Acórdão nº 0786/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Janeiro de 2010

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução13 de Janeiro de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:- Relatório -1 – A Federação Portuguesa de Futebol recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, de 22 de Abril de 2009, que julgou improcedente a oposição por si deduzida à execução fiscal n.º 2194199201023691 e apensos, instaurada no Serviço de Finanças do Montijo com vista à cobrança coerciva da quantia de € 241.235,33, apresentando para tal as seguintes conclusões:

  1. O ponto deste recurso é que a matéria fáctica assente não consente que se julgue a Oponente parte legítima, que de facto o não o é, porque não actuou em nome próprio nos actos em causa neste processo, nomeadamente no auto de dação em pagamento de fls….

  2. Não há qualquer elemento fáctico ou documento (maxime uma procuração) que permita sustentar que a Oponente actuou em nome próprio do auto de dação em pagamento.

  3. Na sentença recorrida invocam-se os arts. 22º nº 2 da LGT e 512º e 513º do C.C. para demonstrar que, no âmbito tributário, também pode haver uma responsabilidade solidária. Vamos aceitar tal pressuposto.

  4. Só que, não sendo a Oponente devedora originária dos débitos tributários em causa, tal responsabilidade solidária só poderia recorrer (sic) ou directamente da lei – o que não acontece – ou de qualquer manifestação da sua vontade, validamente expressa, no sentido da assunção dessa obrigação – o que também não acontece.

  5. É por isso que a sentença se refugia no despacho ministerial “supra” referido, o qual, porém, apenas apresenta a perspectiva ou, quiçá, o desejo da Administração Fiscal, mas não pode “ipso facto” vincular a Oponente.

  6. E – no mais – não há qualquer facto assente ou documento donde decorra que a Oponente, enquanto tal, se vinculou ao pagamento das responsabilidades em apreço.

  7. A procuração referida na alínea G) dos factos assentes da sentença ora recorrida até expressamente admite que o Presidente da Federação Portuguesa de Futebol interveio no auto de dação no âmbito de procurações emitidas pelos clubes, “in casu” pelo CLUBE DESPORTIVO DO MONTIJO, pelo que, “ipso facto”, aí não estaria a vincular a ora Oponente.

  8. A sentença recorrida violou os princípios gerais da representação voluntária – “maxime”, o art. 258° do C.C. –, uma vez que sustenta que a Recorrente actuou em nome próprio no auto de dação em causa, sem invocar qualquer documento ou facto de onde isso se possa extrair.

  9. Por outro lado, a sentença recorrida violou o disposto nos arts. 595° n° 1 do C.C. e 7° n° 1 do D.L. n° 124/96, que estabelecem o enquadramento legal da assunção de dívida em apreço por terceiros, quando tal art. 7° exige que tais terceiros prestem garantia pelo valor desse capital e formulem requerimento nesse sentido, sendo manifesto que nenhum desses requisitos foi preenchido.

  10. Finalmente, não pode deixar de se colocar da inconstitucionalidade – e até da violação da CEDH – do entendimento normativo dado aos arts. 22º nº 2 e 41º nº 1 da LGT, devidamente conjugados com o art. 7º nº 1 do D.L. nº 124/96 e com os arts. 512º, 513º e 595º do C.C., no sentido de que é possível imputar uma responsabilidade tributária a quem não é devedor de um crédito tributário sem que isso decorra directamente da lei ou de qualquer assunção de dívida por si subscrita.

  11. Tal entendimento normativo violaria o direito de propriedade privada e o princípio constitucional da protecção da confiança.

  12. A Oponente é parte ilegítima, o que a sentença recorrida erroneamente não considerou.

    Termos em que o recurso merece provimento, com as legais consequências.

    2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

    3 – O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer nos seguintes termos: A questão objecto do presente recurso consiste em saber se assume voluntariamente a dívida exequenda a associação desportiva (FPF) que interveio em nome de um seu associado num auto de aceitação de dação em pagamento.

    Alega a recorrente que não há qualquer elemento fáctico ou documento (maxime uma procuração) que permita sustentar que a Federação Portuguesa de Futebol actuou em nome próprio do auto de dação em pagamento.

    E que a sentença recorrida violou os princípios gerais da representação voluntária – maxime, o art. 258.º do C.c.-, uma vez que sustenta que a Recorrente actuou em nome próprio no auto de dação em causa, sem invocar qualquer documento ou facto de onde isso se possa extrair.

    Afigura-se-nos que o recurso não merece provimento.

    Antes de mais cumpre salientar que a questão objecto do recurso foi já tratada em dois acórdãos deste Supremo Tribunal Administrativo, que versaram casos em tudo idênticos ao dos presentes autos, em que era oponente a Federação Portuguesa de Futebol e em que se analisou o auto de dação em pagamento referido no probatório (pontos G e H).

    Ora do referido auto de dação em pagamento (a fls. 34) consta que os termos da dação definida no Despacho n.º 7/98 – XII de 4 de Março do Secretário de estado dos assuntos Fiscais passaram a fazer parte do mesmo, facto que foi aceite pelo representante da ora recorrente Federação Portuguesa de Futebol.

    Daí que, como se sublinha no Acórdão do Supremo tribunal administrativo de 19.03.2009, recurso 866/09 (e também no Acórdão 233/07, já citado na decisão recorrida) assumirá «voluntariamente a dívida exequenda a associação desportiva que interveio em nome de um seu associado num auto de aceitação de dação em pagamento (…) O facto de ter iniciado todo este procedimento na qualidade de gestora de negócios dos clubes de futebol e de ter subscrito o aludido auto de dação na qualidade de representante desses clubes não significa, nem é impeditivo, que a associação desportiva não pudesse assumir, como o fez, na qualidade de terceiro, responsabilidades na garantia da dívida ou que o credor não pudesse condicionar a aceitação da dação à assunção da dívida remanescente por parte daquela».

    Mas a recorrente invoca ainda uma questão nova que é da inconstitucionalidade do entendimento normativo dado aos arts. 22º nº 2 e 41º nº 1 da LGT, devidamente conjugados com o artº 7º nº 1 do D.L. nº 124/96 e com os arts. 512º, 513º e 595º do Cod. Civil, por violação dos princípios constitucionais da confiança e da propriedade privada.

    Também aqui não deverá proceder a sua argumentação.

    Em primeiro lugar e quanto à violação do princípio da confiança, porque faz um apelo genérico ao princípio, sem concretizar em que termos e porque razões ocorre tal violação.

    Em segundo lugar, e quanto à violação do direito de propriedade privada, porque se entende que o mesmo não é um direito absoluto.

    Com efeito «o dever de pagar impostos é um dever geral...

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