Acórdão nº 1213-A/2001.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelSERRA BAPTISTA
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1 – No domínio das relações imediatas, e tratando-se de uma livrança em branco, é livremente oponível ao portador da letra a inobservância do pacto de preenchimento; 2 – A obrigação do avalista é materialmente autónoma, ainda que formalmente dependente da do avalizado; 3 – Atenta esta autonomia, o avalista não pode defender-se com as excepções do avalizado, salvo no que concerne ao pagamento; 4 – Mas, se tiver intervindo no pacto de preenchimento, pode opor ao portador, se o título não tiver entrado em circulação, a excepção do preenchimento abusivo; 5 – Ficando a seu cargo o respectivo ónus da prova; 6 – Preenchida a livrança com violação do pacto, no tocante ao montante acordado, deve a responsabilidade do embargante limitar-se à assumida no respectivo acordo, confinando-se a dívida aos limites de tal pacto; 6 – Mas, preenchida a livrança em branco ao completo arrepio do pacto de preenchimento antes celebrado, visando, afinal, garantir um outro diferente empréstimo pelo mesmo exequente também concedido, provado que ficou, na íntegra, o preenchimento abusivo invocado, não vale a mesma livrança assim preenchida como título executivo.

Decisão Texto Integral: ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: A CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS. SA. veio intentar acção executiva para pagamento de quantia certa, sob a forma de processo ordinário, contra AA e BB, reclamando a cobrança coerciva do montante de 93.030.460$40, correspondendo o montante de 55.064.383$00 ao capital mutuado, a quantia de 37. 954.577$40, aos juros vencidos entre 15/01/1994 e 20/12/2001 (empréstimo em conta corrente) e entre 15/01/1999 e 20/12/2001 (empréstimo de curto prazo titulado por livrança) e a importância de Esc. 11.500$00, a despesas havidas no quadro do primeiro mútuo, acrescendo os juros vencidos desde 20/12/2001, à razão de Esc. 8.569$00 por dia, respeitantes à abertura de crédito em conta corrente e à taxa legal de 10% no que se refere ao empréstimo de curto prazo, até integral pagamento.

Funda esse pedido nos seguintes títulos executivos: - Contrato de abertura de crédito que celebrou, em 29/06/1992, com a empresa CC - CONSTRUÇÃO CIVIL, LDA., por um prazo de 6 meses renovável, até ao montante de 20.000.000$00, e destinado a suprir eventuais deficits de tesouraria e a fazer face a quaisquer responsabilidades assumidas ou a assumir pela mutuária perante a mutuante e relativamente ao qual a aqui Executada e o marido BB se constituíram fiadores, tendo tal negócio jurídico sido incumprido a partir de 15/01/1994; - Subcrição por parte da executada e marido, no lugar do aval, de uma livrança em branco para garantia de um contrato de empréstimo de curto prazo (180 dias), destinado a apoio de tesouraria e no montante máximo de 20.000.0000$00 (capital mutuado), que a Exequente celebrou com a referida empresa CC– CONSTRUÇÃO CIVIL, LDA, tendo o dito título sido oportunamente preenchido e com data de vencimento de 14/1/99.

Citada a executada, veio a mesma deduzir embargos à execução, tendo neles alegado, em síntese: Em relação ao empréstimo através de crédito em conta corrente, prestou fiança como sócia da sociedade mutuária, CC, LDA., qualidade que perdeu em 2 de Abril de 1993, quando a dívida ainda não estava vencida.

Em relação às obrigações futuras, a fiança sempre seria nula, por não conter quaisquer limites ou critérios para a determinação das obrigações garantidas.

Assim, quer no período de renovação do contrato, quer no da contabilização dos juros, a embargante já não era sócia daquela sociedade, conforme a exequente sabia, por lhe ter sido comunicado.

Além disso, a fiança não foi prestada de acordo com o formalismo legal, não foram executados os bens da devedora e a embargante não foi interpelada quanto à dívida e juros de mora.

Em relação aos juros, estão prescritos os com mais de 5 anos, nos termos do artigo 310.°, alínea d) do Código Civil, pelo que ainda agora a dívida não é certa nem exigível, além de os juros pedidos estarem muito acima da taxa de juro aplicável às operações activas de crédito, e de ter havido cálculo de juros sobre juros.

Finalmente, não se compreende a demora na instauração da execução, e que a embargante e o seu marido sempre tentaram o pagamento, pelo que nunca poderia existir mora da sua parte.

