Acórdão nº 01042/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Janeiro de 2010
Magistrado Responsável | PIMENTA DO VALE |
Data da Resolução | 20 de Janeiro de 2010 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1 – A…, SA, melhor identificada nos autos, deduziu, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, embargos de terceiro contra a penhora de um prédio urbano, efectuada no processo de execução fiscal intentada contra B…, Lda.
Aquele Tribunal, por sentença datada de 17/2/06, julgou improcedentes os referidos embargos de terceiro (fls. 188 e segs.).
Inconformada, a embargante interpôs recurso dessa sentença para o Tribunal Central Administrativo Norte que, por acórdão datado de 24/4/08, decidiu “negar provimento ao presente recurso jurisdicional” (fls. 247 e segs.).
Por requerimento datado de 9/5/08, a embargante veio arguir a nulidade daquele aresto, com os fundamentos que constam de fls. 263 e segs., o qual foi indeferido por decisão de 19/6/08 (vide fls. 269 e segs.).
Daquele acórdão, aquela interpôs recurso para o Pleno desta Secção do Contencioso Tributário, invocando como fundamento do mesmo oposição entre esse acórdão e os acórdãos datados de 2/5/01; de 10/4/02 e 27/9/00 prolatados por esta Secção do STA, in recs. nºs 25.843, 26.295 e 23.287, respectivamente e de 26/4/06 prolatado pelo TCAN, in rec. nº 468/04 (fls. 264 e 265).
Em consequência, a embargante foi notificada para, de entre os acórdãos ali identificados, eleger o acórdão tido por fundamento, sob cominação de rejeição do recurso (vide fls. 395).
Na exposição de fls. 397, depois de a embargante referir que no acórdão recorrido se suscitavam diversas questões e que cada um dos acórdãos supra identificados diziam respeito a cada uma dessas questões por si suscitadas no presente recurso, elegeu, por mera cautela de raciocínio, como fundamento o acórdão de 10/4/02, in rec. nº 26.295 (vide fls. 397 a 401).
Admitido o recurso, a recorrente apresentou, nos termos do disposto no artº 284º, nº 3 do CPPT, alegações tendentes a demonstrar a alegada oposição de julgados (fls. 289 e segs.).
Por despacho do Exmº Relator do Tribunal Central Administrativo Norte, considerou-se existir a invocada oposição de acórdãos e ordenada a notificação das partes para deduzir alegações, nos termos do disposto no artº 284º, nº 5 daquele diploma legal (fls. 304).
A recorrente apresentou alegações com as seguintes conclusões: 1. No caso em apreço a questão jurídica fundamental de direito em causa - saber se a posse do promitente comprador anterior ao registo da penhora prevalece sobre esta - divide-se em diversas sub-questões, que mereceram soluções opostas nos acórdãos fundamento e no acórdão recorrido.
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Enquanto o Acórdão fundamento do Supremo Tribunal Administrativo de 2 de Maio de 2001 entende que o promitente-comprador com detenção ou tradição tem direito de retenção (art° 755º, n° 1 f) do Código Civil) e, se tem esse direito, tem direito a usar dos meios possessórios para defesa desse direito lesado com a penhora (art°s 759°, n° 3 e 670° a) do Código Civil), valorizando o documento que contém o contrato promessa, o Acórdão recorrido não atribui qualquer relevância ao contrato promessa de compra e venda no qual se alicerça a posse da Recorrente.
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O contrato promessa de compra e venda, junto a fls. 23 preenche todos os requisitos legais para ser plenamente válido e eficaz.
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Além disso, à data da celebração desse contrato, a Recorrente estava isenta do pagamento do imposto de Sisa, de acordo com o disposto nos art°s 11°, n° 3 e 13°-A do Código da Sisa e do Imposto Sobre Sucessões e Doações.
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Nessa ocasião, a Recorrente fez o registo provisório da aquisição a seu favor e o seu Administrador Único fez constar do Relatório de Gestão e Contas do exercício de 2001 o adiantamento de Eur: 224.459,06 efectuado para aquisição do prédio urbano em questão.
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Ao ignorar a celebração do contrato promessa, pelos motivos que enunciou, além de perfilhar solução oposta aos dos citados Acórdãos fundamento, o Acórdão recorrido violou o disposto no artº 410º do Código Civil e a jurisprudência fixada no assento 15/94 de 12.10.
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O Acórdão recorrido está ainda em oposição com o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10 de Abril de 2002, que entende igualmente que o promitente comprador que realiza actos materiais correspondentes ao exercício do direito de propriedade pode ter acesso aos meios de tutela da posse, admitindo como válido o contrato promessa outorgado entre as partes.
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O Acórdão recorrido não teve em consideração as circunstâncias especiais do caso em apreço, entre as quais o facto de a Recorrente não ter adquirido o imóvel para nele instalar a sua sede ou um estabelecimento, mas antes tendo em vista o seu arrendamento ou revenda (dado que é esse precisamente o seu objecto social).
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O Acórdão recorrido desvalorizou a prova testemunhal produzida alicerçado na errónea, incompreensível e infundada conclusão de que as testemunhas inquiridas tinham interesse na causa.
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Também sobre a qualidade terceiro da Recorrente/Embargante, o Acórdão recorrido consagra solução oposta à do Acórdão fundamento do Supremo Tribunal Administrativo de 27 de Setembro de 2000, porquanto este entende que “terceiros, para efeitos do disposto no art° 5° do Código do Registo Predial, são os adquirentes de boa fé, de um mesmo transmitente comum, de direitos incompatíveis, sobre a mesma coisa”, em conformidade com a jurisprudência fixada pelo Acórdão n° 3/99 do STJ, e aquele (o Acórdão recorrido) aplica o Acórdão do STJ uniformizador de jurisprudência nº 15/97, entretanto revogado pelo referido Acórdão do STJ n° 3/99.
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A concepção restrita de terceiros para efeitos de registo predial adoptada pelo Ac. do STJ n° 3/99 foi expressamente acolhida no Código do Registo Predial, o que implica que o direito da Recorrente, ainda que não registado, é oponível à Fazenda Nacional, uma vez que esta não é considerada “terceiro para efeitos de registo”, ou seja, a Recorrente pode deduzir, com êxito, embargos de terceiro contra a penhora.
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Demonstraram-se nos autos os elementos subsumíveis à noção de posse e, designadamente, a prática, pela Recorrente dos actos materiais correspondentes ao exercício do direito de propriedade em nome próprio, com intenção de exercer sobre a coisa um direito real, ou, quando muito, a manutenção de um estado de facto em que não surgiram quaisquer obstáculos à prática de actos materiais.
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A diversa concepção da posse adoptada pelos Acórdãos fundamento (não se exigindo contacto material, mas apenas a possibilidade desse contacto) e o Acórdão recorrido (segundo o qual a posse se traduz numa relação material, num poder físico) levou a que naqueles Acórdãos se analisasse a factualidade...
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