Acórdão nº 11692/04.1TJPRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelHENRIQUE ANTUNES
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: REVOGADA A DECISÃO.

Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO - LIVRO 347 - FLS 22.

Área Temática: .

Sumário: I - A falta de entrega de exemplar, ao consumidor, do contrato de crédito, é causa de nulidade mista ou atípica, que não constitui objecto admissível do recurso se não tiver sido arguida na instância recorrida; II - A exclusividade da concessão de crédito por uma instituição financeira aos clientes do vendedor ou do prestador de serviço, restringe-se à adstrição do crédito concedido à satisfação do preço do bem ou do serviço, objecto do contrato conexo com o contrato de crédito.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Proc. nº 11692/04 Acordam no Tribunal da Relação do Porto: 1.

Relatório.

B………. deduziu oposição à execução para pagamento de quantia que contra ela foi promovida, no .º Juízo de Execução, .ª secção, da Comarca do Porto, por C………., SA, pedindo a extinção daquela execução.

Fundamentou a oposição no facto de, em Janeiro de 2003, uma funcionária de D………., Lda., a haver contactado, telefonicamente, na sua residência, comunicando-lhe que havia sido contemplada com um aparelho para medir a tensão e convidando-a a estar presente, no dia 25 daquele mês, nas suas instalações, onde lhe seria entregue aquele prémio e assistiria a uma demonstração de equipamentos de saúde, de, naquela data se ter deslocado àquelas instalações, tendo assistido à demonstração de um colchão ortomagnético em cuja aquisição, por € 4.579.00, acabou por anuir, tendo-lhe sido entregues vários documentos, entre os quais, um contrato de compra e venda, referente ao colchão, entretecido com aquela firma, e o contrato de mútuo, nº ……, da lavra do exequente, que acabou por subscrever, de ter endereçado a D………., Lda. uma carta registada, datada de 3 de Fevereiro de 2003, comunicando-lhe a intenção de desistência da compra e venda por séria dificuldades económicas, mas, apesar disso, no dia 19 do mesmo mês, o colchão lhe haver sido entregue, tendo, duas semanas mais tarde, sido recolhido por funcionários da D………., Lda., e de, por carta registada, recepcionada pela exequente em 10 de Março de 2003, ter solicitado a anulação do contrato de mútuo e do respectivo plano de pagamento, tendo, porém, aquela, por não acolher as razões invocadas, movido a execução.

A exequente afirmou, com contestação, designadamente, que tudo sabe é que concedeu à opoente um financiamento no montante de € 4.759.20, que é totalmente alheia seja à escolha do fornecedor, seja à escolha do bem financiado, por parte da opoente, sendo esta a única e exclusiva responsável por essa escolha, que celebrou com aquela o contrato de mútuo, através do qual lhe concedeu o empréstimo destinado à aquisição de um colchão, a liquidar em 36 prestações, no valor unitário de € 127.00, com inicio em 5 de Março de 2003, contrato devidamente assinado por aquela, em poder da qual ficou um exemplar, tendo ainda subscrito a livrança dada à execução, que a opoente não liquidou nenhuma das prestações do mútuo, pelo que, em 24 de Novembro de 2003, resolveu o contrato, considerando antecipadamente vencidas todas as prestações, e procedeu ao preenchimento daquela livrança pelo valor total da dívida, com vencimento no dia 24 de Dezembro de 2003, pelo que impugna toda a matéria constante da petição inicial.

Sem ter havido lugar à selecção da matéria de facto, procedeu-se à audiência de discussão e julgamento.

A sentença final da oposição julgou-a improcedente.

