Acórdão nº 2671/04.0TBVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelJOSÉ FERRAZ
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: CONFIRMADA.

Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO - LIVRO 819 - FLS 243.

Área Temática: .

Sumário: I – Na vigência do RAU, a falta da licença de utilização do local arrendado não determinava a nulidade do contrato de arrendamento, nem a licença é exigível tratando-se de prédios construídos antes da data da entrada em vigor do RGEU, aprovado pelo DL nº 38383, de 07.08.51.

II – Não há abuso do direito se o seu titular o exerce para o fim para que a lei o atribuiu nem contraria conduta sua anterior que justifique legítima confiança na outra parte no sentido do não exercício na forma adoptada.

III – Se o arrendatário conhecia perfeitamente o local arrendado, à data da celebração, não pode invocar a culpa “in contrahendo” do senhorio (que garantiu que o local tinha todas as condições para, aí, ser desenvolvida a actividade visada), para peticionar a indemnização por obras feitas necessárias para adaptar o local ao exercício dessa actividade.

IV – Se o arrendatário ocupa o local arrendado, entregue pelo senhorio, não pode deixar de pagar a renda baseando-se na inexistência da licença de utilização, ao menos quando a falta desta não impediu o gozo do local arrendado.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1) –

  1. B………., C………. e D………., o primeiro com domicílio na Rua ………., …, ……, e os outros com domicílio no ………., ., no Porto, instauraram acção declarativa ordinária contra “E………., L.DA” e F.………, aquela com sede na Rua ……., …, ………., e este com domicílio na Rua ………., …, ………., em Vila Nova de Gaia, alegando que deram de arrendamento à R. metade do R/C do prédio sito na Rua ………., …, Gaia, para o exercício da actividade de estação de serviço, lavagem e manutenção automóvel, pelo prazo de um ano e com início em 01 de Setembro de 2003, mediante a renda anual de € 15.000,00, a ser paga em duodécimos de € 1.250,00, no primeiro dia do mês anterior ao que respeitasse.

    A Ré apenas pagou as rendas relativas aos meses de Setembro e Outubro de 2003, não tendo pago qualquer uma das subsequentes, no valor global, até á data da proposição, de € 7.500,00, pelo que existe fundamento para a resolução do contrato.

    O Réu constituiu-se fiador de todas as obrigações da ré emergentes do contrato, nomeadamente o pagamento das rendas.

    Terminam a pedir: 1) que seja decretada a resolução do contrato de arrendamento e a Ré condenada a despejar imediatamente o arrendado e entregá-lo, livre de pessoas e coisas, aos AA. e 2) que sejam os RR. condenados a pagar aos AA. as rendas vencidas e não pagas, que ascendem, até à propositura, a € 7.500,00, e vincendas até efectiva entrega da fracção aos AA., acrescida de juros moratórios à taxa legal, vencidos e vincendos até integral pagamento da dívida e que, até à propositura, perfazem a quantia de € 76,00, tudo no total de € 7.576,00 e subsidiariamente, 3) que sejam os RR. condenados a pagar aos AA. as rendas vencidas e não pagas e vincendas até ao trânsito em julgado da decisão que ponha termo à presente acção, acrescidas de indemnização igual a 50 % desse montante, anos termos do artigo 1041.º, n.º 1 do Código Civil -, num total, até à data da proposição, de € 11.250,00.

  2. Citados, os RR contestaram e deduziram reconvenção. Dizem que na data da celebração do contrato, os AA informaram os RR que o local tinha todas as condições para aí ser desenvolvida a actividade de estação de serviço, lavagem e manutenção automóvel, garantiram que o mesmo estava licenciado para essa actividade, como tinha ligação de água e luz, e garantiram que o locado se encontrava em bom estado d conservação, sendo com base nesses pressupostos que o contrato foi celebrado e que, desde logo, a ré iniciou a realização de obras de adaptação para aí exercer a actividade a que o locado se destinava.

    No entanto veio a verificar-se que no locado não existia ligação de corrente eléctrica nem de água, não se encontrava em condições de nele se exercer a actividade a que se destinada o local, como inexistia licença de utilização, o que permite à ré resolver o contrato e exigir indemnização do senhorio.

    O que legitima a recusa da ré pagar as rendas acordadas, enquanto os AA não assegurando o gozo da coisa para o fim que se destinava.

    A ré realizou diversas obras de adaptação bem como de reparação para colocar o locado em condições de nele exercer a actividade a que se destinava.

    Na execução de obras, por o locado não ter as condições asseguradas pelos AA e instalar equipamento no interior do locado e viu-se impedida de exercer a actividade.

    Sofreu prejuízos de € 70.000,00 e viu prejudicada a sua imagem e bom nome junto dos clientes.

