Acórdão nº 1487/17.8T9FNC.L1-9 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 04 de Abril de 2019

Magistrado ResponsávelALMEIDA CABRAL
Data da Resolução04 de Abril de 2019
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, os Juízes da 9.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: 1 – No Juízo Local Criminal do Funchal, Juiz 1, Processo Comum Singular n.º 1487/17.8T9FNC, onde são arguidos AA e BB – CC, foram estes julgados e condenados: - O AA, pela prática de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, p. p. nos termos dos artºs. 105.º, nºs. 1, 4 e 5 e 107.º, n.º 1, todos do RGIT, na pena de doze meses de prisão, suspensa na sua execução sob a condição de, no mesmo prazo, entregar à Instituição FF a importância de mil euros; - A CC, pela prática de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, p. p. nos termos dos artºs. 105.º, nºs. 1, 4 e 5 e 107.º, n.º 1, todos do RGIT, na pena de duzentos e quarenta dias de multa, à taxa diária de 5,00 €uros.

Porém, com esta decisão não se conformou o Ministério Público, pelo que da mesma interpôs o presente recurso, o qual sustentou na desajustada medida das respectivas penas, que haveriam de ter sido fixadas em não menos de 500 dias de multa relativamente à arguida e em não menos de dois anos e dois meses de prisão relativamente ao arguido, também suspensa na sua execução, mas sob a condição do pagamento de 2.200,00 €uros à Segurança Social da Madeira ou ao Estado Português e, bem assim, no facto de dever ser declarada perdida a favor do Estado a vantagem patrimonial obtida pelos arguidos directamente resultante do facto ilícito em causa, no montante actual de 85.692,97 €uros.

Da motivação do recurso extraiu as seguintes conclusões: “(...) A.) Exórdio 1. Por sentença proferida a 13 de Novembro de 2018, o Tribunal A Quo condenou os arguidos AA e “BB.”, pela prática de um crime de Abuso de confiança contra a Segurança Social, na pena de multa de € 1 200,00, quanto à sociedade arguida, e, quanto ao arguido pessoa singular, na pena de 1 ano de prisão, suspensa por igual período, sob a condição do mesmo pagar, no prazo de suspensão, a quantia de € 1000,00 à associação “FF”.

  1. Na mesma sentença, o Tribunal A Quo declarou improcedente a promoção de perda de vantagens patrimoniais do crime formulado pelo Ministério Público com a acusação, no sentido de ser declarada perdida a favor do Estado a vantagem patrimonial correspondente às prestações devidas à Segurança Social e não entregues ao Estado pelos arguidos, no montante de € 94 201,80.

  2. A sentença proferida, salvo o devido respeito e melhor opinião, é no entanto equívoca relativamente aos aspectos atrás apontados, pelo que o presente recurso, embora incida sobre a mesma, é restrito apenas às seguintes matérias: i) – discussão sobre a medida das penas aplicadas aos arguidos e sobre as operações complementares associadas à pena de prisão suspensa na sua execução aplicada somente ao arguido AA; ii) – discussão sobre se há lugar, no caso vertente, à declaração de perda a favor do Estado da vantagem patrimonial obtida pelos arguidos como resultado directo da prática do crime.

    B.) - Das razões da nossa discordância face à medida das penas aplicadas aos arguidos e face às operações e decisões complementares associadas à pena de prisão suspensa na sua execução B.1) – Das medidas das penas 4. Nada temos a apontar quanto à espécie das penas aplicadas aos arguidos.

  3. No entanto, atenta a fundamentação judicial onde se estriba a aplicação de tais penas, cremos que se impõe a conclusão de que o quantum das mesmas é intoleravelmente reduzido face aos níveis elevadíssimos de ilicitude e culpa sob observação, assim como à luz das elevadas exigências de prevenção geral associadas a este tipo de ilícitos.

