Acórdão nº 56/07.5TBMSF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelVIEIRA E CUNHA
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: REVOGADA A DECISÃO.

Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO - LIVRO 322 - FLS 80.

Área Temática: .

Legislação Nacional: ARTS 1036º, 1046º, 1072º Nº 2 AL. A) CÓDIGO CIVIL Sumário: I - O caso de força maior a que alude o art° 1072° n°2 al. a) Código Civil é o evento natural ou de acção humana de outrem que não o arrendatário que, embora pudesse prevenir-se, não podia ser evitada, nem em si, nem nas suas consequências danosas e que torne compreensível, aceitável, perfeitamente explicável que aquele não resida na casa arrendada, não se confundindo com a situação de infiltrações de água (por humidades) do andar superior, que é uma situação anómala, mas, por natureza, reparável em curto espaço de tempo.

II - Ainda que as obras de conservação ordinária do locado incumbam ao senhorio — art° 1036° n°1 C.Civ., o arrendatário deve demonstrar que interpelou ou intimou o senhorio para a reparação dos danos resultantes das infiltrações de humidades, sob pena de, não se encontrando a senhoria em mora quanto à sua obrigação de fazer obras, no momento da propositura da acção, nada existir a objectar à resolução do contrato.

III - Ainda que a norma do art° 1046° n°1 se insira numa subsecção do Código Civil relativo à restituição da coisa locada, se as despesas ou benfeitorias realizadas na coisa locada derem origem a um crédito, o início do prazo de prescrição do direito tem lugar quando o direito está em condições de ser exercitado, isto é, logo que o crédito se mostra constituído.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Acórdão do Tribunal da Relação de Porto Os Factos Recurso de apelação interposto na acção com processo sumário nº56/07.5TBMSF, da comarca de Mesão Frio.

Autores – B………., a quem sucedeu, por habilitação de herdeiros, no decurso da acção, C………..

Réus – D………. e marido E………. .

Pedido 1) Que seja declarado resolvido o contrato de arrendamento.

2) Que seja decretado o despejo imediato do local arrendado, para que o mesmo seja entregue aos AA. completamente livre e devoluto.

Pedido Reconvencional Subsidiário Que a Reconvinda seja condenada a pagar aos Reconvintes a quantia de € 5.000, a título de indemnização pelas benfeitorias necessárias e inamovíveis por aqueles realizadas no prédio urbano identificado na Petição Inicial, a que acrescerão juros à taxa legal, desde a notificação da Reconvenção, até efectivo e integral pagamento.

Tese dos Autores É dona de um prédio urbano arrendado à Ré para exploração de estabelecimento comercial de mercearia e vinhos.

Desde Janeiro de 2006 que o locado se encontra encerrado, contínua e permanentemente.

Os Réus vêm usando o prédio para habitação, ou seja, para um fim diverso daquele a que se destina, bem como realizaram obras que alteraram a estrutura interna e externa do locado.

Prescreveu o direito dos RR. à reclamação do valor de quaisquer benfeitorias efectuadas no locado.

O fim a que se destinava o locado sempre foi, no seu todo, fim comercial, sendo desconhecida da Autora qualquer outra utilização do locado, designadamente habitacional.

Tese da Ré A Autora consentiu em que os RR. fizessem do locado habitação, permitindo-lhe condições de habitabilidade e salubridade, que não detinha, e realizando obras, com as quais valorizaram o locado em, pelo menos, € 5.000.

O locado encontra-se fechado para a realização de obras que permitam que o locado funcione como mercearia, com exposição de produtos alimentares.

Tais rendas foram sempre propostas à Autora, que sempre se recusou realizá-las.

Não deixou porém o locado de funcionar para armazenamento de produtos alimentares, relativamente a outro estabelecimento que os RR. possuem na vila de Mesão Frio.

Sentença Na sentença proferida pela Mmª Juiz “a quo”, a acção foi julgada integralmente improcedente, e os Réus absolvidos dos pedidos.

Conclusões do Recurso de Apelação da Autora (resenha): 1 – Foram alegados e provados dois fundamentos de resolução do contrato: a) que, desde Janeiro de 2006, o locado se encontra encerrado contínua e permanentemente; b) que os RR. fizeram um uso do prédio para fim diverso daquele a que se destinava, ainda que parcialmente, sem conhecimento e sem consentimento da Autora (no armazém da mercearia fizeram uma casa de habitação).

2 – Tais comportamentos são susceptíveis de tornar inexigível ao senhorio a manutenção do contrato.

3 – O Tribunal recorrido fez errada interpretação do artº 1083º nº2 als c) e d) C.Civ.

4 – A necessidade de preenchimento do conceito genérico e indeterminado de incumprimento como fundamento de resolução do contrato (artº 1083º nº2 C.Civ.) só se exige para outro tipo de incumprimentos que não os constantes das alíneas desse nº2, porque estes, por si sós, preenchem aquele conceito genérico e indeterminado (neste sentido, Pinto Furtado, Manual do Arrendamento Urbano, 4ª ed., II).

