Acórdão nº 251/19 de Tribunal Constitucional (Port, 23 de Abril de 2019
Magistrado Responsável | Cons. Gonçalo Almeida Ribeiro |
Data da Resolução | 23 de Abril de 2019 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
ACÓRDÃO Nº 251/2019
Processo n.º 21/2019
3ª Secção
Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro
Acordam na 3ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, em que é recorrente o Ministério Público e recorrido A., foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), da sentença daquele tribunal de 30 de outubro de 2018.
2. O recorrido resolveu a 30 de agosto de 2014, com fundamento em justa causa, o contrato de trabalho que o ligava a uma sociedade cuja insolvência foi decretada por sentença de 13 de julho de 2015. Uma vez que apenas parte dos créditos laborais reclamados foi reconhecida pelo administrador da insolvência, o ora recorrido impugnou a lista de créditos. Por sentença de 22 de setembro de 2017, foi a impugnação julgada parcialmente procedente, e reconhecido a favor do ora recorrido um crédito laboral no montante global de € 8.301,89. Em 9 de outubro de 2017 foi requerido ao Fundo de Garantia Salarial (referido adiante pela sigla «FGS») o pagamento dos créditos reconhecidos, pedido que foi indeferido pelo Presidente do Conselho de Gestão do Fundo, com o seguinte fundamento: «O requerimento não foi apresentado no prazo de 1 ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, nos termos do n.º 8 do artigo 2.º do Dec.-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril».
O recorrido propôs uma ação administrativa especial contra o FGS, com vista a impugnar este despacho e a obter a condenação do Fundo no pagamento da totalidade dos montantes judicialmente reconhecidos como créditos laborais. A ação foi julgada parcialmente procedente, tendo o tribunal recorrido decidido não aplicar o disposto no n.º 8 do artigo 2.º do novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (referido adiante pela sigla «RFGS»), «por contender com o princípio do Estado de Direito e da garantia especial dos salários dos trabalhadores, consagrados nos artigos 2.º e 59.º da Constituição da República Portuguesa». Em consequência, condenou o FGS a deferir o requerimento apresentado pelo recorrido, na parte equivalente a seis meses de retribuição (nos termos previstos no n.º 1 do artigo 3.º do RFGS).
3. O Ministério Público interpôs recurso obrigatório para o Tribunal Constitucional, tendo produzido alegações, que concluiu do seguinte modo:
«1 – A norma do artigo 2.º, n.º 8, do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril, na interpretação segundo a qual o prazo de um ano para requerer o pagamento dos créditos laborais, certificados com a declaração de insolvência, cominado naquele preceito legal é de caducidade e insuscetível de qualquer interrupção ou suspensão é inconstitucional, por violação dos artigos 2º, 13.º e 59º, nºs 1, alínea a), e 3, da Constituição.
2 – Termos em que deve ser negado provimento ao recurso.»
4. O recorrido não produziu alegações.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
5. A questão de constitucionalidade colocada no presente recurso é idêntica àquela sobre a qual incidiu o Acórdão n.º 328/2018 (retificado pelo Acórdão n.º 447/2018), proferido pela 1.ª Secção do Tribunal Constitucional. Nesse aresto, o Tribunal julgou inconstitucional, «a norma contida no artigo 2.º, n.º 8, do Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril, na interpretação segundo a qual o prazo de um ano para requerer o pagamento dos créditos laborais, certificados com a declaração de insolvência, cominado naquele preceito legal é de caducidade e insuscetível de qualquer interrupção ou suspensão», juízo reiterado no Acórdão n.º 583/2018, também da 1.ª Secção, e nas Decisões Sumárias n.os 111/2019 e 114/2019.
Pode ler-se em tal aresto:
«2.4. Estabelece o artigo 59.º da CRP:
Artigo 59.º
(Direitos dos trabalhadores)
1. Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito:
a) À retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna;
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3. Os salários gozam de garantias especiais, nos termos da lei.
Reafirmando, neste específico domínio, o princípio da igualdade no corpo do n.º 1, a lei fundamental afirma, na alínea a), o direito à justa retribuição do trabalho, cujo destaque encontra evidente justificação. Nas palavras do Acórdão n.º 257/2008 (ponto 13):
“[…]
Na verdade, a retribuição da prestação laboral, quer na sua causa, quer na sua destinação típica, está intimamente ligada à pessoa do trabalhador. Ela é a contrapartida da disponibilização da sua energia laborativa, posta ao serviço da entidade patronal. Ela é também, por outro lado, o único ou principal meio de subsistência do trabalhador, que se encontra numa situação de dependência da...
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