Acórdão nº 00832/17.0BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução11 de Janeiro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório MH, devidamente identificada nos autos, no âmbito da “Ação administrativa em matéria de Asilo” que apresentou contra o Ministério da Administração Interna, tendente à “concessão de asilo ou de autorização de residência por proteção subsidiária, inconformado com a decisão proferida no TAF de Braga, em 11 de setembro de 2018, através da qual foi decidido julgar a Ação “totalmente improcedente”, veio recorrer da decisão proferida.

Assim, em 30 de outubro de 2018, concluiu o seu Recurso MH: “1 - A sentença recorrida enquadra a matéria de facto invocada pelo ora recorrente com base na petição inicial, bem como, nas declarações por ele prestadas perante as autoridades administrativas, onde sustenta o pedido de obtenção da proteção nas perseguições de que teria sido vítima, tanto por parte do grupo terrorista talibãs, como por parte das forças policiais, estando por isso impossibilitado de regressar ao seu país de origem, pois corre o risco de sofrer uma ofensa grave.

2 - O Tribunal a quo relevou “à participação ativa do recorrente na denúncia da atividade criminosa e persecutória desenvolvida pelo grupo terrorista armado talibã”, e “que a descrição realizada pelo Autor, nesta parte, se revelou pormenorizada, suficientemente desenvolvida e detalhada…”; 3 - Ainda aceitou o Tribunal a quo ser “insofismável que os elementos mencionados concorrem em conjunto, para a formulação de uma ressonância da verdade, respeitante a um possível e real perigo de perseguição do Autor, que não só dos seus familiares, que o Autor terá sido alvo em 2015 e que tem relevo para a ponderação da existência do risco de “ofensa grave”, atenta a formulação exemplificativa da densificação do conceito constante no artigo 7.º, n.º 1 previsto no seu n.º 2.” 4 - Todavia, quando o recorrente manifesta um temor por parte das autoridades policiais, o Tribunal a quo entende que o relato dos factos não apresenta concretização suficiente para sustentar o temor e a ameaça invocados, resultantes da perseguição que lhe é movida, quer pelo grupo terrorista, quer pelas forças policiais locais.

5 - Discorda-se do raciocínio expendido pelo Tribunal a quo porque o recorrente, nas declarações prestadas perante o SEF declarou exatamente o inverso (cfr. ponto G dos factos provados).

6 - Das declarações prestadas pelo recorrente, transcritas na sentença recorrida, resulta de forma assertiva que o mesmo se viu forçado a queixar-se dos talibãs à autoridade policial “FC”, uma vez que a polícia local de NS, que opera na sua área de residência, não acreditou nele.

7 - Está evidenciado que o recorrente encontrou na polícia da “FC” o acolhimento às denúncias efetuadas, descrevendo de modo bastante pormenorizado a relação que estabeleceu com a mesma.

8 - De igual modo está demonstrado que o recorrente se sente ameaçado pelas forças policiais locais, nomeadamente pela dita polícia de NS.

9 - Facilmente se depreendendo que a referência feita à polícia da “FC” é totalmente contraditória com o sentido global das declarações prestados pelo recorrente no interrogatório efetuado pelo SEF (cfr. G) dos factos provados).

10 - Sendo o seu teor manifestamente contrário ao do documento junto em C) dos factos provados, onde se pode comprovar ter sido a “FC” que apreendeu diverso material bélico ao grupo terrorista, como também deteve e entregou um terrorista à polícia de HA.

11 - Não sendo, por isso, plausível que esta polícia tenha procedido à libertação do preso que entregara à autoridade policial local.

12 - Acresce que as declarações recolhidas pelo SEF foram prestadas em língua pachtum, com o auxílio de um intérprete, o que pode facilmente gerar dificuldades de comunicação, com consequências na tradução e na transcrição, e que podem alterar o sentido da declaração prestada.

13 – As desconsideradas declarações do recorrente revelam-se coerentes, sempre abonatórias quando se refere à polícia do “FC” e, em consequência, posto o que impunha dar por não provada a declaração do recorrente na parte em que ele estabelece a ligação entre a polícia do “FC” e os talibãs, acusando-a de os ter libertado.

14 - São também coerentes as declarações do recorrente quando explica as razões porque se sente ameaçado e perseguido pelo grupo terrorista e pelas forças policiais locais.

15 - A sentença sob recurso enferma de manifesto erro sobre os pressupostos de facto.

16 – Relativamente à contradição apontada entre as declarações prestadas perante o SEF e os factos vertidos na petição inicial, no que respeita à ligação da polícia do “FC” e o grupo terrorista, vale o acima exposto.

17 - Tendo o recorrente na petição inicial densificado e aclarado, como é normal, a factualidade ocorrida.

