Acórdão nº 08S2587 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Setembro de 2009

Data30 Setembro 2009
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : I - Formulando-se na petição inicial um pedido de condenação em quantia certa, que inclui juros legais e retribuições vencidas, e pedindo-se também os juros e retribuições vincendas, o valor destes juros e prestações não tem qualquer influência na determinação do valor da causa, já que, como resulta do disposto nos arts.º 305.º, 306.º e 308.º do CPC o valor da causa reporta-se aos interesses já vencidos à data da formulação do pedido, sendo irrelevantes para tal fixação os valores dos interesses que se venham a vencer durante a sua pendência.

II - Formulado pedido reconvencional, o valor da causa passa a corresponder ao da soma dos pedidos: principal e reconvencional.

III - A rejeição, por inadmissibilidade legal, do pedido reconvencional importa apenas para efeitos de tributação do reconvinte, mas já não para efeitos do valor da causa que fica inalterado após a dedução da reconvenção, independentemente da sorte desta.

IV - No domínio da vigência do art.º 43.º do DL n.º 409/71, de 27 de Setembro, e tendo presente o princípio da liberdade contratual e, até, da igualdade, não se descortina qualquer fundamento para a interpretação no sentido de o trabalho a tempo parcial só poder ser estabelecido por negociação colectiva, antes, face àqueles princípios, deve concluir-se pela admissibilidade do trabalho a tempo parcial em relações de trabalho não abrangidas, ou à margem, daquela regulamentação.

V - A circunstância de a Lei n.º 103/99, de 26 de Julho, só considerar trabalho a tempo parcial o que corresponda a um período normal de trabalho semanal igual ou inferior a 75% do praticado a tempo completo, numa situação comparável, não significa que a celebração de contratos de trabalho com duração superior a 75% do contrato de trabalho a tempo completo seja contrária à lei uma vez que tal interpretação atentaria contra os interesses dos próprios trabalhadores.

VI - Assim, é de considerar válido, no âmbito de vigência da Lei n.º 103/99, de 26 de Julho, o vínculo que existiu entre Autora e Ré e nos termos do qual aquela se obrigou a prestar a esta a sua actividade 32h30m por semana contra o pagamento proporcional da respectiva retribuição.

VII - A resolução do contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador, com fundamento em justa causa subjectiva, pressupõe a imputação à entidade empregadora de um comportamento culposo, violador dos seus deveres contratuais, de que resultem efeitos de tal modo graves que determinem a impossibilidade de manutenção da relação laboral.

VIII - No escrito resolutivo, o trabalhador tem que indicar quais os factos que constituem justa causa, só estes podendo, posteriormente, vir a ser invocados em acção judicial que intente contra a entidade empregadora com fundamento na referida resolução do contrato de trabalho.

IX - Não constitui fundamento de resolução do contrato de trabalho a redução do horário de trabalho da Autora – e consequente proporcional redução da respectiva retribuição – quando se desconhecem os motivos ou causa por que ocorreu aquela redução, mormente que se tenha devido a vontade unilateral da Ré e, consequentemente, a sua actuação ilícita.

Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I – No Tribunal do Trabalho de Bragança, e em acção com processo comum, a autora AA pediu a condenação da ré BB a: 1. reconhecer a existência de justa causa e a licitude da rescisão do contrato de trabalho por ela (autora) levada a cabo, com efeitos a partir de 19 de Fevereiro de 2003; 2. pagar à autora: a) uma indemnização no valor correspondente a um mês de remuneração de base por cada ano de antiguidade ou fracção, até à data da sentença, que liquidou, em Abril de 2003, no montante de € 3.952,00 (€ 494,00 x 8 meses); b) a quantia de € 10.170,77, a título de diferenças nas remunerações base auferidas e devidas entre Janeiro de 1997 e Fevereiro de 2003; c) a quantia de € 161,00, relativa a subsídio de refeição devido desde a prestação de trabalho nos meses de Janeiro e Fevereiro de 2003; d) a quantia de € 201,96, devida a título de diuturnidades vencidas entre Setembro de 2000 a Dezembro de 2001; e) a quantia correspondente a juros de mora, à taxa legal, sobre tais importâncias, desde a respectiva constituição em mora, e vincendos até integral e efectivo pagamento.

Para o efeito, alegou, em resumo, que, em 3 de Setembro de 1996, foi admitida ao serviço da ré, por tempo indeterminado, para exercer as funções de assistente de consultório, com um horário diário de 8 horas, de 2.ª a 6.ª feira, e que a partir de 2 de Janeiro de 2003, a ré lhe alterou e reduziu, unilateralmente, o horário de trabalho, passando a fazer um horário diário entre as 14.30 horas e as 19.00 horas, tendo-lhe, também, reduzido a respectiva remuneração mensal.

Mais alegou que, não obstante prestar diariamente entre uma hora e uma hora e meia de trabalho suplementar, a ré não lhe pagou o mesmo, factos que associados à «pressão» que a mesma ré lhe fez ao longo do mês de Janeiro de 2003, para se “despedir”, a levaram a rescindir o contrato de trabalho, com invocação de justa causa, com efeitos a partir de 19 de Fevereiro de 2003.

