Acórdão nº 30/02.8GEGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Novembro de 2009
Magistrado Responsável | FERNANDO MONTERROSO |
Data da Resolução | 16 de Novembro de 2009 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães Na 1ª Vara de Competência Mista de Braga, em processo comum com intervenção do tribunal colectivo (Proc.nº 30/02.8GEGMR), foi proferido acórdão que: 1. Quanto à matéria criminal: a) Condenou o arguido Manuel M... na pena de quatro (4) anos de prisão, pela prática de um crime de ofensa à integridade física grave, p. e p. pelos artigos 143º e 144º, b); b) Suspendeu esta pena na sua execução pelo período de quatro (4) anos; 2. Quanto à matéria civil: a) Julgou o pedido de indemnização civil deduzido por José C... parcialmente procedente e, consequentemente, condenou o demandado a pagar-lhe: · a quantia de € 46.026,72 (quarenta e seis mil e vinte e seis euros e setenta e dois cêntimos), a título de danos patrimoniais; · juros de mora sobre esta quantia, à taxa legal, desde a data da notificação do pedido cível e até integral pagamento; · a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) a título de danos não patrimoniais; · juros de mora sobre esta quantia, à taxa legal, desde a data do presente acórdão e até integral pagamento; b) Julgou o pedido de reembolso pelo Hospital de S. João integralmente procedente e, consequentemente, condenar o demandado a pagar-lhe: · a quantia de € 1.523,38 (mil quinhentos e vinte três euros e trinta e oito cêntimos); c) juros de mora sobre esta quantia, à taxa legal, desde a data da notificação do pedido cível e até integral pagamento;* O arguido Manuel M...
e o assistente e demandante cível José C...
interpuseram recurso deste acórdão, suscitando as seguintes questões: O arguido Manuel M...
: - argui a nulidade da sentença por inexistência de exame crítico das provas – arts. 374 nº 2 e 379 al. a) do CPP; - impugna a decisão sobre a matéria de facto; - invoca a existência dos vícios previstos nas als. a), b) e c) do art. 410 nº 2 do CPP; - invoca a violação do princípio in dubio pro reo; - questiona a pena concreta; e - questiona a condenação cível.
O assistente e demandante cível José C...
visa que a suspensão da execução da prisão seja condicionada à obrigação do pagamento da indemnização arbitrada no prazo de um ano.
* Respondendo, ao recurso do assistente, a magistrado do MP junto do tribunal recorrido e o arguido defenderam a ilegitimidade do mesmo para recorrer e, subsidiariamente, a improcedência do recurso.
Respondendo ao recurso do arguido a magistrada do MP junto do tribunal recorrido defendeu a sua improcedência.
Nesta instância, o sr. procurador-geral adjunto emitiu parecer no sentido do recurso do assistente merecer parcial provimento e do recurso do arguido ser improcedente.
Cumpriu-se o disposto no art. 417 nº 2 do CPP.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
* I – No acórdão recorrido recorrida foram considerados provados os seguintes factos (transcrição): No dia 01.02.2002, pelas 18.30 horas, o arguido dirigiu-se à residência da mãe dos seus filhos, Maria M..., sita na Rua S. Salvador, Tagilde, Guimarães.
Com efeito e para que, como habitualmente, passassem o fim de semana com o pai, no dia referido na douta acusação, cerca das 19.00 horas, o arguido, acompanhado do filho Sérgio, deslocou-se à residência da sua ex-mulher a fim de aí buscar o seu outro filho, Diogo, então de 11 anos de idade. Sendo que, também, como habitualmente, parou o seu veículo ligeiramente abaixo da aludida residência e buzinou de modo prolongado.
Por este motivo, o ofendido José C..., companheiro da Maria M..., dirigiu-se ao arguido dizendo-lhe uma expressão análoga a “porque é que não vais apitar para … (o outro lado)”, utilizando um termo obsceno.
Na sequência, o arguido e o ofendido envolveram-se em discussão.
No decorrer dessa discussão, o arguido munido com um cabo eléctrico, branco, dobrado tipo chicote, com cerca de 50 cm, que trazia no chão da sua carrinha, desferiu várias pancadas no ofendido José C..., atingindo-o em várias partes do corpo.