18 - Não se pode concordar com a conclusão do Tribunal a quo de que o recorrente omitiu em sede administrativa “a referência à perseguição ativa realizada pela polícia com vista a detê-lo seja para interrogatório ou para outros fins”, dado que, em sede administrativa, referiu com pormenor a atuação da polícia local, evidenciando sentir-se ameaçado e perseguido por aquela autoridade (cfr. G) dos factos dados como provados).

19 - Nem pode aceitar-se a conclusão de que na petição inicial teriam sido acrescentados factos não alegados nas declarações prestadas, ou sequer a divergência apontada quanto ao papel da cada uma das forças policiais intervenientes.

20 - Também aqui o M.º Juiz a quo errou na análise da matéria de facto.

21 - A situação experienciada e relatada pelo recorrente é ainda reforçada pelo teor da Informação n.º 615/GAR/15, em que se refere que o receio demonstrado em regressar ao Paquistão, por temer ser morto quer pelos talibãs, quer pelas autoridades policiais que o acusaram de ser terrorista, a qual não é contraditória com a informação veiculada pelas organizações internacionais dos direitos humanos que referem que as autoridades policiais paquistanesas mantém detidas indefinidamente em prisão preventiva um número desconhecido de pessoas supostamente afiliadas a organizações terroristas, pessoas essas que foram torturadas e abusadas (cfr. H) dos factos provados).

22 - O recorrente repudia também a decisão na parte em que se conclui que o recorrente depois dos acontecimentos ocorridos no Paquistão teria tido a oportunidade de pedir proteção às autoridades dos países por que passou, sendo certo que não o fez, por motivos válidos, pois quem viaja nas mão de passadores profissionais, como foi o caso, não tem liberdade de ação, nem de escolha, restando-lhe pedir proteção no país onde aqueles o deixam ficar.

23 - É inquestionável que o recorrente, mediante os relatos da situação por si vivida, tenha receio de voltar ao seu país de origem, onde sente a sua vida ameaçada, por via das perseguições de que é alvo.

24 - Perseguição tanto por parte do grupo de terroristas que denunciou, e que como retaliação o ameaçou de morte, tendo nessa sequência assassinado o seu irmão de 15 anos de idade, como pela polícia local, que ao mesmo tempo que o ameaça com a prisão, por ter ligações aos talibãs, omite os seus deveres de proteção, deixando-o à sua sorte.

25 - Atendendo ao seu relato credível dos acontecimentos, e tendo em consideração o princípio do benefício da dúvida, bem como os demais elementos carreados para o processo, insofismável se mostra a razão para o recorrente se sentir ameaçado e perseguido, pelo que é merecedor de proteção por razões humanitárias.

26 - A decisão ora recorrida fez uma incorreta interpretação da lei e dos meios probatórios, tendo incorrido em erro sobre os pressupostos de facto, e deste modo violando o disposto no artigo 7.º, nºs 1, 2, al. c) e 3, da citada Lei, incorreu em manifesta violação da lei.

27 - Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, revogar-se a sentença e condenar-se a entidade recorrida a conceder ao recorrente a autorização de residência por proteção subsidiária.”*O Recorrido/MAI veio a apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 19 de novembro de 2018, concluindo: “I. O Ministério, nas peças processuais oportunamente juntas aos autos, explicitou os motivos por que a argumentação que o Recorrente agora repete se mostrava inconsequente; II. Compulsados os autos, analisando-se da legalidade que estes comportam, é inequívoco que o ato administrativo ora sob escrutínio respeita a lei e o direito; III. O despacho, de 21 de julho de 2016, do Senhor Secretário de Estado da Administração Interna, com fundamento na Informação do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e ao abrigo do n.º 5, do artigo 29.°, da Lei n.º 27/2008, de 30 de junho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 26/2014, de 5 de maio, que recusou o direito de asilo ao cidadão MH, nacional do Paquistão, por não preencher os requisitos do artigo 3.° da citada Lei. Com base na mesma informação o Senhor Secretário de Estado da Administração Interna recusou, por não reunir os pressupostos no artigo 7.° do mesmo diploma legal, a concessão da autorização de residência por proteção subsidiária, foi praticado em plena conformidade à lei e não enferma de qualquer vício; IV. Improcedem todos os argumentos aduzidos pelo Recorrente, sendo inquestionável a legalidade da decisão em crise; Assim; I — DA CONCESSÃO DO DIREITO DE ASILO V. A Lei n.º 27/2008, de 30 de junho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 26/2014, de 5 de maio, que estabelece as condições e procedimentos de concessão de asilo ou proteção subsidiária, determina no n.º 1, do artigo 3.° que "é garantido o direito de asilo aos estrangeiros e aos apátridas perseguidos ou gravemente ameaçados de perseguição, em consequência de atividade exercida no Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana"; VI. Em auto de declarações prestadas em sede de pedido de asilo, o Autor, ora Recorrente...

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