recurso a autora e a ré.

A autora finalizou as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. A douta sentença em recurso, relativamente ao pedido de condenação nos juros de mora, omitiu a devida pronúncia, enfermando da nulidade prevista no art. 668, nº 1, al. d) do CPC.

  1. Os autos reúnem todos os elementos para ser proferida decisão segura no sentido da condenação da ré nos juros de mora.

  2. A obrigação da autora vender à ré toda a produção de leite e cláusula penal convencionada foi estabelecida apenas como forma de garantir o pagamento das prestações de amortização do empréstimo.

  3. Tendo a autora pago, no tempo e lugar devidos, as prestações de amortização do empréstimo e os respectivos juros, não pode a ré exigir o pagamento da cláusula penal, sob pena de violação do disposto no art. 811, nº 1 do C.Civil.

    Sem prescindir, 5. A cláusula estabelecida e integrada no clausulado de um contrato de mútuo oneroso, nos termos da qual um produtor de leite (mutuário), durante a vigência do contrato, se obriga a vender toda a sua produção leiteira ao mutuante, é incompatível com os princípios contidos nos arts. 81 e 82 do Tratado da União Europeia, e nula face ao disposto no art. 4 e 7 da Lei nº 18/2003, de 11 de Junho.

  4. Sendo nula a cláusula, nula será também a cláusula penal convencionada para o incumprimento da obrigação.

    Sem prescindir, e no caso de improcedência das conclusões 3, 4, 5 e 6: 7. Nas particulares circunstâncias do caso “sub judice” impõe-se uma redução ainda mais substancial do montante da cláusula penal: 8. Foi violado o disposto nos arts. 811, nº 1 do C. Civil e arts. 4, nº 1, al. c) e g) e 7, nºs 1 e 2, al. a) da Lei nº 18/2003, de 11 de Junho.

    A ré, por seu turno, apresentou contra-alegações e finalizou as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. A decisão proferida que reduziu equitativamente a cláusula penal, ao abrigo do art. 812 do Cód. Civil, deve ser revogada.

  5. Não assistindo ao julgador, no caso concreto, essa possibilidade e também, ainda que fosse possível, sem que se encontrassem configurados os respectivos pressupostos.

  6. A possibildade de o tribunal, de acordo com a equidade, reduzir a claúsula penal, não é admissível sem que o interessado nessa redução haja realizado pedido nesse sentido e bem assim alegar factos integradores para consubstanciar essa possível questão.

  7. O uso dessa faculdade de redução da cláusula penal não é oficioso, mas sim dependente de pedido do devedor da indemnização.

  8. E mesmo que se considere não ser necessária a formulação de um pedido formal, sempre devem ser alegados “os factos donde se possa concluir pelo carácter manifestamente excessivo da cláusula, nomeadamente à luz do caso concreto, balizadores do julgamento por equidade que a lei reclama para a redução, ou seja, os factos que forneçam ao julgador elementos para determinação dos limites do abuso, do que a liberdade contratual não suporta...” 6. Da aplicação a estes autos do art. 812 do CC em causa deve concluir-se que não existe nenhum pedido formal para...

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