  4. Notamos que perante níveis de dolo intenso, de ilicitude elevada, de exigências de prevenção geral elevadíssimas, que perante um saque nas contas da Segurança Social superior a € 90.000,00 e que perante um período de mais de quatro anos em que os arguidos, pura e simplesmente, resolveram “fazer de conta” que a Segurança Social não existia, o Tribunal resolveu “premiá-los” com uma pena de multa situada no limite mínimo legal aplicável e numa pena de prisão suspensa na sua execução por um período igualmente próximo desse mínimo, ou seja, de apenas 1 ano, o que corresponde a um quinto do limite máximo da moldura penal abstracta aqui aplicável.

  5. É imperativa a determinação de medidas de pena que não só advirtam eficazmente os arguidos de que o seu comportamento não mais irá ser tolerado pela ordem jurídica, mas também que exija aos mesmos, no futuro, a assunção de um comportamento preventivo da prática de novos crimes e que, ademais, sopesando os benefícios do crime e a sanção criminal sofrida pela sua prática, impeçam a incrustação da ideia na comunidade no sentido de que é compensatório não pagar à Segurança Social, ainda para mais quando falamos de quantias elevadíssimas como sucede no caso dos autos em que os valores em dívida ultrapassaram os € 90.000,00.

  6. Como tal, e ponderando todos os elementos acima descritos, impõe-se aqui o seguinte: I) – a condenação da sociedade arguida numa pena de multa computada num patamar situado entre de 1/3 e metade do limite máximo abstracto da pena aqui aplicável, ou seja a condenação desta última numa pena concreta nunca inferior a 500 dias de multa à taxa diária de 5 euros (num total de € 2.500,00); e II) - a condenação do arguido pessoa singular em patamar idêntico face à moldura da pena de prisão aplicável, ou seja numa pena concreta situada num nível nunca inferior a 2 anos e 2 meses de prisão suspensa na sua execução por igual período.

    B.2) Quanto ao destino e valor estabelecidos para a quantia a pagar como uma das condições da suspensão da pena de prisão 9. Se o valor ilicitamente arrecadado pelos arguidos ascendeu ao montante de € 94 201,80 não faz, na nossa óptica, qualquer sentido estabelecer a quantia a pagar pelo arguido pessoa singular, como condição de manutenção da suspensão da execução da pena, num valor tão desproporcionalmente inferior ao atrás referido. [isto é € 1.000,00].

  7. Dito isto, e recuperando as considerações por nós já vertidas na motivação de recurso que antecede, consideramos como sendo exigível ao arguido - pessoa singular - retirar mensalmente do seu rendimento, para pagamento da condição estabelecida como suspensão de execução da pena de prisão que lhe foi aplicada, uma quantia na ordem dos € 85,00.

  8. Consequentemente, e considerando o período de duração da pena de prisão suspensa na sua execução por nós proposto (26 meses), temos que existem condições mais do que suficientes para estabelecer que o valor final a pagar pelo arguido no fim do prazo fixado como duração da suspensão da execução da pena ascenderá ao montante de € 2.200,00 o que, contrariamente ao definido na sentença, o situa num patamar proporcionalmente ajustado face à equação onde se conjugam os níveis de culpa e ilicitude registados nos autos, as condições pessoais do arguido e as necessidades de prevenção emergentes no presente caso e acima descritas.

  9. No que ao destino do pagamento desta quantia diz respeito, também se impõe salientar que discordamos em absoluto do decidido pelo julgador ao ter determinado atribuir o valor em questão a uma associação que nada tem a ver com a problemática em destaque neste processo e com o bem jurídico atacado: ou seja a receita tributária atribuída à Segurança Social e que funciona como sua fonte de sustentabilidade.

  10. Logo, se foi a Segurança Social a entidade patrimonialmente prejudicada com a conduta do arguido em questão, e tendo esta entidade fontes permanentes de despesa em áreas tão vitais relacionadas com a própria subsistência da sociedade, que sentido faz atribuir o valor a pagar pelo condenado a uma associação que nada tem a ver com a problemática sob evidência nestes autos.

  11. Ademais, também se impõe frisar que por uma questão de justiça...

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