Acórdão nº 2156/04.4TBSTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Março de 2010

Data01 Março 2010
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: REVOGADA, EM PARTE.

Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO - LIVRO 827 - FLS 85.

Área Temática: .

Sumário: I – A omissão da consignação, na respectiva acta de audiência de julgamento, dos elementos mencionados no art. 615º do CPC constitui uma irregularidade susceptível de ter influência na decisão da causa no caso de a inspecção judicial vir a ser um dos meios de prova em que o juiz fundamente a decisão sobre a matéria de facto, consubstanciando, então, uma nulidade secundária, atípica ou inominada.

II – No caso das servidões legais, a desnecessidade prevista no art. 1569 nº3 do CC tem de derivar sempre de uma alteração objectiva superveniente das circunstâncias do prédio dominante, uma vez que não se concebe que uma servidão seja imposta coercivamente e, portanto, possa constituir-se sem ser necessária.

III – Tratando-se de servidão constituída por usucapião, o que a lei, no fundo, pretende é uma ponderação actualizada da necessidade de manter o encargo sobre o prédio, deixando ao prudente alvedrio do julgador avaliar se, no momento considerado – e segundo uma prognose de proporcionalidde subjacente aos interesses em jogo – haverá, ou não, alternativa que, sem ou com um mínimo de prejuízo para o prédio encravado.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Proc. nº 2156/04.4TBSTS – 3ª Secção (Apelação) ● Acção Ordinária – .º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Santo Tirso Rel. Deolinda Varão (399) Adj. Des. Freitas Vieira Adj. Des. Cruz Pereira Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.

B………. e mulher C………. instauraram acção declarativa com forma de processo ordinário contra D………. e marido E………. .

Pediram que se declarasse extinta, por desnecessidade, a servidão de passagem que incide sobre o prédio dos autores a favor do prédio dos réus, referida de 21º a 26º da petição inicial.

Como fundamento, alegaram, em síntese, que o prédio urbano dos autores confina com um prédio dos réus; que, antes da partilha por morte em que os autores vieram a adquirir o seu prédio, celebraram contrato-promessa com os outros herdeiros, entre os quais se incluíam os réus, para que o mesmo fosse entregue aos autores “devoluto e livre de quaisquer ónus ou encargos”; que o prédio dos réus tem acesso directo à via pública desde 1978; que, após a celebração da escritura de partilha, em 16.07.99, os réus passaram a pretender usar, para passar em direcção à via pública, uma faixa de terreno que tem início no seu prédio e que atravessa o prédio dos autores, sendo certo que, por sentença judicial proferida em acção instaurada em 2000, veio a ser reconhecido aos réus o direito de servidão de passagem em causa, constituído por usucapião.

Os réus contestaram, invocando a ineptidão da petição inicial e a violação do princípio da concentração da defesa e impugnando os factos alegados pelos autores.

Na réplica, os autores responderam às excepções e, alterando a causa de pedir e o pedido, formularam os seguintes pedidos: A) Ser declarado que, aquando da celebração da escritura de partilha de 16.07.99, o prédio nela referido foi adjudicado aos autores livre de quaisquer ónus ou encargos, nomeadamente de qualquer servidão de passagem em benefício do prédio dos réus, e que tal correspondeu à vontade de autores e réus e, em consequência, devem ser condenados estes a não utilizar o caminho em causa nos autos; Subsidiariamente, B) Ser declarada extinta, por desnecessidade, a servidão de passagem que onera o prédio dos autores, referida de 21º a 26º da petição inicial, condenando-se os réus a reconhecê-lo e a não utilizar o caminho em causa nos autos; Subsidiariamente, ainda, C) Ser alterado o local do prédio dos autores sobre o qual, actualmente, se exerce o direito de servidão de passagem a favor do prédio dos réus, passando tal direito a ser exercido sobre uma faixa de terreno do mesmo prédio, com a largura de 1,35 m, com início na abertura, actualmente existente na confrontação entre o prédio dos réus e o prédio dos autores e desenvolvendo-se, desde essa abertura, de Norte para Sul, ao longo da estrema Poente desse prédio, onde deve inflectir para Nascente, sempre na sua estrema, até à Rua ………., conforme assinalado na planta junta com a réplica como documento nº 1.

Como fundamento dos novos pedidos, alegaram, em síntese, que o acesso constituído em 1978 é mais largo do que o caminho de servidão e dá acesso mais rápido aos locais mais centrais da freguesia; e que os autores não teriam pagado aos réus 5.800.000$00 pelo quinhão hereditário destes nem teriam outorgado a escritura de partilha se não tivessem como certo que o prédio lhes seria entregue livre de ónus ou encargos, tal como constava no contrato-promessa.

Os réus treplicaram, impugnando os factos alegados pelos autores na réplica.

No despacho saneador, foram julgadas improcedentes as excepções invocadas pelos réus.

