Acórdão nº 0542/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Janeiro de 2010
Magistrado Responsável | COSTA REIS |
Data da Resolução | 14 de Janeiro de 2010 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam em conferência no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: O MUNICÍPIO DE SANTA COMBA DÃO interpôs - nos termos do art.º 152.º do CPTA - recurso para a uniformização de jurisprudência do Acórdão do TCAN, de 19/02/2009, - que confirmou a sentença proferida no TAF de Viseu que indeferiu a suspensão de eficácia do Despacho Conjunto do Sr. Ministro das Finanças e do Sr. Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local, de 5/12/2007, que determinou a aplicação àquele Município de uma redução de 10% no âmbito da transferência do Fundo de Equilíbrio Financeiro, com início Dezembro de 2007 - alegando que essa decisão estava em contradição sobre a mesma questão fundamental de direito com o que se havia sentenciado no Acórdão do TCAS de 29/05/2008 (rec. n.º 3789/07).
Rematou as suas alegações do seguinte modo: 1. O Acórdão prolatado, em 19.02.2009, pelo Tribunal Central Administrativo Norte (Processo n.° 244/08.7BEVIS-A), que negou provimento ao recurso jurisdicional interposto da Sentença, datada de 22.10.2008, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, no Processo n.° 244/08.7BEVIS-A (Acórdão impugnado) colide, frontalmente, com anterior Acórdão, já transitado em julgado, prolatado pelo 2.° Juízo, 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul, no Processo n.° 03789/08 (Acórdão fundamento); 2. Tal contradição incide sobre a mesma questão fundamental de direito (interpretação e aplicação do requisito do periculum in mora no âmbito de providências cautelares conservatórias com idêntico quadro factual, documental e jurídico), tendo o Acórdão impugnado negado provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo Recorrente, recusando, portanto, a concessão da providência cautelar de suspensão de eficácia do acto suspendendo, por entender não se encontrar preenchido o pressuposto do periculum in mora, enquanto o Acórdão fundamento, ao conceder total provimento ao recurso jurisdicional interposto pelo Município de Fornos de Algodres, determinou a suspensão da eficácia do despacho suspendendo, por considerar verificado quer o pressuposto da ponderação de interesses (n.° 2, do artigo 120°), quer os demais requisitos legais (desde logo o do periculum in mora), previstos na alínea b), do n.° 1.º do artigo 120.°. Com efeito: 3. Por um lado, no Acórdão impugnado o TCAN sustentou, erradamente, que (i) não foi invocada a situação contabilística concreta da autarquia e que (ii) não constitui, só por si, um prejuízo irreparável o facto das retenções mensais levarem a um pior serviço público aos munícipes; 4. Enquanto, no Acórdão fundamento o TCAS defendeu que os interesses municipais deveriam prevalecer sobre os interesses estaduais, dando, igualmente, como integralmente verificados, ainda que de modo implícito ou indirecto, quer o pressuposto do fumus non malus iuris, quer o requisito do periculum in mora, na esteira do juízo decisório efectuado, em primeira instância, pelo TAF de Castelo Branco no Processo n.° 64108.9BECTB-A; 5. Aliás, o TCAS, no Acórdão fundamento, não deixou de afirmar o seguinte: Num contexto, claramente indiciado, de grave situação económica, o Município ver-se-ia forçado a cortar nas despesas até à decisão final a proferir no processo principal. O que significa, é evidente, uma redução do serviço público prestado pelo município às populações locais. E constituiu uma situação irreversível no plano dos factos, uma vez que não é possível reverter no plano dos factos a redução da prestação desse serviço no período em que durar o processo principal (...) (pg. 17 do doc n.° 4); 6. Diga-se, aliás, que a apreciação do requisito da ponderação de interesses, segundo critérios de proporcionalidade (cfr. n.° 2, do artigo 120.° do CPTA), consubstancia um juízo de verificação, temporal e logicamente, posterior à indagação atinente aos demais pressupostos legais (cfr. alíneas b) e c) do n.