Acórdão nº 150-D/1996.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelISAÍAS PÁDUA
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: AGRAVO Decisão: CONFIRMADA Legislação Nacional: ARTºS 351º E SEGS. DO CPC.

Sumário: I – Ao contrário do regime anterior, hoje os embargos de terceiro não se destinam apenas à defesa da posse lesada pela diligência judicial mas, também, à defesa de “qualquer direito incompatível com a realização ou âmbito da diligência”.

II – Dispõe o artº 351º, nº 1, do CPC, que “se a penhora ou qualquer acto judicialmente ordenado de apreensão ou entrega de bens, ofender a posse ou qualquer direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência, de que seja titular quem não é parte da causa, pode o lesado fazê-lo valer deduzindo embargos de terceiro”.

III – O embargante terá não só de alegar e provar os factos constitutivos do seu direito (que pode ir da simples posse até ao próprio direito de propriedade) como também a desconformidade (incompatibilidade) da diligência com esse seu direito.

IV – Como regra, o promitente-comprador que obteve a traditio da coisa apenas frui um direito de gozo, que exerce em nome do promitente-vendedor e por tolerância deste – sendo, nesta perspectiva, um possuidor ou detentor precário.

V – Todavia, pode em circunstâncias excepcionais a tradição da coisa, em contrato-promessa, envolver a transmissão da posse a favor do promitente-comprador (transformando este num verdadeiro possuidor), tudo dependendo do animus que acompanha o corpus, e a forma como ambos são exercidos ou se revelam na concreta realidade.

Decisão Texto Integral: Acordam neste Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório 1. Por apenso aos autos de inventário, nº 150/1996, do 3º juízo cível do tribunal de Leiria, que tiveram lugar para partilha da herança deixada por óbito de A...

, no qual são interessadas as suas filhas - B...

e C....

-, e onde corre actualmente execução para venda de imóvel ali inicialmente adjudicado à interessada B..., D...

deduziu (em 13/2/2009) embargos de terceiro.

Para o efeito, alegou, em síntese, o seguinte: 1.1 Ser residente em .... e ter outorgado, em 17/12/2005, um contrato-promessa de compra e venda do prédio urbano sito na...., inscrito na matriz predial urbana sob o nº .... da freguesia de ...., composto por r/c, 1º, 2º e 3º andar, no qual a referida B..., afirmando-se dona e possuidora do referido imóvel, declarou prometer vender ao embargante, livre de ónus ou encargos, o referido prédio, pelo preço de € 60.000,00, a ser pago no acto da escritura pública, que aquela se comprometeu a marcar.

Logo nessa data aquela promitente-vendedora lhe entregou as chaves do imóvel, entrando o embargante na posse do mesmo.

1.2 Todavia, a referida promitente-vendedora nunca mais marcou a escritura pública com vista formalizar o negócio prometido, sendo certo que o ora embargante continua a manter interesse na sua realização.

1.3 Porém, quando o ora embargante fez, em inícios de 2009, um ultimato à referida B...no sentido de marcar a tal escritura, esta informou-o então que o imóvel (objecto do aludido contrato-promessa) iria ser vendido em tribunal no dia 13/2/2009, o que o deixou chocado por o ora embargante ter a sua posse, e ter direito de retenção sobre o mesmo.

1.4 Pelo que terminou pedindo a procedência dos embargos, com o cancelamento da venda do referido imóvel e bem assim dos registos e aquisições que venham a fazer-se sobre o mesmo.

1.5 Para prova do alegado juntou prova documental (referente ao invocado contrato-promessa) e arrolou prova testemunhal (duas testemunhas, por sinal com residência coincidente com a do referido imóvel, sendo precisamente uma delas a alegada promitente-vendedora).

  1. Conclusos que lhe foram os autos, a srª juiz do processo proferiu despacho em que rejeitou liminarmente os aludidos embargos (o que fundamentou por ausência de alegação e demonstração dos invocados direitos de posse e de retenção sobre o aludido imóvel, ou seja, quanto ao último por inexistência de qualquer direito de crédito, e quanto ao primeiro devido à ausência de alegação de factos ou actos materiais que possam conduzir à conclusão da existência de posse sobre o referido imóvel pelo embargante).

  2. Não se tendo conformado com tal decisão, dela apelou o embargante.

  3. Nas correspondentes alegações que apresentou a tal recurso, o embargante concluiu as mesmas nos seguintes termos: “a) A sentença recorrida indeferiu liminarmente os embargos, sem que o embargante tivesse oportunidade de produzir prova; b) O embargante tem a posse do imóvel e goza do direito de retenção; c) Deveria ter-se permitido que, no mínimo, o embargante produzisse prova relativamente à matéria dos embargos; d) Foram violadas as seguintes normas: artigo 351º do CPC e artigos 342º, 755º e 1285º do Código Civil.” 5. Contra-alegou a interessada, C..., defendendo a inadmissibilidade do recurso (com o fundamento das respectivas alegações não terem sido juntas com o requerimento de interposição do recurso) e, caso assim não se entenda, pugnando pela improcedência do recurso, com a manutenção do despacho recorrido.

  4. Em despachos preliminares do relator (e apreciando a questão prévia suscitada nas contra-alegações pela interessada B...), decidiu-se, por um lado, admitir o recurso e, por outro, alterar a espécie do recurso de apelação (como havia sido recebido na 1ª instância) para agravo.

  5. Cumpre-nos, agora, apreciar e decidir.

    *** II- Fundamentação A) De facto.

    Com interesse para a decisão e melhor compreensão do objecto do presente recurso, devem ter-se como assentes os factos supra descritos sob o ponto I e ainda os seguintes (todos resultantes das diversas peças processuais e documentais que integram e acompanharam estes autos): 1. O imóvel referido em 1.1 do ponto I foi adjudicado (entre...

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