Percorrida a tramitação subsequente, foi proferida sentença que: A) Julgou improcedente o pedido de declaração de que, na escritura de partilhas, o prédio foi adjudicado aos autores livre de quaisquer ónus ou encargos, nomeadamente de qualquer servidão de passagem em benefício do prédio dos réus e o pedido de condenação dos réus a não utilizarem o caminho em causa nos autos, nessa parte absolvendo os réus; B) Julgou improcedente o pedido subsidiário de declaração de extinção, por desnecessidade, da servidão de passagem que onera o prédio dos autores e de condenação dos réus a reconhecerem isso mesmo e a não utilizarem o caminho em causa, nessa parte também absolvendo os réus; C) Julgou procedente o pedido sub-subsidiário e permitiu aos autores que, à sua custa e pelo trajecto demarcado a verde no mapa de fls. 116, alterassem o percurso por onde se exerce a servidão de passagem, construindo de raiz o novo leito do caminho, com projecto e caderno de encargos previamente aprovados pelos réus e mantendo no novo trajecto pavimento idêntico ao actual e a largura de 1,35 m; D) Condenou os autores na multa de € 129,00 por litigância de má fé em relação ao pedido subsidiário referido em B).

Os autores recorreram, formulando as seguintes Conclusões ……………………………………………………… ……………………………………………………… ……………………………………………………… Os réus contra-alegaram, pugnando pela improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

*II.

O tribunal recorrido considerou provados os seguintes factos: Os autores são proprietários do “Prédio misto, composto por uma casa destinada exclusivamente a habitação, com quintal e terreno de cultura e ramada, sito no ………., freguesia de ………., descrito na CRP de Stº Tirso sob o nº 44883 e inscrito na respectiva matriz predial sob os artºs 1039 urbano e 624 rústico”. (A) Os autores adquiriram o prédio referido em A) por sucessão na partilha da herança aberta por óbito dos pais do autor marido e da ré D………., partilha titulada por escritura de 16.07.99 do 1º Cartório Notarial de Stº Tirso. (B) O referido prédio encontra-se registado a favor dos autores através da inscrição G-1. (C) Ainda antes da celebração da escritura de partilha, os autores prometeram comprar a alguns herdeiros, nomeadamente aos réus, os respectivos quinhões hereditários. (D) Para o que com eles celebraram acordo que denominaram de “contrato promessa de compra e venda”. (E) No âmbito do acordo a que se alude em E), foi estabelecido, designadamente na cláusula 1ª, o seguinte: “Os Primeiros contraentes prometem vender ao Segundo contraente, ou a quem estes vierem a indicar, completamente devolutos e livres de quaisquer ónus ou encargos e estes por sua vez, prometem comprar, um quinto indiviso de todos os bens imobiliários que façam parte da acima referida herança aberta por óbito de seus pais”. (F) Os réus receberam o preço da cessão do seu quinhão hereditário, 5.800.000$00. (G) Os réus são proprietários de um prédio rústico denominado “F……….”, sito no ………., ………., descrito na CRP de Stº Tirso sob o nº 40335 e inscrito na respectiva matriz predial sob o artº 664. (H) Prédio que os réus adquiriram por compra titulada por escritura pública de 26.03.76. (I) Com fundamento na necessidade de rectificar as extremas deste prédio, os réus compraram a G………. e mulher H………., uma parcela de terreno com a área de 159 m2 a destacar do prédio sito no mesmo ………., descrito na mesma Conservatória sob o nº 19330 e inscrito na matriz sob o artº 660. (J) Compra que foi titulada por escritura pública de 21.03.78. (K) Apesar de na escritura de compra desta parcela ter ficado a constar que se destinava à rectificação de extremas, tal apenas se ficou ao facto de constituir a única possibilidade de efectuar o destaque. (L) A verdadeira razão da aquisição foi dotar o prédio dos réus de um acesso próprio e autónomo até à via pública. (M) Trata-se de uma parcela de terreno com cerca de 55 m de comprimento por 3 de largura, assinalada a azul na planta junta sob o doc. nº 2 da petição inicial. (N) Que leva desde a Rua ………. até ao prédio dos réus. (O) O seu piso é composto por uma camada de gravilha com cimento. (P) Após a aquisição da dita parcela, o prédio dos réus ficou com as seguintes confrontações: a Norte com G………. e mulher e herdeiros de I……….; a Sul com J………. e outros; a Nascente com os autores e a Poente com G………. e mulher e estrada camarária. (Q) O prédio dos réus tem, pois, desde 21.03.78, acesso directo à via pública, mais concretamente à Rua ………., através da parcela referida em J). (R) Sobre o prédio rústico de que são proprietários os réus construíram uma casa em que habitam. (S) Por sentença proferida em 12.06.03 nos autos de acção declarativa com processo sumário que correram termos com o nº …/00 pelo .º Juízo Cível de Sto Tirso, foi declarada a existência de um direito de servidão de passagem constituído por usucapião que incide sobre o prédio dos aqui autores e constituída a favor do prédio dos ora réus e que consiste no direito de...

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