Acórdão nº 01148/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Janeiro de 2010

Data13 Janeiro 2010
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

A…, LDA, com os demais sinais dos autos, recorre da decisão proferida em 25 de Setembro de 2009 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, de improcedência da reclamação que deduziu, ao abrigo do disposto no artigo 276º do CPPT, contra o acto de indeferimento do pedido de declaração de prescrição da dívida exequenda formulado na execução fiscal n.º 2194199901014730.

Terminou a sua alegação enunciando as seguintes conclusões: A- O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, de 25 de Setembro de 2009, que julgou “totalmente improcedente” a Reclamação que havia sido apresentada em 20 de Fevereiro de 2008 pela Reclamante ora Recorrente.

B- Entende a ora Recorrente que a sentença proferida no presente processo pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada assenta no que respeita à análise da matéria de direito que lhe subjaz.

C- No âmbito do presente processo, discute-se se uma dívida respeitante a IRC prescreveu ou não, devendo considerar-se que o facto tributário gerador do referido imposto data de 1994.

D- Nessa data a lei tributária aplicável era o CPT e o prazo de prescrição aplicável era de 10 anos (n.º 1 do artigo 34º do CPT), pelo que o início da contagem do mesmo é fixado em 1 de Janeiro de 1995 (n.º 2 do artigo 34º do CPT); E- São duas as questões nucleares que decidirão o presente recurso: − Sucedendo-se várias causas interruptivas, todas elas produzem tal efeito sobre o prazo prescricional, ou apenas se dará relevância à que se verificar primeiro? (devendo ainda relevar-se que, em concreto, tais causas pertencem a regimes positivos diferentes); − O sistema e pensamento jurídicos permitem, atento o problema geral da sucessão de leis no tempo, a aplicação retalhada de várias normas compreendidas em diferentes diplomas, ou antes impõe a aplicação em bloco de apenas um dos regimes? F- Como resulta já hoje pacífico, é manifesta a ilegalidade e injustiça da aceitação dos efeitos de várias causas interruptivas que se vão sucedendo no tempo, pelo que, atento o caso concreto, a instauração do processo executivo n.º 2194199901014730 não tem a virtualidade de interromper a contagem do prazo prescricional. Assim, unicamente à luz do CPT, não se verificando qualquer outra situação que, nestes exactos termos, pudesse interromper ou suspender - situação nem sequer positivada no CPT - o prazo prescricional, então a dívida de IRC relativa a 1994 encontra-se actualmente prescrita.

G- Quanto à questão de saber se, contrariamente ao que tem vindo a ser pressuposto, é possível ou não a aplicação de dois regimes diversos - CPT e LGT - ao mesmo caso concreto, entende a Recorrente que tal não é possível.

H- A divergência de resultados prático-jurídicos entre as duas perspectivas é notória: na argumentação defendida pela Administração Tributária e secundada na sentença recorrida, a dívida em causa ainda não teria prescrito; na argumentação da ora Recorrente, a dívida em causa havia já prescrito em 1 de Janeiro de 2006.

I- Nestes termos, “Integrando-se a prescrição nos elementos essenciais do imposto, o seu prazo há-de ser, em regra, aquele que está fixado na lei reguladora de tais elementos essenciais à data da constituição da obrigação tributária” (RODRIGUES, Benjamim, ob. cit.), pelo que o sentido “garantístico” do prazo de prescrição compreende também as causas interruptivas da prescrição. Ou seja: o prazo de prescrição é um com as suas causas interruptivas, sob pena de inconstitucionalidade.

J- Esta interpretação decorre, aliás, dos princípios da legalidade tributária e da não retroactividade da lei fiscal, hoje previstos nos nºs 2 e 3 do artigo 103° da CRP. Tal proibição da retroactividade prevista no artigo 103° da CRP homenageia as ideias de previsibilidade e segurança jurídica: o contribuinte deve poder prever o futuro com base nos factos presentes, nomeadamente nas normas jurídicas vigentes.

K- Se fosse possível interpretar/aplicar o artigo 48.° da LGT no sentido da sua aplicação imediata, como pretendido na sentença recorrida, então essa norma seria inconstitucional.

L- Assim, o facto tributário em causa decorreu em 1994, a dívida de IRC, para o período de tributação de 1994 em 1 de Janeiro de 2005 - 10 anos contados de 1 de Janeiro de 1995, salvo se, até esta data, tivesse ocorrido alguma das circunstâncias previstas no n° 3 do artigo 34° do CPT, as únicas susceptíveis de interromper (ou suspender, nos termos da parte final do n° 3 do mesmo artigo) o mesmo prazo de prescrição.

M- Atentas as vicissitudes a que esteve sujeita a suposta dívida em análise, há que considerar que o Recurso Hierárquico (Processo n.° 649/98) foi interposto no dia 20 de Novembro de 1997, pelo que, atento o disposto no n° 3 do artigo 34° do CPT, nessa data, o decurso do prazo de prescrição foi interrompido. Com efeito, apesar de ter sido instaurado processo de execução fiscal, tal apenas sucedeu em 1999, pelo que, o facto interruptivo relevante e único atendível é aquele que ocorreu em primeiro lugar, ou seja, o recurso hierárquico interposto.

