Acórdão nº 08A4106 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Outubro de 2009

Magistrado ResponsávelMOREIRA ALVES
Data da Resolução13 de Outubro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

N Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA A REVISTA Sumário : I - Decorre do disposto nos arts. 1027.º e 1208.º do CC, que o empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato, visto que se encontra adstrito a uma obrigação de resultado.

II - Detectado o defeito pelo dono da obra e denunciado dentro dos prazos legais, o empreiteiro é responsável por todos aqueles, relativos à qualidade dos materiais aplicados (se não forem fornecidos pelo dono da obra), podendo o dono exigir a sua eliminação, ou, no caso de não puderem ser eliminados, nova construção, salvo se as despesas forem desproporcionadas em relação ao proveito – art. 1221.º do CC.

III - Não sendo eliminados os defeitos ou construída nova obra, o dono da obra pode exigir a redução do preço ou a resolução do contrato, se os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que se destina – art. 1222.º do CC –, tudo sem prejuízo de exigir cumulativamente uma indemnização nos termos gerais – art. 1223.º do CC.

IV - Os direitos conferidos ao dono da obra pelos arts. 1221.º e 1222.º do CC não podem ser exercidos arbitrariamente, nem existe entre eles uma relação de alternatividade; existe, sim, uma sequência de prioridades que o dono da obra terá de respeitar.

V - In casu, perante a notícia dos defeitos de natureza estrutural e outros ligados à segurança sísmica de uma moradia, vícios ocultos de que o autor (dono da obra) só teve conhecimento após ter analisado o relatório do estudo que mandou efectuar, impunha-lhe a lei que interpelasse a ré (empreiteira), não para proceder a nova construção, mas para reparar os vícios fundamentais detectados, tudo em conformidade com o disposto no art. 1221.º, n.º 1, do CC.

VI - Pertenceria, então, à ré a opção por eliminar esses defeitos ou construir nova moradia, já que, por qualquer destas vias ficaria satisfeito o interesse do autor (credor). O direito do autor de exigir nova construção só surgiria se a ré, ela própria, a não construísse, ou não reparasse os defeitos.

VII - Não estando provado, no caso concreto, serem incorrigíveis os defeitos comprovadamente existentes (qualquer deles), teria o autor de interpelar a ré para os corrigir em conformidade com o regime legal da empreitada acima explicitado.

VIII - O direito à resolução só nasce estando o empreiteiro em mora relativamente a qualquer das referidas obrigações e desde que transformada a mora em incumprimento definitivo, nos termos do art. 808.º do CC.

Decisão Texto Integral: Relatório Nas Varas Cíveis da Comarca de Lisboa, AA, Intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra BB Resort Turístico de Luxo, S.A., alegando em resumo: - O A. celebrou com a Ré um contrato de empreitada por via do qual a Ré se obrigou a construir uma moradia para o A. mediante o preço de 115.000.000$00 + IVA.

- A Ré construiu tal moradia, mas a mesma apresentava defeitos de construção, que o A. denunciou à Ré.

- Apesar das reparações efectuados pela Ré, a moradia continuou a apresentar defeitos.

- veio, entretanto, o A. a apurar que a causa desses defeitos é a deficiente concepção e execução do projecto da moradia.

- Tais defeitos não podem ser eliminadas.

- Impõe-se, por isso, a demolição da moradia e a construção de outra.

- A Ré, porém não deu o seu acordo à demolição, pelo que o A. deu o contrato de empreitada como resolvido, - o que tudo provocou incómodos e despesas para o A. que devem ser ressarcidos.

Pede, então, que seja julgada justificada a resolução do contrato de empreitada celebrado entre o A. e a Ré em 12/11/94 e, consequentemente, que a Ré seja condenada: - a pagar ao A. a quantia de 573.618,00 € correspondente ao preço do edifício construído pela Ré, mas que tem de ser demolido, acrescida do valor que o mesmo edifício custaria em 2002, que estima em 246.655,00 € (o acréscimo); - a indemnizar o A. dos custos da demolição, que calcula em 150.000€; - a indemnizar o A. pelos incómodos inerentes, designadamente pela perda de repouso sofridos, em quantia que computa em 60.000 €; - a indemnizar o A. pela deterioração dos objectos decorativos que se encontram no edifício a demolir, bem como pelas despesas de armazenamento dos que não se deteriorarem, em quantia que computa em 30.000 €, e, - a indemnizar o A. pelo tempo que ficará privado da moradia, em 12.500 € mensais, num total de 150.000 €.

