Acórdão nº 01217/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 06 de Janeiro de 2010

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução06 de Janeiro de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1 – A… requereu neste Supremo Tribunal Administrativo a adopção da providência cautelar de suspensão de eficácia do acórdão do Conselho Superior do Ministério Público, de 20-10-2009, que lhe aplicou a pena disciplinar de inactividade, que foi graduada em 18 meses, bem como do acto do Senhor Procurador-Geral Distrital do … que fixou a data do início da sua execução.

O Requerente defende, em suma, que estão verificados os requisitos para adopção da providência tanto ao abrigo da alínea a) como ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art. 120.º do CPTA e que os danos resultantes da recusa da providência são superiores aos que resultariam da sua concessão, que considera inexistentes.

O Conselho Superior do Ministério Público deduziu oposição em que apresentou as seguintes conclusões: 1. A aplicação da pena de "INACTIVIDADE" É UMA IMPOSIÇÃO LEGAL: é a pena que as normas dos artigos 182º, 183º, 170º e 176º, todos do EMP, mandam aplicar a infracção disciplinar grave, por prática de actos que consubstanciam uma conduta incompatível com o exercício da função de Magistrado do Ministério Público; 2. os prejuízos dela decorrentes são os próprios de uma pena disciplinar que implica o afastamento do exercício de funções e a perda do correspondente vencimento, prejuízos esses que não são irreversíveis ou de difícil reparação; 3. os efeitos do cumprimento de uma pena de "INACTIVIDADE" - afastamento do serviço e perda do vencimento - são essenciais à natureza lesiva e retributiva que ela encerra, são inerentes a ela; 4. a ausência de prejuízos irreversíveis e de difícil reparação merecedores da tutela do direito impõe o INDEFERIMENTO da providência requerida; 5. o acto suspendendo NÃO É NULO, nem padece de qualquer VÍCIO QUE POSSA DETERMINAR A SUA ANULAÇÃO; 6. o decretamento da providência requerida CAUSA PREJUÍZO NO INTERESSE PÚBLICO, reconhecido pela própria lei - artigo 50º, n.º 2, "a contrario" do CPTA - que o CSMP prossegue com o exercício da acção disciplinar materializado na aplicação de penas, cujos efeitos retributivos e preventivos reclamam estabilidade, rigor e firmeza, alcançáveis com uma pronta, pública e exemplar execução das sanções.

Sem vistos, vêm os autos à conferência para decisão 2 – São os seguintes os factos relevantes para a apreciação da providência cautelar:

  1. O Requerente é Procurador da República, exercendo funções no …, desde 24-4-2009; b) Entre 3-10-2000 e 24-4-2009, o Requerente exerceu funções no Círculo Judicial de … e no …, tendo-lhe sido atribuídas classificações de serviço de BOM COM DISTINÇÃO e MUITO BOM; c) Em 21-6-2006, o Requerente participou à Polícia Judiciária que detectara o desaparecimento do disco rígido do seu computador, bem como de diversos processos de inquérito que se encontravam no seu gabinete de trabalho nas Instalações do referido …; d) A Polícia Judiciária, arquivou o processo de inquérito instaurado para averiguar os factos referidos na alínea anterior, sem que tivessem sido recuperados o disco rígido e os processos de inquérito em causa; e) Nessa sequência, por despacho de 5-7-2006, a Senhora Procuradora-Geral Adjunta, Directora do … ordenou ao Requerente que procedesse à reforma dos processos desaparecidos; f) Por provimento n.º 1/2009, de 29-1-2009 da Senhora Procuradora-Geral Adjunta, Directora do …, e por determinação do Senhor Procurador-Geral Distrital do …, os processos na titularidade do Requerente transitaram na sua maior parte para outros Magistrados do Ministério Público; g) Por ofício datado de 16-2-2009, o Senhor Procurador-Geral Distrital do … deu conhecimento ao Senhor Vice-Procurador-Geral da República da existência de processos a cargo do Requerente em risco de prescrição, propondo a realização de inspecção extraordinária; h) Em 17-2-2009, o Senhor Vice-Procurador-Geral da República determinou a realização de inquérito com vista à averiguação da existência de irregularidades na prestação funcional do Requerente; i) Em 25-5-2009, por despacho do Senhor Vice-Procurador-Geral da República, o processo de inquérito foi convertido em processo disciplinar; j) No Relatório Final desse processo disciplinar, o Senhor Instrutor propôs que fosse aplicada ao Requerente a pena de transferência, por ter concluído que havia incorrido na prática de violação continuada do dever profissional de zelo, por – não ter prestado informação e ter incumprido a obrigação de movimentar e despachar, em tempo útil, o processo n.º …, cujo procedimento criminal estava em risco de prescrição; – não ter procedido às diligências de reforma dos processos desaparecidos do seu gabinete; – não ter despachado os processos dentro dos prazos legalmente previstos, cujos procedimentos criminais se encontravam em risco de prescrição k) A Secção Disciplinar do Conselho Superior do Ministério Público, em acórdão de 12-5-2009, entendeu que deveria ser efectuado diferente enquadramento dos factos apurados no processo disciplinar e que deveria ser aplicada a pena de inactividade por um período de dois anos, determinando a devolução dos autos ao Instrutor do processo para a realização de novas diligências, bem como para a apresentação de defesa pelo ora Requerente; l) O Requerente veio a exercer o direito de defesa em 17-6-2009, tendo requerido a junção ao processo disciplinar: dos despachos finais proferidos nos 38 inquéritos por cuja prescrição do procedimento havia sido responsabilizado; das comunicações efectuadas pelo … à Procuradoria-Geral da República relativamente à sua pendência, pelo menos desde Setembro de 2007; dos ofícios (desde 28.11.2005 a 25.05.2006) através dos quais lhe foi solicitada informação sobre o andamento do processo n.º …; e do ofício através do qual lhe foi concedido o prazo de 30 dias para a reforma dos processos.

