Acórdão nº 997/08.2TMFAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 03 de Março de 2010

Data03 Março 2010

S Meio Processual: APELAÇÃO Decisão: CONFIRMADO O ACÓRDÃO Sumário: I - Ser progenitor, de corpo inteiro, implica dar carinho, atenção, protecção, segurança e ter capacidade para formar, tratar e cuidar dos filhos. Se o(s) mesmo(s), apesar dos apoios que lhe(s) foi(ram) dado(s) por terceiros e de se ter verificado algum esforço feito naquele sentido, o que é de louvar, e das boas intenções, é(são) e continua(m) a ser incapaz(es) de desempenhar tais tarefas e funções, terá necessariamente de se arranjar um substituto, capaz de, com vantagens evidentes para o menor, as exercer.

II – A incapacidade de exercer uma paternidade ou maternidade responsável pode configurar uma situação que pode qualificar-se de maus-tratos. Na verdade, por maus-tratos não se entende só a agressão física ou psicológica, mas também "o insucesso na garantia do bem-estar material e psicológico da criança, necessário ao seu desenvolvimento saudável e harmonioso”.

III - Nestes casos justifica-se e impõe-se a tomada de medidas protectoras, designadamente a do afastamento ou ruptura com a família biológica, com vista a integração noutra família que ame e proteja a criança.

IV - Para a verificação da situação prevista na alínea d) nº 1 do art. 1978 CC, não é de exigir que a mesma se impute aos pais a título de culpa, bastando a sua objectiva ocorrência.

Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: Proc.º N.º 997/08.2TMFAR.E1 Apelação 1ª Secção Recorrente: D…..………...

Recorridos: Ministério Público e R……...

* O Ministério Público veio aos autos de promoção e protecção relativos ao menor R.................. .................., nascido em 23.02.2008, requerer que a favor fosse aplicada a medida de promoção de confiança a instituição com vista a futura adopção e, em consequência, fosse a progenitora declarada inibida do exercício das responsabilidades parentais - art. 1978°-A do Código Civil e que fosse designado o director da Instituição como curador provisório da criança, tudo nos termos do disposto nos artigos – 1978º al. d) e e) do CC arts. 62°-A. n.º 2 da L.P.C.J.P. e 167°. n"s 1 e 2 da O.T.M.

Em síntese alegou que o menor tem sido negligenciado pela mãe desde o seu nascimento em virtude dos hábitos de consumo de álcool e haxixe, sendo que esta é ainda uma jovem com problemas de saúde e imatura, a qual se encontra em Portugal há poucos anos e sem qualquer suporte familiar, pois residindo também em Portugal a avó materna da criança e um tio, as relações entre a progenitora do menor e a respectiva mãe são pautadas por conflitos constantes chegando ao ponto de existirem agressões físicas.

Foi proferida decisão provisória a folhas 17 e seguintes, tendo sido decretada a medida provisória de acolhimento institucional temporário. com os fundamentos de facto e legais aí constantes.

Após a realização as diligências instrutórias foi declarada encerrada a instrução e notificado o M.P. e a progenitora do menor para alegarem por escrito e apresentarem prova no prazo de 10 dias (art.º 114 n.º 1 da LPCJP).

Foi nomeado defensor oficioso ao menor.

O M.P. apresentou as suas alegações a fls. 119 e seguintes, nas quais conclui dever ser aplicado ao menor a medida de promoção de confiança a instituição com vista a futura adopção, como aliás atrás se referiu, pelos factos ali contidos.

Foi realizado o debate judicial com intervenção dos juízes sociais e por fim foi proferido acórdão onde se decidiu o seguinte: «

  1. Aplicar ao menor R.................. .................. nascido em 23.02.2008, a medida de promoção de confiança a Instituição com vista a futura adopção, nos termos do disposto nos artigos 34° al. a), 35° n.º1 g) da LPCJP.

  2. Nos termos e para os efeitos do art.º 167°, n.º I, da O.T.M. e 62° A, n.º 2, da L.P.C.J.P., nomeia-se curador provisório do menor o (a) director (a) da Instituição onde o menor se encontra.

  3. O decretamento da medida supra referida tem como um dos seus efeitos a inibição do exercício do poder paternal da progenitora, pelo que deverá ser remetida certidão da sentença à Conservatória do Registo Civi! para efeitos de averbamento ao assento de nascimento do menor - art. 19780 A, do C. Civil: d) Nos termos do disposto no art. 62º-A da LPCJP não haverá visitas ao menor por parte da família natural».

*Inconformada, veio a requerida D.................. ............, interpor recurso de apelação, que rematou com as seguintes conclusões: « 1- A Recorrente considera incorrectamente julgados os factos n.º 2, a 4,8 ,9, 16, 22, 25, 29, 54, 55, 56 e 59 dados como assentes no douto acórdão recorrido uma vez que os mesmos não têm suporte na prova produzida.