Acrescenta, por fim, que a ré não lhe pagou a remuneração devida em conformidade com o estipulado no CCT, assim como subsídio de refeição referente aos meses de Janeiro e 13 dias de Fevereiro de 2003, quantia devida a título de diuturnidades e, ainda, a remuneração correspondente a 19 dias de Fevereiro de 2003.

A ré contestou, sustentando, em suma, que a autora foi contratada em regime de trabalho a tempo parcial, o qual vigorou até Janeiro de 2003, e em função do qual foi remunerada, negando, por isso, que lhe sejam devidas quaisquer quantias a título de diferenças salariais, de diuturnidades ou de subsídio de refeição – sendo-lhe tão só devida a remuneração referente aos dias (9) em que trabalhou em Fevereiro de 2003 –, negando ainda que exista fundamento para a autora rescindir com justa causa o contrato de trabalho.

Pugna, por isso, pela improcedência da acção e, em reconvenção, formulou o pedido de indemnização de € 5.000,00, por alegados danos não patrimoniais que a conduta da autora lhe provocou.

Respondeu a autora, tendo reduzido o pedido quanto às diferenças salariais devidas no ano de 1998 e pugnado pela improcedência da reconvenção.

Os autos prosseguiram os seus termos, sendo de referir, no que ora interessa, que não foi admitido o pedido reconvencional, procedeu-se a audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença, que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a ré a pagar à autora a quantia de € 185,56, acrescida de juros de mora desde 28-02-2003 até integral pagamento, no mais absolvendo a ré do pedido.

Sob apelação da autora, o Tribunal da Relação do Porto concedeu parcial provimento ao recurso e condenou a ré a pagar àquela: a) €1.195,54 a título de diferenças salariais referentes a 1997, 2000, 2002 e Janeiro de 2003; b) €123,20, a título de subsídios de refeição referentes a Janeiro e Fevereiro de 2003; c) €164,05, a título de diuturnidades referentes a Setembro de 2000 a Dezembro de 2001; d) juros de mora, à taxa legal, desde a data do vencimento de cada uma das quantias em dívida até integral pagamento.

II – Novamente inconformada, a autora interpôs a presente revista, em que formulou as seguintes conclusões: 1.ª - A fls. 18, ponto 3.2, o douto Acórdão estabelece que : "Ora, até 27.07.1999 (data da entrada em vigor da Lei 103/99) afigura-se-nos que, razão alguma, de ordem formal ou substancial, impedia que se considerasse, como se considera, que a A. prestava o seu trabalho em regime de trabalho a tempo parcial." 2.ª - Salvo o devido respeito, a recorrente entende em sentido contrário, considerando que, até 27-07-1999, beneficiava já de um contrato de trabalho por tempo indeterminado, a tempo completo.

  1. - Até à entrada em vigor da Lei n° 103/99, de 26 de Julho, a figura do contrato de trabalho a tempo parcial encontrava-se regulada no art. 43º, do Dec. Lei n° 409/71, de 27-09, cujo número 1 estabelece que os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, sempre que tal for consentido pela natureza das actividades ou profissões abrangidas, deverão conter normas sobre o regime de trabalho a tempo parcial.— cfr. fls. 14, douto Acórdão.

  2. - Daqui resulta que o contrato a tempo parcial só seria admitido se previsto em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho aplicável.

  3. - Neste pressuposto, a questão decorrente é saber se é admissível a existência de um contrato a tempo parcial, vigente entre A. e R. a partir de Setembro de 1996, tendo por base a respectiva previsão em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.

  4. - Entendemos que não. Isto porque, nos termos constantes no douto acórdão – fls. 18, in fine – à relação de trabalho da A. e R. é aplicável o CCT celebrado entre a APAC e a FEPCES, " ... publicado no BTE n° 10, de 15.10.80, ex vi da existência de Portaria de Extensão ( PE ), publicada no BTE n° 31, de 22.8.92, assim como as suas alterações..." 7ª - Porém, no referido CCT (com data de 1980), o n° 1 da cláusula 17ª estabelece que o período normal de trabalho é de quarenta e duas horas semanais. Neste pressuposto, o respectivo n° 4 estabelece que " Consideram-se regime de tempo parcial os horários inferiores a trinta e cinco horas semanais, com respeito pelos horários em prática parciais remunerados por tempo inteiro.".

  5. - Por sua vez, a Portaria de Extensão (PE), publicada no BTE n° 31, tem data de 22 de Agosto de 1992 e estabelece no n° 3 que " Não são objecto de extensão determinada nos números anteriores as cláusulas das convenções que violem normas legais imperativas ", previsão que é idêntica à introduzida nas sucessivas PE's publicadas - cfr. douto Acórdão, fls. 19, início.

  6. - Concomitantemente, verifica-se que, por força da entrada em vigor em 1 de Dezembro de 1996 da Lei...

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