Citada a Ré contestou, pugnando pela improcedência da acção. Para o caso de procedência, deduziu pedido reconvencional (que aqui não interessa considerar)Houve réplica e tréplica.

Foi proferido despacho saneador, fixaram-se os factos assentes e organizou-se a base instrutória.

Procedeu-se a julgamento e, fixada a matéria de facto, foi proferida sentença final que julgando a acção parcialmente procedente (e improcedente a reconvenção) decidiu: “ Condeno a Ré a pagar ao A. e esposa (que entretanto veio intervir nos autos), em conjunto, as quantias que vierem a ser apuradas, em incidente de liquidação, correspondentes: - aos danos não patrimoniais (incómodos) sofridos pelo A. e mulher; - (às) necessárias à reparação das anomalias detectadas e descritas ou necessária à demolição e reconstrução de moradia igual à construída pela Ré, se este montante não for superior àquele; - aos danos correspondentes à privação da moradia durante o período de tempo necessário à reparação ou demolição e reconstrução; - ao custo de armazenamento dos objectos da casa.

No mais julgo a acção improcedente, absolvendo a Ré do respectivo pedido.

Julgo improcedente a excepção de caducidade e as pretensões invocados pela Ré, do que absolvo o A.”.

Inconformada recorreu a Ré e também o A., este subordinadamente.

Apreciando as apelações, a Relação julgou-os parcialmente procedentes e consequentemente: - revogou a sentença recorrida; - julgou justificada a resolução do contrato relativo à construção da moradia celebrado entre o A. e a Ré, e - condenou a Ré a pagar ao A. e mulher, em conjunto, as quantias seguintes: a) 573.618,00 €, correspondente ao preço pago pelo A.

  1. a correspondente aos custos com a demolição da moradia e transporte a vazadouro dos materiais decorrentes daquela, que se vier a apurar em incidente de liquidação até ao valor de 150.000,00 €.

  2. 15.000 €, correspondente à indemnização pelos danos não patrimoniais.

Novamente inconformados voltam a recorrer a Ré e o A., este subordinadamente, agora de revista e para este S.T.J..

ConclusõesApresentadas tempestivas alegações formularam os recorrentes as seguintes conclusões: Conclusões da Revista subordinada do Autor - CONCLUSÕES.

  1. Recorrida/Ré e Recorrente/Autor ajustaram o preço da empreitada para construção da moradia do Autor por Esc: 115.000.000$00 em 1994.

  2. O Recorrente/Autor pagou aquele preço em 1994.

  3. Desde a celebração do contrato até à data presente, vão decorridos 14 anos.

  4. Os preços no consumidor, desde 1994 até Agosto de 2008, sofreram um aumento de 44,4 %.

  5. Objectivamente, e para o cidadão normal, era imprevisível que passados 14 anos após a adjudicação da construção de uma vivenda, a mesma não estivesse concluída sem defeitos, ou não estivesse reembolsado das quantias pagas.

  6. Um cidadão normal não incluiria nos riscos do negócio uma delonga de 14 anos na resolução de questões relativas à construção de uma moradia.

  7. A construção da moradia devia ser concluída no prazo de um ano, ou seja 11.12.95.

  8. A restituição do preço pago há 14 anos, sem qualquer actualização, ofende as regras da equidade e não se inclui nos riscos próprios do negócio.

  9. A actualização das obrigações pecuniárias é possível ao abrigo do art.° 551° do C. Civil, com recurso à alteração das circunstâncias em que as partes celebraram o contrato, nos termos do art.° 437° do C. Civil.

  10. O Recorrente/Autor, peticionou na Petição Inicial e na Apelação o pagamento de indemnização correspondente ao preço actual da construção da vivenda que é de €: 828.304,39.

  11. O recurso objecto da...

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