Acórdão nº 844/07.2TBCNT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução03 de Novembro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

A...

intentou acção declarativa, constitutiva, com pedido divórcio, contra seu marido, B... .

Pediu: O decretamento da dissolução do casamento por si celebrado com o réu com culpa exclusiva deste, tudo com as legais e devidas consequências.

Para tanto invocou em síntese: Desde há muito que o demandado faz uma vida totalmente separada da demandante, não lhe fornecendo qualquer informação sobre os negócios em que se envolve, vindo apenas a A. a ter deles conhecimento quando interpelada por credores a reclamar-lhe o pagamento de dívidas; ao manifestar ao Réu a sua tristeza por ser por ele ignorada, é a A. apelidada de “parva”, acrescentando não ter ela nada que ver com a sua vida.

Que o Réu é muito ciumento, vendo amantes em todo o lado e insinuando, mesmo diante de amigos e familiares, que a A. o trai, ameaçando-a de morte.

Que o Réu partiu vidros e tubos do radiador do automóvel da A., e introduziu água no respectivo depósito, furou os pneus, e arroubou asfechaduras das portas de casa.

Ora, a A. é uma pessoa muito trabalhadora, boa mãe, de elevada educação e apurada sensibilidade moral.

E que os cônjuges tomam as refeições em separado e não dormindo juntos há mais de três anos, apenas partilhando a mesma casa porque o demandado se recusa a sair dela.

Contestou o réu.

Dizendo, e em síntese, não corresponder à verdade o que a A. alegou na sua douta petição inicial, designadamente quanto aos comportamentos imputados ao contestante, pelo que inexistindo fundamentos para a decretação do divórcio pretendido pela A., pugnou pela improcedência da acção.

  1. Prosseguiu a acção os seus legais ermos, tendo, a final, sido proferida sentença que: – Decretou o divórcio entre a A. e o Réu, declarando, assim, dissolvido o seu casamento.

    – Declarou o Réu exclusivo cônjuge culpado pela dissolução do casamento.

  2. Inconformado apelou o réu.

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões; 1ª Dos factos provados não se pode concluir que ele violou os deveres conjugais estatuídos no artº 1672º e segs do CC.

    1. Dos mesmos factos apurados não decorre a separação de facto por mais de três anos prevista no artº 1782º nº1do CC.

    2. A nova legislação aplicável ao regime do divórcio – Lei 68/2008 de 31/10 – não se aplica aos presentes autos colocados em juízo em data anterior à vigência da mesma.

    3. A sentença violou os artºs 1779º, 1672º, 1673º, 1674º, 1675º e 1676º do CC.

  3. Sendo que, por via de regra: artºs 684º e 690º do CPC - de que o presente caso não constitui excepção - o teor das conclusões define o objecto do recurso, a questão essencial decidenda é a seguinte: Consubstanciam, ou não, os factos provados violação dos deveres conjugais e/ou separação de facto por mais de três anos.

  4. E os factos dados como assentes no tribunal a quo e que importa respeitar e analisar são os seguintes: 1 – A. e Réu celebraram casamento entre si no dia 9 de Junho de 1974, sem convenção antenupcial; 2 – C... nasceu no dia 28 de Fevereiro de 1992, e é filho da demandante e do Réu; 3 – A A. e o Réu tomam refeições em separado e dormem em camas separadas desde momento não concretamente apurado; 4 – O Réu não informa a A. sobre alguns dos negócios em que tem estado envolvido; 5 – A A. é interpelada por credores do demandado, que reclamam dela o pagamento de dívidas; 6 – O Réu já disse, pelo menos uma vez, a terceira pessoa (in casu, a irmã da A., D... ) que a A. o trai e, por isso, ele a há-de “rebentar”; 7 – Pelo menos uma vez, o Réu disse à demandante que a matava; 8 – O Réu arrombou as fechaduras das portas da casa de morada de família; 9 – O Réu já furou os pneus do automóvel da A.; 10 – A demandante é que paga a electricidade e, por vezes, o Réu acende e mantém acesas diversas luzes da casa de morada de família durante várias horas da noite, sem qualquer motivo aparente; 11 – Por vezes, o Réu liga o aparelho de televisão durante a noite, com o volume elevado, perturbando o sono e o descanso da A.; 12 – A. e Réu não conversam entre si; 13 – Por vezes, o Réu sai de casa por algum tempo, sem que a A. saiba para onde vai; todavia, tem igualmente acontecido estar o Réu fora de casa durante alguns períodos de tempo, em trabalho, em países estrangeiros, o que é do conhecimento da demandante.

  5. Apreciando.

    6.1.

    Previamente: Decorre do teor das conclusões de recurso que o Sr. Juiz a quo terá sustentado a sua decisão na nova e actual legislação do divórcio e que ele terá outrossim decretado o divórcio com base no fundamento da separação de facto.

    Porém, nada disto é verdade.

    Pois que conforme ressumbra do expresso teor da decisão recorrida, nela, adrede e inequivocamente, se expendeu que a lei aplicável é a anterior à entrada em vigor da lei n.º 61/2008, de 31/10.

    E que: «…mesmo defendendo …que os factos referidos quanto à não partilha do leito conjugal, das refeições e até do diálogo entre A. e Réu denunciam uma cessação ou ausência de comunhão de vida entre eles), apenas sabemos que tal estado de coisas dura há algum tempo… assim, falece a demonstração (que à A. cabia – art. 342º/n.º 1 C.C.) dos três anos consecutivos da existência de uma situação de separação de facto…Portanto, por esta via, o pedido de divórcio da A. não pode proceder.» (sic, com realce nosso).

    O thema decidendum do...

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