° 1, do artigo 120.° do CPTA), o que significa que a realização, em concreto, desse juízo de proporcionalidade não assume natureza puramente autónoma, antes dependendo do prévio e exacto preenchimento dos restantes requisitos legalmente previstos, entre os quais figura, de modo especial, o requisito do periculum in mora, que fornecerá ao julgador o exacto “peso” de um dos “pratos da balança” (prejuízos para os interesses do Requerente da providência cautelar), a tomar em linha de conta no exercício de ponderação previsto no n.° 2, do artigo 120.° do CPTA; 7. Ainda que não se dê como verificada a existência de uma contradição entre o Acórdão impugnado e o Acórdão fundamento, o que não se concede, sempre se dirá que o Acórdão impugnado colide, frontalmente, também, com o Acórdão prolatado, em 25.10.2007, pelo 2.° Juízo do TCAS, no Processo n.° 02942/07, no qual se deu como verificado o requisito do periculum in mora num caso em tudo análogo ao presente; 8. O Acórdão impugnado encontrando-se juridicamente inquinado por errada interpretação e aplicação do requisito do periculum in mora, legalmente estabelecido na alínea b), do n.° 1, do artigo 120.° do CPTA, tendo o TCAN adoptado uma interpretação demasiado exigente — em rigor, uma interpretação extra legem — e, nesse medida, uma interpretação em patente desconformidade com o quadro jurídico vigente quanto ao mencionado pressuposto legal; 9. Ao contrário do decidido, deveria o TCAN face à prova produzida com o requerimento inicial de providência cautelar (e à prova potencial que o Tribunal de primeira instância decidiu não mobilizar), ter dado como verificado o pressuposto processual da existência de um fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses do Recorrente, pois é de mediana compreensão que uma diminuição, não previamente prevista, das receitas de um Município durante anos, implica sérios prejuízos no pagamento das despesas previstas e na prossecução do interesse público municipal em geral, que não podem ser reparados mesmo que esse Município — in casu, o Recorrente — venha a receber essas verbas meses ou anos mais tarde; 10. lmprocede o argumento, expresso no Acórdão impugnado, de que o Recorrente não invocou a situação contabilística concreta do Município, porquanto no Documento n.° 9 junto ao requerimento inicial — que consiste numa declaração do Presidente da Câmara de Santa Comba Dão, datada de 31 de Janeiro de 2008 — é feita referência ao sério agravamento do deficit de Tesouraria do Município de € 7.460.34 para € 39.552.34, sendo que esse aumento viria a ter reflexos na actuação diária do Recorrente, fundamentalmente, na dilatação do prazo médio de pagamentos a entidades externas, de forma a não agravar ainda mais os encargos financeiros decorrentes do eventual incumprimento dos prazos com amortizações de empréstimos e juros, factoring e Ieasings; 11. Relativamente ao nível da despesa capital, resulta ainda desse Documento que o resultado negativo é bastante considerável se tomarmos em linha de conta o atraso e adiamento de investimentos já assumidos pelo Recorrente, em contratos-programa (no montante de € 409.000,00) e noutras obras executadas directamente pelo Recorrente; 12. A redução das transferências orçamentais do FEF, colocaria, inevitavelmente, em risco o cumprimento integral de um conjunto de pagamentos obrigatórios e em curso (ainda que não se possa indicar com precisão qual a obra ou obras que vão ser especificamente afectadas, pela inexistência de uma consignação das verbas do FEF a quaisquer despesas), entre os quais os pagamentos decorrentes das obras já adjudicadas pelo Recorrente, muitas das quais já concluídas e em fase de pagamento, aqui se incluindo a Empreitada de Recuperação de Valorização do Património, da Paisagem e dos Núcleos Populacionais em Meio Rural na Colmeosa-Couto do Mosteiro, a criação de Espaços Públicos de Acesso à Internet na Biblioteca Municipal e na Casa da Cultura...
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