II- As provas que impõem decisão diversa da recorrida resultam com clareza dos depoimentos das testemunhas inquiridas; Denise………… cujas declarações se encontram registadas com referência dia 8/6/2009 das 11: 18 horas às 12:20 horas; Dinora………. cujas declarações foram gravadas no dia 17/6/2009 entre as 14.28 horas e as 15:05 horas; declarações de Paula ……… cujas declarações em 17/06/2009 estão registadas entre as 15:05 horas e as 15:28 horas; depoimento de Maria ……… cujas declarações podem ser ouvidas com referência das 15:39 horas às 16.14 horas do dia 17/6/2009; Cidália……….. cujas declarações estão registadas com respeito à mesma data entre as 16: 14 horas e as 16:30 horas; a progenitora do menor D.................. ............ cujas declarações foram gravadas em 17/6/2009 entre as 16:30 horas e 16:59 horas; relatórios sociais de fls. contrato de trabalho de fls. ..

III- Termos em que, deve a referida matéria de facto provada ser modificada em conformidade com o teor da impugnação ao abrigo do disposto no art. 712.°, n.º 1, al. a) do C.P.C ..

IV-A omissão no douto acórdão recorrido dos factos indicados sob as alíneas a) a e) das alegações de recurso consubstancia nulidade da sentença de acordo com o disposto no art. 668.°, n.º 1 , al. b) e n.º 4 do C.P.C.

V- Ao não admitir as alegações apresentadas pela progenitora do menor, em sede de debate judicial, indeferindo a inquirição das testemunhas indicadas e presentes nessa data e a inquirição da progenitora do menor sobre os factos alegados pelo Ministério Público, violou o Tribunal a quo o disposto no art. 4.°, al. i), art.104º n.º 2 e n.º 3 , art. 100.° da LPCJP e art. 1409.° , n.º 2 e art. 1410.° do C.P.C.

VI - A decisão proferida, ao afastar definitivamente o menor da mãe e ao não permitir uma ulterior revisão 102:0 Que conhecida a identidade do pai da crianca. contraria a lei e designadamente o disposto no art. art.4º, al. a) , al. e), al. f) , al. g), primeira parte, art. 34.° da LPCJP pelo que deve ser substituída pela medida de acolhimento em instituição, pelo tempo que se julgue adequado, prevista no art. 35.°, al. f) da LPCJP.

TERMOS EM QUE: Deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência:

  1. Deve julgar-se nula a sentença proferida, B) Ou, quando assim não se entenda deverá modificar-se a factualidade provada nos termos supra-alegados e determinar-se a alteração da medida de promoção e protecção aplicada, substituindo-a pela medida de acolhimento em instituição, prevista no art. 35.0 al. f) da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo».

Com as alegações a recorrente juntou cópia dum requerimento, subscrito por Samuel…………, dirigido ao processo de averiguação oficiosa de paternidade e onde o requerente manifesta intenção de perfilhar o menor R.................. .............

Perante tal documento, o relator deste acórdão, tomou a iniciativa de solicitar aos serviços do MP do Tribunal de Família e Menores de Faro, informação sobre a sequência dada a tal requerimento e se o requerente teria sido submetido a exames biológicos para determinação da paternidade e quais os resultados. Foi respondido que o requerimento, em causa, não foi apreciado por se encontrar suspenso o processo.

Foi ainda informado, com cópia dos resultados, que os exames biológicos realizados ao requerente excluíam, em absoluto, a paternidade do menor.

Daqui decorre, naturalmente, a impossibilidade legal do requerente poder perfilhar o filho da recorrente (art.º 1859º do CC)!*Contra-alegou o MP e o defensor do menor, pedindo a improcedência do recurso.

A sr.ª Juíza, pronunciou-se sobre a alegada nulidade da sentença, sustentando não ocorrer vício de tal natureza.

*Os recursos têm como âmbito as questões suscitadas pelos recorrentes nas conclusões das alegações (art.ºs 690º e 684º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil) [1] salvo as questões de conhecimento oficioso (n.º 2 in fine do art.º 660º do Cód. Proc. Civil).

Das conclusões decorre que são três as questões objecto do recurso: - alegada nulidade da sentença por falta de fundamentação; - Ilegalidade da decisão de não admissão das alegações e rol de testemunhas apresentadas pela requerida, finda a instrução (art.º 114 n.º 2 da LPCJP ) - Alteração da decisão de facto, no tocante aos factos sob os n.ºs 2, a 4,8 ,9, 16, 22, 25, 29, 54, 55, 56 e 59 e consequentemente a decisão jurídica.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

Dos factos Na primeira instância foram dados como provados, os seguintes factos.

  1. «(Sé), encontrando-se registado apenas como filho de D.................. ............ ............, sob o assento de nascimento n.o 43 12, do ano de 2008, da Conservatória do Registo Civil de Faro.

  2. Relativamente à mesma corre termos neste tribunal processo ele averiguação oficiosa de paternidade 202/08. ITMFAR - 1° Juízo, aguardando o mesmo a realização de exames para determinação da paternidade aos (quatro indivíduos indicados pela progenitora como possíveis pais da criança.

  3. Até à data, nenhum dos indicados como possíveis progenitores da criança mostrou qualquer interesse relativamente à mesma.

  4. A criança foi sinalizada à Comissão de Protecção de Crianças e Jovens de Loulé em Maio de 2008 pelo Centro de Saúde de Boliqueime por a mãe haver faltado, com a criança. a uma consulta e também por ter ali comparecido depois com menor...

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