N- Verifica-se que, com a interposição do Recurso Hierárquico, a contagem do prazo de prescrição foi interrompida, pelo que o indicado prazo de 10 anos seria contado, já não das datas acima indicadas, mas desde 20 de Novembro de 1997, independentemente do período de imposto a que se reporte a alegada dívida.

O- No entanto, uma vez que aquele Recurso Hierárquico esteve parado por mais de um ano, por facto não imputável ao contribuinte, cessou o efeito interruptivo no momento em que se perfez um ano de paragem do processo, havendo que somar-se o tempo decorrido após esta data com o que decorreu até à data da autuação. Assim, no caso sub judice, o Recurso Hierárquico foi interposto em 20 de Novembro de 1997, e o acto processual imediatamente posterior, a decisão de indeferimento parcial, por despacho do SEAF, data de 27 de Abril de 1999, não tendo tido lugar durante aquele período intermédio qualquer ocorrência processual, incluindo a notificação para exercício do direito de audição, que não teve lugar.

P- Dúvidas não restam que o processo esteve parado por mais de um ano, por facto não imputável à ora Recorrente, o que faz cessar o efeito interruptivo que surgiu com a interposição do Recurso Hierárquico. Concluindo-se que desde 1 de Janeiro de 1995 até à data da autuação, isto é, 20 de Novembro de 1997, decorreram dois anos, onze meses e vinte dias, período que se irá somar ao tempo decorrido depois de o procedimento administrativo ter estado parado por mais de um ano.

Q- Assim, esteve o procedimento de Recurso Hierárquico em apreço parado por mais de um ano, desde o dia 20 de Novembro de 1997 até ao dia 27 de Abril de 1999, pelo que o efeito interruptivo, neste caso, cessou em 21 de Novembro de 1998. E, portanto, a somar ao tempo decorrido até à data da autuação do Recurso Hierárquico, está o tempo que passou desde 21 de Novembro de 1998 até hoje.

R- Pelo que, não haverá como não concluir que a dívida subjacente ao presente Recurso encontra-se prescrita desde 1 de Janeiro de 2006.

S- Não se vislumbra qualquer outra causa que possa ter interrompido (ou suspendido) o prazo de prescrição que se encontrava em curso, por outro lado porque é manifestamente ilegal a aplicação de qualquer norma da LGT ao caso concreto decidendo. Assim, e ainda que se tenha verificado em data posterior à instauração do mencionado recurso hierárquico, uma qualquer circunstância determinante da interrupção do prazo de prescrição, a mesma não terá qualquer repercussão sobre o presente processo, pois esse efeito - interrupção - verificou-se, e consumou-se, em termos definitivos, aquando da interposição do Recurso Hierárquico.

T- Quer, atente-se bem, tal nova causa interruptiva estivesse prevista no CPT, quer posteriormente na LGT.

U- Não pode ser perfilhado o entendimento segundo o qual, apesar de a contagem do prazo de prescrição neste caso em concreto estar sujeita à lei antiga (CPT), para efeitos das causas de interrupção ou de suspensão se aplica a lei nova (LGT), pois tal interpretação é, salvo melhor opinião, inconstitucional.

V- O entendimento supra mencionado é amplamente corroborado pelo Parecer junto aos autos do Ex.mo Senhor Professor Diogo Leite de Campos.

W- Tanto a prescrição como a caducidade do direito de liquidar se fundam em razões “de certeza, de segurança e de paz jurídicas, quer para o Estado quer para os cidadãos”. E, uma outra característica da prescrição das obrigações tributárias, continua o mesmo Autor, é de que elas estão sujeitas ao princípio constitucional da reserva da lei formal.

X- Assim, como o fim da prescrição é essencialmente dar segurança ao devedor tributário, “esta integra-se no elemento essencial dos impostos designado por garantias dos contribuintes a que o n.º 2 art.° 103° da Constituição da República Portuguesa” E, também dispõe a alínea a) do n.º 2 do artigo 8° da LGT, em termos de densificação do princípio constitucional, que os prazos de prescrição e caducidade estão sujeitos ao princípio da legalidade tributária.

Y- Num outro prisma, há também que considerar que, “Integrando-se a prescrição nos elementos essenciais do imposto, o seu prazo há-de ser, em regra, aquele que está afixado na lei reguladora dos tais elementos essenciais à data da constituição da obrigação tributária”. Este é “um simples postulado dos princípios da legalidade tributária, da não retroactividade de lei fiscal” previstos na Constituição da República. De tal forma que, “O direito de crédito do Estado consubstanciado no imposto tem pois estatuto substantivo que está fixado na lei à data da sua constituição. Aplicar uma nova lei a dívidas tributárias constituídas antes, comportando-se o novo prazo desde o momento da constituição dessa dívida, ou seja, desde do momento da ocorrência dos factos tributários se anteriores à vigência do preceito, representa...

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