Acórdão nº 140/08.8TBMDR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelM. PINTO DOS SANTOS
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO.

Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO - LIVRO 334 - FLS 35.

Área Temática: .

Sumário: I - Na reapreciação da prova, a Relação tem a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância, deve valorá-la de acordo com o princípio da livre convicção e se conseguir formar, relativamente aos concretos pontos impugnados, uma convicção segura acerca da existência de erro de julgamento da matéria de facto, deve proceder à modificação da decisão da 1ª instância, fazendo «jus» ao reforço dos poderes que tem enquanto tribunal de instância que garante um efectivo segundo grau de jurisdição.

II - A nulidade do contrato de mútuo, por vício de forma, é de conhecimento oficioso e a respectiva declaração impõe a restituição de tudo o que foi prestado no pressuposto da validade do contrato.

III - Além da restituição do capital mutuado, o mutuante tem direito ao recebimento de juros de mora a partir da citação (excepto se antes tiver havido interpelação com vista àquela restituição) e não desde a data acordada para a restituição da quantia emprestada, já que a nulidade do contrato importa a nulidade das respectivas cláusulas.

IV - Apesar da nulidade do contrato, o cônjuge do mutuário é também responsável pela restituição do capital e pelo pagamento de juros, nomeadamente quando consentiu na celebração do contrato de mútuo e a quantia emprestada foi utilizada pelo casal, aqui réus.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Pc. 140/08.8TBMDR.P1 – 2ª Secção (apelação) __________________________ Relator: Pinto dos Santos Adjuntos: Dr. J. Ramos Lopes Dr. Cândido Lemos * * * Acção comum sob a forma sumária, em que são partes: Autor: B………., residente na Rua ………., .., em Miranda do Douro Réus: C………. e mulher D………., residente na Rua ………., …, também em Miranda do Douro.

* * * Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: O autor alegou que emprestou aos réus, em 01/06/2004, através de cheque, a quantia de € 20.000,00, a qual deveria ser-lhe restituída por estes, conforme acordado, a 30/12/2006, mas que chegada tal data eles não o fizeram, nem posteriormente, constituindo-se, assim, em mora, o que lhe confere, a ele demandante, o direito de pedir a restituição daquela importância e o pagamento de juros de mora a partir da data referida em segundo lugar.

E pediu a condenação dos réus a pagarem-lhe: ● a aludida quantia de € 20.000,00; ● a importância de € 1.420,27, de juros de mora vencidos entre 30/12/2006 e a data da apresentação em juízo da petição inicial; ● os juros legais que se vencerem a partir da p. i. e até total e efectivo pagamento.

Os réus contestaram a acção, por excepção e por impugnação.

No primeiro caso, sustentaram que se fosse verdadeira a existência do alegado contrato de mútuo, ele seria nulo por falta de forma.

No segundo, negaram o contrato e a dívida mencionados na p. i. e apresentaram versão diversa para a existência do cheque junto pelo autor com aquele articulado, dizendo que resultou do acerto de contas que então fizeram relativamente à aquisição de uma casa de habitação que o demandante lhes vendeu.

Pugnaram pela improcedência da acção, “por nulidade do contrato alegado pelo autor e porque nenhuma dívida existe para com ele por parte dos réus”.

Foi proferido despacho saneador e foram seleccionados os factos assentes e os controvertidos, estes formando a base instrutória, sem reclamação das partes.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, no termo da qual, após a produção da prova, foi proferido despacho de resposta aos quesitos da base instrutória.

Foi depois proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu os réus do pedido.

Inconformado com tal decisão, interpôs o autor o presente recurso de apelação cuja motivação concluiu do seguinte modo: “● O contrato de mútuo que aparece nos autos é nulo por falta de forma, o que não pode servir de pretexto para absolver os ora recorridos de pagarem ao ora recorrente a quantia de € 20.000,00 que receberam dele, para ser paga a 30/12/2006.

● A força probatória do doc. de fls. 86 e 86v dos autos, reconhecida nos termos do art. 374º do CC, conjugada com os depoimentos das testemunhas - E………., (que) depôs a todos os quesitos e cujo depoimento se encontra gravado em D:200905271405-6363-64794.html, - F……….s, que depôs aos quesitos 1, 2 e 3 de fls. 28 dos autos (e está gravado em) D:20090527121405-5363-64793.html (cujos depoimentos vêm transcritos no corpo da motivação, nas partes que o recorrente considera relevantes para a sua impugnação), terá de levar, com o devido respeito pela opinião contrária, à anulação das respostas negativas aos quesitos 1, 2 e 3 de fls. 48 e 103 dos autos, com revogação da (…) sentença de fls. 110-118 dos autos; ● Para que o (…) Tribunal «ad quem» possa dar aos mesmos quesitos 1, 2 e 3 resposta de provados e profira (…) acórdão que julgue a acção provada e procedente e condene os ora recorridos no pedido.

