Acórdão nº 693705.2TAFIG-B.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Dezembro de 2009

Magistrado ResponsávelFERNANDO FRÓIS
Data da Resolução17 de Dezembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: RECURSO DE REVISÃO Decisão: PROVIDO Sumário : I -O recurso de revisão constitui um meio extraordinário de reapreciação de uma decisão transitada em julgado e tem como fundamento essencial a necessidade de se evitar uma sentença injusta, a necessidade de reparar um erro judiciário, de modo a dar primazia à justiça material em detrimento de uma justiça formal.

II - Um dos fundamentos do recurso de revisão é a existência de factos novos (ou meios de prova) que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação (art. 449.º, n.º 1, al. d), do CPP), isto é, de factos que, por um lado, fossem ignorados ao tempo do julgamento e, por outro, que tais factos provoquem uma grave dúvida (e não apenas uma qualquer dúvida) sobre a justiça da condenação.

III - A jurisprudência tem-se dividido quanto a saber o que são factos ou meios de prova novos, ignorados ao tempo do julgamento ou desconhecidos na ocasião do julgamento. Para uns –corrente dominante – isso não significa que tais factos ou meios de prova não fossem ou não pudessem ser conhecidos pelo arguido no momento em que o julgamento teve lugar, significa tão só que se trata de factos ou meios de prova que não foram valorados no julgamento porque desconhecidos do tribunal. Para outros, porém, tais factos ou meios de prova são aqueles que eram ignorados pelo recorrente ao tempo do julgamento e não puderam ser apresentados antes deste (aqueles que não puderam ser apresentados e apreciados antes, na decisão que transitou em julgado).

IV - É de autorizar a revisão, se resulta dos elementos constantes dos autos que os factos ou meios de prova que a recorrente apresenta como novos, não eram conhecidos dela, aquando da audiência de julgamento, mas antes posteriores à sentença condenatória e, por outro lado, ressaltam, com suficiência desses novos factos e novos meios de prova, graves dúvidas sobre a justiça da respectiva condenação.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: A arguida/condenada AA, identificada nos autos, interpôs recurso para revisão de sentença.

Requer que seja admitida a revisão e que o processo seja reaberto e que a sentença venha a ser anulada face á descoberta de novos meios de prova e, a final, a arguida seja absolvida e lhe seja atribuída uma indemnização global de € 33.060,00 (sendo € 8.060,00 a título de danos patrimoniais e € 25.000,00 a título de danos não patrimoniais) e lhe seja restituído o montante que pagou de custas e taxas de justiça, com juros á taxa legal.

Formulou as seguintes – e extensas! – conclusões (transcrição): 1) Em 10-07-2007 foi proferida sentença, com a qual a arguida não se conformou, pelo que, recorreu da matéria de facto e de direito, para o Tribunal da Relação de Coimbra, sobre o qual foi proferido Acórdão que, em suma, manteve a decisão de que ora se recorre.

2) A arguida foi condenada pela prática de um crime de ofensa colectiva, organismo ou serviço p. e p. pelo art. 187°, nº1, do C.P., na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros) o que perfaz o montante global € 600,00 (seiscentos euros) que já liquidou, em três prestações de € 200,00, acrescendo as taxas de justiça e demais encargos com o processo, nomeadamente, os honorários da advogada da arguida, que acompanhou os presentes autos.

3) Sucede que, a aqui arguida descobriu novos meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitam dúvidas sobre a justiça da condenação nestes autos, e demoverão, no entendimento da recorrente, o sentido da decisão de condenação proferida, tendo a mesma sido severamente penalizada com a dita condenação, de todo imerecida.

4) Efectivamente, a arguida foi chamada a colaborar, porquanto ofendida, em Inquérito a correr no Departamento de Investigação e Acção Penal de Coimbra, na 33 Secção, ao qual foi atribuído o nº 317/07.3JACBR.

5) No âmbito do mesmo colaboraram e intervieram outros depoentes, cujos depoimentos ora se juntam em certidão judicial, a partir do qual é possível extrair conclusões diversas daquelas em que assentou a sentença de que se recorre.

6) Decorre dos depoimentos e diligências de investigação supra (doc.1) e bem assim do parecer da CCDRC, com despacho datado de 08-10-2007, que a arguida tinha, em boa fé, razão para proferir as declarações que prestou quanto à existência de ilegalidades e irregularidades, agora confirmadas e conhecidas por todos (C.M.F.F., C.C.D.R.C., funcionários, técnicos, dirigentes, etc...) e bem assim, quanto às "falhas" dos processos administrativos de obras e ao beneficio do loteador e dos proprietários dos lotes em detrimento dos interesses e direitos da arguida.

7) Desde logo, nos presentes autos, a arguida referiu que "não lhe eram prestadas informações" e que na sequência da consulta aos processos, detectou a "falta de elementos", tendo, porém, tais factos sido julgados não provados.

8) Sucede porém que resulta dos depoimentos de BB e de CC que efectivamente, à arguida e ora recorrente não foi dada resposta cabal às suas pretensões e pedidos de informação.

