Acórdão nº 03734/10 de Tribunal Central Administrativo Sul, 02 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelGOMES CORREIA
Data da Resolução02 de Março de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acorda-se, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo: I. - RELATÓRIO A..., com os sinais identificadores dos autos, interpôs recurso jurisdicional da decisão do Mmo. Juiz do TAF de Sintra, que julgou improcedente a presente impugnação judicial por si deduzida contra a liquidação de IRS do ano de 2004, concluindo assim as suas alegações: l. A sentença ora recorrida resulta de erro de julgamento decorrente da subsunção dos factos considerados provados nas normas aplicáveis, designadamente por errada aplicação do artigo 10.°, n.° 5 do Código do IRS.

  1. Deste modo, e de acordo com o elemento literal da supra referida norma, para que haja exclusão de tributação, é necessário que se verifiquem, cumulativamente, os seguintes requisitos: (iv) O ganho obtido provenha da venda da habitação própria e permanente do sujeito passivo e / ou do seu agregado familiar; (v) O produto daquela venda seja utilizado para a aquisição da propriedade de outro imóvel destinado também à habitação própria e permanente do sujeito passivo e/ou do seu agregado familiar; (vi) O produto obtido com a venda da habitação própria e permanente deverá ser utilizado na aquisição da nova habitação no prazo dos 24 meses posteriores à sua obtenção.

  2. Da letra da lei deve, naturalmente, partir a interpretação. No entanto, esta não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir, a partir dos textos, o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

  3. Com esta norma de exclusão, o legislador, à semelhança de outras normas que existem no nosso ordenamento jurídico-tributário, pretendeu excluir de tributação em IRS o produto da realização da venda da habitação própria e permanente do sujeito passivo, desde que esse produto fosse utilizado na aquisição de novo imóvel com o mesmo destino - habitação própria e permanente do sujeito passivo.

  4. Protege-se assim o direito fundamental e constitucionalmente consagrado do direito de habitação de cada indivíduo, isentando de tributação as operações que visem a alteração dessa habitação, a substituição dos prédios a ela destinados, ainda que no sentido da progressiva melhoria da sua qualidade, mas, não naturalmente, os negócios sobre a restante propriedade imobiliária do sujeito passivo.

  5. O que o legislador pretende salvaguardar é que o produto obtido com a venda da sua habitação própria e permanente seja tão só utilizada na aquisição da sua nova habitação própria e permanente.

  6. É por isso que os tribunais superiores e a doutrina, têm entendido que o que importa é que o contribuinte apresente prova idónea que irremediavelmente confirme que o produto obtido com a venda da habitação própria e permanente seja efectivamente utilizado para a aquisição da nova habitação própria e permanente (cfr. Acórdãos do Tribunal Central Administrativo Sul, de 16/10/2007 que julgou o recurso n.° 1597/07, e de 04/11/2008, que julgou o recurso n.° 01575/07).

  7. Aliás a própria Administração Fiscal sempre entendeu assim, olhemos para a Informação n.° 1169/99 de 02/11/1999 DGI/DSIRS: "Uma interpretação que privilegie o rigor formal dos conceitos dirá que a única forma de validamente adquirir um bem imóvel é a escritura pública, nos termos do artigo 875° do Código Civil (...). [No entanto], não é este o entendimento que, melhor concilia a letra da lei com a prossecução da finalidade extrafiscal em que se fundamenta a exclusão tributária.

    Assim, a expressão "aquisição"... deve ser tomada como alusão ...ao conjunto de actos, desde que evidenciados através de qualquer formalidade prevista em lei, que integram o processo aquisitivo do bem.

    A interpretação da norma fiscal deve, nestas circunstâncias atender ... à substância económica do facto sobre o qual incide. É que a " finalidade extrafiscal identificável neste benefício tem um recorte iminentemente económico, destinando-se a garantir a neutralidade fiscal.

