Acórdão nº 0759/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Dezembro de 2009

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução02 de Dezembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

B… recorre da sentença do TAF de Lisboa que julgou parcialmente procedente a acção que - na qualidade de Administrador da Falência de C… - intentou contra o Município de Lagos pedindo a sua condenação no pagamento de uma quantia que ressarcisse os prejuízos por ele causados após ter tomado posse dos trabalhos, materiais e equipamentos existentes na obra do Mercado de …, em consequência da rescisão do respectivo contrato de empreitada.

Recurso que finalizou com formulação das seguintes conclusões: I.

C… foi declarado falido por sentença de 01.06.1990 de cuja falência foi então nomeado Administrador o ora recorrente.

II.

A Câmara Municipal de Lagos em 13.08.1987 apossou-se dos equipamentos constantes do respectivo auto de posse pertencentes ao recorrente.

III.

Desses equipamentos a Câmara só devolveu à recorrente em 30.11.2004 uma grua Richier, um crivo eléctrico, uma betoneira eléctrica, um balde de 0,5m3, uma betoneira e silo, balanças, uma mini central e dois contentores, por ordem judicial expressa no despacho proferido no processo de liquidação do activo n° 117-A/87 do 2° Juízo da Comarca de Lagos.

IV.

Tais equipamentos foram devolvidos em estado de sucata e sem qualquer valor venal.

V.

Desde que a Câmara Municipal de Lagos se apossou daqueles equipamentos, o falido primeiro e depois o Administrador da Falência, ficaram deles privados não obtendo deles o rendimento normal que os mesmos poderiam proporcionar, utilizados directamente ou alugados.

VI.

O rendimento que os equipamentos de construção civil podem proporcionar são equivalentes ao seu “custo de posse” ou valor de aluguer calculado nos termos previstos para o efeito no artigo 117° do RJEOP vigente ao tempo.

VII.

Por incúria, desleixo e falta de vigilância a Câmara Municipal de Lagos deixou perecer todos os equipamentos de se apossara, uns porque os deixou furtar e outros porque se tornaram apenas sucata sem qualquer valor.

VIII.

Independentemente do destino que a Câmara Municipal de Lagos deu ou não deu aos equipamentos de que desapossou o falido e manteve até 30.11.2004 na sua posse, os prejuízos que tal desapossamento causou ao falido são indemnizáveis, independentemente do benefício que a Câmara deles tirou (artigo 214° do D.L. 235/86).

IX.

O disposto no artigo 211.° do D.L. 48.871, de 19.02.1969, permite o apossamento dos equipamentos do empreiteiro pelo dono da obra para este os utilizar na conclusão da obra e não para qualquer outro fim.

X.

A citada disposição legal permite também mas não impõe, que o empreiteiro possa reaver os seus equipamentos mediante a prestação de caução do seu valor.

XI.

O empreiteiro, por falta dos equipamentos parou toda a sua actividade, requereu imediatamente a recuperação da sua empresa (Proc. n.° 117/87 do 2° Juízo de Lagos) mas foi declarado falido por sentença de 01.06.1990.

XII.

No estado de “recuperação de empresa” ou de “falido” não poderia este ou o Administrador da Falência prestar qualquer caução para obter a devolução dos seus equipamentos.

XIII.

A Massa Falida tem direito, nos termos do disposto no artigo 214°, n.° 1, do D.L. 236/86 ao valor do “aluguer” dos equipamentos apossados enquanto a posse administrativa durar, que calculado nos termos do artigo 117° do RJEOP aplicável ao tempo era à data da propositura da acção de 64.400.572$00.

XIV.

Uma vez que parte dos bens desapossados ao falido ainda não foram devolvidos e os devolvidos são sucata sem valor deve o seu valor ser pago o qual à data da posse administrativa era de 13.706.522$00.

XV.

Foram violados por não aplicados ou mal interpretadas as disposições conjugadas do artigo 211° do D.L. 48871 de 19.02.1969, artigo 117° do RJEOP e artigo 214° do D.L. 235/86.

XVI.

Nestes termos e nos melhores do Direito aplicável deve o presente recurso provimento e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida e substituída por uma outra que condene o Réu nos pedidos formulados contra ele.

O Município de Lagos contra-alegou para defender a manutenção do julgado, sem, contudo, formular conclusões.

A Ex.ma Procuradora Geral Adjunta pronunciou-se no sentido do provimento parcial do recurso por entender que, se é certo que o apossamento pelo dono da obra dos materiais e equipamentos nela existentes visa não só facultar a sua utilização como garantir o cumprimento das obrigações do empreiteiro, também o é que, em contrapartida, ele assume, relativamente aos bens apreendidos, as obrigações do credor pignoratício, entre as quais se encontram a da sua guarda e a da sua restituição em correcto estado logo que extinta a obrigação. O que não tinha acontecido in casu já que os bens apreendidos foram devolvidos em estado de sucata. O Réu deveria ser, assim, condenado a pagar o valor dos bens de que se apossou, reportado à data da posse, excluído o da grua que fora entregue ao administrador judicial, acrescido dos correspondentes juros.

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

FUNDAMENTAÇÃOI. MATÉRIA DE FACTO A decisão recorrida julgou provados os seguintes factos: 1.

Em 28.4.1986 C…, declarado falido por sentença de 1.06.1990, celebrou com o Réu um contrato de empreitada para a construção do Mercado Municipal de …; 2.

Por deliberação da Câmara Municipal de Lagos de 29.07.1987 - cuja certidão da acta consta de fls. 12 a 14 dos autos - foi rescindido o contrato supra referido e deliberado tomar posse administrativa dos trabalhos; 3.

Em 13.08.1987 foi lavrado o auto de posse administrativa de todos os equipamentos e materiais que se encontravam na obra, sendo as máquinas e materiais os constantes do inventário anexo ao auto de posse, junto a fls. 16 e 17 dos autos cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido; 4.

O Réu incorporou todos os materiais de construção referidos nesse inventário e relacionados no documento de fls. 32 e 33 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido - no acabamento da construção da obra designada por Mercado Municipal de …; 5.

Materiais que tinham em 13.08.1987 o valor de 357.513$00; 6.

O Réu não comprou ou alugou ao empreiteiro os equipamentos/máquinas referidos em 3, nem foi acordado ou fixado qualquer preço para o efeito; 7.

Em 13.7.1990 foram apreendidos, no âmbito do processo de falência de C…, na obra do Mercado Municipal, uma “grua torre richier com 48 metros de altura e 40 metros de lança (...) sobre carris, desmontada, incompleta, com falta de peças, em muito mau estado de conservação, avaliada em 200.000$00” e um “crivo eléctrico, trifásico, marca rabor, só esqueleto” em “muito mau estado”, que foram entregues ao Administrador Judicial; 8.

Os equipamentos (máquinas/ferramentas)...

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