Em relação ao crédito de curto prazo, e garantido por aval, o seu preenchimento foi abusivo, existindo mesmo abuso de direito, uma vez que o aval foi prestado apenas para garantir responsabilidades enquanto a embargante fosse sócia da sociedade, o que já não acontecia à data do seu vencimento, sendo certo que também não tirou nenhum proveito dos assuntos de tesouraria da sociedade.

Além disso, o negócio subjacente é nulo, nos termos do artigo 280.°, nº 1 do Código Civil, por não estarem determinados os títulos de que poderiam resultar as obrigações a garantir.

Por outro lado, existe desconformidade entre a data e o valor da livrança dada à execução e o referido contrato, tudo indicando que essa livrança foi entregue para uma operação distinta da dos autos.

Em relação aos juros pedidos, dá como reproduzido o que alegou em relação ao primeiro empréstimo, acrescentando que, em qualquer caso, a taxa de juro nunca poderia ser superior a 7%.

Termina pedindo a intervenção de terceiros e a suspensão da execução em relação ao primeiro empréstimo.

Notificada a embargada para contestar a oposição deduzida, veio apresentar a sua contestação, tendo nela, e também suma, alegado: Em relação ao primeiro empréstimo, a fiança não ficou limitada ao período em que a embargante fosse sócia da sociedade, até porque a CGD a informou de que não aceitava essa liberação.

Não existe mora da sua parte, uma vez que não era obrigada a receber parcialmente a prestação, nos prazos e condições pretendidos pelos devedores.

A fiança foi prestada nos termos legais e é válida, não havendo qualquer indeterminação do seu conteúdo.

Em relação ao crédito garantido por aval, foi respeitado o acordo de preenchimento da livrança, embora tenha ocorrido um lapso na data e valor que nela constam.

Uma vez que estão em causa obrigações mercantis, não existe o benefício de excussão prévia Os juros de mora foram calculados nos termos acordados e, sobre a prescrição dos juros, alega que a mesma foi interrompida com a acção executiva, além de que a embargante foi interpelada através de carta de 20.06.1996, seguida de várias reuniões onde, com o seu marido, reconheceu ambos os débitos.

A embargada veio ainda opor-se ao incidente de intervenção principal provocada.

Foi indeferido o incidente de intervenção principal provocada por despacho do senhor Juiz do processo, o qual foi objecto de recurso de agravo por parte da Embargante (fIs. 67), admitido a fIs. 69 e que subiu a este mesmo Tribunal da Relação de Lisboa, para apreciação, ignorando-se qual a decisão final do mesmo.

Foi proferido despacho saneador, tendo sido fixado os factos assentes e organizada a base instrutória.

Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho junto de fls 204 a 208 consta.

Foi proferida a sentença que, julgando os embargos parcialmente procedentes, decidiu:

  1. Julgar extintos, por prescrição, os juros de mora anteriores a 24.12.1996.

  2. que não são devidos juros de mora sobre os montantes de juros capitalizados, de € 2.485,24 (fls. 199) e de € 2.220,65 (fls. 200), pelo que a execução não deve prosseguir em relação aos montantes de € 2.192,00 (fls. 199) e de € 2.744,98 (fls. 200), e a juros vencidos ou vincendos sobre aqueles primeiros montantes.

  3. O valor em dívida do empréstimo de curto prazo, garantido pela livrança, vence juros de mora a partir de 15.01.1999 às taxas legais dos juros de mora civis, acima mencionadas, decorrentes do artigo 559.º do CC.

Julgando-se os embargos improcedentes na parte restante.

Inconformados, vieram, embargante e embargada, interpor recurso dessa sentença para o Tribunal da Relação de Lisboa, onde, por acórdão de 18 de Junho de 2009, se decidiu: a) julgar-se parcialmente procedente o recurso de apelação da embargante AA e, nessa medida, alterar a decisão recorrida, com a absolvição da recorrente do pedido executivo contra ela formulado com fundamento no aval aposto pela mesma na livrança dada à execução; b) julgar-se parcialmente procedente o recurso de apelação subordinado da CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS e, nessa medida, revogar a decisão recorrida na parte em que relativamente ao contrato de abertura de crédito (1º empréstimo), considerou prescritos os juros de mora vencidos até 24/12/96 e entendeu não serem devidos os juros de mora no...

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