Acórdão nº 3531/03.7TTLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1.

Ressalvadas as limitações constantes dos n.os 5 e 6 do artigo 10.º da LCCT, a empregadora, directamente ou através do instrutor que tenha nomeado, está obrigada a realizar as diligências probatórias requeridas pelo arguido na resposta à nota de culpa, sendo que a não realização de tais diligências, se não devidamente fundamentada, acarreta, necessariamente, a invalidade do processo disciplinar e, consequentemente, a ilicitude do despedimento, nos termos do artigo 12.º, n.º 1, alínea a), e n.º 3, alínea b), da LCCT.

  1. O procedimento disciplinar que a empregadora moveu contra o trabalhador — e que culminou com a aplicação da sanção de despedimento, com fundamento em justa causa — é de reputar inválido por violação do direito de defesa do arguido, no caso consubstanciado pela omissão da realização de uma das diligências de prova requeridas aquando da resposta à nota de culpa.

  2. Não resultando da matéria de facto provada qualquer factualidade da qual se possa extrair que o autor contribuiu para a não inquirição da testemunha arrolada na resposta à nota de culpa, não se vislumbra o abuso do direito invocado.

    Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

    Em 2 de Julho de 2003, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, AA instaurou a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra BB PORTUGAL, GESTÃO DE PROJECTO E OBRAS LDA., pedindo que fosse: (a) declarada a nulidade do seu despedimento, por ilícito, com as legais consequências; (b) declarada como abusiva a sanção de despedimento, com as legais consequências, e, a ser assim, a ré condenada a pagar-lhe, a título de indemnização prevista no artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 49.408 de 24 de Novembro de 1969, os montantes a apurar em sede executiva; (c) declarada a caducidade do processo disciplinar que conduziu ao despedimento, com as legais consequências; (d) a ré condenada a reintegrá-lo no posto de trabalho, com as legais consequências, ou (e) condenada a pagar-lhe uma indemnização de antiguidade, nos termos do n.º 3 do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, a calcular até à data da sentença, acrescida de juros legais desde a citação até ao integral pagamento, opção a ser tomada oportunamente; (f) a ré condenada a pagar-lhe a quantia referente às prestações pecuniárias já vencidas, bem como todas as vincendas até à data da sua reintegração, a liquidar em execução, tudo acrescido de juros à taxa legal até integral pagamento; (g) a ré condenada a um pagamento anual de € 977,17, referentes aos custos suportados pela empresa com o respectivo seguro de vida, desde o despedimento até à data da sua reintegração, acrescidos de juros; (h) a ré condenada a um pagamento anual de € 1.448,19, referentes aos custos suportados pela empresa com o seguro de saúde, para o autor e agregado familiar, desde o despedimento até à data da sua reintegração, acrescidos de juros; (i) a ré condenada no pagamento de montante a apurar em sede executiva, atinente ao valor mensal de € 249,40, referentes aos custos suportados pela empresa com a utilização do seu telemóvel, desde o despedimento até à data da instauração da acção, assim como todos os valores vincendos até à sua reintegração, acrescidos de juros; (j) a ré condenada no pagamento de montante a apurar em sede executiva, correspondente ao valor mensal de € 498,80, referentes aos custos suportados pela empresa com o pagamento de despesas consignado em contrato, desde o despedimento até à data da instauração da acção, assim como todos os valores vincendos até à sua reintegração, acrescidos de juros; (k) a ré condenada a pagar a quantia de € 6.000, relativos ao subsídio de alimentação, nunca recebido, no valor de € 150 mensais, desde Março de 2000 até à data da instauração da acção, assim como todos os valores vincendos até à sua reintegração, acrescidos de juros; (l) a ré condenada a pagar a quantia de € 50.000, a título de indemnização por danos não patrimoniais; (m) a ré condenada a pagar, a título de sanção pecuniária compulsória, € 1.000, por cada dia de atraso na sua readmissão, destinando-se a referida quantia, em partes iguais, para o autor e para o Estado; (n) a ré condenada no pagamento das custas do processo, de procuradoria condigna e dos demais encargos legais.

    Em síntese, alegou que foi despedido, por carta recebida em 9 de Julho de 2002; porém, o processo disciplinar enferma de várias nulidades, invocando, ainda, a caducidade do mesmo; mais sustenta que os factos que lhe foram imputados na nota de culpa são falsos e que a sanção disciplinar aplicada é abusiva.

    A ré contestou, reiterando a justa causa para o despedimento e impugnando as invocadas caducidade e nulidades do processo disciplinar.

    Após o julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a ré do pedido.