    [Pelo que], o produto da venda de imóvel habitado pelo sujeito e o seu agregado familiar, só poderá evidenciar mais-valia, caso não seja consumido da aquisição de outro imóvel que na economia do sujeito e do agregado familiar desempenhe a mesma função." (cfr.

    Documento n.° 1 que se junta e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).

  8. Por outro lado, entendeu Supremo Tribunal Administrativo que "(...) o que se torna decisivo, em face da lei, para a exclusão da tributação em sede de IRS (mais-valias) é a prova de que foi feito um reinvestimento, ou seja que o produto da alienação tenha sido utilizado na aquisição de outro imóvel destinado a habitação (...) (cfr. Acórdão do STA, Processo n.° 0892/08 de 11/02/2009 com o Relator Miranda de Pacheco).

  9. No que se refere ao imóvel sito em Torres Vedras, terreno para construção, decidiu bem a sentença ora recorrida, uma vez que o sujeito passivo, ora Recorrente, não tinha aqui a sua habitação própria e permanente.

  10. Com efeito, não se encontra preenchido o 1° requisito desta norma de exclusão: (i) Ganho obtido provenha da venda da habitação própria e permanente do sujeito passivo e /ou do seu agregado familiar.

    XII.Já no que respeita ao produto obtido com a venda do imóvel sito no Lumiar, a sentença a quo não decidiu em conformidade com o quadro normativo vigente supracitado e, por isso, deverá ser anulada nesta parte.

    XIII.Com efeito, todos os requisitos exigidos pelo n.° 5 do artigo 10.° do Código do IRS encontram-se preenchidos no caso ora controvertido: (i) O imóvel do Lumiar (melhor descrito nos presentes autos) era a habitação própria e permanente do ora Recorrente, pelo que, o ganho obtido com a venda deste imóvel deverá ser relevado para efeitos de exclusão de tributação; (ii) O produto obtido com a venda do imóvel do Lumiar foi integralmente utilizado para a aquisição do imóvel do Estoril que passou a ser a habitação própria e permanente do sujeito passivo e / ou do seu agregado familiar; (iii) O produto obtido com a venda do imóvel do Lumiar foi integralmente utilizado no prazo dos 24 meses posteriores à sua obtenção na compra do imóvel do Estoril, que passou a ser a habitação própria e permanente do ora Recorrente.

    XIV.Deste modo, e encontrando-se os três requisitos cabalmente provados, dúvidas não subsistem de que, o produto obtido com a venda do imóvel do Lumiar deverá ser excluído de tributação nos termos do n.° 5 do artigo 10.° do Código do IRS, pelo que, deverá a sentença ora recorrida ser anulada nesta parte por violação da norma vertida no n.° 5 do artigo 10.° do Código do IRS.

    Termos em que deverá o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência anulada a douta sentença recorrida, na parte respeitante ao valor resultante da venda da fracção do Lumiar reinvestido na aquisição da fracção situada no Estoril, com as demais consequências legais.

    Não houve contra –alegações.

    A EPGA pronunciou-se no sentido da procedência do recurso.

    Os autos vêm à conferência com dispensa de vistos.

    * II. - FUNDAMENTAÇÃO: 2.1. - DOS FACTOS: Na sentença recorrida e vista a prova documental produzida foi fixado o seguinte probatório: factos provados A) O Impugnante declarou na declaração de rendimentos, Modelo 3, Anexo G, relativa ao IRS de 2000, no quadro 4 (Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis...), os seguintes rendimentos: a) €187 049,21 (37 500 000$00) proveniente da venda, em 28/11/2000, da fracção autónoma CL do artigo matricial 1432, da freguesia do Lumiar, em Lisboa, conforme escritura pública do 1.° Cartório Notarial de Lisboa, a fls. 8 a 13 do processo administrativo tributário apenso; b) €102 253,57 (20 500 000$00) proveniente da venda, em 27/07/2000, de um terreno para construção sito na freguesia do ..., artigo matricial R …, em Torres Vedras - cfr. fls. 4 a 7 do processo administrativo tributário apenso; B) O Impugnante declarou na...

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