    m) Em 7-7-2009, o Requerente foi notificado da junção ao processo dos elementos probatórios referidos na alínea anterior; n) Em 11-8-2009, o Requerente requereu a emissão de certidão dos elementos probatórios referidos; o) A certidão foi recebida pelo Requerente em 11-9-2009; p) Por acórdão de 11-9-2009, a Secção Disciplinar do Conselho Superior do Ministério Público aplicou ao Requerente a pena disciplinar de inactividade graduada em 18 meses; q) Em 29-9-2009, o Requerente reclamou do acórdão referido na alínea anterior para o Plenário do Conselho Superior do Ministério Público, nos termos que constam da cópia da reclamação a fls. 328-356, cujo teor se dá como reproduzido, em que, além do mais, requereu a realização de diligências de prova testemunhal, invocando o art. 61.º do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores da Função Pública e justificando tal requerimento, «tendo em conta o que agora se alega no Acórdão de 11.09.2009, designadamente quanto ao conhecimento hierárquico das estatísticas»; r) Em 20-10-2009, o Plenário do Conselho Superior do Ministério Público proferiu o acórdão cuja cópia consta de fls. 357-375, cujo teor se dá como reproduzido, em que desatendeu a reclamação e manteve o acórdão da Secção Disciplinar de 11-9-2009; s) Em 11-12-2009, o Requerente foi notificado nos seguintes termos (fls. 128): Por ordem do Senhor Procurador-Geral Distrital fica V. Ex.ª notificado do acórdão de 20 de Outubro de 2009 do Conselho Superior do Ministério Público, que a partir desta data se deve considerar na situação de inactividade, por 18 (dezoito) meses).

    t) Em 14-12-2009, deu entrada neste Supremo Tribunal Administrativo o requerimento de providência cautelar que deu origem ao presente processo; u) Na sequência da recepção do duplicado do requerimento referido em e), o Senhor Procurador-Geral da República, no uso da competência delegada pela deliberação do Conselho Superior do Ministério Público n.º 246/2007, cujo extracto foi publicado no Diário da República, II Série, de 15-2-2007, página 4149, proferiu «resolução fundamentada», nos seguintes termos:RESOLUÇÃO FUNDAMENTADA O Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) tomou conhecimento do pedido de suspensão de eficácia da deliberação do seu Plenário de 20 de Outubro de 2009 que confirmou a decisão da respectiva Secção Disciplinar de 11 de Setembro de 2009, a que aplicou ao Lic. A… a pena disciplinar de “INACTIVIDADE” PELO PERÍODO DE 18 (DEZOITO) MESES, acrescida das sanções acessórias que dela obrigatoriamente decorrem, nos termos do artigo 175°, n°s 1 e 3, aplicável “ex vi” artigo 176°, n° 1, ambos do Estatuto do Ministério Público (EMP), aprovado pela Lei n.º 47/86 de 15 de Outubro, na redacção Introduzida pela Lei nº 60/89 da 27 de Agosto.

    Além disso, o Senhor Magistrado Requerente deduziu pedido de suspensão de eficácia «... da ordem do Sr. Procurador Geral Distrital, notificada ao Requerente em 11 de Dezembro de 2009, que fixa o termo inicial da execução da pena disciplinar aplicada ao Requerente para o dia 14 de Dezembro de 2009” — sic. Fls. 53 do requerimento em causa.

    Entende o CSMP que esta ordem constitui um acto de execução, sem lesividade autónoma e, por isso, contenciosamente inimpugnável. Consequentemente, também não poderá ser objecto de providência cautelar.

    No entanto, os efeitos a produzir pela presente RESOLUÇÃO FUNDAMENTADA, que o CSMP apresenta ao abrigo da norma do artigo 128°, n.º 1 do Código do Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) relativamente ao acto punitivo — bem como a decisão a proferir no âmbito da providência cautelar pendente — abrangem necessariamente os do(s) acto(s) que o executam.

    Assim, o CSMP apresentaRESOLUÇÃO FUNDAMENTADAà qual se reporta o artigo 128° n.º 1 do CPTA, o que faz nos termos seguintes: Independentemente das razões de ilegalidade que o Lic. A… aponta à deliberação punitiva, que se contestarão em sede própria, a interposição da providência cautelar de suspensão de eficácia de tal deliberação implica para o CSMP a proibição de Iniciar ou prosseguir a respectiva execução, salvo se reconhecer que o diferimento do seu cumprimento é gravemente prejudicial...

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