    Na sequência dos recursos de agravo e de apelação interpostos pelo autor, o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu: a) quanto ao agravo de fls. 1.039, revogar o despacho recorrido, «que deverá ser substituído por outro que admita a junção do documento de fls. 1026 a 1032 e ordene a notificação da Ré nos termos requeridos pelo A.»; b) em conformidade, anular o julgamento, ordenando-se a repetição do mesmo quanto a aspectos relacionados com a resposta aos artigos 1.º e 3.º da base instrutória; c) manter os despachos impugnados pelo recurso de agravo de fls. 1092 e considerar prejudicado o objecto do mesmo quanto à impugnação da resposta dada ao ponto 1.º da base instrutória e a arguição de nulidade da sentença e a apelação.

    Realizado novo julgamento, foi exarada sentença que decidiu julgar a acção improcedente, por não provada, e absolver a ré do pedido.

  3. Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa julgado procedente o recurso, declarando ilícito o despedimento do autor e condenando a ré (a) a reintegrar o autor, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, e a pagar-lhe as prestações pecuniárias correspondentes ao valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à reintegração, que são a remuneração mensal de € 6.272,38, o prémio do seguro de vida do autor no montante anual de € 977,17, o prémio do seguro de saúde MEDIS, para o autor e agregado familiar, no montante anual de € 1.448,19, a quantia de € 249,40, mensais inerentes ao direito de utilização de telemóvel, e a quantia de € 498,80, inerentes ao pagamento de despesas, com as deduções a que se refere o n.º 2 do artigo 13.º da LCCT, tudo a liquidar na execução, e (b) a pagar ao autor, sobre as prestações acima referidas, juros de mora, à taxa legal, até integral pagamento, condenando, também, a ré a pagar, por cada dia de atraso no cumprimento da readmissão do autor, a partir do trânsito em julgado do acórdão, o montante diário de € 200,00, que se destina, em partes iguais, ao autor e ao Estado, absolvendo a ré dos demais pedidos.

    É contra esta decisão do Tribunal da Relação de Lisboa que a ré agora se insurge, mediante recurso de revista, em que alinha as seguintes conclusões: «1.ª Em virtude da indisponibilidade das três testemunhas residentes no estrangeiro oferecidas pelo Recorrido se deslocarem a Portugal, foi proposto pelo instrutor do processo disciplinar e acordado com o Mandatário do Recorrido a audição daquelas testemunhas através de depoimento[s] escritos de cada uma delas.

    2.ª Para o efeito, foram solicitados por escrito ao Mandatário do Recorrido questionários donde constassem os factos sobre os quais pretendia fossem interrogadas as testemunhas.

    3.ª Considerando que a responsabilidade pela apresentação das testemunhas para depor oferecidas, pelo Arguido, recai sobre este, nos termos do n.º 6 do art. 10.º da LCCT, tal responsabilidade abrange, por decorrência lógica da mesma norma, quanto aos depoimentos escritos das mesmas, no caso dos autos, as diligências para que se verifique a remessa tempestiva dos questionários e dos depoimentos ao Processo Disciplinar.

    4.ª Na falta do depoimento escrito da testemunha J… S…, a Recorrente não estava obrigada à alegação escrita prevista n.º 5 do art. 10.º da LCCT, ao contrário do que decidiu o Acórdão recorrido.

    Isto porque, 5.ª Tal alegação só é exigível na hipótese legal prevista na norma citada de a Empresa /instrutor considerar a diligência dilatória ou impertinente, o que não sucedeu no caso dos autos pois que foi ela própria que propôs a audição da testemunha por documento escrito, por a sua deslocação a Portugal se mostrar inviável.

    6.ª A Recorrente nem sequer era obrigada a propor o depoimento escrito a enviar para o Processo Disciplinar, pois que a apresentação das testemunhas, residentes ou não no estrangeiro, incumbia, por obrigação legal, ao Recorrido e se este não podia apresentá--las por ser inviável a sua deslocação a Portugal — fosse qual fosse a razão da inviabilidade — nenhuma das três testemunhas seriam ouvidas sem que pudesse ser assacada qualquer responsabilidade à Recorrente.

    7.ª Aliás, o Instrutor do processo disciplinar agiu sempre com enorme flexibilidade, cooperação e boa fé quanto à instrução do processo, não só 8.ª Propondo o depoimento escrito para as testemunhas residentes no estrangeiro, como 9.ª Esperando, mais de dois meses, pelos depoimentos escritos de duas daquelas testemunhas, ou seja, desde 23.04.2002 (a fls. 49 do Processo Disciplinar), data em que propôs os depoimentos escritos e solicitou indicação dos factos e serem perguntados às testemunhas, até lhe terem sido enviados os depoimentos, em 03.07.2002, como, ainda, 10.ª Aceitando as testemunhas L… G… e J… D…, claramente extemporâneas, pois a Recorrente só tinha obrigação de as aceitar se tivessem sido arroladas na resposta à nota de culpa, o que não sucedeu, pois foram oferecidas cerca de dois meses depois.

    11.ª Tal comportamento da Recorrente não foi reconhecido pelo...

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