Em contra-alegações, os Réus pugnam pela manutenção do julgado.

Salientam encontrar-se provado que a Autora sabia da realização das obras, por parte dos RR., desde a data do casamento destes, em 1986, bem como ter ficado provado que o locado se encontrava encerrado por necessitar de obras para poder funcionar com estabelecimento comercial e que, durante o período do encerramento, os RR. se serviram do locado como armazém.

Factos Considerados Provados em 1ª Instância 1 – Encontra-se registada a favor da Autora a propriedade do prédio urbano sito no ………., ………., em Mesão Frio, composta por casa de rés-do-chão, andar e anexo, inscrito na respectiva matriz predial sob o artº 228º e descrito na Conservatória do Registo Predial de Mesão Frio sob o nº 00036/050188.

2 – Com relação ao prédio referido em 1, foi verbalmente acordado entre o pai da Autora e os pais da Ré mulher um arrendamento.

3 – No âmbito do processo de inventário por virtude do decesso da mãe da Ré mulher, em 3/2/85, o estabelecimento comercial existente no prédio referido em 1, propriedade da mesma e do seu cônjuge, foi adjudicado a esta última.

4 – A partir da adjudicação referida em 3), a Ré mulher procedeu ao pagamento das rendas relacionadas com o arrendamento referido em 2), as quais, em Abril de 2007, ascendem a € 44,54.

5 – Posteriormente ao seu casamento, em 26/11/86, os RR. foram residir para o locado, o qual passou a ser composto por uma zona comercial e, na parte restante, pela sua casa de habitação.

6 – Em Abril de 2007, o prédio referido em 1) encontrava-se arrendado à Ré mulher.

7 – Para a exploração de um estabelecimento comercial de mercearia e vinhos.

8 – O acordo verbal referido em 2) reporta-se a meados dos anos 50 do século passado.

9 – Desde Janeiro de 2006 que o locado se encontra encerrado, de forma contínua e permanente.

10 – O locado tinha as paredes divisórias em barro, não possuía instalação eléctrica e ligação de água e parte do seu chão era em terra batida.

11 – Pelo que, para permitir a habitabilidade do locado, os RR. criaram quatro divisões, colocaram azulejo no chão da sala, cozinha e quarto de banho, pintaram e substituíram as paredes divisórias, instalaram electricidade e água e mobilaram a cozinha.

12 – A A. teve conhecimento da realização de obras na ocasião referida em 14).

13 – As obras referidas em 11) aumentaram o valor do locado em € 5.000.

14 – Tendo sido realizadas no ano de casamento dos RR.

15 – Não sendo susceptíveis de daí serem retiradas.

16 – O locado esteve encerrado para serem realizadas obras.

17 – Por não reunir condições para o funcionamento do estabelecimento comercial.

18 – O chão do estabelecimento comercial é em cimento e o seu tecto em madeira.

19 – Estando as paredes com humidade, o que impossibilita a colocação de produtos alimentares nas prateleiras.

20 – E existindo, por cima do estabelecimento, uma moradia familiar, cuja utilização da casa de banho inunda o tecto e as paredes do locado.

21 – Durante o período de encerramento referido em 16), os RR. colocaram um aviso, no sentido de o estabelecimento se encontrar encerrado, por motivo de obras.

22 – Durante o período de encerramento do locado, os RR. serviram-se dele para armazenar produtos que iriam comercializar num outro estabelecimento comercial que possuem em Mesão Frio.

23 – Cuja exploração pelo R. marido teve início antes do seu casamento.

Fundamentos As questões colocadas pelo presente recurso são as seguintes: - procedência dos dois fundamentos invocados para a resolução do contrato: a) que, desde Janeiro de 2006, o locado se encontra encerrado contínua e permanentemente; b) que os RR. fizeram um uso do prédio para fim diverso daquele a que se destinava, ainda que parcialmente, sem conhecimento e sem consentimento da Autora (no armazém da mercearia fizeram uma casa de habitação); - eventual análise àcerca da procedência do pedido reconvencional subsidiário.

Apreciemos, uma por uma, as ditas questões.

IA primeira questão que cumpre analisar prende-se com o invocado uso para fim diverso do prédio, fim esse de natureza habitacional.

Se é verdade, haver-se provado que os RR. construíram ou adaptaram o armazém da mercearia a casa de habitação, não menos verdade é que (10) o locado tinha as paredes divisórias em barro, não possuía instalação eléctrica e ligação de água e parte do seu chão era em terra batida, (11) os RR. criaram quatro divisões, colocaram azulejo no chão da sala, cozinha e quarto de banho, pintaram e substituíram as paredes divisórias, instalaram electricidade e água e mobilaram a cozinha, (12) a A. teve conhecimento da realização de obras na ocasião (14) do ano de casamento dos RR., casamento esse ocorrido (5) em 26/11/86. Mais se provou que (4) a Ré...

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