9) Neste sentido, admite o Presidente da CMFF que muito embora o despacho "Arquivo" não seja da sua autoria certo é que, como reconhece, sobre a referida denúncia/exposição não foi ordenada qualquer fiscalização/averiguação, sendo esta omissão da responsabilidade de DD - vide linhas 39 a 60 do seu depoimento constante do doc. 1.

10) Por outro lado, no que concerne ao tratamento diferenciado, conclui a Directoria da Policia Judiciária no âmbito do Inquérito supra, que "é possível colher elementos que dão conta da falta de resposta por parte da CMFF a solicitações da Sr.ª AA, conforme cópias das sentenças dos Processos de Intimação do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra (. .. ), extrai-se que, no conjunto dos 12 processos fornecidos para os autos, verifica-se que 3 processos terminaram com sentença de intimação ao Sr. Presidente para responder; em 7 processos é declarada a extinção da instância por, entretanto, a CMFF ter respondido ao solicitado, sendo que num desses processos a CMFF foi condenada ao pagamento das custas por tentar imputar litigância de má fé à Sr.ª Elisa; e por último, em apenas em 2 processos é indeferida a pretensão da AA.

" 11) E assim, resulta dos novos meios de prova apresentados e de que a arguida e ora recorrente teve acesso, que é confirmado o anteriormente alegado pela arguida nos presentes autos, que se queixava de tratamento diferenciado relativamente ao comum dos munícipes e, por via disso, de privilégio ao loteador e aos proprietários dos lotes, que face à omissão e não actuação da C.M.F.F., em tempo, iam construindo - vide depoimentos EE (o próprio loteador), CC (presidente da CMFF), FF e GG (ambos dirigentes da CCDRC).

12) Por outro lado, também a Directoria da P.J. constatou que: "(. .. ) considerando os vários pedidos de informação, etc ... que não tiveram também a devida resposta da CMFF, considerando também as denúncias acima referenciadas que também não tiveram a devida fiscalização por parte da CMFF foi o Presidente questionado sobre o motivo para a falta de procedimentos" (vide linhas 61 a 82), tendo o Presidente da CMFF esclarecido que: "a informação que lhe era dada pelo responsável do Departamento de Urbanismo, DD, era que não tinham que responder "porque se tratava de mais uma queixa da Sr.ª AA".

13) E assim, como este veio agora confessar, nem o Presidente, nem o Director de Departamento de Urbanismo, DD, testemunha da C.M.F.F. neste autos, tomaram qualquer atitude no sentido de dar o "normal e correcto" encaminhamento ou resposta devida e cabal às pretensões, cartas, exposições e reclamações da arguida, e ora recorrente, AA.

14) Efectivamente, não deram ambos, Presidente, DD e demais dirigentes da C.M.F.F., relevância às denúncias, exposições e queixas de irregularidades da arguida e ora recorrente as quais, apesar de já serem conhecidas - como resulta, entre outras, das declarações dos técnicos, funcionários e dirigentes da C.M.F.F prestadas no âmbito do Inquérito supra - entretanto, também se vieram a confirmar dando origem a pedidos de alterações nos loteamentos e à legalização de obras sem licença ou sem projecto ou materializadas e implantadas em desconformidade com o projecto.

15) A C.M.F.F. contrariamente à posição veiculada pelos seus funcionários e director do Departamento de Urbanismo, DD, nestes autos, prestou falsas declarações ao alegar desconhecer as intimações judiciais para prestação de informações e/ou passagem de certidões que a arguida teve que apresentar no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, consubstanciando tal conduta um verdadeiro abuso de poder da suposta ofendida C.M.F.F.

16) Aliás, com tal conduta, da C.M.F.F., como resulta evidenciado dos depoimentos de BB e demais funcionários e técnicos da C.M.F.F na Directoria da PJ de Coimbra, a mesma C.M.F.F. lesou, a arguida, não lhe dando um tratamento normal e comum ao dos demais munícipes e cidadãos, antes omitindo informação ou dando informação parcial ou por serviços incompetentes, ou arquivando as mesmas, ou fazendo-as desaparecer.

17) Efectivamente, como confessa o loteador, o Dr. HH veio a solicitar o seu apoio e colaboração “na resolução dos problemas junto da CMFF, na sequência dos contactos que recebeu da CMFF, dando conta das denúncias relativamente à sua moradia e dos seu lote".

18) Perante todo o ocorrido posteriormente, nomeadamente nas reuniões do loteador com a C.M.F.F., é inegável que todas as situações vertidas nas exposições e requerimentos da arguida, dadas aos autos pela C.M.F.F., eram verdadeiras, como ela afirmava, sendo verdadeira a existência das referidas "ilegalidades e irregularidades" bem como, o tratamento diferenciado da C.M.F.F. relativamente a este loteador e proprietários dos lotes, em detrimento do tratamento dado à arguida.

19) Sendo que é o próprio presidente da CMFF, pessoa...

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