● A (…) sentença ora em crise é ilegal, por ter violado os arts. 653º do CPC, 362º e 374º e segs. do CC”.

Os réus-recorridos contra-alegaram em defesa da confirmação do decidido na sentença recorrida.

Foram colhidos os vistos legais.

* * * II. Questões a decidir: Face às conclusões das alegações do apelante [são estas que delimitam o «thema decidendum» a cargo desta 2ª instância, de acordo com o estabelecido nos arts. 684º nº 3 e 685º-A nºs 1 e 3 do CPC, na redacção aqui aplicável, resultante das alterações introduzidas pelo DL 303/2007, de 24/08, atenta a data da instauração da acção], o objecto deste recurso visa a apreciação das seguintes questões: ● Se há que alterar os pontos da matéria de facto por ele impugnados; ● E se há que revogar a decisão recorrida na solução jurídica que decretou e condenar os réus a pagarem ao autor o peticionado, embora com base em nulidade do contrato de mútuo.

* * * III. Factos provados: Na sentença recorrida consideraram-se provados os seguintes factos: 1) No dia 1 de Junho de 2004, o autor emitiu e entregou ao réu o cheque nº …….799, preenchido pelo valor de € 20.000,00 (vinte mil euros), sacado sobre o G………., SA, para ser descontado da conta à ordem nº …………, da titularidade do autor [al. A da Matéria de Facto Assente].

2) O réu entregou o cheque nº ……...799 no balcão de Miranda do Douro do H………., SA, para ser depositado na sua conta de depósitos à ordem [al. B da MFA].

3) O H………., SA apresentou o cheque nº …….799 à compensação a 2 de Junho de 2004 e, assim, foi transferida a quantia de € 20.000,00 da conta do autor, aludida em 1), para a conta dos réus [al. C da MFA].

4) Por documento particular denominado «contrato promessa de compra e venda», datado de 10 de Abril de 2002, assinado pelo autor e (pel)o réu marido, aquele declarou ser «dono e legítimo proprietário de um lote de terreno na urbanização de ………., com a área de 464m2, inscrito no referido loteamento com o nº 118» e que «no referido lote irá construir um edifício para habitação bifamiliar (…), construção essa que será dividida em duas fracções, uma designada fracção A…». Mais declarou o autor prometer vender e o réu declarou prometer comprar a fracção autónoma designada pela letra A do prédio urbano supra referido [al. D da MFA].

5) No documento aludido em 4) consta ainda, na cláusula quinta, que «o valor total desta prometida venda é de € 84.800,00 (oitenta e quatro mil e oitocentos euros). O pagamento desta venda será efectuado do seguinte modo: a) na celebração do presente contrato, a quantia de € 7.000,00 (sete mil euros); b) a restante será pago em entregas periódicas, de modo a totalizar a quantia total, comprometendo-me a realizar a escritura logo após ter recebido o valor total do negócio em questão» [al. E da MFA].

6) Em 31 de Maio de 2004, no Cartório Notarial de Vimioso, foi outorgada escritura pública de compra e venda, mútuo com hipoteca e fiança, na qual intervieram, entre outros, na qualidade de primeiros outorgantes, o ora autor e a sua esposa, I………., na qualidade de segundos outorgantes os ora réus e, na qualidade de terceiros outorgantes, dois legais representantes da J………., CRL [al. F da MFA].

7) Na escritura aludida em 6), os primeiros outorgantes declararam que «pela presente escritura e pelo preço já recebido de oitenta mil euros, vendem ao segundo outorgante marido, livre de qualquer ónus ou encargo, a fracção autónoma designada pela letra A, rés-do-chão, destinada a habitação, com garagem na parte lateral direita da cave e logradouro na parte lateral direita, do prédio urbano sito no ………. ou ………., freguesia e concelho de Miranda do Douro, inscrito na respectiva matriz sob o art. P2342, descrito na Conservatória do Registo Predial de Miranda do Douro sob o nº 1093» [al. G da MFA].

8) Na escritura aludida em 6), o segundo outorgante, ora réu, declarou que aceitava a venda aludida em 7), nos termos exarados [al. H da MFA].

9) Na escritura aludida em 6), os terceiros outorgantes declararam que «pela presente escritura, para aquisição do referido prédio, a “J……….”, representada dos terceiros outorgantes, concede aos segundos outorgantes um empréstimo no montante de oitenta mil euros…», que os segundos outorgantes declaram ter recebido nesta data e de que se confessam devedores [al. I da MFA].

10) Em 31 de Maio de 2004, no Cartório Notarial de Vimioso, foi outorgada escritura pública de mútuo com hipoteca e fiança, na qual intervieram, na qualidade de primeiros outorgantes, os ora réus e, na qualidade de segundos...

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