Apelou, naturalmente, a executada, que, com o propósito de mostrar o mal fundado da decisão recorrida, extraiu da sua alegação, estas conclusões: 1. A douta sentença recorrida violou por erro de interpretação e aplicação os artigos 490.º, do CPC, 13.º, n.º 2, alínea d), 18.º, n.º 1 e 5, 19.º, n.º 4, todos do DL n.º 143/2001, de 26.04, e 6.º, n.º 1, 7.º, n.º 1, 8.º, n.º 1 e 12.º, n.º 2, todos do DL n.º 359/91, de 21.09; 2. No art. 53.º, da douta contestação, é impugnada “…toda a matéria constante da petição inicial”; 3. Dispõe o art. 490.º, n.º 1, CPC, aqui aplicável com as devidas adaptações, ex vi art. 466.º, n.º 1, CPC, que “ao contestar, deve o réu tomar posição definida perante os factos articulados na petição”, considerando-se “admitidos por acordo os factos que não forem impugnados, salvo se estiverem em oposição com a defesa considerada no seu conjunto, se não for admissível confissão sobre eles ou se só poderem ser provados por documento escrito”, conforme resulta do n.º 2, do mesmo preceito; 4. Relativamente aos factos alegados nos arts. I a XXV da petição inicial, não é apresentada na contestação da exequente qualquer versão dos mesmos, contraposta à da aqui apelante, e, como vem sendo entendido pacificamente pela jurisprudência, devendo o réu tomar posição definida perante os factos articulados na petição, não é admissível a contestação por negação pura e simples; 5. Pois, como se escreveu no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 07.10.1982 (BMJ, n.º 320, pág. 455), “…é preciso distinguir, do ponto de vista do contestante, se o facto alegado pela outra parte é absolutamente falso, ou se ocorre apenas uma inexactidão relativa. No primeiro caso, a maneira de impugnar a alegação parece ser a de impugnar pura e simplesmente, mas se se trata de inexactidão relativa, deve o contestante procurar restabelecer a verdade, narrando o que realmente ocorreu. Se, nesta hipótese, assim não acontecer, se houver negação pura e simples, não especificada, mas em termos genéricos, deve considerar-se o facto como não impugnado”; 6. Na impugnação vertida no art. 53.º da contestação, a exequente não distingue, no que concerne aos factos alegados nos arts. I a XXV, da p.i., entre aqueles que entende serem absolutamente falsos, dos relativamente inexactos; 7. No Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 11.12.1984 (CJ 1984, Tomo V, pág. 268), sumariou-se que “o ónus da impugnação especificada não obriga o demandado a utilizar necessariamente uma negação «per posicionem», sendo perfeitamente legítima e eficaz, no plano processual, a negação simples, desde que dirigida, concreta e definitivamente, a factos determinados dos articulados”; 8. “Assim se impugnando toda a matéria constante da petição inicial” trata-se de uma negação simples, mas não dirigida, concreta e definitivamente, a factos determinados da petição inicial e, logo, devem considerar-se como não impugnados e admitidos por acordo os factos alegados nos arts. I a XXV, da petição inicial; 9. Consequentemente, deverão ser dados como provados e aditados à matéria de facto tida como assente, os seguintes factos alegados na p.i., relevantes para a boa decisão da causa: • No mês de Janeiro de 2003, em dia não apurado, foi a executada contactada telefonicamente, na sua residência, por uma funcionária da firma “D………., Lda.”.

• Comunicando-lhe o facto de ter sido contemplada com um prémio, um aparelho para medir a tensão, e convidando-a a estar presente no dia 25.01.2003, nas instalações da referida empresa, onde lhe seria entregue o prémio e teria a oportunidade de assistir a uma demonstração de equipamentos de saúde.

• Deslocou-se a executada na data agendada para o efeito, às instalações da referida empresa, onde assistiu a uma demonstração de um colchão ortomagnético, acompanhada pelas explicações dos funcionários da dita empresa, que lhe davam conta de todos os benefícios em termos de conforto e bem-estar proporcionados por tal equipamento, cujo preço de venda era de € 4.579,40, em promoção naquele evento.

10. Estamos, então, perante um contrato de compra e venda equiparado a um contrato ao domicílio, celebrado entre a aqui apelante e a D………., ao abrigo do art. 13.º, n.º 2, alínea d), DL n.º 143/2001, de 26.04, uma vez que se tratou de um contrato celebrado no local indicado pelo fornecedor do bem para consumo, no caso em concreto, as instalações da D………., ao qual a apelante, como consumidora, se deslocou por sua conta e risco, na sequência de uma comunicação comercial feita pela referida empresa; 11. Aplicam-se a tal contrato as normas do referido DL n.º 143/2001, de 26.04, nos termos de cujo art. 18.º, n.º 1, assiste à apelante o direito de resolver o contrato de compra e venda no prazo de 14 dias, a contar da data da sua assinatura, ou até 14 dias ulteriores à entrega do bem, se esta for posterior àquela, o que a apelante logrou concretizar, através de carta registada datada de 03.02.2003, junta aos autos como docs. 3-4, da p.i.; 12. Resolução essa que foi aceite pela D………., pois os funcionários desta deslocaram-se posteriormente à residência da apelante e aceitaram a devolução do colchão, conforme, aliás, consta do ponto 6, da matéria de facto tida como assente. Portanto, não há dúvida que o contrato de compra e venda foi validamente resolvido pela aqui apelante; 13. Simultaneamente à celebração do contrato de compra e venda com a D………., celebrou a apelante um contrato de concessão de crédito com a exequente, e, assim, o caso dos autos configura nitidamente uma compra e venda financiada; 14. Sendo o contrato de compra e venda celebrado entre a apelante e a D………. equiparado a um contrato ao domicílio e tendo a oponente resolvido o contrato de compra e venda dentro do prazo e com o formalismo previsto no art. 18.º, n.º 1 e 5 do DL 143/2001, rege o disposto no art. 19.º, n.º 4 do mesmo diploma, i.e., “sempre que o preço do bem ou serviço for total ou parcialmente coberto por um crédito concedido pelo fornecedor ou por um terceiro com base num acordo celebrado entre este e o fornecedor, o contrato de crédito é automática e simultaneamente tido por resolvido, sem direito a indemnização, se o consumidor exercer o seu direito de resolução em conformidade com o disposto no art. 18.º, n.º 1”; 15. Assim foi o caso dos autos, pois o contrato de compra e venda foi resolvido tempestivamente, conforme consta dos docs. 3 e 4, da p.i., e se tivermos em conta os pontos 3, 5 e 6, da matéria de facto tida como assente; 16. Por força do regime do...

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