De seguida, o arguido ainda desferiu, pelo menos, dois golpes com um objecto com lâmina, de características não apuradas, na face do mesmo ofendido e quando este colocou a mão esquerda à frente do rosto para se defender o arguido desferiu outro golpe como mesmo objecto, atingindo o ofendido no braço esquerdo.
Em consequência da conduta do arguido o ofendido José C... sofreu múltiplas lacerações profundas na face e laceração da face anterior do antebraço.
Estas lesões foram causa directa e necessária de 553 dias de doença com incapacidade profissional e 29 dias de incapacidade temporária profissional total.
Das referidas lesões resultou como sequela permanente diminuição da acuidade visual em 90%, desfiguração da face pelas cicatrizes (num grau de 3/7) e eptose palpebral esquerda.
O arguido agiu voluntária livre e conscientemente com intenção de molestar fisicamente o ofendido, o que conseguiu, utilizando para o efeito dois objectos, sendo um deles, o cabo eléctrico supra descrito e o outro com lâmina, pelas suas características, objectos perigosos e adequados a provocar lesões graves, como foi o caso.
O arguido tinha perfeito conhecimento que a sua conduta era proibida e punida por lei.
O arguido é divorciado.
Trabalha por conta própria como reparador de máquinas da indústria têxtil e de confecção, auferindo por mês cerca de € 600,00.
Não paga alimentos aos filhos.
Vive numa casa que era propriedade de sua mãe, nada gastando a este título.
Faz face às suas despesas normais com alimentação, vestuário e saúde com o seu referido vencimento.
Tem o 4º ano de escolaridade.
* Por causa das sequelas permanentes, o demandante ficou com uma IPP de 26,52%.
À data da agressão, o demandante tinha 31 anos de idade.
Era funcionário da V... – S..., Lda – onde auferia em média o vencimento de € 527,90.
Deixou de trabalhar pelo período de 553 dias, por causa das lesões da agressão, não recebendo os respectivos vencimentos.
Também não recebeu as quantias de subsídio de férias e de Natal proporcionais ao período em que não trabalhou.
Em despesas médicas, medicamentos, tratamentos, deslocações e outras, despendeu o requerente a quantia de € 1.198,76 euros.
Sofreu imensas dores (num grau de 4 em 7), humilhação e vexame, perante a família, amigos e colegas de trabalho.
Sofreu angústia e desespero por se ver cego com a acuidade visual do olho esquerdo diminuída em 90%, sendo ainda jovem e com uma vida inteira para viver.
As cicatrizes que lhe desfiguram a cara (num grau de 3 em 7) também lhe causam uma enorme dor e angústia e tristeza.
O requerente era, antes da agressão, um homem escorreito, bem parecido e de boa saúde.
O requerente vivia maritalmente, em comunhão de mesa e habitação com Maria M....
Constituíam um casal, e era com o rendimento comum dos seus trabalhos, que faziam face á vida que também tinham em comum.
Nos dez primeiros meses após a agressão, o requerente teve de se submeter a tratamentos ao olho de que ficou com acuidade diminuída.
Não podia abri-lo, muitas vezes, porque lhe doía e não suportava ver luz.
Necessitou dos cuidados diários da sua companheira a Maria M... para tratar de si naquele período de tempo, de grande dor e angústia.
A Maria M... também trabalhava na V..., Lda.
* Na sequência da agressão o ofendido foi transportado para os serviços do Hospital de S. João, a fim de ser socorrido e tratado aos ferimentos apresentados.
Foram prestados ao ofendido cuidados de saúde que ascendem à quantia de € 1.523,38.
* Considerou-se não provado que: As lesões sofridas pelo ofendido tenham sido directa e necessária de apenas quinhentos e vinte e cinco dias de doença com incapacidade para o trabalho geral e de sessenta dias com afectação da capacidade para o trabalho profissional; O demandante tenha ficado cego do olho esquerdo; O demandante tenha ficado com uma IPP de 60%; O demandante tenha ficado sem trabalhar por um período de 20 meses; O demandante ainda viva maritalmente com Maria M... e ainda constituam um casal; Os tratamentos a que o demandante teve que se submeter ao olho esquerdo fossem diários; A companheira do...
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