    Conclui, pedindo: a) a improcedência da acção, b) a procedência da reconvenção e, por essa via, a condenação dos AA a pagarem à ré: - a quantia de € 70.000,00, por danos patrimoniais, - a quantia de € 10.000,00 por danos não patrimoniais, - juros à taxa legal, sobre esses valores, desde a “citação até efectivo e integral pagamento e - ser reconhecido à ré o direito de retenção sobre o locado até efectivo integral pagamento.

  3. Os AA replicaram. Impugnam o alegado pelos RR quanto às condições do locado e garantias dadas pelos AA, que apenas se comprometeram a pagar a ligação de água e energia eléctrica, como vieram a fazer.

    O prédio não tem licença de habitabilidade e está da mesma dispensado, por inscrito antes de 1951 e os RR conheciam perfeitamente o arrendado aquando da celebração do contrato, que utilizaram e continuam a utilizar o locado para a sua actividade.

    E nos termos contratuais, a ré não tem direito a indemnização pelas obras eventualmente realizadas.

    Pedem a procedência da acção e a improcedência da reconvenção.

  4. E, alegando que os RR continuam a não pagar a renda, os AA requereram que fosse decretado o despejo imediato.

    Respondendo a esta última questão, os RR pedem se indefira o requerido.

    O despejo imediato veio a ser decretado por acórdão deste tribunal da Relação, decisão que foi mantida pelo Supremo Tribunal de Justiça.

    Tendo sido emitidos os mandados para despejo, veio o locado a ser entregue pela Ré aos AA, conforme fls. 321/322.

  5. Foi proferido despacho saneador a julgar a instância válida e regular, após o que foi selecciona a matéria de facto, fixando-se os factos assentes e organizando-se a base instrutória (fls. 238/242), com reclamação dos AA que foi desatendida.

  6. Realizada a audiência de discussão e julgamento, e decidida a matéria de facto provada e não provada, foi proferida sentença que, julgando a acção procedente a reconvenção improcedente, condenou os RR a “pagar aos AA. as rendas vencidas e não pagas, que ascendem, até ao momento, a € 7.500,00 (sete mil e quinhentos euros), e vincendas até efectiva entrega da fracção aos AA., acrescidas de juros moratórios à taxa legal, vencidos e vincendos até integral pagamento da dívida e que até ao momento perfazem a quantia de € 76,00 (setenta e seis euros), tudo no total, até ao momento, de € 7.576,00 (sete mil, quinhentos e setenta e seis euros)”.

    2) – Inconformados com a sentença, recorrem os RR.

    Alegando, concluem doutamente: ……………………………………………… ……………………………………………… ……………………………………………… Os apelados respondem pela confirmação da sentença.

    Corridos os vistos legais, cumpre decidir.

    3) – São os seguintes os factos provados:

  7. O primeiro A. é usufrutuário de metade e os segundo e terceiro AA. são donos e legítimos proprietários da outra metade, do prédio sito na Rua ………., nº …, na freguesia de ………., concelho de Vila Nova de Gaia, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia sob o nº 02184, e inscrito a seu favor – (A)[1].

  8. Este prédio está inscrito na matriz predial urbana do concelho de Vila Nova de Gaia, da freguesia de ………., sob o artigo 31 – (B).

  9. Em 6 de Agosto de 2003, os AA. deram de arrendamento à R., que por sua vez o tomou de arrendamento, metade do rés-do-chão do prédio identificado supra, por contrato celebrado por escrito particular – (C).

  10. O “contrato de arrendamento” foi celebrado pelo prazo de um ano, tendo o seu início em 1 (um) de Setembro de 2003 e renovando-se, portanto, em 1 (um) de Setembro de cada ano subsequente – (D) E) O arrendado destinava-se ao exercício da actividade de estação de serviço, lavagem e manutenção automóvel – (E).

  11. A renda anual acordada foi de € 15.000,00 (quinze mil euros), a ser paga em duodécimos mensais de € 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta euros) cada, no primeiro dia útil do mês anterior aquele a que respeitasse, na ………., nº … – .º, Sala .., na freguesia de ………., Vila Nova de Gaia – (F).

  12. A renda inicialmente acordada mantém-se nos € 15.000,00 anuais, a pagar em duodécimos mensais de € 1.250,00 – (G).

  13. Até hoje, a R. apenas pagou as rendas relativas aos meses de Setembro e Outubro de 2003 – (H).

  14. E não efectuou o pagamento da renda relativa ao mês de Novembro de 2003 – (I).

  15. Até hoje, não mais efectuou o pagamento de qualquer renda, relativa aos meses subsequentes – (J).

  16. O R. constituiu-se fiador de todas as obrigações da R. previstas no contrato de arrendamento, incluindo a de pagamento das rendas. A fiança foi prestada no próprio contrato de arrendamento – (K).

  17. O prédio em causa não tem licença de habitabilidade – (L).

  18. Na data da celebração do contrato os Autores informaram detalhadamente a Ré e o Réu que é seu gerente que o local tinha todas as condições para aí ser desenvolvida a actividade de estação de serviço...

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